tag:blogger.com,1999:blog-21921682837274791412024-02-20T10:02:48.813+00:00Coração DuploCrítica Literária | Filipa MeloFilipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comBlogger423125tag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-34648165498291220972021-08-19T18:10:00.010+01:002021-08-19T23:32:42.472+01:00Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><br /><p class="p1" style="font-family: Helvetica; font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; text-align: justify;"><br /></p><p class="p2" style="font-family: Helvetica; font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; min-height: 14px; text-align: justify;"><br /></p><p class="p1" style="font-family: Helvetica; font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; text-align: justify;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg2Ux37qBCEeEt1qk78rbnl0Lqo125jEKaDdmj4_FsLfJaYforgKzjeJ8dekp1JL0swLF9tZoa4uYEOUWeNfkQk_UXQmHFQxazhyYqKxv-kRKxtfuFTaLMHn64Wn2wP9iTbSdCn1iZsOZg/" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img alt="" data-original-height="1280" data-original-width="1920" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg2Ux37qBCEeEt1qk78rbnl0Lqo125jEKaDdmj4_FsLfJaYforgKzjeJ8dekp1JL0swLF9tZoa4uYEOUWeNfkQk_UXQmHFQxazhyYqKxv-kRKxtfuFTaLMHn64Wn2wP9iTbSdCn1iZsOZg/w640-h426/boy-60778_1920.jpg" width="640" /></a></div><b><span style="font-family: verdana;">Khaled Hosseini retratou o amor filial<span class="Apple-converted-space"> </span>e o Afeganistão </span></b></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><b><span style="font-family: verdana;">e arrasou as tabelas.</span></b></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><b><span style="font-family: verdana;"><br /></span></b></div></div><p class="p1" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; text-align: justify;"><span style="font-family: verdana;">Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, Saboor conta ao filho Abdullah (dez anos e meio) e à filha Pari (três anos e meio) a história de um <i>dev</i> (demónio) que obrigou um pobre homem a entregar-lhe o filho mais novo e lhe roubou a memória. No dia seguinte, partem os três pela montanha em direcção a Cabul, onde Pari é vendida a um casal rico. Na aldeia, ninguém mais falará deste «dedo cortado para salvar a mão», mas Pari persiste no coração de Abdullah «como a poeira que se lhe colava à camisa». Mais de seis décadas e quase 400 páginas depois, os dois irmãos irão reencontrar-se. <i>E as Montanhas Ecoaram</i> é o terceiro romance do ex-médico internista afegão Khaled Hosseini (n. 1965), autor dos <i>best sellers O Menino de Cabul</i> e <i>Mil Sóis Resplandecentes</i>; 50 milhões de livros vendidos em 70 países e 57 línguas.<span class="Apple-converted-space"> </span></span></p><p class="p1" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; text-align: justify;"><span style="font-family: verdana;">No topo das tabelas de venda e em algumas destronando Inferno de Dan Brown, E as Montanhas Ecoaram prova que a arte de contar histórias unida a uma qualidade literária superior também cria fenómenos comerciais. A raiz deste sucesso é a aura mítica evocada em cada narrativa através dos saltos no tempo, das mudanças de registo da enunciação e da intensidade emocional com que Hosseini desenha, entrelaça e multiplica os retratos de uma dúzia de personagens.</span></p><p class="p1" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; text-align: justify;"><span style="font-family: verdana;">O escritor diz admirar As Vinhas da Ira de Steinbeck e, na verdade, os seus painéis narrativos devem muito ao tema do deslocado. «Como um comboio em movimento», a rede de histórias de vida em E as Montanhas Ecoaram abre-nos janelas inesperadas sobre o passado e o presente do Afeganistão, a relação do país com o exterior e a saga épica daqueles que o trocam pelo Ocidente ou que, mais tarde, pretendem resgatá-lo (Timur e Idris, vindos da Califórnia). Personagens como Adel (filho de um comandante terrorista), Markos (cirurgião plástico), Nila Wahdati (mãe adoptiva de Pari), Parwana (segunda mulher de Saboor, irmã gémea de Massoma), o seu irmão Nabi (cozinheiro e motorista em Cabul) ou Pari (filha de Abdullah, herdeira do nome e da memória da irmã perdida) são construções delicadas que revelam o interior do mundo afegão: «as esperanças e mágoas e sonhos que jaziam disfarçados por pele e osso».</span></p><p class="p2" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px; min-height: 14px; text-align: justify;"><span style="font-family: verdana;"><b><br /></b></span></p><p class="p3" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span style="font-family: verdana;"><b><i>E as Montanhas Ecoaram</i>, Khaled Hosseini, Editorial Presença, 392 págs.</b></span></p><p class="p3" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span style="font-family: verdana;"><br /></span></p><p class="p3" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span style="font-family: verdana;">SOL/19-07-2013</span></p><p class="p3" style="font-size: 12px; font-stretch: normal; font-variant-east-asian: normal; font-variant-numeric: normal; line-height: normal; margin: 0px;"><span style="font-family: verdana;">© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)</span></p>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-38635882144482492312019-07-26T04:53:00.002+01:002019-07-26T05:13:34.570+01:00José Riço Direitinho | O sexo que nos ilumina<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjCLo9M7YEOWDkLqGc28el8qbdZpRUPITaaY_HjPksFqy9ndw6ekGYHFlfi-WKy7kthoiHb4G_2zK1oUDfSq-ejViafcYRINjTR97UXvO_oKx437CJcxQFedJePBkFoZBYXivRFdcwh_N0/s1600/rosca.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="560" data-original-width="840" height="425" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjCLo9M7YEOWDkLqGc28el8qbdZpRUPITaaY_HjPksFqy9ndw6ekGYHFlfi-WKy7kthoiHb4G_2zK1oUDfSq-ejViafcYRINjTR97UXvO_oKx437CJcxQFedJePBkFoZBYXivRFdcwh_N0/s640/rosca.jpg" width="640" /></a></div>
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span>
<span style="font-family: "cochin";">Em Portugal, temos o hábito muito entranhado de, em público, não chamarmos as coisas pelos seus nomes, não darmos os nomes devidos às coisas. Não darmos nome às queixas, às zangas, às conquistas, às dores, às derrotas, aos sentimentos, e sobretudo, sobretudo, não darmos a palavra ao sexo. Salvo raríssimas exceções, não a demos durante séculos na literatura. Até que chega o dia. Ou, como diria Bocage, um desses poucos que honrosamente quebraram a regra. Chegou por fim “o fornicário dia”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Chegou com <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Escuro Que te Ilumina</i>, o regresso de José Riço à ficção, após 13 anos de silêncio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Perfila-se pois, riço e bem direitinho, o autor. </span><span style="font-family: cochin;">Ele é um homem – evidência – corajoso, um escritor que os tem no sítio – uma evidência para quem acabar de ler estas 142 páginas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Este é um romance pequeno, mais novela, talvez. É a fala confessional de um homem, sem nome, professor catedrático, que, à noite, espreita os vizinhos e se apaixona platonicamente por uma mulher, cujos gestos observa minuciosa e enlevadamente através de um telescópio apontado ao prédio da frente. Diz: “O trágico da paixão, a minha, é ter de a viver sozinho.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Há quem assegure que as pessoas mais tristes e solitárias na intimidade são aquelas que mais fazem rir os outros em público. São o palhaço triste, mascarado, disfarçado de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">entertainer</i>. Neste livro, solidão acaba por rimar com muita tesão. Exibicionismo também. Mas, sobretudo, com uma tesão melancólica, passada ao acto no <i style="mso-bidi-font-style: normal;">bas-fond</i> de Lisboa e arredores, em bares ou em terrenos baldios, onde se pratica <i style="mso-bidi-font-style: normal;">glory holes</i> e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">happy ends, </i>chuvas douradas e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">butt </i><i>plugs</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">figging</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">dogging ou carparking</i> — se não sabem o que nada disto é, leiam o livro – rituais plurais, yoyeuristas, sadomasoquistas, o que se quiser como expressão sexual livre.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">O protagonista apresenta-se de batina preta, “desabotoada de alto a baixo: o hissope levantado na mão quando me aproximava dos grupos, dando-lhes uma mãozinha no que fosse preciso: fé, esperança e caridade:”, aspergindo-os por fim com um muito pós-moderno amor líquido.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Faz sexo com desconhecidos, serve-lhe “para tornar a realidade irreal: é esse o jogo, estar e não estar. O outro não existe como alguém, ainda não teve tempo para ser outro para quem o olha: é uma coisa, menos <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>do que um corpo, é um s<i style="mso-bidi-font-style: normal;">ex toy </i>que se mexe por si, sem precisar de pilhas.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, neste livro há carne, muita carne, senhores, e é servida crua. Nome a nome, gesto a gesto, está aqui o que (quase?) nunca esteve assim num romance português: sexo a nu, mostrado de forma amoral.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">É verdade que Riço Direitinho o <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>temperou com suficiente meta-ficção. O protagonista ensina literatura, é culto, cita Nietzsche, Al Berto, Klaus Knausgard — a quem, suspeito, se deve muito do impulso de auto-ficção deste livro —, Ângelo de Lima, Borges, Vergílio Ferreira, Kavafis, Rubem Fonseca ou Agustina Bessa Luís.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Mas diz, por exemplo: </span><span style="font-family: cochin;">“Estou cada vez mais convencido de que uma das coisas que falta aos corpos docentes é foder.” </span><span style="font-family: cochin;">E, depois, com a inteligência em riste, profusamente excitada por uma aluna, declama Bocage ou adapta Florbela Espanca:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">“Foder, foder perdidamente!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Foder só por foder: aqui, além,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">mais este e aquele e aquela,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">o outro e a outra e toda a gente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Foder, foder. E não foder ninguém!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">É preciso cantar a Primavera em cada vida:<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">é preciso cantá-la assim florida,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">pois se Deus nos deu caralho e cona foi para foder!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">E se um dia teremos de ser pó, cinza e nada,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">que sejam as nossas noites uma longa alvorada,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">que nos saibamos perder para nos encontrarmos.<o:p></o:p></span><span style="font-family: cochin;">”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Depois, há uma colega que ensina Filosofia Medieval e que ele encontra no Mise-em-Scène, um bar liberal e<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> kinky</i> ali para os lados do Parque Eduardo VIII. Também há uma juíza, torturada com sádica privação, e uma inspectora da PJ... Há naufrágios, inundações, fornicações e divagações várias.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, neste livro há sexo, muito sexo. Todavia, o que motiva as incursões noturnas do protagonista é um caso de amor platónico. E repete, vezes e vezes: </span><span style="font-family: cochin;">“</span><span style="font-family: "cochin";">Escrevo como se me lesses...</span><span style="font-family: cochin;">”</span><span style="font-family: cochin;"> Diz que torna a sua vida mais devassa para não sentir tanto a falta dela, a vizinha da frente, tão distante e inacessível. </span><span style="font-family: cochin;">É uma desculpa para não pôr o protagonista só a ter sexo. Mas nós aceitamo-la como engenho literário, não se pode querer ter tudo, assim, do dia para a noite. No final, foi tudo um sonho. Petrarca e Laura andam por aqui, e o primeiro diz: </span><span style="font-family: cochin;">“</span><span style="font-family: cochin;">Por vós convém que eu arda e em vós respire, que fui só vosso; e se de vós me privo, nenhuma outra desgraça é tal tormento.”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">O sexo deve integrar a História, com H grande, e também a que o traz pequeno. O sexo deve integrar a Literatura. Sexo aberto e gráfico, mais ou menos literário. Mas: sexo. Porque muitos dos momentos mais intensos e felizes das nossas vidas estão ligados ao sexo. E já é hora da literatura portuguesa falar de nós e das nossas vidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Escrever sobre sexo implica tacto, muito tacto – não se riam, é verdade. É preciso medir o poder das palavras. Deixar entrar o material natural, sem filtros, direitinho, inteirinho, trabalhá-lo de uma forma nem decorosa, nem indecorosa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">A história não acaba nem bem nem mal, que é como acabam todas as histórias verdadeiras: há o amor consumado, um <i>piercing</i> no prepúcio, a inscrição definitiva da amada no corpo do protagonista, um dióspiro erótico e uma janela vazia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">“O sexo é a narrativa”, lê-se a poucas páginas do fim. Alguns dirão: Não havia necessidade. Mas havia, sim, e muita. Ora, ora, aqui o têm.<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin: 0cm;">
<span style="color: black; font-family: "cochin";">Apresentação de "O Escuro Que Te Ilumina", 2018<o:p></o:p></span></div>
<div style="margin: 0cm;">
<span style="color: black; font-family: "cochin";">© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-29586986910080961422019-07-18T01:45:00.000+01:002019-07-18T14:15:56.824+01:00Entrevista | António Mega Ferreira<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiRrh_Ou3w4ndtLC_fcMkxHG4gm9r5DubRj5LCitAw3usvJ7n3t7jo0M3OTOyp6RxYuBOjzucgMEjnzhcdJrMa3Ncqo7iYOQrr1TeUlcdBWjyqmmfAYGfcg6g7XguV3eRZjyGPxzwa7_Eo/s1600/Filme-Canaletto-em-Veneza.-Panoramas-de-Canaletto-em-Veneza.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="480" data-original-width="801" height="382" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiRrh_Ou3w4ndtLC_fcMkxHG4gm9r5DubRj5LCitAw3usvJ7n3t7jo0M3OTOyp6RxYuBOjzucgMEjnzhcdJrMa3Ncqo7iYOQrr1TeUlcdBWjyqmmfAYGfcg6g7XguV3eRZjyGPxzwa7_Eo/s640/Filme-Canaletto-em-Veneza.-Panoramas-de-Canaletto-em-Veneza.jpg" width="640" /></a></div>
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span>
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span>
<span style="font-family: "cochin";">A propósito do lançamento do conjunto de ensaios bio-bibliográficos <i>O Essencial sobre Dante</i>, o escritor António Mega Ferreira fala sobre a sua paixão pelo poeta italiano e pela <i>Divina Comédia</i>, e, inevitavelmente, sobre a sua atração fervorosa por Itália. O que colhemos ainda como herança daquele país? Como caracterizá-lo? Segue-se uma longa conversa, em resposta a estas e outras questões sobre a realidade passada e atual de Itália, a cultura italiana, Dante à cabeça, e os exercícios de reconhecimento necessários para delas nos aproximarmos, com um outro olhar.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Quando visitou a Itália pela primeira vez?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Em 1978, com 28 anos. Aterrei em Roma e fui diretamente para a Via dei Portoghesi, onde fiquei alojado, em casa de um amigo então em missão diplomática, José Sasportes. A primeira impressão da cidade foi muito forte. Desde então, viajei por várias vezes, pelas várias Itálias, mas sempre com especial enfoque em Roma, que é uma cidade completamente prodigiosa; em 2002, fiquei lá durante um mês [estadia que deu origem a <i>Roma: exercícios de reconhecimento</i>, espécie de guia intelectual e artístico para uma visita à cidade].<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">O que mais o impressionou nesse primeiro contacto com Roma?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Um certo caos urbano, com uma sedução irresistível. Havia uma certa desordem organizada na vida daquela cidade e dos romanos que me fascinou de imediato. E, depois, ao virar de cada esquina, havia sempre qualquer coisa de extraordinário para ver, e isso em camadas sobrepostas de estratos deixados por diversas épocas históricas e culturais. Antes de mais, os vestígios do Império Romano, no que podemos imaginar ter sido o seu apogeu. Depois, a Roma cristã, sede da consagração de um culto hoje duplamente milenar. Enfim, o enorme espectáculo de Roma barroca, que vai desde os sinais deixados por Bernini um pouco por toda a parte, sobretudo no centro, até um barroquismo da encenação, muito marcado pelo chamado <i>barroco romano</i>, com o seu auge no séc. XVII.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Em Lisboa, essa sobreposição é feita de volumes arquitectónicos, em perspectiva. Em Roma, é uma sobreposição de raízes...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, é uma sobreposição diferente, porque é orgânica. O paradigma disso é o Teatro di Marcello, que me impressionou logo na primeira viagem: um anfiteatro romano, construído no tempo de Augusto (séc. I a. C.), que foi sendo organicamente reutilizado ao longo das épocas, de tal forma que, hoje em dia, alberga apartamentos de habitação e espaços para escritórios. De facto, a cidade foi-se construindo organicamente, desentranhando-se das formas passadas, reutilizando o antigo, acumulando e sobrepondo. Outra ruína marcante é o Mercado de Trajano, que nos diz mais sobre a maneira de viver dos romanos do que muitos livros de história; é só saber ler o que lá está, saber visitá-lo. No apogeu do Império, o Mercado de Trajano era um verdadeiro <i>shopping center</i>, um símbolo do cosmopolitismo de Roma.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Roma, a cosmopolita. Roma, a decadente. É muito misteriosa essa conjugação de opostos que ainda hoje caracteriza também a realidade e a cultura italianas. Na primeira vez que conduzi em Itália, dei logo de caras com um carro em contramão. </span></b><span style="font-family: "cochin";">[risos] <b>E o mais espantoso é que os italianos são capazes de andar em sentido contrário, não respeitam os sinais ou os peões, mas raramente buzinam em protesto pela condução dos outros.<o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Há uma organização no caos, uma convenção tácita que permite que as coisas fluam. Esse aspecto impressionou-me muito desde o início e é muito sedutor. Gosto muito pouco das coisas assépticas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Embora, em Itália, o ideal da harmonia esteja sempre presente.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">É verdade. Mas a suprema harmonia pode ser encontrada através das dissonâncias, como sabemos desde Mozart, com o seu célebre quarteto nº 19 em Dó maior.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrSpzwsfDc7ytK0v-QY6-o9_4uKcuwWQ9H46Qtmxldo2nbUDt8R01zMQhUXEg2-Wjk4V-h6iCDjWvl9wqnn4nus-KCFT12LZ_SV_xy2fMKvOLMs8xrFK3RaZbvzKomXiRcYocC42aTWac/s1600/2231903771_c5314451a7_b.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="352" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrSpzwsfDc7ytK0v-QY6-o9_4uKcuwWQ9H46Qtmxldo2nbUDt8R01zMQhUXEg2-Wjk4V-h6iCDjWvl9wqnn4nus-KCFT12LZ_SV_xy2fMKvOLMs8xrFK3RaZbvzKomXiRcYocC42aTWac/s640/2231903771_c5314451a7_b.jpg" width="640" /></a></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">O visitante que chega a Florença de carro pode comprová-lo quando, após quilómetros e quilómetros de paisagem suburbana feíssima, estaciona, caminha até ao centro histórico e chega, por fim, à apoteótica Piazza della Signoria.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Circundando Florença, perdemo-nos de viaduto para viaduto e vamos parar ao meio de coisa nenhuma, onde, apesar de tudo, surgem uns ciprestes de vez em quando, a lembrar-nos de que estamos na Toscana. Mas, é verdade, o que nós conhecemos das grandes cidades é sempre o centro histórico e monumental, o seu verdadeiro cartão de visita.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">No centro de Florença, ainda é possível sofrermos do síndroma de Stendhal [desordem psicossomática provocada pelo contacto com uma obra artística; Stendhal sentiu-a quando visitou pela primeira vez a Galeria degli Uffizi]?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">É possível senti-lo, tão esmagadora é a presença de obras de arte únicas. Mas há que fazer um exercício prévio de purificação. Há que colocar um filtro: não olhar para os turistas, não ver as mulheres gordas, os homens barrigudos, as crianças malcriadas... Não ver! E seguir diretamente para os Uffizi. Depois, ninguém pode ir lá pela primeira vez e pôr-se na fila para ir ver toda as salas do museu, não faz sentido; há que escolher o que se quer ver, como intróito a visitas futuras. Da última vez que lá estive, fui direto aos quadros de Fra Filippo Lippi e do filho, Filippino Lippi, que pude apreciar com tempo, até porque estava pouca gente naquelas salas. A incomparável <i>Madonna</i> de Lippi pai dá vertigens… Mas esta é a única possibilidade hoje em dia de ainda se ‘desmaiar esteticamente’ numa cidade como Florença, que, entretanto, foi invadida pelos turistas. Por exemplo, quase ninguém vai ver a prodigiosa basílica de San Miniato al Monte, situada lá no topo, visível da margem do Arno... Já Stendhal o dizia: há coisas que estão reservadas para uns <i>happy few</i>.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Para a elite italiana, a herança cultural é mais forte do que o dinheiro ou o apelo da moda?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Por ser imemorialmente mais rica, a elite italiana é mais culta e estilizada. Quando se chega ao palácio de uma <i>principessa</i> qualquer, no norte, que tem vinte e tal quadros de um mesmo pintor e vive no meio deles, percebe-se que, inevitavelmente, isso é gerador de cultura.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">E de diferença social.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Claro. A Itália é um país ferozmente desigual; onde a igualdade será sempre aparente e não mais do que aparente. Há que admitir que, ali, ao longo dos séculos, a riqueza, o património, a arte, a cultura, a arquitectura, geraram produtos de beleza absolutamente incomparáveis. Conto-lhe uma história curiosa. Há muitos anos, uns vinte, houve uma discussão extraordinária, durante a Feira do Livro de Frankfurt, entre um deputado social-democrata alemão e José Saramago. A certa altura, o deputado começou a falar contra os Papas, os papistas e a ostentação do poder do Vaticano. Saramago ergueu-se...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">... e imagino que do alto do seu realismo-socialista... </span></b><i><span style="font-family: "cochin";">[risos]</span></i><b><span style="font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">... apostrofou o deputado luterano: que ele não percebia nada, que, se não tivesse havido os papas, não teríamos tido o Renascimento, não teríamos as obras de arte barrocas, não teríamos isto e aquilo, e que, apesar de tudo, o cristianismo legou à Humanidade coisas que o luteranismo não foi capaz de legar. <i>Chapeau</i>! Porque há que reconhecer que o facto de a Itália ser extraordinária é fruto da enorme desigualdade que sempre marcou a sua história.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">A Itália, na verdade, é um país muito recente: data do século XIX. </span></b><b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Durante grande parte da sua história pós-romana, foi um espaço fragmentado em vários reinos e </span></b><a href="https://pt.wikipedia.org/wiki/Cidade-Estado" title="Cidade-Estado"><b><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">cidades-Estado</span></b></a><b><span style="background: white; font-family: "cochin";">.</span></b><span style="background: white; font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">A partir do final do séc. X, a Itália sofreu a enorme influência do movimento comunal, o que não foi fenómeno único na Europa, mas que, ali, foi vivido com especial intensidade, alastrando-se como mancha de óleo e arrastando-se por séculos. Na realidade, quando chegamos ao século XII, a Itália do centro e do norte é uma miríade de cidades-Estado. A cidade era o que estava intra-muros, dentro das fortificações próprias das cidades medievais, e o seu ‘contado’ eram os campos que pertenciam à administração da cidade e de onde lhe vinham as vitualhas. Muitas vezes, o contado não era mais do que meia dúzia de quilómetros em redor da cidade. Assim florescem, ao mesmo tempo, na Idade Média, Florença, Siena, a 50 quilómetros, ou Prato, a apenas 19 quilómetros. Havia muitas micro-cidades-Estado, que eram autónomas, soberanas, e que, na maior parte dos casos, cunharam moeda própria, até à invenção do florim. Por exemplo, durante um curto período no séc. XIII, Mântua teve uma moeda própria, com a efígie do poeta latino Virgílio, natural da cidade. Outro dado importantíssimo: cada cidade-Estado falava o seu dialecto próprio. Dante analisou esses dialectos, sobretudo os do norte, e escreveu o tratado <i>De vulgari eloquentia</i>, onde questionava o porquê de cidades completamente contíguas terem dialectos diferentes. Aí nasceu o projecto que ele, <i>modestamente</i>, se propôs construir e que o levou a escrever a <i>Divina Comédia </i>em vernáculo: criar uma língua literária a partir do vulgar, compreensível por aquela gente toda e que, sobretudo, servisse uma expressão literária uniformizada.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Dante conseguiu-o, mas os dialectos persistem e, genericamente, os italianos são bilingues. Essa composição medieval pulverizada explica a rivalidade que persiste ainda hoje entre várias cidades italianas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Sim, esse ADN mantém-se até à actualidade. Os regionalismos, os particularismos de cidade contra cidade — Lucca contra Pistoia, Florença contra Siena... — mantêm-se no norte e, com particular fulgurância, no centro de Itália. Porque, atenção, não existe uma identidade italiana, existem</span><span style="font-family: "cochin";"> identidades italianas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Aliás, o António defende, em <i>Itália, Práticas de Viagem</i> (2017, Sextante), que </span></b><b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">Dante foi apanhado no auge do embate entre a Igreja e o Império, com Florença por epicentro, e que é por isso que ele jamais teria entendido a paixão unificadora e centralizadora que levou à criação do Reino de Itália, em 1861.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">A paisagem política italiana era atomizada. Mas Dante achava que Florença era o centro do universo italiano. Daí que existam diversas passagens na <i>Divina Comédia </i>em que ele diz pessimamente de outras cidades, sobretudo de Siena. A ideia de nação, propriamente dita, não existe no final do séc. XIII, início do séc. XIV, o tempo de Dante. Ele nunca teria entendido a paixão do <i>Risorgimento</i>, impulsionada pelas elites e depois adoptada pelo povo, através de alguns meios de unificação, como o orgulho pela ancestralidade imperial (segundo Dante, a Itália era “o jardim do Império”), a reivindicação dessa herança imperial, o poema de Dante e a língua italiana (surgida a partir do dialecto toscano) ou a música de Verdi.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Num referendo recente sobre a autonomia das regiões italianas, 95% dos votantes na Lombardia e em Veneto votaram a favor. É compreensível, porque são as duas regiões mais ricas do país: Milão contribui anualmente com 20% do PIB italiano, Veneza com 10%. A desigualdade norte-sul continua a ser gritante e justifica os desejos de autonomia e, até, nalguns casos, de independência de algumas regiões.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">É simples: as regiões mais ricas e mais estruturadas, a norte, não querem participar no esforço económico do resto da Itália. O Mezzogiorno [sul] é paupérrimo. A Sicília poderia ser rica, mas não é. Nápoles é a segunda maior cidade italiana, mas, aí, o caos é menos organizado ou, melhor, é organizado por redes subterrâneas. Veja-se a célebre tentativa abortada de racionalização da gestão dos lixos de Nápoles, de que se falou tanto há cerca de dez anos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">O poder da Camorra e dos reis do lixo na Campânia ficou bem claro nessa altura e é uma excelente metáfora dos meandros sujos da governação de Itália.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Escrevi então uma crónica exactamente nesse sentido. O caso tornou-se ainda mais espantoso quando a Suíça se ofereceu para receber os lixos de Nápoles, o que achei de extraordinária ironia: o norte acabar por acolher os lixos do sul...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Um dos momentos altos de <i>Il Divo</i>, o filme de Paolo Sorrentino sobre a arte da política italiana, personificada na figura de Giulio Andreotti </span></b><i><span style="font-family: "cochin";">[</span></i><i><span style="background: rgb(254 , 254 , 254); color: #0a0a0a; font-family: "cochin";">sete vezes primeiro-ministro, oito vezes ministro da Defesa, cinco vezes ministro dos Negócios Estrangeiros e, por fim, senador vitalício]</span></i><span style="background: rgb(254 , 254 , 254); color: #0a0a0a; font-family: "cochin";"> </span><b><span style="font-family: "cochin";">é quando este abraça e beija Toto Riina, a «Fera», o «chefe dos chefes» da Cosa Nostra. Riina, preso em 1993, mandante de, pelo menos, 150 assassinatos e condenado com 26 penas de prisão perpétua, faleceu a 17 de novembro último, com 86 anos. Apesar da sua morte, não se espera que algo mude na Mafia italiana, pois não?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Jamais. São realidades historicamente enraizadas. Em Itália, são essas redes mais ou menos subterrâneas, que vão permitindo que aquilo vá andando... É isso: a Itália é um país que vai andando.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Houve 65 governos desde a implantação da República, em 1946. A política italiana é compreensível para quem não é italiano?</span></b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Dificilmente. É possível compreender-se as grandes linhas institucionais, as opções afetivo-partidárias de fundo, a estrutura dominante composta por essas redes subterrâneas, mas, por outro lado, nem os próprios italianos conhecem a sua verdadeira extensão. Creio que nem os próprios que estão dentro das redes conseguem vê-las com clareza. O caso da recolha do lixo de Nápoles demonstrou-o, revelando um negócio que se tornou uma arma poderosíssima, inteiramente nas mãos da Camorra. A imagem projectada pela Itália para o exterior é de estagnação; porém, a Itália vai andando, à custa desses braços ocultos que a vão suportando e empurrando e do dinamismo daquilo a que podemos chamar sociedade civil.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";"><b style="font-family: Calibri, sans-serif;"><span style="font-family: "cochin";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrSpzwsfDc7ytK0v-QY6-o9_4uKcuwWQ9H46Qtmxldo2nbUDt8R01zMQhUXEg2-Wjk4V-h6iCDjWvl9wqnn4nus-KCFT12LZ_SV_xy2fMKvOLMs8xrFK3RaZbvzKomXiRcYocC42aTWac/s1600/2231903771_c5314451a7_b.jpg" imageanchor="1"></a><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhhBMPatkeKHoPnQHZZ6y9Hg2zv5A5BtD2VIiCjpKKl7knfTmXlokb0yXUuRkNPHq8Yh0t-oxOB5QohatePFLgwxCrCd6-lWU5ZzRPPAEIhkIX1kHaJjO_pmue60EwKndg0l3DeXl9oKk4/s1600/venice-4056970_1920.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="406" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhhBMPatkeKHoPnQHZZ6y9Hg2zv5A5BtD2VIiCjpKKl7knfTmXlokb0yXUuRkNPHq8Yh0t-oxOB5QohatePFLgwxCrCd6-lWU5ZzRPPAEIhkIX1kHaJjO_pmue60EwKndg0l3DeXl9oKk4/s640/venice-4056970_1920.jpg" width="640" /></a></span></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Matteo Renzi, o anterior primeiro-ministro, ex-presidente da Câmara de Florença, líder do Partido Democrático, propôs um referendo constitucional em 2016, e perdeu-o, o que o levou a demitir-se. Um dos lemas que defendia era: “A Itália não pode ser um país-museu, tem de ser um país-laboratório.” Quer comentar?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Para muitos, as mudanças na Constituição pretendidas por Renzi enquadravam-se na melhor tradição dos tiranos italianos. Através de uma mudança de estatuto do Senado, cuja composição seria decidida pelo PM (o que é impensável num sistema democrático electivo), ele tornar-se-ia um verdadeiro <i>Signore</i>, com todo o poder. Já havia o “prémio da maioria”, cuja ideia constitucional não é disparatada, no sentido de contrariar a instabilidade política <i>[o partido que vencesse uma eleição com mais de 40%, teria automaticamente um prémio</i></span><i><span style="background: rgb(254 , 254 , 254); color: #0a0a0a; font-family: "cochin";"> que lhe garantisse a maioria ou, então, ele seria disputado numa segunda volta entre as duas formações mais votadas]</span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">, mas que, mesmo assim, </span><span style="font-family: "cochin";">não garantia a governabilidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">O afastamento de Renzi permitiu, por exemplo, que o governo da região autónoma da Sícilia tenha sido recentemente conquistado por Nello Musumeci, o líder de um partido pós-fascista, apoiado por Berlusconi e a quem os próprios partidários chamam «<i>fascista perbene</i>» (um fascista como deve ser)...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sempre que o Partido Democrático desce, a direita sobe e lá vem outra vez aquele indivíduo inenarrável, que parece ter sete vidas...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">D.H. Lawrence, que conheceu muito bem o país, diz, em <i>Crespúsculo em Itália</i>: “[Ali], a mente subjuga-se aos sentidos. Como num gato, há subtileza e beleza e a dignidade das trevas. Mas o lume é frio, como nos olhos de um gato, é um lume verde. É fluido, eléctrico. […] Há o eu, sempre o eu. E a mente fica submersa, subjugada. Os sentidos, porém, mostram-se magnificamente arrogantes.”<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Bom, o Lawrence escorrega sempre para o lirismo, por vezes despropositado… Mas essa metáfora do felino aplica-se bastante bem a Itália. Trata-se de uma nação felina, com imensa agilidade e uma enorme capacidade de cair de muito alto, em cima das patas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Já falámos da língua, do <i>pasticcio </i>[imbróglio] político e das redes subterrâneas. Para além disso, o que é que unifica a Itália? O sentido canónico da beleza ocidental?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Não. O mais forte elemento da identidade nacional italiana é a consciência de que eles são melhores do que os outros. É a auto-confiança italiana que torna a Itália italiana. Visto do exterior, isto redunda em arrogância, mas só isso explica que a eliminação da Itália do Campeonato do Mundo de Futebol seja vivida como uma tragédia nacional.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">E perder logo para a Suécia!<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-family: "cochin";"> [risos]</span></i><b><span style="font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Com a Espanha e a Alemanha, eles já estão habituados a perder. Agora, perderem com a Suécia é verdadeiramente terrível e fere a identidade nacional. Porque os italianos são os melhores do mundo! Há uma anedota que explica isto. Em 1756, Casanova <i>[a quem António Mega Ferreira dedicou a ficção </i>Cartas de Casanova<i>, Sextante, 2013]</i> evade-se da prisão dos Piombi, em Veneza, e desagua em Paris. Uma noite, é levado à Opera e é apresentado a Madame Pompadour, que é a favorita do rei, Luís XV...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">E que é uma boneca.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, e a boneca pergunta-lhe: “E então, senhor Casanova, como é que estão as coisas <i>lá-bas</i>, em Veneza?” Ele responde: “<i>Madame, Venise n’est pas là-bas, Venise est là-haut</i>.” É isto: os italianos estão sempre <i>por cima</i>.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Daí que um dos conselhos que os próprios dão com frequência aos turistas seja: nunca seja simpático, não deixe passar ninguém à frente, se não vai ser tomado por parvo. Na verdade, a exuberância sonora dos italianos disfarça muito bem a sua pouquíssima abertura para os outros, certo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Essa exuberância existe, mas é só entre eles. Aliás, admito que ela acaba por intimidar o visitante. Confesso que, hoje em dia, depois de ter estado tantas vezes em itália, já não sinto isso. Mas esse sentimento de soberba, de superioridade sobre os outros, acaba por ser também um cimento da identidade nacional.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Mais uma vez, isso não terá a ver com a ideia da posse de um sentido canónico da beleza e da cultura?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">As elites têm isso. O povo limita-se a alimentar a sua soberba com o mito da Roma imperial, do Dante, do Petrarca, do Verdi, do Manzoni, da <i>squadra azzurra</i>, <i>et cetera</i>. Mussolini bebeu nessa fonte de identificação popular. Essas heranças são como que <i>commodities</i> que os italianos usam para afirmar a sua superioridade, que é, historicamente, relativamente comprovável, porque, na realidade, mesmo em períodos em que não foram uma potência dominante na Europa (sobretudo porque não eram uma potência centralizada), eles eram o referente. Não por acaso, o Grand Tour era feito através dos Alpes, para ir a Itália, como bem sabemos pelo testemunho de numerosos e importantes viajantes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Hoje em dia, a Itália tem uma das maiores taxas de desemprego jovem da Europa e a segunda maior dívida pública. A burocracia estatal é ineficiente, a tributação pesada, os gastos públicos comem metade do PIB nacional e existem altíssimos níveis de corrupção política. Orgulham-se de quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Orgulham-se da sua <i>ideia</i> de Itália, mais do que das realidades. Mas, apesar de tudo, a Itália é uma das seis maiores economias da União Europeia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Porquê? Por causa do turismo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Também. Mas não só por isso. A Itália foi, a partir do século XIX e ao longo de todo o séc. XX, uma grande potência industrial. Grande parte da indústria europeia do automóvel é de origem italiana. Ainda hoje viajamos com enorme conforto na excelente rede ferroviária italiana, em comboios de alta velocidade desenvolvidos por italianos. Eles não copiam; desenvolvem, acrescentam, inovam. Acrescentam sobretudo <i>design</i>; são dados a isso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Devido a um especial sentido estético?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Os italianos têm séculos e séculos de uma cultura e de um olhar treinado para o belo e para o luxo. É uma questão de envolvência; saem à rua, nem dão por isso, mas estão permanentemente a ser impregnados pela herança cultural e pela beleza. Para mais, têm uma capacidade produtiva e inventiva extraordinária, que se estende a tudo. No campo do <i>design</i>, sobretudo, aquilo sai-lhes tudo melhor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Tal qual o <i>caffè espresso</i>!<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Ah, o café Illy! A propósito, aceita um?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-family: "cochin";">[pausa curta para café bem escuro</span></i><span style="font-family: "cochin";">]<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">No documentário A <i>Síndrome de Veneza </i>(2013), do alemão Andreas Pichler, sobre a enorme pressão do turismo de massa sobre a cidade, há um veneziano que, ao ver as hordas de turistas a circularem numa rua, exclama: “Tanta gente! Onde é que eles vão todos fazer chichi?”<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">[g<i>argalhadas</i>]<b><o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Isso é genial! A perplexidade tem toda a razão!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">O realizador fala de uma cidade “encurralada pela sua própria beleza”, abandonada pelos locais, deserta à noite, decadente, que deixou de existir como estrutura urbana. Em 2019, os grandes paquetes (com mais de 130 mil toneladas) vão ser interditados de circular no canal da Giudecca. Mas, ainda assim, não se prevê que diminua o número de visitantes por ano: cerca de 20 milhões (1,5 milhões chegam em cruzeiros), uma média de 60 mil por dia. A cidade já tem menos de 50 mil habitantes.</span></b><span style="background: white; font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Quando comecei a ir a Veneza, no início dos anos 1980, havia 80 mil habitantes. Entretanto, a cidade transformou-se num parque temático cultural e monumental. Hoje, Veneza é o paroxismo do turismo de massas, o que a afecta exponencialmente porque se trata de uma cidade muito particular, inorgânica, cristalizada, sem meios de se renovar ou autoregenerar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Em <i>Itália, Práticas de </i>Viagem, descreve-a, a propósito da Ponte de Rialto representada num quadro de Carpaccio, como «um organismo especular». É uma cidade prisioneira da sua própria imagem?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Efetivamente, o que mais me impressiona em Veneza é esse ambiente, essa atmosfera e essa natureza especular. Toda a cidade se olha a si própria...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Como Laudomia, d’<i>As Cidades Invisíveis </i>de Calvino, a cidade tripla, cujas facetas, dos mortos, dos vivos e dos não nascidos, se olham e reflectem constantemente umas às outras?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">E não é por acaso que Calvino é italiano. Veneza vive constantemente nessa relação especular, sendo que a relação do visitante com a cidade acaba por ser, ela própria, especular. Viramos uma esquina e deparamo-nos com água. Estamos rodeados por espelhos, no chão, o que nos transmite uma grande insegurança. Aliás, Veneza é uma cidade profundamente inquietante, sobretudo à noite, quando fica deserta, completamente morta, e tudo, não só os sons, ecoa. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Depois, há essa “estranha ambiência cromática”, a que se refere a propósito do <i>Trafugamento</i> <i>del corpo di San Marco</i>, de Tintoretto. Ainda a conseguimos encontrar em Veneza?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Sim, na Scuola Grande di San Rocco, que tem uma dimensão demencial porque é toda ela decorada com as telas gigantescas de Tintoretto. Tenho, aliás, um poema muito antigo, sobre esse outro mundo, que só existe ali.<o:p></o:p></span></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">A SOMBRA DE SAN ROCCO<o:p></o:p></span></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";"> Entre nós, haverá sempre<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";"> a sombra de San Rocco,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";"> o mármore gasto das escadas,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";"> o duplo olhar no espelho, a insólita heresia<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">daquela Adoração, em que tudo<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">se passa no andar de cima.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">Porém, eu avisei-te.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">Disse-te que havia em San Rocco<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">mais e menos que um estilo<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">de pintura. Que talvez a penumbra<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">do Albergo ganhasse outra cor,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">se a desvendássemos de mão dada,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">enquanto, lá fora, os pombos<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">se enroscavam na bruma da manhã.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">Mas a hisória é outra: outra<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">seria a história de San Rocco,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">ou a nossa história,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">se não fosse o que me atrai a tua sombra.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">Porque era ali, na sombra de San Rocco,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">que o teu olhar se deveria iluminar<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">de cinza.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">(É por dentro da cinza, sabes,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">que a luz cintila, maior que a própria cor,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">maior que a vida.)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">Porque a luz pensa,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">nestes quadros, pulsa na obscura<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">energia que toda a mão destila.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">(Ah, mas tu da sombra nada sabes,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">ou o que sabes não passa pela dor.)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">Vê, então, na Última Ceia, como Cristo<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">se anuncia,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">na impossível perspectiva<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">que faz caber no quadro tudo o que existe;<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">e como o movimento da tua mão desperta<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">outra perspectiva,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">porque por ela é que se agita<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">a sombra de San Rocco<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "cochin";">que entre nós persiste.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<b><i><span style="background: white; font-family: "cochin";">in </span></i></b><i><span style="font-family: "cochin";">Os princípios do fim</span></i><span style="font-family: "cochin";">, Lisboa, Quetzal, 1992.</span><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-align: center; text-indent: 35.4pt;">
</div>
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";"><o:p> </o:p></span></b><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiv4i6XSv2EAK1oA7JjJfFq9ALqUhhFMZzruGFnG33gq5g-HLc0TlAZRaSjHE7GCu_XbXOW0yYxwfVTYH6kA2fFy7pyj4Nn-zArLR9rBweZMhRAHfwZqxmThOS1XibPLMNhQGHJvMLL97I/s1600/766px-Dante_exile.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em; text-align: center; text-indent: 47.2px;"><img border="0" height="500" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiv4i6XSv2EAK1oA7JjJfFq9ALqUhhFMZzruGFnG33gq5g-HLc0TlAZRaSjHE7GCu_XbXOW0yYxwfVTYH6kA2fFy7pyj4Nn-zArLR9rBweZMhRAHfwZqxmThOS1XibPLMNhQGHJvMLL97I/s640/766px-Dante_exile.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">N</span></b><b><span style="font-family: "cochin";">ão por acaso, os italianos são provavelmente o único povo mediterrânico apaixonado pela leitura pública de poesia. Roberto Benigni fez uma <i>tournée </i>pelo país, com enorme sucesso, a dizer a <i>Divina Comédia</i>.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Eles gostam imemorialmente de ouvir dizer poesia. Repare que a primeira leitura pública da <i>Divina Comédia </i>de que se tem notícia é feita por Boccaccio, em 1373, na Badia Fiorentina, ao pé da casa onde terá nascido Dante, que morrera apenas 50 anos antes. Boccaccio, que faz essa leitura comentada, é o primeiro grande campeão da <i>Divina Comédia </i>e do Dante e passa a vida a fazer-lhe elogios junto de Petrarca, aos quais este torce um bocado o nariz. É Boccaccio quem atribui o adjectivo “divina” ao poema ao qual, nas primeiras edições manuscritas, se chamava apenas <i>Commedia</i>.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">E <i>Comédia</i>, porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Porque, segundo a classificação de Aristóteles, o poema tinha um final feliz: a ascensão da alma de Dante até à luz divina.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">A <i>Divina Comédia</i> é um poema de ecos e de sombras de múltiplas influências, onde estão identificadas, por exemplo, 140 derivações da obra de Virgílio, que é referido pelo poeta como seu «mestre, senhor e guia». Contudo, Dante trata bastante mal Virgílio, despede-se dele à porta do Paraíso, e a segunda figura tutelar <i>[existe uma terceira, Estácio]</i> é Guido Cavalcanti, que, no poema, está já morto...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Há outra coisa extraordinária: logo no início do poema, no primeiro círculo do Inferno, que é uma espécie de limbo — uma inovação teológica por parte de Dante, na medida em que o limbo era para onde iam as crianças não batizadas e as almas penadas —, encontramos as cinco sombras gloriosas: Homero, Ovídio, Horácio, Lucano e Virgílio. Dante conta como, por gestos, estas glórias o convidam a juntar-se-lhes e, assim, ele se torna a sexta glória. Mas não creio que Dante trate mal Virgílio; este é que se despede dele, porque, tendo vivido antes de Cristo, não recebeu o sacramento do baptismo, não podendo, portanto, aceder ao céu.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><i><span style="font-family: "cochin";">O Essencial sobre Dante</span></i></b><b><span style="font-family: "cochin";"> segue cronologicamente a bio-biliografia do poeta, tem nove capítulos e um anexo: a sua tradução da versão integral do Canto V. A segunda parte é inteiramente dedicada à <i>Divina Comédia</i>. O prólogo fala de uma ruptura. Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">A ruptura dá-se quando Dante vai a Roma para o Jubileu decretado por Bonifácio VIII, na semana de Páscoa de 1300, e percebe que nada do que ali se faz tem a ver com o catolicismo ortodoxo, a remissão dos pecados ou o júbilo interior, e que o papa anda a vender indulgências para fazer dinheiro para a igreja. É então que ele rompe com Bonifácio VIII, o que é decisivo. Porquê? Porque quando, quatro ou cinco anos depois, já no exílio, Dante começa a escrever a <i>Divina Comédia</i>, situa a ação do poema precisamente nessa semana do Jubileu de 1300.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">E aproveito para voltar um pouco atrás, à relação de Dante com Guido Cavalcanti. Eu penso que ele comete um assassínio ritual<i> </i>de Guido Cavalcanti, tido durante muito tempo por seu melhor amigo (é ele que o diz: <i>“il primo dei miei amici”</i>), o que é hoje bastante contestável. No Canto X do <i>Inferno</i>, o pai Cavalcante dei Cavalcanti pergunta-lhe por que não está o seu filho também ali, já que era inseparável de Dante. Dante não responde, precisamente porque a ação do poema se passa antes da morte de Cavalcanti, que ocorre três meses depois do Jubileu, de malária [a doença que também matará Dante, em 1321], a caminho de Florença, após um curto exílio em Sarzana. Quando este canto é escrito, já Guido morreu; mas Dante não responde ao pai Cavalcanti, porque não lhe pode dizer que ele está vivo ou que morreu. Mata-o ritualmente, porque não responde ao pai Cavalcanti. Encarrega outra figura de informar Cavalcanti que, da última vez que viu Guido, ele ainda estava vivo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Esse tipo de retórica, que percorre todo o poema, não é prosaica, mas, antes, totalmente original, dantesca. Ela expressa-se sobretudo na criação do dispositivo do “eu” do narrador-viajante e do “ele” usado para o peregrino. Ambos são, afinal, Dante, cujo nome concreto surge uma única vez em todo o poema. Trata-se de mais uma expressão da <i>modestia</i> do poeta?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">O peregrino é o perguntador, que está numa aventura pessoal, que é a da salvação da sua alma, à procura de encontrar Deus. O peregrino é o único que está vivo, ao longo de todo aquele percurso, durante o qual só encontra mortos — o que, convenhamos, significa que Dante se atribuiu uma função extraordinária. O narrador também é Dante, mas a sua função é dar respostas ao peregrino, através das falas das personagens. Esta dupla figura de que o poeta se arma é um artifício absolutamente genial para conseguir distanciar, constantemente, os argumentos e a narração. As opiniões propriamente ditas são do Dante narrador.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Podemos considerar que um representa o aristotélico e o outro o gnóstico?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">É uma via possível. O narrador busca o conhecimento, dá as respostas racionais que explicam o sentido da curiosidade do peregrino. A <i>Divina Comédia</i> é, além de tudo o resto, uma história da curiosidade (Alberto Manguel escolhe Dante como guia para um ensaio muito interessante, chamado, exatamente, <i>Uma História da </i>Curiosidade). E note-se que, no tempo de Dante, a curiosidade é condenada e punida pela igreja, que determina que ninguém pode saber mais do que aquilo que pode saber. Mas, o que é que se pode saber, segundo a <i>Divina Comédia</i>? Na cabeça de Dante, a resposta é: o que Deus permite que saibamos. Mas esta é uma verdade tornada relativa pelo próprio poema: o que Dante procura é uma empresa de dimensão ulissiana, conhecer para lá dos limites consentidos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">No caso de Beatriz, a curiosidade satisfaz-se, o conhecimento alcança-se, através da revelação. Ela é, para Dante, “a luz entre a verdade e o intelecto”, a via para a ascensão, como o foi Laura, em Petrarca...</span></b><span style="font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Elas são dois ideais instrumentais.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Nos <i>Nove Ensaios </i>Dantescos, Jorge Luis Borges diz: </span></b><b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">“Apaixonar-se é criar uma religião que tem um deus falível. Que Dante professou uma admiração idólatra por Beatriz é uma verdade que não sofre contestação; que ela o ridicularizou uma vez e que o desprezou uma outra são factos apresentados pela<i> Vita nuova</i>. Alguns defendem que esses factos são simbólicos de outros. A ser verdade, isso fortaleceria ainda mais a nossa certeza de um amor infeliz e supersticioso.” Podemos entender </span></b><b><span style="font-family: "cochin";">Beatriz como um veículo pela negação, no sentido em que ela representa a idealização de um amor nunca vivido, um objeto de desejo intocável?</span></b><b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Beatriz não poderia amar Dante. Ele vê-a aos nove anos de idade, revê-a nove anos depois, e nunca chegam a trocar uma única palavra. </span><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">É um amor perdido porque, nessa vida real, Beatriz não só não lhe liga nenhuma, como se casa com outro. Quando ele escreve a <i>Divina Comédia</i>, ela já está morta há muito. </span><span style="font-family: "cochin";">Quatro séculos depois, <i>Dom Quixote</i> replica exatamente esse mito da adoração platónica pela mulher ideal, com Dulcineia del Toboso e Aldonza Lorenzo, enfatizando o pormenor quase picaresco da idealização de uma paixão extraordinária que nasce sem que exista qualquer contacto com a amada. Numa primeira fase, em 1293-94, essa paixão é coroada por Dante em <i>Vita nuova,</i> ainda ligada ao conceito de amor dos poetas do Dolce Stil Nuovo [<i>o estilo poético novo, cuja criação, à chegada ao Purgatório, Bonagiunta Orbicciani, um poeta italiano do séc. XII, atribui a Dante, Guido Cavalcanti e Guido Guinizelli</i>]</span><span style="background: white; color: #222222; font-family: "cochin";">. Nessa fase, a paixão ainda representa <i>il disio</i></span><i><span style="font-family: "cochin";">, </span></i><span style="font-family: "cochin";">o desejo. Contudo, já no final de <i>Vita nuova</i>, Dante diz qualquer coisa como: tenho de encontrar uma nova e mais elevada expressão para dizer a beleza desta mulher. Essa beleza aparecerá na <i>Divina Comédia</i>, já não na sua expressão física, mas numa dimensão espiritual.</span><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">É nesse sentido que Beatriz surge como uma emissária de Deus?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, aliás, logo no início da <i>Divina Comédia</i>, ela vem ter com Virgílio e Dante e diz-lhes: eu venho de lá, do sítio de onde ninguém chega, e venho encaminhar-vos, para depois rapidamente voltar para lá, para Deus. Por isso, Virgilio conduz Dante até ao final do Purgatório e, às portas do Paraíso, diz-lhe que já não pode avançar mais (porque nasceu antes de Cristo, logo, não pode atingir a salvação) e passa-o para “outra mais digna do que eu”: Beatriz, que conduzirá Dante a partir dali.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">O teólogo Charles Williams, um dos grandes teóricos da figura de Beatriz, defende que ela é a encarnação do divino, mas, também, “uma revelação pessoal”, que se dá através do confronto com o sexo oposto. Concorda?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim e não, porque a idealização só é efetivamente possível quando não há contacto. Veja-se que Dante não faz qualquer referência em todo o poema à sua mulher, Gemma Donati, mãe dos seus três filhos, que terão um papel importantíssimo na revelação <i>post-mortem </i>da sua obra – por exemplo, o mais velho, Pietro Alighieri, notário, é quem fixa o <i>Paraíso</i> e o divulga pela primeira vez em manuscritos completos. Gemma nunca é referida pelo poeta, porque é uma mulher real e não uma projeção, como Beatriz.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Mas, regressemos à ideia de que, para Dante, o conhecimento possível para no que Deus permite que saibamos. Logo, existem limites para a curiosidade?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">No canto XXVI do <i>Inferno</i>, um canto absolutamente extraordinário, dos mais belos da <i>Comédia</i>, Dante e Virgílio encontram Ulisses. Dante questiona a presença do herói homérico ali, entre os chamados <i>consiglieri di frode</i>, que se pode traduzir como “os ardilosos”. E Virgílio responde-lhe que Ulisses enganou este e aquele, enganou os troianos, com um cavalo de madeira, é um infame, tem de estar condenado às penas eternas. Então, Dante pede a Virgílio: <i>Pergunta-lhe como é que ele morreu? Se está aqui, é porque está morto.</i> Na realidade, nem na <i>Odisseia</i>, nem em nenhum dos outros poemas autênticos, se diz como morreu Ulisses. Na <i>Divina Comédia</i>, Ulisses explica como é que morreu. Um dia, estava ele em Ítaca, já apaziguado...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Já tinha feito o banho de sangue...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Já tinha dado cabo dos pretendentes todos, sim. Aliás, Dante podia tê-lo posto a morrer às mãos da vingança dos familiares dos pretendentes de Penélope, porque é assim que acaba a <i>Odisseia</i>. Mas, não, ele prefere o caminho mais difícil. Ulisses explica que, estando em Ítaca, se voltou para os seus companheiros e lhes disse: <i>Vocês, que andaram para o Ocidente, estão agora aqui assim, amodorrados? </i>E segue-se um terceto belíssimo: “<i>Considerate la vostra semenza:/ fatti non foste a viver come bruti/ ma per seguir virtute e canoscenza.” </i>Lembrai-vos da vossa origem, daquilo para que fostes criados: não para viver como brutos, mas para buscar virtude e sapiência. E, então, partiram todos para o mundo desconhecido, que estava para lá dos pilares de Hércules; para lá de Gibraltar, o limite que os deuses tinham estabelecido e que nenhum ser humano deveria ultrapassar. Ulisses e os companheiros internam-se pelo Oceano Atlântico fora, e vão parar aos pés de uma montanha que, no canto seguinte da <i>Comédia</i>, percebemos tratar-se da montanha do Purgatório. Ali chegados, os deuses desencadeiam uma enorme tempestade, e assim morreram todos, inclusivamente Ulisses.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"> <a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj43DdiRp5Hp9BDZ-HGCLwHxQmnm01UyiWcnedoq_Lx_IQ8snoKY5lGnz9j5TvI3eyD9P0chdRHM6a2YKKtdtBlVwwB_7_EfVPxIAe2iNE7JcD1oTJ8vdM44TfNpv_II1DyyvwNjbzT9Fg/s1600/750px-Gustave_Dor%25C3%25A9_-_Dante_Alighieri_-_Inferno_-_Plate_65_%2528Canto_XXXI_-_The_Titans%2529.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="512" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj43DdiRp5Hp9BDZ-HGCLwHxQmnm01UyiWcnedoq_Lx_IQ8snoKY5lGnz9j5TvI3eyD9P0chdRHM6a2YKKtdtBlVwwB_7_EfVPxIAe2iNE7JcD1oTJ8vdM44TfNpv_II1DyyvwNjbzT9Fg/s640/750px-Gustave_Dor%25C3%25A9_-_Dante_Alighieri_-_Inferno_-_Plate_65_%2528Canto_XXXI_-_The_Titans%2529.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">A jornada deles para na base da montanha, nem chegam a subi-la. A de Dante irá mais longe.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Claro!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-family: "cochin";">[risos]<b><o:p></o:p></b></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">A morte de Ulisses assim é uma invenção de Dante. Porquê? A interpretação mais corrente, das muitas que existem, é a de que, de alguma forma, Dante via na sua própria viagem uma viagem blasfema, sacrílega, em relação ao Deus cristão, tal como a de Ulisses o tinha sido em relação aos deuses pagãos. Ou seja, ele tem uma ambivalência enorme em relação à própria figura do Ulisses. Está a tentar fazer um poema onde se descreve o indescritível...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Mas para no limite da ortodoxia?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Dante, ele próprio, não para. Por um lado, fascina-o a coragem e a audácia de Ulisses, mas, por outro, ele não deixa de o castigar por causa de uma coisa que é <i>“il trapassar del segno”</i>, o ultrapassar o limite estabelecido, do sinal divino. Mas Dante não pode deixar de pensar que também ele, com a empresa que está a seguir, de alguma forma está a fazer um percurso semelhante ao que atribui a Ulisses e que é...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Humano?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Exatamente. A viagem de Ulisses é uma metáfora da própria viagem de Dante. E o poeta não tem ainda a certeza de que Deus lhe permitirá «<i>il trapassar del segno</i>”. O episódio do canto XXVI do <i>Inferno</i> torna a empresa de Dante ainda mais extraordinária, porque mostra que ele tinha dúvidas metafísicas quanto à sua legitimidade — não quanto à sua exequibilidade, porque ele escreve o poema até ao fim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Dante pergunta-se se Deus lhe permitirá chegar ao conhecimento e a conhecê-lo. Ou seja, ele é determinado pela teologia, que não é um mero recurso entre outros usados no poema?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Harold Bloom, por exemplo, defende que a <i>Divina Comédia </i>não tem nada de teológico.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">E que Dante é um super-naturalista, que transcende a natureza, por</span></b><b><span style="background: white; font-family: "cochin";">que o único teólogo que verdadeiramente contava para Dante era o próprio Dante. Isto, a si, deve irritá-lo imenso...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, porque Bloom conclui isso, muito à sua maneira, excluindo tudo o resto. É uma leitura tão fundamentalista como as leituras “teológicas”. Não é esse o meu caminho: entendo que a <i>Divina Comédia</i> é um poema incomparável porque está lá tudo. Estão lá as dimensões todas, todos os conhecimentos da época, todas as filosofias, todos os saberes encontram ali um reflexo. A <i>Divina Comédia </i>é uma enorme enciclopédia; o escritor húngaro Miklós Szentkuthy diz mesmo que se trata do “único dicionário integral da Idade Média”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">A erudição gigantesca de Dante é ainda mais surpreendente por ele ter sido um autodidacta.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Ele foi um autodidacta com uma capacidade de absorção extraordinária. E, depois, tinha uma outra grande vantagem: nunca fez nada! Não se lhe conhece nenhuma ocupação regular ao longo da vida, à exceção de umas missões diplomáticas, e de ter sido, durante dois meses, um dos <i>priori</i> (governador) de Florença.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Pode entender-se a <i>Divina Comédia </i> como um poema profético?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Não é um poema que antecipe, efetivamente, nada do que se vai passar no futuro. O tom profético é ali usado, normalmente, para relatar acontecimentos futuros que, ao tempo da escrita do poema (mas não da ação, que, recorde-se, tem lugar em 1300), já tinham acontecido. Contudo, tem pontos proféticos. Por exemplo, quando Beatriz diz a Dante, já no Paraíso, que há-de vir o DXV <i>[500, 10, 5, na numeração romana]</i>, entendido como um anagrama de Dux <i>[líder]</i>, que os dantólogos veem como uma profecia da vinda do imperador que há de salvar a Itália das garras do papado. Profecia falhada, no entanto. Porque Dante começa por ser guelfo, partidário do Papa e do poder temporal da igreja, mas depois rompe com Bonifácio VIII pelos motivos atrás referidos, mas também porque este queria conquistar a República Florentina para pôr lá um sobrinho dele. Já no exílio, Dante vai deslizando para posições próximas das dos gibelinos [apoiantes do Imperador Romano-Germânico]. E acaba a escrever a <i>Monarquia</i>, que é, sobretudo, um tratado de filosofia política, e a defender que a solução estava na vinda de um imperador, de um príncipe que congregasse o poder e a fé e mantivesse as duas esferas afastadas. Esta posição é defendida pelo narrador e pelas personagens da <i>Divina Comédia</i> a partir de metade do <i>Purgatório</i> e em todo o <i>Paraíso</i>.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Como é que um não-crente como o António pode gostar de um poema que apresenta como sendo “uma narrativa autobiográfica, uma peregrinação movida pelo desejo do saber e pela ânsia muito medieval da salvação da alma”, mas, acima de tudo, como «um poema sobre o Amor; e, em última (que é primeiríssima) instância, sobre o Amor divino que [para Dante] é, finalmente, o motor de todas as coisas”?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Porque, tal como diz Bloom, mas não exclusivamente como diz Bloom, a <i>Divina Comédia </i>é, para lá do teológico, um poema do conhecimento, um poema astrológico, um poema enciclopédico, mas é, convém não esquecê-lo, poesia. O que o torna espantoso não é a acumulação de saberes, nem a cosmologia da salvação que Dante inventa para o <i>Paraíso</i>; é tudo isso vertido num poema admirável, onde os recursos imagéticos e estilísticos de Dante erguem um edifício sem precedentes na tradição poética ocidental.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">É a definição e o desdobramento, a reinterpração e reequação dos conceitos e dos métodos, através de uma paixão enorme pela ordem e pela precisão da poesia. Porque tudo aquilo é preciso...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Exactamente, mas o que torna isso extraordinário é o que resulta, aquilo a que poderíamos chamar, quase tautologicamente, a qualidade poética da poesia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Uma qualidade de evocação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Uma qualidade de criação de uma linguagem poética propriamente dantesca, completamente original, até na invenção da <i>terza rima</i>, que lhe confere um ritmo incomparável. Tudo é trinitário no poema, da <i>terza rima</i> à própria estrutura dos cantos. A célula significante do poema são as <i>terzine </i>dantescas, os tercetos. Mas cada terceto tem três versos, cada verso com onze sílabas [<i>hendecassílabo</i>], logo um total de 33 sílabas; o poema tem três partes (<i>Inferno</i>, <i>Purgatório</i> e <i>Paraíso</i>), cada uma dividida em 33 cantos, com aproximadamente 40 a 50 tercetos, que terminam com um verso isolado no final. No total, são 100 cantos, porque existe um canto primeiro, proemial, que serve de introdução aos 99 seguintes. No Canto XIV do <i>Paraíso</i>, Dante refere “esse um e dois e três que é sempre e deve / sempre reinar em três e dois e num”. O poema é indissociável da concepção trinitária cristã, da Santíssima Trindade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Poema alegórico, poema teológico, da redenção pela fé... Insisto: enquanto não-crente, vê-o sobretudo como redenção poética?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Não. Vejo-o como um enorme poema, sendo indiferente acreditar naquilo que é a sua direção. O que admiro no poema é...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">A jornada poética?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Precisamente. O que me interessa é a jornada, porque o caminho faz-se caminhando, como dizia António Machado. Há uma dantóloga australiana, Prue Shaw, que tem uma frase muito bonita sobre isso: ela diz que à medida que vai caminhando, ele descobre-se poeta. Como? Escrevendo o poema que faz dele um poeta.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgnD_eckMFJ_GlgqUfuGblmK_7ACgJ-R0hWocQtrKibiHEFtQHIqZiNYlleHtadJYCfLot019ZZgYqhm5rTe3V9jjPNIChJynKtCV9dvrQQZ5SK0UV6bgdNCYAPqnuXY20shPmyVLQVhzY/s1600/dante-statue-1268271_1280.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgnD_eckMFJ_GlgqUfuGblmK_7ACgJ-R0hWocQtrKibiHEFtQHIqZiNYlleHtadJYCfLot019ZZgYqhm5rTe3V9jjPNIChJynKtCV9dvrQQZ5SK0UV6bgdNCYAPqnuXY20shPmyVLQVhzY/s640/dante-statue-1268271_1280.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Se Dante escrevesse numa outra época, aquela poderia ser já uma jornada humanista?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Na <i>Divina Comédia</i>, dá-se a ascensão do Monte Purgatório, em cujo topo está o Paraíso. O Purgatório dantesco não é um lugar de punição <i>ad eternum </i>(como o Inferno), mas onde há ascensão até ao limiar da redenção. Em Dante, a ascensão do Monte Purgatório faz-se para atingir Deus. Em Petrarca, uma geração literária depois, a ascensão do Monte Ventoux (por ele localizada temporalmente em 1336) faz-se para quê?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Para se encontrar a si mesmo.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-family: "cochin";">Voilá</span></i><span style="font-family: "cochin";">! Dante ascende para se dissolver na luz divina. Em Petrarca, apesar de ele ser cristianíssimo também, a ascensão é ainda pessoal, como em Dante, mas é feita para se conhecer a si próprio e, assim, aperfeiçoar-se e atingir Deus. É a mudança de perspectiva introduzida pelo primeiro humanismo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Em <i>A Voz do Silêncio</i>, André Malraux escreve sobre Giotto, e poderia estar a escrever sobre Dante e o seu contributo para a poesia universal. Diz: “É o primeiro na pintura a descobrir o gesto largo sem dele fazer um gesto teatral. Substitui as pregas.”<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Uma lenda muito difundida sustenta que Dante e Giotto ter-se-iam encontrado, quando este estava a pintar a Capela dos Scrovegni, em Pádua. Não se sabe ao certo se este encontro se deu ou não, porém, em <i>O Essencial sobre Dante</i>, defendo virtualmente que, se se tivessem encontrado, não seria de espantar. As imagens que estão na Capela dos Scrovegni, aquelas figurações do Inferno, do Purgatório e do Paraíso, poderiam ter saído das páginas da <i>Divina Comédia</i>. A afirmação de Malraux é interessante, mas não toca no essencial em Giotto: o olhar. Todas as suas personagens olham umas para as outras, interagem, tal como na <i>Divina Comédia</i> Dante vê as coisas e reage e transmite aquilo que vê. Ambos compõem teatros do olhar. De um olhar novo, cuja modernidade, no entanto, pode ser discutida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">UM PONTO NÃO TEM SOMBRA<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;"> A menos que outro milagre<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">fizesse desabar a neve<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">em pleno verão<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">(mas não seria milagre,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">apenas meteorologia),<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">nunca havemos de ver<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">o que os guias turísticos<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">nos descrevem: os flocos,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">leves, de si imponderáveis,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">que em lenta espiral morrente<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">descem da lucarna<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">do Panthéon<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">e vêm depositar-se, humilíssimos,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">aos pés da urna de Rafael.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">Restos junto a restos,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">o frio do céu a prosternar-se<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">diante do indescritível frio<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">da terra, o génio,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">a sua morte.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">Curva-te para ver melhor: o epitáfio,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">admirável sentença<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">(tudo soa melhor quando gravado sobre<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">o mármore).<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">De que nos vale, porém, imaginar<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">o que não é, se o sol, vertical,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">Solene, se precipita no maior calor<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">do dia, desenhando a esquadro,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">infalível geometria,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">um círculo de luz<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">sobre o imediato centro<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;"> do lugar dos deuses,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">ponto sem sombra<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">(um ponto não tem sombra)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">onde convergem<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">as almas todas que ali<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">se juntam,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">famintas de História,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">ou do rasto dela,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">ou do que leram dela<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">(discurso sobre discurso)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">nos apressados roteiros<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">que distribuem maravilhas<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">às vezes, até, onde só existem<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 70.8pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">ruínas de ruínas,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">vozes emudecidas<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">de calor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">É este raio de sol<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">o mesmo<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">que iluminou Agripa<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">e deixou Adriano de fora, na sombra<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "bookman old style" , serif;">desse verão.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 35.4pt; text-indent: 35.4pt;">
<i><span style="font-family: "bookman old style" , serif;">Inédito de 2014<o:p></o:p></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<b>Ler Inverno 2017</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-53510117885274696312019-07-18T01:42:00.001+01:002019-07-18T01:42:35.996+01:00Manifesto | Philip Roth<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMspfz87xCF0xOtTsiIuQnXaT_9Vvw4uaXTvfpIvPqgm_nP_v8QA2VCmKHggYHtW7lUvY-TZk2XifAYY84ZQYMX86r8aUZ9tcQbKPRJ4KRB7W2iUN0Uv_G0B-8tzQczkqyWlwTI7EUOrk/s1600/philip_roth122380-1.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="413" data-original-width="620" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMspfz87xCF0xOtTsiIuQnXaT_9Vvw4uaXTvfpIvPqgm_nP_v8QA2VCmKHggYHtW7lUvY-TZk2XifAYY84ZQYMX86r8aUZ9tcQbKPRJ4KRB7W2iUN0Uv_G0B-8tzQczkqyWlwTI7EUOrk/s640/philip_roth122380-1.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
Philip Roth 1, Wikipedia 2</div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
<div class="MsoNormal" style="font-size: 12pt; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px;">
<div style="margin: 0px; padding: 0px; text-align: start;">
Morto o escritor, vence a Wikipedia.</div>
</div>
</div>
<br style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;" />
<span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "times new roman" , serif; font-size: 16px; text-align: justify;">Na página da Wikipedia em inglês relativa a </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">A Mancha Humana</i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "times new roman" , serif; font-size: 16px; text-align: justify;">, publicado por Philip Roth no ano 2000, continua a ler-se, em destaque, que o protagonista do romance, Coleman Silk, foi alegadamente inspirado numa personagem real: o escritor e crítico literário Anatole Broyard (1920-1990) que, como Coleman, se fez passar por “branco”, escondendo as suas raízes afro-americanas. Ora, o escritor norte-americano negou e tentou corrigir esta informação desde que tomou conhecimento dela, em 2012, chegando ao ponto de, numa longa e detalhada carta aberta publicada na </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">New Yorker </i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "times new roman" , serif; font-size: 16px; text-align: justify;">nesse ano, especificar a verdadeira inspiração para a personagem (“um episódio infeliz na vida do meu velho amigo Melvin Tumin, professor de Sociologia em Princeton”) e escrever: “Eu sou Philip Roth […] e não existe qualquer verdade nessa afirmação.” Perante o pedido de rectificação que lhe foi endereçado por Roth, o administrador da referida página </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">online</i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "times new roman" , serif; font-size: 16px; text-align: justify;"> foi peremptório: “Compreendo o seu ponto de vista de que o escritor é a autoridade máxima sobre a sua própria obra, mas nós exigimos fontes secundárias.” Logo, Roth não era uma fonte credível. A melhor ficção, fica provado, existe na Wikipedia.</span><br />
<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-61921390946190580452019-07-18T01:40:00.001+01:002019-07-18T01:40:36.103+01:00Manifesto | LGBT<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhaJj_xUggXIlFtSq9CFuUJ6O2H-xM_J8x-ATTqnvG7gjDji-tO63x3d4vhGO3TTZqyWUvfy6eCGPyb0UKctv_FupocWjIbw4SMxGZBjDgCkvkQyJAx88BgQdBpBFxqixxbQTwrWAzxtu0/s1600/gay-wedding-cake.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="571" data-original-width="846" height="430" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhaJj_xUggXIlFtSq9CFuUJ6O2H-xM_J8x-ATTqnvG7gjDji-tO63x3d4vhGO3TTZqyWUvfy6eCGPyb0UKctv_FupocWjIbw4SMxGZBjDgCkvkQyJAx88BgQdBpBFxqixxbQTwrWAzxtu0/s640/gay-wedding-cake.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
O sexo dos bonecos</div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
<o:p style="margin: 0px; padding: 0px;"></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; padding: 0px; text-align: justify;">
Ou de como um bolo de noivo prova uma lenda urbana.</div>
<br style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;" /><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; text-align: justify;">Em 2014, uma pastelaria de Belfast recusou-se a confeccionar um bolo para um activista LGBT, porque a inscrição solicitada para a cobertura </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">glacée</i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; text-align: justify;"> ia contra a fé cristã evangélica dos proprietários. Acusados de discriminação em primeira instância, estes interpuseram recurso e aguardam para breve a decisão do Supremo Tribunal irlandês. Visto que a mensagem constava de um retrato do Egas e do Becas, com a legenda “Apoiem o casamento </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">gay</i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; text-align: justify;">”, caso o veredicto final dê razão aos pasteleiros, será por fim exposta a perniciosa mensagem subliminar a que a </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">Sesame Street </i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; text-align: justify;">submeteu gerações e gerações de crianças desde 1965, sem jamais o admitir (“os bonecos não existem abaixo da cintura”, insistem eles). A pastelaria Ashers recusou-se porque sabe que o Egas e o Becas esfregam as costas um do outro no banho e dormem juntos, logo, são </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">gay</i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; text-align: justify;">, ou seja, percebe o que todos querem negar. Se o tribunal lhe der razão, poderemos finalmente gritar também ao mundo que: o duo de ranzinzas de camarote é um velho casal </span><i style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; margin: 0px; padding: 0px; text-align: justify;">gay</i><span style="background-color: white; color: #343434; font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16px; text-align: justify;">, a Piggy é um transsexual e os narizes de quase todas as personagens são gigantescos falos. Como diria o conde Draco de Contar: “Um-dois--trrrrês-quatrrrro, ha-ha-ha-ha!”</span><br />
<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-4844576370472988932019-07-18T01:23:00.000+01:002019-07-18T01:52:17.702+01:00Entrevista | Miguel Tamen<div dir="ltr" style="line-height: 1.2; margin-bottom: 0pt; margin-top: 0pt; text-align: justify;">
</div>
<br />
<div dir="ltr" style="line-height: 1.2; margin-bottom: 0pt; margin-top: 0pt; text-align: justify;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj4bdHq9zqOZCcc-ZnVJDMIdz3RIPrdkCA8Q0v78qTBiklRYtw7PaG9OT2W9pEBgBHMunOo_zYfUoK3neSw_rCDz-c5zq9h5trxVuAG7eRynulMBAzmqtCfLGhNNqXFNIccUDH1xAZlv4c/s1600/maxresdefault.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"> </a><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;"><br /></span>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: left;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEikuTPnnKTwl2hymxm-EUh0fZXn3LuZA4o61pY_Zo_-AvGUwfnIwVD0WqgjimcQDH_uMByuVJRLfl3cIlidBVcdh9Q95GSdqNyYdAUgv8Czm_6IriC4Pcv2SFkY0Q50t4zjDT4oERYmSV8/s1600/maxresdefault.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="360" data-original-width="640" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEikuTPnnKTwl2hymxm-EUh0fZXn3LuZA4o61pY_Zo_-AvGUwfnIwVD0WqgjimcQDH_uMByuVJRLfl3cIlidBVcdh9Q95GSdqNyYdAUgv8Czm_6IriC4Pcv2SFkY0Q50t4zjDT4oERYmSV8/s640/maxresdefault.jpg" width="640" /></a></div>
<br />
<span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">Poucas vezes surgem em
Portugal meteoritos como este, chamado <b>Miguel Tamen</b>, professor com interesses
em filosofia e literatura, filósofo, formado por cá, pós-graduado na América,
recém-eleito, por maioria, diretor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
</span><span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">Manifesto opositor do acordo ortográfico, da
auto-indulgência, do paternalismo do Estado e das instituições, das grandes
convições pessoais como da pedagogia dos chamados grandes valores estéticos</span><span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">.
A sua ideia de universidade é democrática, iconoclasta e crítica, no sentido
revolucionário da palavra. </span><span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">Vá se lá saber se este
espírito extraterreste conseguirá atingir o solo.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nos seus livros prefere a sugestão à afirmação, a comparação e
a analogia inesperada...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que eu faço
é relacionar coisas diferentes e, portanto, sugerir que coisas diferentes são
parecidas ou distinguir entre coisas que as pessoas pensam que são parecidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">À procura de quê? De um ponto comum entre perspetivas
diferentes?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">À procura de
perceber coisas que não percebo e às quais posso aceder comparando-as com
coisas que conheço um pouco melhor ou com outras coisas que me parece que são
parecidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando estão em viagem, caricaturalmente, os portugueses têm
tendência para compararem as paisagens estrangeiras com as paisagens domésticas.
Por exemplo, estão diante do Taj Mahal e comparam-no com... o Mosteiro dos
Jerónimos. Suponho que rejeite esta procura da familiaridade que é, afinal, uma
forma de recusa do que é estrangeiro.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Num certo
sentido essa é a perspetiva de toda a gente. A única maneira de alguém perceber
alguma coisa é comparar essa coisa com outras que já conhece; tentar imaginar
pontos de semelhança entre coisas que lhe são muito familiares e coisas que lhe
são menos familiares. Mas creio que se estava a referir a uma embirração
recorrente minha: contra a redução do mundo àquilo que nos é familiar e contra
a tentativa de descrever o mundo como simplesmente obedecendo às categorias e
descrições que nos são mais próximas e comezinhas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que é identificável, em especial, no modo de ser português?</span></b><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Sim. É uma
forma particular de loucura, que consiste em imaginar que todo o mundo gira à
volta de Portugal.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Um messianismo espiritual...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">... que é
simplesmente um mecanismo de consolação por não haver nenhuma forma de
messianismo mais musculado que alguém em Portugal tome a sério. Portanto,
imagina-se que a língua portuguesa é a língua das línguas, que o futebol
português é diferente do futebol espanhol ou que a poesia portuguesa é
diferente da poesia eslovena.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Em que é que se define como português?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Um certo
cartão de cidadão?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Só? Nasceu aqui...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nasci e vivi
a maior parte do tempo em Lisboa. Não me passa pela cabeça deixar de ser
português, porque, tirando casos de emergência (pessoas perseguidas,
apátridas...), a ideia de mudar de nacionalidade não faz para mim sentido
nenhum. Mas não sinto nenhuma responsabilidade ou peso especial por ser
português. Não sinto que deva dizer ou pensar certas coisas por ser português.
Aliás, se fosse esloveno, norueguês ou tanzaniano, teria esta mesma opinião.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Se tivesse de escolher um combate,
hoje, em Portugal, ou dois, ou três, quais seriam?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A eliminação do direito administrativo, da ideia de que devam
existir modos jurídicos especiais para as nossas interações com o Estado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A ideia de identidade nacional é determinante em e para quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não o é, com
certeza, nas declarações que fazemos ou nas teorias que formulamos. Quando
muito, a ideia de identidade nacional coincide com certas maneiras habituais de
fazer coisas — mas estas incluem, muitas vezes, a possibilidade de nos
distanciarmos das maneiras habituais dos nossos vizinhos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas isso não é, afinal, uma forma de comparação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não. Não me
sinto nada tentado a fazer comparações do género: <i style="mso-bidi-font-style: normal;">nós cá</i> e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">eles lá</i>. Há
muito tempo ouvi a história de uma pessoa a orgulhar-se da sua educação
cosmopolita, de ter lido Stendhal e de ter ido ao Prado. E houve alguém também
presente que lhe perguntou: “Operado a quê?” Acho a pergunta perfeita.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quer queiramos quer não, subsiste uma ideia de hierarquia na
aproximação à arte e ao saber.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Que tipo de
hierarquia?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">No acesso, na capacidade de entender, de relacionar com
conhecimento adquirido e referenciais históricos e estéticos...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Existe saber
mais, saber menos, aprender, não perceber, discordar...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">E não existe também ser-se mais ou menos cosmopolita?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Há a frase
assassina do Fernando Pessoa, numa conversa com Mário de Sá-Carneiro, em que
ele lhe diz algo como: ‘O seu problema, meu caro, é que você admira as grandes
cidades.’ Para Pessoa, esta admiração pelas grandes cidades é uma forma de
provincianismo, e eu concordo com ele. Veja-se, por exemplo, a atração dos
jornalistas contemporâneos por Nova Iorque.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">No seu caso, formou-se na
Universidade de Lisboa e depois na University of Minnesota. O contacto com a
filosofia analítica norte-americana não foi determinante?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Foi, mas a minha ideia de perceber coisas é mais
antiga do que o meu interesse pela filosofia. Sinto uma afinidade grande com
pessoas que não aldrabam aquilo que não percebem e que tentam clarificar e
explicar bem aquilo que percebem, sem que, em nenhum momento, achem que podem
dissolver todas as suas incompreensões.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">O que pode definir tanto
um filósofo como um pedagogo, certo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Há uma relação muito antiga entre filosofia e ensino
de Filosofia, mas o tipo de clareza que se deve procurar pode existir também
numa aula de Francês ou de Matemática.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">O professor deve orientar
os alunos para a vida através de uma pedagogia específica?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">A única coisa que me interessa no ensino é dar
aulas. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Ser professor é uma
vocação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Não o vejo assim. Mas falar com pessoas sobre coisas
que não se percebe muito bem é, para mim, muito importante. Um filósofo que
admiro costumava referir-se à sua longa e ilustre carreira de filósofo e de
professor como a de alguém que conduzia a sua educação em público.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Essa afirmação
interessa-lhe como sinal de quê? De honestidade, de humildade?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Não necessariamente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Porque é questionável.
Ainda que saber mais seja sempre conhecer e conhecer-se mais, a prática como
professor implica um determinado grau de saber, logo, um estatuto
pré-estabelecido.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Sim, mas não implica saber tudo. A propósito de
humildade, desconfio muito daqueles professores que dizem que aprendem sempre
muito com os seus alunos. Eu não aprendo praticamente nada com os meus alunos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Começa cada novo semestre
e cada conferência, dizendo<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>aos
auditores: </span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">‘São estes os artigos que tenho; alguns eu acho que são muito
importantes — e vou explicar porquê. O resto é convosco.’ <span style="background: white; mso-highlight: white;"><o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Justamente. Porque há uma parte muito importante do
ensino que se passa nas cabeças dos alunos. E, portanto, o professor não deve
explicar ou fazer tudo, mas deve esperar que os alunos façam qualquer coisa. Há
uma frase que também cito, do Saul Bellow: ‘Eu ensaboo, vocês barbeiam.’<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Sou alérgico à noção de discípulo, à ideia de que a
excelência de um aluno é medida pela maneira como ele se parece com os
professores que teve. O melhor que pode acontecer a um ex-aluno meu é pensar
pela sua própria cabeça e ir por aí fora, sem pedir satisfações a ninguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Numa conferência, algures nos EUA, defendeu: ‘Muitos daqueles
que reconhecemos como nossos heróis intelectuais não seriam hoje convidados
para os lugares [académicos] através dos quais se tornaram reconhecidos como
tal.’ Antes de mais, quais são os seus heróis intelectuais?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Bem, não
quero especificar, tenho muitos, a maior parte deles mortos...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pode dar um exemplo de um deles e do porquê de achar que,
hoje, ele não teria hipótese de ser contratado para qualquer dos lugares que
teve na universidade?</span></b><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"> <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Wittgenstein
teria quando muito aquilo que nós chamaríamos em Portugal uma licenciatura em
Engenharia e, em 1929, com base num livro que ele publicara oito anos antes, o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Tratactus Logico-Philosophicus</i>, dois
filósofos da Universidade de Cambridge, [Bertrand] Russell e [George Edward]
Moore, decidiram atribuir-lhe um doutoramento. Wittgenstein deu aulas naquela
universidade nos vinte anos seguintes. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O reconhecimento do talento de pessoas cujo conhecimento não
podemos medir deixou de ser possível na universidade?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Eu diria que
não há consequências da admiração. Do facto de eu admirar muito uma pessoa não
se segue quase nada na universidade, pelo menos nas Humanidades. E esse é um
problema muito sério. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pode dar exemplos na área da crítica literária?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Um deles é o
de William Empson, talvez o maior crítico literário do século XX, que teve
muitos problemas nas universidades em que deu aulas. Hoje, Paul de Manou Harold
Bloom não teriam qualquer hipótese de arranjar um lugar numa universidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O caso de George Steiner é uma exceção.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Steiner não é
nem crítico literário, nem filósofo... Sabe, não tenho admiração nenhuma por
ele.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não? Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Acho-o um
fala-barato. Dá-nos sempre a impressão de que sabe coisas que não sabe.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">E isso é alimentado por quê? Pela aura de intelectual judeu,
poliglota...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É alimentado
pelo modo misterioso como fala de coisas que não são nada misteriosas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como é que se reconhece um fala-barato na academia?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Os critérios
são os mesmos dentro e fora da academia: é preciso tempo. Às vezes não se
reconhece um fala-barato à primeira.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Há quem diga que os falsários estão cada vez melhores também a
esse nível.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Relembro-lhe
o princípio do presidente Lincoln: não se consegue enganar toda a gente durante
todo o tempo. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que resta hoje da ideia de humanismo ligada às Humanidades?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que me
interessa na ideia das Humanidades na universidade é a possibilidade de uma
conversa, com certeza com imensos mal-entendidos, mas de uma conversa entre pessoas
que se interessam por arte, por filosofia, por história, ... O fato de esta
espécie de conversa comum se dar em termos que não são exatamente idênticos
requer uma tradução constante — o que me parece ser também muito importante
numa conversa entre pessoas que fazem ciências ditas mais sérias ou ciências
ditas menos sérias. Deve ser possível a qualquer pessoa fazer-se entender. Este
esforço de clareza e de tradução deve ser requerido em qualquer lado. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por mais específico que seja o campo de saber em questão?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É inquietante
e muitas vezes triste a maneira como as pessoas se defendem por detrás das suas
especialidades. E, quanto mais pequenas forem as especialidades, menor é a
probabilidade de haver quem consiga falar com elas e, portanto, menor é a exigência
de justificação.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que, no caso das ciências humanas, faz aumentar o espírito
de exclusivismo.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Um bocadinho
como Sá-Carneiro admirava Paris, as Humanidades repetem e imitam o pior do pior
das ciências: neste caso, a ideia de que existem pequenas comunidades de
profissionais acessíveis apenas a quem a elas ganhou acesso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">What Art is Like </i>[</span></b><span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Harvard 2012]<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">, para abordar o discurso sobre a arte, parte dos livros de Alice, de
Lewis Carroll. Porquê?<o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; color: black; font-family: "cochin";">Muitas vezes certos problemas parecem-nos muito difíceis
porque nos esquecemos das soluções simples. Há certos livros muito complicados
que são intuitivamente evidentes para pessoas que não dispõem das ferramentas
para perceber a complicação desses livros. Tive um professor que dizia que,
para se perceber <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Origem da Obra de Arte</i>,
um ensaio muito complicado e exasperante de Heidegger, era preciso ter cinco
anos de idade. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Logo no início do ensaio, surge Humpty Dumpty, que se diz
capaz de explicar a Alice todos os poemas alguma vez inventados e até alguns
ainda por inventar. Mas, apesar de ele ter respondido a todas as perguntas
dela, no final, o poema permanece tão <i style="mso-bidi-font-style: normal;">estrangeiro
</i>para Alice como na primeira leitura.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O Humpty
Dumpty é como um professor de Literatura, de Linguística ou de Filosofia. Ele é
uma máquina de produzir explicações.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quase a tombar do muro?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É uma máquina
de produzir explicações porque acha que as palavras querem sempre dizer aquilo
que ele quer que elas queiram dizer. É o oposto da ideia de comunidade e da
convicção de que, para conseguirmos tornar uma coisa explícita, ou
compreensível, ou inteligível, temos de tentar perceber as outras pessoas. O
Humpty Dumpty não precisa de mais ninguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">No mesmo ensaio, diz que tem de existir um patamar comum de
familiaridade com a obra de arte, mas que, em simultâneo, tem de aceitar-se que
não existe uma linguagem da poesia ou uma linguagem da arte. Ou seja, aquilo
que não é familiar é intrínseco na obra de arte ou na obra literária?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Sim, mas isso
não é caraterística exclusiva do discurso sobre a obra de arte; é caraterístico
de qualquer conversa. As pessoas começaram a conversar sobre coisas muito antes
de nós termos nascido. Como é que nós somos admitidos à mesa dos crescidos, à
mesa das conversas? De muitas maneiras diferentes. É como entrarmos numa sala
em que as pessoas já estão todas a conversar: temos de nos adaptar aos termos
da conversa já existentes e, depois, só devagarinho e quando as pessoas nos dão
atenção, é que podemos dar o nosso contributo. E, depois, há pessoas que não se
calam...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quais são as melhores armas para nos fazermos ouvir: a
originalidade, a tenacidade, a riqueza do ponto de vista?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É tão
completamente contingente. Muitas vezes, depende da sorte. Às vezes, depende da
riqueza do ponto de vista, sim, mas também da capacidade das pessoas que já
estão a falar prestarem atenção a quem acabou de entrar na sala. Esse é um
talento muito importante: o de saber prestar atenção, por exemplo, a quem está
calado ou a quem diz algo de que não se está à espera; não imaginar apenas que
as pessoas que estão ali há muito tempo é que têm coisas interessantes com que
contribuir. Não se trata de um talento de uma determinada profissão: é um
talento pessoal. Há pessoas para quem tudo o que importa são as credenciais, há
outras que privilegiam antes o que as pessoas dizem (como fez Russell em
relação a Wittgenstein).<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porque é que deixou de escrever crónicas para o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Observador </i>[publicou-as semanalmente
entre 2014 e 2017, reuniu-as em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Erro
Extremo</i>]?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Queria acabar
um livro, e deixei de ter tempo para as escrever como achava que deviam ser
escritas; e quando pensei que as ia poder recomeçar a minha profissão
alterou-se inesperadamente e continuei a não ter tempo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Essas suas crónicas, a que poderíamos chamar pequenos ensaios,
motivaram reações bastante antagónicas. Metaforicamente, houve leitores que
disseram que o Miguel só conseguia falar em chinês e outros defenderam que
ninguém diria melhor o que disse. O que é que pretendia quando começou a
escrevê-las?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não tinha
nenhuma agenda, apenas um jornal hospitaleiro, o compromisso de tentar
escrevê-las, de encontrar um tom que me fosse agradável e de continuar enquanto
achasse que estava a fazê-lo bem. Muitas vezes escrevia sobre coisas que me
intrigavam, noutras sobre coisas que me faziam rir, me interessavam ou eram
muito importantes para mim.<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"> </b>O que eu
fazia nessas crónicas é exatamente aquilo que faço nas minhas aulas: comparar
coisas diferentes e distinguir coisas parecidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não necessariamente o avesso?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Às vezes,
sim, mas não necessariamente. E desconfiar intuitivamente daquelas coisas que
são ditas com um tom muito enfático por muitas pessoas. Quando há muitas
pessoas a dizerem a mesma coisa, adotam um tom muito caraterístico...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Usado, por exemplo, no <i style="mso-bidi-font-style: normal;">name
dropping</i>?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É uma parte
desse tom.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Um <i style="mso-bidi-font-style: normal;">tone dropping</i>?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Sim, um tom
no sentido prosódico do termo. Quase todas as pessoas na televisão, nas arenas
políticas, nas conferências profissionais, usam esse tom: o de
alguém-que-está-a-ensinar-coisas. É um tom que sugere que elas vêm coisas que
não são evidentes para mais ninguém e que elas nos vão explicar a todos
como-é-que-essas-coisas-são.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Em grande parte, o sucesso dessas pessoas depende da absoluta
evidência e banalidade do que dizem.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas o sucesso
depende de os outros estarem convencidos de que eles sabem mais. Trata-se de
pessoas que têm acesso a conhecimentos e a segredos especiais e que se dignam
comunicá-los, com o tom um bocadinho impaciente e um bocadinho enfadado de um
professor para quem os alunos são todos estúpidos. É o tom habitual dos debates
na televisão e das discussões políticas e intelectuais em Portugal.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É o tom também de um certo discurso intimidatório relativo à
arte e à literatura.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É aquilo a
que um crítico literário chamava ‘demonstrações no sentido militar do termo’.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Hoje, muitos visitantes dos museus mais famosos limitam-se a
tirar <i style="mso-bidi-font-style: normal;">selfies </i>ou fotografias às obras
expostas, quase ou sem mesmo olharem diretamente para elas. Como o explica?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que conta
para essas pessoas é o fato de terem estado na vizinhança de certos quadros. É
como tirar fotografias ao pé da Torre Eiffel ou colecionar autógrafos de
pessoas famosas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nas paredes dos barracões visitáveis em Auschwitz-Birkenau,
por exemplo, confundem-se hoje as inscrições originais feitas pelos
prisioneiros com outras, entretanto sobrepostas por visitantes, com mensagens
como: <i style="mso-bidi-font-style: normal;">X loves Y</i> ou <i style="mso-bidi-font-style: normal;">X was here</i>.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O meu impulso
imediato é dizer que existe um contraste horrível entre a frivolidade dessas
inscrições sentimentais contemporâneas e a seriedade daquilo que se passou
naquele sítio. Mas depois, a seguir, faço uma pausa e digo que todas as coisas
duram e continuam por causa desses acrescentos fúteis.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Na medida em que eles são uma forma de apropriação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Sim, como as
árvores com coisas marcadas a canivete e como as inscrições triviais que são
apagadas e depois reinscritas e por aí em diante. Aquilo a que hoje chamamos
Auschwitz é Auschwitz com aquilo que se passou lá e com o atrito causado pelas
pessoas que visitaram um sítio onde já não se passava aquilo que era, no fundo,
a razão pela qual, na maior dos casos, elas ali estavam.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A relação das pessoas com a obra de arte está dependente
sobretudo de quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Das próprias
pessoas. O critério para a relevância da arte não é que a arte seja um
documento da história do espírito humano... Para já, falar da arte em geral
faz-me confusão porque o acho um bocadinho exagerado. Falar da arte com ‘A’
grande assusta-me.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Qual é a alternativa?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Falar de
objetos individuais, de coleções ou de grupos de objetos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É a ideia de autoridade da Arte o que o assusta?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Normalmente,
quando se fala da arte com ‘A’ grande está-se a imaginar uma coleção de objetos
e uma espécie de dever indiscriminado de dedicar a mesma afeição a todos esses
objetos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou seja, normativiza-se a aproximação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Claro. Não quer
dizer que não haja muitos, infinitos, objetos desses que não sejam merecedores
da mais extraordinária afeição (ainda que eu não saiba muito bem o que é um
objeto merecedor da nossa afeição, mas essa é outra discussão). O critério da
relação com a arte não pode ser, por exemplo, ter estado na proximidade de
muitos desses objetos ou ter lido muitos livros. Tal como o critério para
conhecer o género humano não é conhecer muitas pessoas. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">No entanto, fala da importância de a arte ser algo contíguo à
pessoa. Defende que ‘a arte é algo que nos acontece’ e que <span style="background: white; mso-highlight: white;">o discurso sobre ela deve
assemelhar-se a, como disse Alice, ‘enviar presentes para os nossos próprios
pés’. Quer explicar?<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">As coisas que
realmente nos importam são aquelas sem as quais não nos conseguimos imaginar.
São muitas vezes as coisas que queremos ter ao pé de nós e há muitas maneiras
de podermos ter coisas ao pé de nós: quer tê-las literalmente, quer pensar
nelas constantemente, quer, em certos casos, porque isso é tecnicamente possível,
repeti-las sob forma diminuída, como, por exemplo, quando assobiamos ou nos
lembramos de uma linha melódica. Esse tipo de proximidade leva-nos
frequentemente a usar essas coisas que são importantes para nós na descrição de
uma série de outras coisas. Eu descrevo aquilo que não percebo bem com a ajuda
daquilo que me é mais próximo. O repertório das coisas que me são próximas
varia imenso. A relevância da arte não é dada por eu ter iluminações
particulares que em mim são causadas pela arte, mas pela maneira como ela não
se consegue separar de todas as outras coisas que são importantes para mim:
pessoas, animais, coisas, ideias, argumentos, opiniões, emoções, ...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É importante existir uma relação física com o objeto
artístico?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não sei se é
física, mas tem de haver uma relação. Stendhal observou uma coisa que é
exatamente o oposto do famoso síndrome de Stendhal [segundo o qual o contato
com uma obra de arte pode ser tão intenso que chega a provocar perturbações
físicas], nomeadamente que a proximidade em relação às coisas não assegura que
o que quer que seja aconteça. Há o episódio muito famoso, em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Cartuxa de Parma</i>, em que o
protagonista, Fabrice, fascinado por Napoleão, foge de casa para ver o grande
homem e aterra na batalha de Waterloo, para descobrir que esta, afinal, não se
assemelha a nada de tudo o que ele lera sobre Napoleão e sobre batalhas.
Depois, há uma série de acidentes, Fabrice acaba por cair e torcer um pé e é
salvo por um sargento e, por fim, evacuado na retirada do exército francês. A
certa altura, deitado numa maca, ele pergunta ao sargento: ‘Então é isto que é
uma batalha?’ E o sargento, muito experimentado, responde: ‘Um bocadinho.’
Fabrice esteve lá e não percebeu nada. As pessoas podem ter ido ao Prado ou ter
sido operadas e não perceberem nada de nada. Pode haver alguém que nunca foi ao
Prado, mas que percebe melhor <i style="mso-bidi-font-style: normal;">As Meninas </i>do
Velásquez do que uma pessoa que passou lá a vida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: black; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">No ensaio <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Amigos de
Objetos Interpretáveis </i>[Harvard, 2001; Assírio & Alvim, 2003], defende
que os objetos inanimados ganham vida através da sua interpretação, no contexto
de ‘sociedades de amigos’. Quer defini-las?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>‘Sociedade de amigos’ é o modo como os quakers
se referem às suas assembleias, que são conduzidas em silêncio. Nesse contexto,
que é teológico, a comunicação entre as pessoas e a interação com Deus não se
dá de um modo verbal. Os amigos serão ‘comunidades interpretativas’, como lhes
chamou o crítico Stanley Fish, pessoas que estão em acordo e em desacordo em
conjunto, mas, muitas vezes, são também pessoas que sabem que não precisam de
dizer nada umas às outras.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porque existe uma familiaridade entre elas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Exato, muitas vezes a
familiaridade não se traduz em acordos explícitos, nem em proposições que nos
merecem o mesmo grau de aprovação, mas traduz-se, antes, em não sentirmos a
necessidade de dizer mais o que quer que seja sobre esse assunto. Imagine que
está num grupo de admiradores de Velázquez e entra uma pessoa que diz: ‘Gosto
tanto, tanto, d’<i style="mso-bidi-font-style: normal;">As</i> <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Meninas</i>!’ Os outros olham para ele com
um ar esquisito, porque não é preciso dizer aquilo. A nossa admiração nem
sempre tem de ser explicitada através de palavras, muitas vezes pode
traduzir-se, antes, em ações ou omissões.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A afirmação de que o ensino é uma conversa traduz-se em quê, na sua ação
como diretor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A minha responsabilidade
é assegurar-me de que a conversa continua.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Essa conversa existia antes?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nem sempre existiu. Mas a
minha responsabilidade é assegurar-me de que ela continua, de que as pessoas
não são admitidas à conversa por causa das habilitações, de que existam
ambientes em que não se façam perguntas (como ‘quem é esta pessoa que apareceu
aqui?’), mas se oiçam argumentos. Esta é a maior escola de Humanidades em
Portugal e eu tomo muito a sério que todas as pessoas que estudam e que ensinam
aqui possam participar nas várias conversas e nos vários desacordos que
caracterizam uma escola.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Imagino que os anticorpos a esse seu posicionamento sejam imensos...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É possível. Mas as minhas
ambições são muito moderadas e muito conservadoras. Não quero transformar a
natureza humana. E, ainda mais difícil do que transformar a natureza humana,
seria transformar a Faculdade de Letras de Lisboa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Einstein dizia que é mais difícil desagregar um preconceito do que um
átomo.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ele tinha toda a razão e,
aliás, a evolução da Física mostrou isso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como é que se explica que esteja aqui, nesta posição, hoje?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Deve-se a uma série de
acasos. Estudei aqui na minha licenciatura e no meu mestrado. Depois, decidi ir
estudar para outro lado e, nessa altura, pensei que era altamente improvável
que eu voltasse a Portugal tão cedo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Noutros lugares, havia
uma audiência e um ambiente mais acolhedor para o tipo de coisas que me
interessavam. Eu não via isto como drama nenhum e muito menos me vi ou veria
como um exilado — aliás, esta palavra é séria demais para se aplicar neste
contexto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Temia ser um estrangeirado? Como o foi Jorge de Sena, por exemplo, quando
regressou após o 25 de abril e a academia lhe fechou as portas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O caso dele é complicado
porque ele era um engenheiro que se reinventou como professor de Literatura e
em Portugal isso não seria possível. A academia, sobretudo nas Humanidades,
nunca mostrou um discernimento especial e não havia por aqui, infelizmente,
(ELIMINAR Bertrand) Russells e Moores que pudessem olhar para pessoas com um
talento especial. Eu digo isto, ainda que, para mim, Jorge de Sena, um poeta
notável, não tenha sido um crítico literário ou um historiador de literatura
notável. Acho é que foi uma grande perda para a universidade portuguesa não lhe
ter dado mais atenção. Como o foi no caso de Ruy Belo, também um grande poeta
do século XX, que, aliás, tinha um doutoramento.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quem é que o ouviu a si? <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Durante a minha
licenciatura em Lisboa, o número de bons professores que tive conta-se pelos
dedos de uma só mão, e de uma pessoa com uma deficiência na mão. A maior parte
dos professores que tive foram muito maus. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Maus em que sentido?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O nome do mal é legião,
havia muitas variedades. Havia pessoas que começavam a aula das nove ao quarto
para as dez e interrompiam-na às dez e vinte para tomar um café; uma preguiça
extraordinária! Havia pessoas que improvisavam, outras que mudavam as regras a
meio. Havia pessoas que não se calavam, outras que não abriam a boca. E,
depois, havia alguns, muito poucos, que eram pessoas extraordinárias, exemplos
de professores, que ainda hoje estimo muito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando terminei o
mestrado, dei aulas como assistente durante dois anos, até que decidi ir fazer
o doutoramento na América e fui admitido em várias universidades. Quando
comuniquei a minha decisão ao então presidente do Conselho Científico, uma
personagem (ELIMINAR venerável) com uma longíssima carreira de modéstia
intelectual continuada, olhou para mim com um ar condescendente, disse-me que
eu era muito novo para pensar em doutoramento, aconselhou-me a não partir e,
por fim, esclareceu-me que, então, o meu contrato com a faculdade teria de
cessar. Pensei que não regressaria jamais.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas voltou, depois de concluir o doutoramento. Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por razões familiares e
pessoais. E, durante o primeiro ano a dar aulas na Faculdade de Letras,
convenci-me de que tinha feito o pior erro da minha vida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nisso pesou também a comparação entre os alunos portugueses e os alunos
norte-americanos?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Os meus alunos de
pós-graduação aqui são tão bons como os de pós-graduação lá. Já os de
licenciatura são francamente piores. Nos Estados Unidos, pelo menos nas
Humanidades, os alunos de licenciatura são melhores do que os de pós-graduação.
Quanto às pós-graduações, nos Estados Unidos, para as Humanidades vão as
pessoas menos espertas e menos interessantes — os realmente espertos, vão fazer
outras coisas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que distingue a universidade
portuguesa da americana?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; text-align: justify;">
<span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A falta de autonomia, e a falta de pessoas interessadas na
autonomia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Então, o que o fez ficar em Portugal e na Faculdade de Letras?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O António Feijó tinha
voltado da América um bocadinho antes, estava numa situação semelhante à minha
e, no fundo, embora nunca tenhamos falado sobre isso, se calhar fizemos das
nossas fraquezas forças. Quase como terapia ocupacional, envolvi-me na criação,
com ele, de um programa de pós-graduação muito pequenino, em Teoria da
Literatura. No primeiro ano, 1991, ainda só com oferta de mestrado, tivemos
quatro alunos e dois desistiram antes do Natal. Depois, o programa tornou-se
cada vez mais interessante e, ao longo de 25 anos, foram aparecendo cada vez
mais alunos. Hoje, temos sessenta alunos e pós-doutorandos, e o programa, de
que me orgulho muito, é um dos melhores do mundo. Por antonomásia, chamamos-lhe
O Programa. Paralelamente, temos uma revista <i style="mso-bidi-font-style: normal;">online</i>, ‘Forma de Vida’, com cinco mil seguidores e recensões novas
todas as semanas, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">workshops </i>semanais
durante todo o ano letivo. Participamos em muitas outras atividades e temos
muitos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">spin-offs</i>, pessoas que estão
ou estiveram ligadas ao Programa, têm ideias e vêm ter connosco.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por que é que esse saber e esse discurso ainda não saíram da universidade
para o espaço público?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Essas coisas não se
passam por desígnio ou por intenção. As propostas do Programa são tão
completamente variadas que não existe um fio condutor — por isso, chamamos-lhe,
genericamente, de Humanidades. Há ex-estudantes nossos que agora estão, dentro
e fora de Portugal, noutras universidades; uns são poetas, outros distribuem
flores, outros são estivadores, outros são investigadores... A ideia de
controlo institucional não nos interessa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por exemplo, permanece a ideia de que o discurso jornalístico e o discurso
académico não podem cruzar-se, habitualmente para desprestígio do primeiro.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando os jornalistas
culturais falam com professores de Humanidades, falam habitualmente com outro
tipo de professores, e se calhar porque precisam de uma imagem tradicional de
professor. Aqui, como no estrangeiro, muito do que se faz nas Humanidades não
me interessa nada ou particularmente. Mas o ponto aqui é haver um conjunto de
pessoas que conseguem pensar de uma maneira distintivamente diferente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A licenciatura em Estudos Gerais da Universidade de Lisboa existe desde
2011 e é inédita a vários títulos. Congrega várias escolas fundadoras, para
oferecer uma formação nas ‘artes liberais’, e privilegia a escolha individual
do aluno pelo seu currículo de interesses, definida com o apoio de um tutor.
Mas é inevitável perguntar-se: no final, serve para quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando as pessoas fazem
essa pergunta, estão a pensar numa profissão. E, se imaginam que os cursos
superiores servem para uma profissão, então, todo o resto da equação vai
aparecer errado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Esse é o argumento principal do ensaio <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A
Universidade como deve ser</i>, que publicou recentemente, em coautoria com
António Feijó, e onde afirmam que ‘a valorização do emprego como fim último, se
não único, da educação universitária revela uma aspiração social pobre’.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Há toda esta ênfase na
empregabilidade, mas ninguém está em posição de garantir emprego a quem quer
que se forme em qualquer curso, exceto no caso em que existe um monopólio
protegido, que é o caso do exercício das profissões médicas. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A lógica é a de que o Estado financia o ensino superior público, logo,
deveria assegurar essa empregabilidade...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas o Estado só pode garantir
todos os empregos na Coreia do Norte. Não há possibilidade de garantir que uma
pessoa com um curso de engenharia vá ser engenheiro ou que alguém com um curso
de arquitetura vá ser arquiteto. É muito importante as pessoas terem emprego e
não há nada de pouco dignificante em trabalhar como caixa num supermercado ou
em ser estivador. Isto não significa nenhuma espécie de displicência da minha
parte em relação a isso. Quero simplesmente chamar a atenção para o fato de que
aquilo que as pessoas fazem e aquilo que as pessoas estudaram não está
naturalmente ligado; há ligações, mas, com exceção da medicina, elas não são
causais. <b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A mudança de mentalidades necessária para que se admitir esse fato é tão
revolucionária como aceitar-se que, no futuro, as pessoas serão sobretudo <i style="mso-bidi-font-style: normal;">freelancers</i>...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou como pensar pela
própria cabeça... Mas, é capaz de ter ocorrido entretanto mudanças geracionais
importantes e, hoje, os miúdos que se formam já não estão tão interessados pela
ideia de terem um único emprego ao longo de toda a vida. Vão provavelmente
mudar de emprego e reinventar-se várias vezes. Alguns deles vão ter ideias e,
como não têm possibilidade de arranjar um emprego por conta de outrem, criarão
o seu próprio emprego. Tudo isto é uma consequência de vivermos em Portugal,
uma sociedade livre e rica, como só o são um número muito pequeno de países. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Está a ironizar?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não. Sempre que se fala
das dificuldades portuguesas, eu sugiro que se olhe para as estatísticas do
Burkina Faso. Ou, já agora, que se olhe para os famosos países de expressão
portuguesa, aos quais nós somos tão iguais. Portugal tem mais a ver com a
Suécia do que com o Brasil.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É por isso que diz que a lusofonia é ‘uma má ideia’?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ainda ninguém me explicou
a teoria física que transforma os falantes de uma língua em pessoas parecidas
entre si. As pessoas podem falar a mesma língua e estarem em desacordo acerca
de tudo e viverem de maneiras completamente diferentes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">E é por isso que diz que ‘a melhor e única decente política da língua é:
nenhuma’ ou que ‘deviam desaparecer todas as cátedras portuguesas pagas pelo
governo português em universidades estrangeiras’?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A não ser os linguistas
ou certos atletas poliglotas, raras vezes as pessoas estão interessadas numa
língua. O que lhes interessa é aquilo que saber uma língua torna possível. Por
exemplo, eu sempre quis ler Tolstói em russo, e por isso aprendo russo.
Garantem-me as pessoas que sabem russo que quem consegue lê-lo nessa língua
consegue perceber em Tolstói coisas que os que o lêem em tradução não conseguem.
Não acredito completamente nessa teoria. Acho que, para a esmagadora maioria
dos efeitos, é suficiente ler Tolstói em tradução. Aliás como, para todos os
efeitos relevantes, basta ler Camões em espanhol.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Admite exceções?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não vou descontar a
existência de casos em que a famosa língua original seja importante. Mas para a
esmagadora maioria das pessoas as traduções são suficientes. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Então, aceita que o Estado apoie programas de tradução?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A ideia de um apoio à
tradução de obras literárias para outras línguas como missão política faz-me
logo franzir o nariz. Porque com o apoio vem a sugestão de que o acesso àquelas
obras é o acesso a uma alma que está escondida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Vem também a imposição de uma determinada autoridade.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pois, e vem uma
metafísica de que eu não partilho. Eu não sei russo, e li Tolstói em traduções
que não foram pagas por nenhuma agência russa. Portanto, ninguém me estava a
dizer que eu ia ter acesso às qualidades extraordinárias da alma russa por
estar a ler Tolstói. Dito isto, não quer dizer que eu não ache que haja
qualidades extraordinárias na alma russa, mas dispenso a ajuda das agências
públicas, muito obrigado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ler torna as pessoas melhores?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou piores. Na maior parte
dos casos, continuamos a ser assim-assim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou seja, ler não influencia o caráter?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pode influenciar, mas a
relação não é necessária, é contingente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A questão moral não está envolvida?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Muitas vezes está, mas
não necessariamente. Há quem não se consiga descrever sem falar de certos
livros que lhe fizeram funda impressão, mas essa é uma muito pequena minoria de
pessoas. Concebo que haja uma pessoa que diga: ‘Proust mudou a minha vida.’ Mas
é uma afirmação quase patológica e, normalmente, as pessoas que dizem isso,
estão a exagerar, estão a tentar impressionar alguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como é que define uma mente independente, em termos intelectuais e em
termos académicos?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É uma pessoa que tem
pouca paciência para os tontos. É uma pessoa que dá atenção aos raciocínios das
outras pessoas e aos seus próprios raciocínios. É uma pessoa que acha que as
questões da verdade não se decidem por referendo e, portanto, não se decidem
pela opinião da maioria. É uma pessoa que, ao mesmo tempo, confia nas opiniões
das outras pessoas, mas desconfia das opiniões partilhadas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Qual é o preço de não ficar, como Montaigne, fechado numa torre? É preciso
ter um discurso provocatório? É preciso forçar os outros ao diálogo?</span></b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Às vezes, e, se somos
pagos para isso, como acontece quando somos professores, com certeza que sim. A
descrição clássica mais antiga e talvez mais extraordinária das dificuldades
desta relação é a maneira como Sócrates fala de si próprio em relação a Atenas,
na <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Apologia de Sócrates</i>. Ele diz algo
como isto: ‘Sou um pateta que anda a fazer perguntas às pessoas pelos caminhos
de Atenas, todos me acham um bocadinho excêntrico, não tenho grande medo do que
me vá acontecer a seguir, mas, ao mesmo tempo, estou completamente ligado a
esta sociedade de idiotas de que faço parte e não posso ir pregar para outra
freguesia.’ No <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Críton</i>, quando já foi
condenado à morte e um amigo fretou um barco e subornou os guardas para o
ajudar a fugir da prisão, Sócrates sugere que mudar de cidade é um plano
injusto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É uma ideia de pertença.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É a ideia de que Sócrates
e Atenas é como bifes e batatas fritas. São duas coisas que vão muito bem
juntas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Sócrates e muitas pessoas
muito menos espertas do que Sócrates não achavam que fossem pessoas especiais,
antes achavam que precisavam das outras pessoas. E este é um ponto filosófico
muito importante: não acharmos que o mundo começou connosco, que vai acabar
connosco e que não existe mais ninguém. Aliás, a cultura contemporânea sublinha
esta possibilidade de não haver ninguém melhor que nós. Há poucas pessoas que
gostam de admitir que, para serem as pessoas que são, precisam das outras
pessoas, e que pensam nisso como uma responsabilidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Hoje em dia, são cada vez menos as pessoas que identificam, ainda menos as
que compreendem, a alusão a um clássico...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas, se estiverem
interessados, a gente explica-lhes, aqui, na universidade. Entre outras coisas,
é para isso que ela serve. Ler Platão ou Shakespeare não significa ter acesso a
conteúdos cognitivos ou, ainda menos, a valores que eles tenham veiculado.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Muitas vezes é reconhecer coisas em que
tínhamos pensado, mas ditas por outras pessoas. Wittgenstein disse num prefácio
de um dos seus livros que este só seria percebido por pessoas que já tivessem
pensado aqueles pensamentos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Voltamos à tal ‘sociedade dos amigos’, que partilha uma familiaridade de
base.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Há dois mil e quinhentos
anos, Platão observou, astutamente, que a experiência principal da aprendizagem
é anamnésica, é uma experiência de rememoração. Como se disséssemos: ‘Ah, estou
a lembrar-me de uma coisa que afinal sabia!’<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nos clássicos, estamos a lembrar-nos de quê? De uma universalidade
qualquer, que transcende o texto?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não acho que seja isso.
Estamos a lembrar-nos de pensamentos que podíamos ter tido ou já tivemos.
Imagine alguém que está a assistir a uma representação do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Rei Lear</i>. Logo no início, ouve a Cordélia dizer: ‘Eu não consigo
içar o coração até à boca.’ E pensa: ‘É extraordinário como eu já pensei isto.’<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como explica que isso aconteça?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porque somos parte da
mesma espécie e por pura coincidência. Ou então, pela extraordinária qualidade
de Shakespeare, que dá muitas vezes a impressão de nos conhecer melhor do que
nos conhecemos a nós próprios.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Que livros lê por puro prazer?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Romances.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Qual foi o último que leu?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pierrette</span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">, de Balzac.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pode indicar cinco ou seis clássicos que gostava que
fossem lidos pelos seus alunos?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Os seis
romances de Jane Austen, ou pelo menos cinco deles.</span><span style="font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Bibliografia:<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Hermenêutica e Mal-Estar </span></i><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>(INCM,
1987, Prémio de Ensaio do Pen Club Português)<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> Manners of Interpretation: The Ends of Arguments in Literary Studies </i>(State
University of New York, 1993; INCM, 1994)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">The Matter of Facts: On
Invention and Interpretation </span></i><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">(Stanford University Press, 2000)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Artigos Portugueses </span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>(Assírio
& Alvim, 2002; ed. aumentada, Documenta, 2015)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Amigos de Objetos Interpretáveis </span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">(Assírio & Alvim,
2003),<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="background: white; color: #262626; font-family: "cochin";">What Art Is Like, in Constant Reference to the Alice
Books</span></i><span lang="EN-US" style="background: white; color: #262626; font-family: "cochin";"> (Harvard University Press, 2012)</span><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Erro Extremo </span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">(Tinta-da-China, 2017)</span><span style="font-family: "cochin";"> <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<!--[if gte mso 9]><xml>
<w:WordDocument>
<w:View>Normal</w:View>
<w:Zoom>0</w:Zoom>
<w:TrackMoves/>
<w:TrackFormatting/>
<w:HyphenationZone>21</w:HyphenationZone>
<w:PunctuationKerning/>
<w:ValidateAgainstSchemas/>
<w:SaveIfXMLInvalid>false</w:SaveIfXMLInvalid>
<w:IgnoreMixedContent>false</w:IgnoreMixedContent>
<w:AlwaysShowPlaceholderText>false</w:AlwaysShowPlaceholderText>
<w:DoNotPromoteQF/>
<w:LidThemeOther>PT</w:LidThemeOther>
<w:LidThemeAsian>X-NONE</w:LidThemeAsian>
<w:LidThemeComplexScript>X-NONE</w:LidThemeComplexScript>
<w:Compatibility>
<w:BreakWrappedTables/>
<w:SnapToGridInCell/>
<w:WrapTextWithPunct/>
<w:UseAsianBreakRules/>
<w:DontGrowAutofit/>
<w:SplitPgBreakAndParaMark/>
<w:EnableOpenTypeKerning/>
<w:DontFlipMirrorIndents/>
<w:OverrideTableStyleHps/>
</w:Compatibility>
<w:DoNotOptimizeForBrowser/>
<m:mathPr>
<m:mathFont m:val="Cambria Math"/>
<m:brkBin m:val="before"/>
<m:brkBinSub m:val="--"/>
<m:smallFrac m:val="off"/>
<m:dispDef/>
<m:lMargin m:val="0"/>
<m:rMargin m:val="0"/>
<m:defJc m:val="centerGroup"/>
<m:wrapIndent m:val="1440"/>
<m:intLim m:val="subSup"/>
<m:naryLim m:val="undOvr"/>
</m:mathPr></w:WordDocument>
</xml><![endif]--><!--[if gte mso 9]><xml>
<w:LatentStyles DefLockedState="false" DefUnhideWhenUsed="false"
DefSemiHidden="false" DefQFormat="false" DefPriority="99"
LatentStyleCount="376">
<w:LsdException Locked="false" Priority="0" QFormat="true" Name="Normal"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" QFormat="true" Name="heading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 9"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="header"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footer"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="35" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="caption"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of figures"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope return"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="line number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="page number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of authorities"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="macro"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="toa heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="10" QFormat="true" Name="Title"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Closing"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Default Paragraph Font"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Message Header"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="11" QFormat="true" Name="Subtitle"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Salutation"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Date"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Block Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="FollowedHyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="22" QFormat="true" Name="Strong"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="20" QFormat="true" Name="Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Document Map"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Plain Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="E-mail Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Top of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Bottom of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal (Web)"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Acronym"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Cite"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Code"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Definition"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Keyboard"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Preformatted"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Sample"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Typewriter"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Variable"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Table"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation subject"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="No List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Contemporary"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Elegant"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Professional"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Balloon Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" Name="Table Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Theme"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Placeholder Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" QFormat="true" Name="No Spacing"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Revision"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="34" QFormat="true"
Name="List Paragraph"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="29" QFormat="true" Name="Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="30" QFormat="true"
Name="Intense Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="19" QFormat="true"
Name="Subtle Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="21" QFormat="true"
Name="Intense Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="31" QFormat="true"
Name="Subtle Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="32" QFormat="true"
Name="Intense Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="33" QFormat="true" Name="Book Title"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="37" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Bibliography"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="TOC Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="41" Name="Plain Table 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="42" Name="Plain Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="43" Name="Plain Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="44" Name="Plain Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="45" Name="Plain Table 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="40" Name="Grid Table Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="Grid Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="Grid Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="Grid Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="List Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="List Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="List Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hashtag"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Unresolved Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Link"/>
</w:LatentStyles>
</xml><![endif]-->
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:roman;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cochin;
panose-1:2 0 6 3 2 0 0 2 0 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-2147482881 1073741898 0 0 7 0;}
@font-face
{font-family:Ovo;
panose-1:2 11 6 4 2 2 2 2 2 4;
mso-font-alt:Calibri;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:auto;
mso-font-signature:0 0 0 0 0 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:"Times New Roman",serif;
mso-fareast-font-family:"Times New Roman";}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-page-numbers:1;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<!--[if gte mso 10]>
<style>
/* Style Definitions */
table.MsoNormalTable
{mso-style-name:"Tabela normal";
mso-tstyle-rowband-size:0;
mso-tstyle-colband-size:0;
mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-style-parent:"";
mso-padding-alt:0cm 5.4pt 0cm 5.4pt;
mso-para-margin:0cm;
mso-para-margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:"Times New Roman",serif;}
</style>
<![endif]-->
<!--StartFragment-->
<!--EndFragment--></div>
<!--[if gte mso 9]><xml>
<w:WordDocument>
<w:View>Normal</w:View>
<w:Zoom>0</w:Zoom>
<w:TrackMoves/>
<w:TrackFormatting/>
<w:HyphenationZone>21</w:HyphenationZone>
<w:PunctuationKerning/>
<w:ValidateAgainstSchemas/>
<w:SaveIfXMLInvalid>false</w:SaveIfXMLInvalid>
<w:IgnoreMixedContent>false</w:IgnoreMixedContent>
<w:AlwaysShowPlaceholderText>false</w:AlwaysShowPlaceholderText>
<w:DoNotPromoteQF/>
<w:LidThemeOther>PT</w:LidThemeOther>
<w:LidThemeAsian>X-NONE</w:LidThemeAsian>
<w:LidThemeComplexScript>X-NONE</w:LidThemeComplexScript>
<w:Compatibility>
<w:BreakWrappedTables/>
<w:SnapToGridInCell/>
<w:WrapTextWithPunct/>
<w:UseAsianBreakRules/>
<w:DontGrowAutofit/>
<w:SplitPgBreakAndParaMark/>
<w:EnableOpenTypeKerning/>
<w:DontFlipMirrorIndents/>
<w:OverrideTableStyleHps/>
</w:Compatibility>
<w:DoNotOptimizeForBrowser/>
<m:mathPr>
<m:mathFont m:val="Cambria Math"/>
<m:brkBin m:val="before"/>
<m:brkBinSub m:val="--"/>
<m:smallFrac m:val="off"/>
<m:dispDef/>
<m:lMargin m:val="0"/>
<m:rMargin m:val="0"/>
<m:defJc m:val="centerGroup"/>
<m:wrapIndent m:val="1440"/>
<m:intLim m:val="subSup"/>
<m:naryLim m:val="undOvr"/>
</m:mathPr></w:WordDocument>
</xml><![endif]--><!--[if gte mso 9]><xml>
<w:LatentStyles DefLockedState="false" DefUnhideWhenUsed="false"
DefSemiHidden="false" DefQFormat="false" DefPriority="99"
LatentStyleCount="376">
<w:LsdException Locked="false" Priority="0" QFormat="true" Name="Normal"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" QFormat="true" Name="heading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 9"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="header"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footer"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="35" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="caption"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of figures"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope return"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="line number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="page number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of authorities"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="macro"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="toa heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="10" QFormat="true" Name="Title"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Closing"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Default Paragraph Font"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Message Header"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="11" QFormat="true" Name="Subtitle"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Salutation"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Date"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Block Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="FollowedHyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="22" QFormat="true" Name="Strong"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="20" QFormat="true" Name="Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Document Map"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Plain Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="E-mail Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Top of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Bottom of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal (Web)"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Acronym"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Cite"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Code"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Definition"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Keyboard"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Preformatted"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Sample"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Typewriter"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Variable"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Table"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation subject"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="No List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Contemporary"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Elegant"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Professional"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Balloon Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" Name="Table Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Theme"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Placeholder Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" QFormat="true" Name="No Spacing"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Revision"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="34" QFormat="true"
Name="List Paragraph"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="29" QFormat="true" Name="Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="30" QFormat="true"
Name="Intense Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="19" QFormat="true"
Name="Subtle Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="21" QFormat="true"
Name="Intense Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="31" QFormat="true"
Name="Subtle Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="32" QFormat="true"
Name="Intense Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="33" QFormat="true" Name="Book Title"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="37" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Bibliography"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="TOC Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="41" Name="Plain Table 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="42" Name="Plain Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="43" Name="Plain Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="44" Name="Plain Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="45" Name="Plain Table 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="40" Name="Grid Table Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="Grid Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="Grid Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="Grid Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="List Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="List Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="List Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hashtag"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Unresolved Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Link"/>
</w:LatentStyles>
</xml><![endif]-->
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:roman;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cochin;
panose-1:2 0 6 3 2 0 0 2 0 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-2147482881 1073741898 0 0 7 0;}
@font-face
{font-family:Ovo;
panose-1:2 11 6 4 2 2 2 2 2 4;
mso-font-alt:Calibri;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:auto;
mso-font-signature:0 0 0 0 0 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:"Times New Roman",serif;
mso-fareast-font-family:"Times New Roman";}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-page-numbers:1;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<!--[if gte mso 10]>
<style>
/* Style Definitions */
table.MsoNormalTable
{mso-style-name:"Tabela normal";
mso-tstyle-rowband-size:0;
mso-tstyle-colband-size:0;
mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-style-parent:"";
mso-padding-alt:0cm 5.4pt 0cm 5.4pt;
mso-para-margin:0cm;
mso-para-margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:"Times New Roman",serif;}
</style>
<![endif]-->
<!--StartFragment-->
<br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Entrevista Miguel Tamen<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Poucas vezes surgem em
Portugal meteoritos como este, chamado Miguel Tamen, professor com interesses
em filosofia e literatura, filósofo, formado por cá, pós-graduado na América,
recém-eleito, por maioria, diretor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Manifesto opositor do acordo ortográfico, da
auto-indulgência, do paternalismo do Estado e das instituições, das grandes
convições pessoais como da pedagogia dos chamados grandes valores estéticos.
A sua ideia de universidade é democrática, iconoclasta e crítica, no sentido
revolucionário da palavra. Vá se lá saber se este
espírito extraterreste conseguirá atingir o solo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Nos seus livros prefere a sugestão à afirmação, a comparação e
a analogia inesperada...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">O que eu faço
é relacionar coisas diferentes e, portanto, sugerir que coisas diferentes são
parecidas ou distinguir entre coisas que as pessoas pensam que são parecidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">À procura de quê? De um ponto comum entre perspetivas
diferentes?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">À procura de
perceber coisas que não percebo e às quais posso aceder comparando-as com
coisas que conheço um pouco melhor ou com outras coisas que me parece que são
parecidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Quando estão em viagem, caricaturalmente, os portugueses têm
tendência para compararem as paisagens estrangeiras com as paisagens domésticas.
Por exemplo, estão diante do Taj Mahal e comparam-no com... o Mosteiro dos
Jerónimos. Suponho que rejeite esta procura da familiaridade que é, afinal, uma
forma de recusa do que é estrangeiro.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Num certo
sentido essa é a perspetiva de toda a gente. A única maneira de alguém perceber
alguma coisa é comparar essa coisa com outras que já conhece; tentar imaginar
pontos de semelhança entre coisas que lhe são muito familiares e coisas que lhe
são menos familiares. Mas creio que se estava a referir a uma embirração
recorrente minha: contra a redução do mundo àquilo que nos é familiar e contra
a tentativa de descrever o mundo como simplesmente obedecendo às categorias e
descrições que nos são mais próximas e comezinhas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">O que é identificável, em especial, no modo de ser português?</span></b><span style="font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Sim. É uma
forma particular de loucura, que consiste em imaginar que todo o mundo gira à
volta de Portugal.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Um messianismo espiritual...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">... que é
simplesmente um mecanismo de consolação por não haver nenhuma forma de
messianismo mais musculado que alguém em Portugal tome a sério. Portanto,
imagina-se que a língua portuguesa é a língua das línguas, que o futebol
português é diferente do futebol espanhol ou que a poesia portuguesa é
diferente da poesia eslovena.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Em que é que se define como português?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Um certo
cartão de cidadão?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Só? Nasceu aqui...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Nasci e vivi
a maior parte do tempo em Lisboa. Não me passa pela cabeça deixar de ser
português, porque, tirando casos de emergência (pessoas perseguidas,
apátridas...), a ideia de mudar de nacionalidade não faz para mim sentido
nenhum. Mas não sinto nenhuma responsabilidade ou peso especial por ser
português. Não sinto que deva dizer ou pensar certas coisas por ser português.
Aliás, se fosse esloveno, norueguês ou tanzaniano, teria esta mesma opinião.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white;">
<b><span style="font-family: "cochin";">Se tivesse de escolher um combate,
hoje, em Portugal, ou dois, ou três, quais seriam?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white;">
<span style="font-family: "cochin";">A eliminação do direito administrativo, da ideia de que devam
existir modos jurídicos especiais para as nossas interações com o Estado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">A ideia de identidade nacional é determinante em e para quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Não o é, com
certeza, nas declarações que fazemos ou nas teorias que formulamos. Quando
muito, a ideia de identidade nacional coincide com certas maneiras habituais de
fazer coisas — mas estas incluem, muitas vezes, a possibilidade de nos
distanciarmos das maneiras habituais dos nossos vizinhos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Mas isso não é, afinal, uma forma de comparação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Não. Não me
sinto nada tentado a fazer comparações do género: <i>nós cá</i> e <i>eles lá</i>. Há
muito tempo ouvi a história de uma pessoa a orgulhar-se da sua educação
cosmopolita, de ter lido Stendhal e de ter ido ao Prado. E houve alguém também
presente que lhe perguntou: “Operado a quê?” Acho a pergunta perfeita.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Quer queiramos quer não, subsiste uma ideia de hierarquia na
aproximação à arte e ao saber.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Que tipo de
hierarquia?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">No acesso, na capacidade de entender, de relacionar com
conhecimento adquirido e referenciais históricos e estéticos...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Existe saber
mais, saber menos, aprender, não perceber, discordar...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">E não existe também ser-se mais ou menos cosmopolita?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Há a frase
assassina do Fernando Pessoa, numa conversa com Mário de Sá-Carneiro, em que
ele lhe diz algo como: ‘O seu problema, meu caro, é que você admira as grandes
cidades.’ Para Pessoa, esta admiração pelas grandes cidades é uma forma de
provincianismo, e eu concordo com ele. Veja-se, por exemplo, a atração dos
jornalistas contemporâneos por Nova Iorque.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">No seu caso, formou-se na
Universidade de Lisboa e depois na University of Minnesota. O contacto com a
filosofia analítica norte-americana não foi determinante?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Foi, mas a minha ideia de perceber coisas é mais
antiga do que o meu interesse pela filosofia. Sinto uma afinidade grande com
pessoas que não aldrabam aquilo que não percebem e que tentam clarificar e
explicar bem aquilo que percebem, sem que, em nenhum momento, achem que podem
dissolver todas as suas incompreensões.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">O que pode definir tanto
um filósofo como um pedagogo, certo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Há uma relação muito antiga entre filosofia e ensino
de Filosofia, mas o tipo de clareza que se deve procurar pode existir também
numa aula de Francês ou de Matemática.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">O professor deve orientar
os alunos para a vida através de uma pedagogia específica?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">A única coisa que me interessa no ensino é dar
aulas. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Ser professor é uma
vocação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Não o vejo assim. Mas falar com pessoas sobre coisas
que não se percebe muito bem é, para mim, muito importante. Um filósofo que
admiro costumava referir-se à sua longa e ilustre carreira de filósofo e de
professor como a de alguém que conduzia a sua educação em público.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Essa afirmação
interessa-lhe como sinal de quê? De honestidade, de humildade?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Não necessariamente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Porque é questionável.
Ainda que saber mais seja sempre conhecer e conhecer-se mais, a prática como
professor implica um determinado grau de saber, logo, um estatuto
pré-estabelecido.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Sim, mas não implica saber tudo. A propósito de
humildade, desconfio muito daqueles professores que dizem que aprendem sempre
muito com os seus alunos. Eu não aprendo praticamente nada com os meus alunos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Começa cada novo semestre
e cada conferência, dizendo aos
auditores: </span></b><b><span style="font-family: "cochin";">‘São estes os artigos que tenho; alguns eu acho que são muito
importantes — e vou explicar porquê. O resto é convosco.’ <span style="background: white; mso-highlight: white;"><o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Justamente. Porque há uma parte muito importante do
ensino que se passa nas cabeças dos alunos. E, portanto, o professor não deve
explicar ou fazer tudo, mas deve esperar que os alunos façam qualquer coisa. Há
uma frase que também cito, do Saul Bellow: ‘Eu ensaboo, vocês barbeiam.’<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Sou alérgico à noção de discípulo, à ideia de que a
excelência de um aluno é medida pela maneira como ele se parece com os
professores que teve. O melhor que pode acontecer a um ex-aluno meu é pensar
pela sua própria cabeça e ir por aí fora, sem pedir satisfações a ninguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Numa conferência, algures nos EUA, defendeu: ‘Muitos daqueles
que reconhecemos como nossos heróis intelectuais não seriam hoje convidados
para os lugares [académicos] através dos quais se tornaram reconhecidos como
tal.’ Antes de mais, quais são os seus heróis intelectuais?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Bem, não
quero especificar, tenho muitos, a maior parte deles mortos...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Pode dar um exemplo de um deles e do porquê de achar que,
hoje, ele não teria hipótese de ser contratado para qualquer dos lugares que
teve na universidade?</span></b><span style="font-family: "cochin";"> <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Wittgenstein
teria quando muito aquilo que nós chamaríamos em Portugal uma licenciatura em
Engenharia e, em 1929, com base num livro que ele publicara oito anos antes, o <i>Tratactus Logico-Philosophicus</i>, dois
filósofos da Universidade de Cambridge, [Bertrand] Russell e [George Edward]
Moore, decidiram atribuir-lhe um doutoramento. Wittgenstein deu aulas naquela
universidade nos vinte anos seguintes. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">O reconhecimento do talento de pessoas cujo conhecimento não
podemos medir deixou de ser possível na universidade?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Eu diria que
não há consequências da admiração. Do facto de eu admirar muito uma pessoa não
se segue quase nada na universidade, pelo menos nas Humanidades. E esse é um
problema muito sério. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Pode dar exemplos na área da crítica literária?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Um deles é o
de William Empson, talvez o maior crítico literário do século XX, que teve
muitos problemas nas universidades em que deu aulas. Hoje, Paul de Manou Harold
Bloom não teriam qualquer hipótese de arranjar um lugar numa universidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">O caso de George Steiner é uma exceção.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Steiner não é
nem crítico literário, nem filósofo... Sabe, não tenho admiração nenhuma por
ele.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Não? Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Acho-o um
fala-barato. Dá-nos sempre a impressão de que sabe coisas que não sabe.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">E isso é alimentado por quê? Pela aura de intelectual judeu,
poliglota...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">É alimentado
pelo modo misterioso como fala de coisas que não são nada misteriosas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Como é que se reconhece um fala-barato na academia?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Os critérios
são os mesmos dentro e fora da academia: é preciso tempo. Às vezes não se
reconhece um fala-barato à primeira.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Há quem diga que os falsários estão cada vez melhores também a
esse nível.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Relembro-lhe
o princípio do presidente Lincoln: não se consegue enganar toda a gente durante
todo o tempo. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">O que resta hoje da ideia de humanismo ligada às Humanidades?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">O que me
interessa na ideia das Humanidades na universidade é a possibilidade de uma
conversa, com certeza com imensos mal-entendidos, mas de uma conversa entre pessoas
que se interessam por arte, por filosofia, por história, ... O fato de esta
espécie de conversa comum se dar em termos que não são exatamente idênticos
requer uma tradução constante — o que me parece ser também muito importante
numa conversa entre pessoas que fazem ciências ditas mais sérias ou ciências
ditas menos sérias. Deve ser possível a qualquer pessoa fazer-se entender. Este
esforço de clareza e de tradução deve ser requerido em qualquer lado. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Por mais específico que seja o campo de saber em questão?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">É inquietante
e muitas vezes triste a maneira como as pessoas se defendem por detrás das suas
especialidades. E, quanto mais pequenas forem as especialidades, menor é a
probabilidade de haver quem consiga falar com elas e, portanto, menor é a exigência
de justificação.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">O que, no caso das ciências humanas, faz aumentar o espírito
de exclusivismo.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Um bocadinho
como Sá-Carneiro admirava Paris, as Humanidades repetem e imitam o pior do pior
das ciências: neste caso, a ideia de que existem pequenas comunidades de
profissionais acessíveis apenas a quem a elas ganhou acesso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Em <i>What Art is Like </i>[</span></b><span style="background: white; font-family: "cochin";">Harvard 2012]<b>, para abordar o discurso sobre a arte, parte dos livros de Alice, de
Lewis Carroll. Porquê?<o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="background: white; font-family: "cochin";">Muitas vezes certos problemas parecem-nos muito difíceis
porque nos esquecemos das soluções simples. Há certos livros muito complicados
que são intuitivamente evidentes para pessoas que não dispõem das ferramentas
para perceber a complicação desses livros. Tive um professor que dizia que,
para se perceber <i>A Origem da Obra de Arte</i>,
um ensaio muito complicado e exasperante de Heidegger, era preciso ter cinco
anos de idade. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Logo no início do ensaio, surge Humpty Dumpty, que se diz
capaz de explicar a Alice todos os poemas alguma vez inventados e até alguns
ainda por inventar. Mas, apesar de ele ter respondido a todas as perguntas
dela, no final, o poema permanece tão <i>estrangeiro
</i>para Alice como na primeira leitura.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">O Humpty
Dumpty é como um professor de Literatura, de Linguística ou de Filosofia. Ele é
uma máquina de produzir explicações.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Quase a tombar do muro?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">É uma máquina
de produzir explicações porque acha que as palavras querem sempre dizer aquilo
que ele quer que elas queiram dizer. É o oposto da ideia de comunidade e da
convicção de que, para conseguirmos tornar uma coisa explícita, ou
compreensível, ou inteligível, temos de tentar perceber as outras pessoas. O
Humpty Dumpty não precisa de mais ninguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">No mesmo ensaio, diz que tem de existir um patamar comum de
familiaridade com a obra de arte, mas que, em simultâneo, tem de aceitar-se que
não existe uma linguagem da poesia ou uma linguagem da arte. Ou seja, aquilo
que não é familiar é intrínseco na obra de arte ou na obra literária?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, mas isso
não é caraterística exclusiva do discurso sobre a obra de arte; é caraterístico
de qualquer conversa. As pessoas começaram a conversar sobre coisas muito antes
de nós termos nascido. Como é que nós somos admitidos à mesa dos crescidos, à
mesa das conversas? De muitas maneiras diferentes. É como entrarmos numa sala
em que as pessoas já estão todas a conversar: temos de nos adaptar aos termos
da conversa já existentes e, depois, só devagarinho e quando as pessoas nos dão
atenção, é que podemos dar o nosso contributo. E, depois, há pessoas que não se
calam...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Quais são as melhores armas para nos fazermos ouvir: a
originalidade, a tenacidade, a riqueza do ponto de vista?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">É tão
completamente contingente. Muitas vezes, depende da sorte. Às vezes, depende da
riqueza do ponto de vista, sim, mas também da capacidade das pessoas que já
estão a falar prestarem atenção a quem acabou de entrar na sala. Esse é um
talento muito importante: o de saber prestar atenção, por exemplo, a quem está
calado ou a quem diz algo de que não se está à espera; não imaginar apenas que
as pessoas que estão ali há muito tempo é que têm coisas interessantes com que
contribuir. Não se trata de um talento de uma determinada profissão: é um
talento pessoal. Há pessoas para quem tudo o que importa são as credenciais, há
outras que privilegiam antes o que as pessoas dizem (como fez Russell em
relação a Wittgenstein).<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Porque é que deixou de escrever crónicas para o <i>Observador </i>[publicou-as semanalmente
entre 2014 e 2017, reuniu-as em <i>Erro
Extremo</i>]?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Queria acabar
um livro, e deixei de ter tempo para as escrever como achava que deviam ser
escritas; e quando pensei que as ia poder recomeçar a minha profissão
alterou-se inesperadamente e continuei a não ter tempo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Essas suas crónicas, a que poderíamos chamar pequenos ensaios,
motivaram reações bastante antagónicas. Metaforicamente, houve leitores que
disseram que o Miguel só conseguia falar em chinês e outros defenderam que
ninguém diria melhor o que disse. O que é que pretendia quando começou a
escrevê-las?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Não tinha
nenhuma agenda, apenas um jornal hospitaleiro, o compromisso de tentar
escrevê-las, de encontrar um tom que me fosse agradável e de continuar enquanto
achasse que estava a fazê-lo bem. Muitas vezes escrevia sobre coisas que me
intrigavam, noutras sobre coisas que me faziam rir, me interessavam ou eram
muito importantes para mim.<b> </b>O que eu
fazia nessas crónicas é exatamente aquilo que faço nas minhas aulas: comparar
coisas diferentes e distinguir coisas parecidas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Não necessariamente o avesso?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Às vezes,
sim, mas não necessariamente. E desconfiar intuitivamente daquelas coisas que
são ditas com um tom muito enfático por muitas pessoas. Quando há muitas
pessoas a dizerem a mesma coisa, adotam um tom muito caraterístico...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Usado, por exemplo, no <i>name
dropping</i>?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">É uma parte
desse tom.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Um <i>tone dropping</i>?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, um tom
no sentido prosódico do termo. Quase todas as pessoas na televisão, nas arenas
políticas, nas conferências profissionais, usam esse tom: o de
alguém-que-está-a-ensinar-coisas. É um tom que sugere que elas vêm coisas que
não são evidentes para mais ninguém e que elas nos vão explicar a todos
como-é-que-essas-coisas-são.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Em grande parte, o sucesso dessas pessoas depende da absoluta
evidência e banalidade do que dizem.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Mas o sucesso
depende de os outros estarem convencidos de que eles sabem mais. Trata-se de
pessoas que têm acesso a conhecimentos e a segredos especiais e que se dignam
comunicá-los, com o tom um bocadinho impaciente e um bocadinho enfadado de um
professor para quem os alunos são todos estúpidos. É o tom habitual dos debates
na televisão e das discussões políticas e intelectuais em Portugal.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">É o tom também de um certo discurso intimidatório relativo à
arte e à literatura.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">É aquilo a
que um crítico literário chamava ‘demonstrações no sentido militar do termo’.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Hoje, muitos visitantes dos museus mais famosos limitam-se a
tirar <i>selfies </i>ou fotografias às obras
expostas, quase ou sem mesmo olharem diretamente para elas. Como o explica?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">O que conta
para essas pessoas é o fato de terem estado na vizinhança de certos quadros. É
como tirar fotografias ao pé da Torre Eiffel ou colecionar autógrafos de
pessoas famosas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Nas paredes dos barracões visitáveis em Auschwitz-Birkenau,
por exemplo, confundem-se hoje as inscrições originais feitas pelos
prisioneiros com outras, entretanto sobrepostas por visitantes, com mensagens
como: <i>X loves Y</i> ou <i>X was here</i>.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">O meu impulso
imediato é dizer que existe um contraste horrível entre a frivolidade dessas
inscrições sentimentais contemporâneas e a seriedade daquilo que se passou
naquele sítio. Mas depois, a seguir, faço uma pausa e digo que todas as coisas
duram e continuam por causa desses acrescentos fúteis.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Na medida em que eles são uma forma de apropriação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Sim, como as
árvores com coisas marcadas a canivete e como as inscrições triviais que são
apagadas e depois reinscritas e por aí em diante. Aquilo a que hoje chamamos
Auschwitz é Auschwitz com aquilo que se passou lá e com o atrito causado pelas
pessoas que visitaram um sítio onde já não se passava aquilo que era, no fundo,
a razão pela qual, na maior dos casos, elas ali estavam.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">A relação das pessoas com a obra de arte está dependente
sobretudo de quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Das próprias
pessoas. O critério para a relevância da arte não é que a arte seja um
documento da história do espírito humano... Para já, falar da arte em geral
faz-me confusão porque o acho um bocadinho exagerado. Falar da arte com ‘A’
grande assusta-me.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Qual é a alternativa?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Falar de
objetos individuais, de coleções ou de grupos de objetos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">É a ideia de autoridade da Arte o que o assusta?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Normalmente,
quando se fala da arte com ‘A’ grande está-se a imaginar uma coleção de objetos
e uma espécie de dever indiscriminado de dedicar a mesma afeição a todos esses
objetos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">Ou seja, normativiza-se a aproximação?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Claro. Não quer
dizer que não haja muitos, infinitos, objetos desses que não sejam merecedores
da mais extraordinária afeição (ainda que eu não saiba muito bem o que é um
objeto merecedor da nossa afeição, mas essa é outra discussão). O critério da
relação com a arte não pode ser, por exemplo, ter estado na proximidade de
muitos desses objetos ou ter lido muitos livros. Tal como o critério para
conhecer o género humano não é conhecer muitas pessoas. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">No entanto, fala da importância de a arte ser algo contíguo à
pessoa. Defende que ‘a arte é algo que nos acontece’ e que <span style="background: white; mso-highlight: white;">o discurso sobre ela deve
assemelhar-se a, como disse Alice, ‘enviar presentes para os nossos próprios
pés’. Quer explicar?<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">As coisas que
realmente nos importam são aquelas sem as quais não nos conseguimos imaginar.
São muitas vezes as coisas que queremos ter ao pé de nós e há muitas maneiras
de podermos ter coisas ao pé de nós: quer tê-las literalmente, quer pensar
nelas constantemente, quer, em certos casos, porque isso é tecnicamente possível,
repeti-las sob forma diminuída, como, por exemplo, quando assobiamos ou nos
lembramos de uma linha melódica. Esse tipo de proximidade leva-nos
frequentemente a usar essas coisas que são importantes para nós na descrição de
uma série de outras coisas. Eu descrevo aquilo que não percebo bem com a ajuda
daquilo que me é mais próximo. O repertório das coisas que me são próximas
varia imenso. A relevância da arte não é dada por eu ter iluminações
particulares que em mim são causadas pela arte, mas pela maneira como ela não
se consegue separar de todas as outras coisas que são importantes para mim:
pessoas, animais, coisas, ideias, argumentos, opiniões, emoções, ...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">É importante existir uma relação física com o objeto
artístico?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin";">Não sei se é
física, mas tem de haver uma relação. Stendhal observou uma coisa que é
exatamente o oposto do famoso síndrome de Stendhal [segundo o qual o contato
com uma obra de arte pode ser tão intenso que chega a provocar perturbações
físicas], nomeadamente que a proximidade em relação às coisas não assegura que
o que quer que seja aconteça. Há o episódio muito famoso, em <i>A Cartuxa de Parma</i>, em que o
protagonista, Fabrice, fascinado por Napoleão, foge de casa para ver o grande
homem e aterra na batalha de Waterloo, para descobrir que esta, afinal, não se
assemelha a nada de tudo o que ele lera sobre Napoleão e sobre batalhas.
Depois, há uma série de acidentes, Fabrice acaba por cair e torcer um pé e é
salvo por um sargento e, por fim, evacuado na retirada do exército francês. A
certa altura, deitado numa maca, ele pergunta ao sargento: ‘Então é isto que é
uma batalha?’ E o sargento, muito experimentado, responde: ‘Um bocadinho.’
Fabrice esteve lá e não percebeu nada. As pessoas podem ter ido ao Prado ou ter
sido operadas e não perceberem nada de nada. Pode haver alguém que nunca foi ao
Prado, mas que percebe melhor <i>As Meninas </i>do
Velásquez do que uma pessoa que passou lá a vida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin";">No ensaio <i>Amigos de
Objetos Interpretáveis </i>[Harvard, 2001; Assírio & Alvim, 2003], defende
que os objetos inanimados ganham vida através da sua interpretação, no contexto
de ‘sociedades de amigos’. Quer defini-las?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"> ‘Sociedade de amigos’ é o modo como os quakers
se referem às suas assembleias, que são conduzidas em silêncio. Nesse contexto,
que é teológico, a comunicação entre as pessoas e a interação com Deus não se
dá de um modo verbal. Os amigos serão ‘comunidades interpretativas’, como lhes
chamou o crítico Stanley Fish, pessoas que estão em acordo e em desacordo em
conjunto, mas, muitas vezes, são também pessoas que sabem que não precisam de
dizer nada umas às outras.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porque existe uma familiaridade entre elas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Exato, muitas vezes a
familiaridade não se traduz em acordos explícitos, nem em proposições que nos
merecem o mesmo grau de aprovação, mas traduz-se, antes, em não sentirmos a
necessidade de dizer mais o que quer que seja sobre esse assunto. Imagine que
está num grupo de admiradores de Velázquez e entra uma pessoa que diz: ‘Gosto
tanto, tanto, d’<i>As</i> <i>Meninas</i>!’ Os outros olham para ele com
um ar esquisito, porque não é preciso dizer aquilo. A nossa admiração nem
sempre tem de ser explicitada através de palavras, muitas vezes pode
traduzir-se, antes, em ações ou omissões.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A afirmação de que o ensino é uma conversa traduz-se em quê, na sua ação
como diretor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A minha responsabilidade
é assegurar-me de que a conversa continua.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Essa conversa existia antes?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nem sempre existiu. Mas a
minha responsabilidade é assegurar-me de que ela continua, de que as pessoas
não são admitidas à conversa por causa das habilitações, de que existam
ambientes em que não se façam perguntas (como ‘quem é esta pessoa que apareceu
aqui?’), mas se oiçam argumentos. Esta é a maior escola de Humanidades em
Portugal e eu tomo muito a sério que todas as pessoas que estudam e que ensinam
aqui possam participar nas várias conversas e nos vários desacordos que
caracterizam uma escola.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Imagino que os anticorpos a esse seu posicionamento sejam imensos...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É possível. Mas as minhas
ambições são muito moderadas e muito conservadoras. Não quero transformar a
natureza humana. E, ainda mais difícil do que transformar a natureza humana,
seria transformar a Faculdade de Letras de Lisboa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Einstein dizia que é mais difícil desagregar um preconceito do que um
átomo.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ele tinha toda a razão e,
aliás, a evolução da Física mostrou isso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como é que se explica que esteja aqui, nesta posição, hoje?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Deve-se a uma série de
acasos. Estudei aqui na minha licenciatura e no meu mestrado. Depois, decidi ir
estudar para outro lado e, nessa altura, pensei que era altamente improvável
que eu voltasse a Portugal tão cedo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Noutros lugares, havia
uma audiência e um ambiente mais acolhedor para o tipo de coisas que me
interessavam. Eu não via isto como drama nenhum e muito menos me vi ou veria
como um exilado — aliás, esta palavra é séria demais para se aplicar neste
contexto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Temia ser um estrangeirado? Como o foi Jorge de Sena, por exemplo, quando
regressou após o 25 de abril e a academia lhe fechou as portas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O caso dele é complicado
porque ele era um engenheiro que se reinventou como professor de Literatura e
em Portugal isso não seria possível. A academia, sobretudo nas Humanidades,
nunca mostrou um discernimento especial e não havia por aqui, infelizmente,
(ELIMINAR Bertrand) Russells e Moores que pudessem olhar para pessoas com um
talento especial. Eu digo isto, ainda que, para mim, Jorge de Sena, um poeta
notável, não tenha sido um crítico literário ou um historiador de literatura
notável. Acho é que foi uma grande perda para a universidade portuguesa não lhe
ter dado mais atenção. Como o foi no caso de Ruy Belo, também um grande poeta
do século XX, que, aliás, tinha um doutoramento.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quem é que o ouviu a si? <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Durante a minha
licenciatura em Lisboa, o número de bons professores que tive conta-se pelos
dedos de uma só mão, e de uma pessoa com uma deficiência na mão. A maior parte
dos professores que tive foram muito maus. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Maus em que sentido?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O nome do mal é legião,
havia muitas variedades. Havia pessoas que começavam a aula das nove ao quarto
para as dez e interrompiam-na às dez e vinte para tomar um café; uma preguiça
extraordinária! Havia pessoas que improvisavam, outras que mudavam as regras a
meio. Havia pessoas que não se calavam, outras que não abriam a boca. E,
depois, havia alguns, muito poucos, que eram pessoas extraordinárias, exemplos
de professores, que ainda hoje estimo muito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando terminei o
mestrado, dei aulas como assistente durante dois anos, até que decidi ir fazer
o doutoramento na América e fui admitido em várias universidades. Quando
comuniquei a minha decisão ao então presidente do Conselho Científico, uma
personagem (ELIMINAR venerável) com uma longíssima carreira de modéstia
intelectual continuada, olhou para mim com um ar condescendente, disse-me que
eu era muito novo para pensar em doutoramento, aconselhou-me a não partir e,
por fim, esclareceu-me que, então, o meu contrato com a faculdade teria de
cessar. Pensei que não regressaria jamais.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas voltou, depois de concluir o doutoramento. Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por razões familiares e
pessoais. E, durante o primeiro ano a dar aulas na Faculdade de Letras,
convenci-me de que tinha feito o pior erro da minha vida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nisso pesou também a comparação entre os alunos portugueses e os alunos
norte-americanos?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Os meus alunos de
pós-graduação aqui são tão bons como os de pós-graduação lá. Já os de
licenciatura são francamente piores. Nos Estados Unidos, pelo menos nas
Humanidades, os alunos de licenciatura são melhores do que os de pós-graduação.
Quanto às pós-graduações, nos Estados Unidos, para as Humanidades vão as
pessoas menos espertas e menos interessantes — os realmente espertos, vão fazer
outras coisas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white;">
<b><span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O que distingue a universidade
portuguesa da americana?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white;">
<span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A falta de autonomia, e a falta de pessoas interessadas na
autonomia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Então, o que o fez ficar em Portugal e na Faculdade de Letras?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">O António Feijó tinha
voltado da América um bocadinho antes, estava numa situação semelhante à minha
e, no fundo, embora nunca tenhamos falado sobre isso, se calhar fizemos das
nossas fraquezas forças. Quase como terapia ocupacional, envolvi-me na criação,
com ele, de um programa de pós-graduação muito pequenino, em Teoria da
Literatura. No primeiro ano, 1991, ainda só com oferta de mestrado, tivemos
quatro alunos e dois desistiram antes do Natal. Depois, o programa tornou-se
cada vez mais interessante e, ao longo de 25 anos, foram aparecendo cada vez
mais alunos. Hoje, temos sessenta alunos e pós-doutorandos, e o programa, de
que me orgulho muito, é um dos melhores do mundo. Por antonomásia, chamamos-lhe
O Programa. Paralelamente, temos uma revista <i>online</i>, ‘Forma de Vida’, com cinco mil seguidores e recensões novas
todas as semanas, <i>workshops </i>semanais
durante todo o ano letivo. Participamos em muitas outras atividades e temos
muitos <i>spin-offs</i>, pessoas que estão
ou estiveram ligadas ao Programa, têm ideias e vêm ter connosco.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por que é que esse saber e esse discurso ainda não saíram da universidade
para o espaço público?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Essas coisas não se
passam por desígnio ou por intenção. As propostas do Programa são tão
completamente variadas que não existe um fio condutor — por isso, chamamos-lhe,
genericamente, de Humanidades. Há ex-estudantes nossos que agora estão, dentro
e fora de Portugal, noutras universidades; uns são poetas, outros distribuem
flores, outros são estivadores, outros são investigadores... A ideia de
controlo institucional não nos interessa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Por exemplo, permanece a ideia de que o discurso jornalístico e o discurso
académico não podem cruzar-se, habitualmente para desprestígio do primeiro.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando os jornalistas
culturais falam com professores de Humanidades, falam habitualmente com outro
tipo de professores, e se calhar porque precisam de uma imagem tradicional de
professor. Aqui, como no estrangeiro, muito do que se faz nas Humanidades não
me interessa nada ou particularmente. Mas o ponto aqui é haver um conjunto de
pessoas que conseguem pensar de uma maneira distintivamente diferente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A licenciatura em Estudos Gerais da Universidade de Lisboa existe desde
2011 e é inédita a vários títulos. Congrega várias escolas fundadoras, para
oferecer uma formação nas ‘artes liberais’, e privilegia a escolha individual
do aluno pelo seu currículo de interesses, definida com o apoio de um tutor.
Mas é inevitável perguntar-se: no final, serve para quê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Quando as pessoas fazem
essa pergunta, estão a pensar numa profissão. E, se imaginam que os cursos
superiores servem para uma profissão, então, todo o resto da equação vai
aparecer errado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Esse é o argumento principal do ensaio <i>A
Universidade como deve ser</i>, que publicou recentemente, em coautoria com
António Feijó, e onde afirmam que ‘a valorização do emprego como fim último, se
não único, da educação universitária revela uma aspiração social pobre’. <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Há toda esta ênfase na
empregabilidade, mas ninguém está em posição de garantir emprego a quem quer
que se forme em qualquer curso, exceto no caso em que existe um monopólio
protegido, que é o caso do exercício das profissões médicas. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A lógica é a de que o Estado financia o ensino superior público, logo,
deveria assegurar essa empregabilidade...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas o Estado só pode garantir
todos os empregos na Coreia do Norte. Não há possibilidade de garantir que uma
pessoa com um curso de engenharia vá ser engenheiro ou que alguém com um curso
de arquitetura vá ser arquiteto. É muito importante as pessoas terem emprego e
não há nada de pouco dignificante em trabalhar como caixa num supermercado ou
em ser estivador. Isto não significa nenhuma espécie de displicência da minha
parte em relação a isso. Quero simplesmente chamar a atenção para o fato de que
aquilo que as pessoas fazem e aquilo que as pessoas estudaram não está
naturalmente ligado; há ligações, mas, com exceção da medicina, elas não são
causais. <b><o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A mudança de mentalidades necessária para que se admitir esse fato é tão
revolucionária como aceitar-se que, no futuro, as pessoas serão sobretudo <i>freelancers</i>...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou como pensar pela
própria cabeça... Mas, é capaz de ter ocorrido entretanto mudanças geracionais
importantes e, hoje, os miúdos que se formam já não estão tão interessados pela
ideia de terem um único emprego ao longo de toda a vida. Vão provavelmente
mudar de emprego e reinventar-se várias vezes. Alguns deles vão ter ideias e,
como não têm possibilidade de arranjar um emprego por conta de outrem, criarão
o seu próprio emprego. Tudo isto é uma consequência de vivermos em Portugal,
uma sociedade livre e rica, como só o são um número muito pequeno de países. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Está a ironizar?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não. Sempre que se fala
das dificuldades portuguesas, eu sugiro que se olhe para as estatísticas do
Burkina Faso. Ou, já agora, que se olhe para os famosos países de expressão
portuguesa, aos quais nós somos tão iguais. Portugal tem mais a ver com a
Suécia do que com o Brasil.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É por isso que diz que a lusofonia é ‘uma má ideia’?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ainda ninguém me explicou
a teoria física que transforma os falantes de uma língua em pessoas parecidas
entre si. As pessoas podem falar a mesma língua e estarem em desacordo acerca
de tudo e viverem de maneiras completamente diferentes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">E é por isso que diz que ‘a melhor e única decente política da língua é:
nenhuma’ ou que ‘deviam desaparecer todas as cátedras portuguesas pagas pelo
governo português em universidades estrangeiras’?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A não ser os linguistas
ou certos atletas poliglotas, raras vezes as pessoas estão interessadas numa
língua. O que lhes interessa é aquilo que saber uma língua torna possível. Por
exemplo, eu sempre quis ler Tolstói em russo, e por isso aprendo russo.
Garantem-me as pessoas que sabem russo que quem consegue lê-lo nessa língua
consegue perceber em Tolstói coisas que os que o lêem em tradução não conseguem.
Não acredito completamente nessa teoria. Acho que, para a esmagadora maioria
dos efeitos, é suficiente ler Tolstói em tradução. Aliás como, para todos os
efeitos relevantes, basta ler Camões em espanhol.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Admite exceções?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não vou descontar a
existência de casos em que a famosa língua original seja importante. Mas para a
esmagadora maioria das pessoas as traduções são suficientes. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Então, aceita que o Estado apoie programas de tradução?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A ideia de um apoio à
tradução de obras literárias para outras línguas como missão política faz-me
logo franzir o nariz. Porque com o apoio vem a sugestão de que o acesso àquelas
obras é o acesso a uma alma que está escondida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Vem também a imposição de uma determinada autoridade.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pois, e vem uma
metafísica de que eu não partilho. Eu não sei russo, e li Tolstói em traduções
que não foram pagas por nenhuma agência russa. Portanto, ninguém me estava a
dizer que eu ia ter acesso às qualidades extraordinárias da alma russa por
estar a ler Tolstói. Dito isto, não quer dizer que eu não ache que haja
qualidades extraordinárias na alma russa, mas dispenso a ajuda das agências
públicas, muito obrigado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ler torna as pessoas melhores?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou piores. Na maior parte
dos casos, continuamos a ser assim-assim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Ou seja, ler não influencia o caráter?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pode influenciar, mas a
relação não é necessária, é contingente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">A questão moral não está envolvida?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Muitas vezes está, mas
não necessariamente. Há quem não se consiga descrever sem falar de certos
livros que lhe fizeram funda impressão, mas essa é uma muito pequena minoria de
pessoas. Concebo que haja uma pessoa que diga: ‘Proust mudou a minha vida.’ Mas
é uma afirmação quase patológica e, normalmente, as pessoas que dizem isso,
estão a exagerar, estão a tentar impressionar alguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como é que define uma mente independente, em termos intelectuais e em
termos académicos?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É uma pessoa que tem
pouca paciência para os tontos. É uma pessoa que dá atenção aos raciocínios das
outras pessoas e aos seus próprios raciocínios. É uma pessoa que acha que as
questões da verdade não se decidem por referendo e, portanto, não se decidem
pela opinião da maioria. É uma pessoa que, ao mesmo tempo, confia nas opiniões
das outras pessoas, mas desconfia das opiniões partilhadas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Qual é o preço de não ficar, como Montaigne, fechado numa torre? É preciso
ter um discurso provocatório? É preciso forçar os outros ao diálogo?</span></b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Às vezes, e, se somos
pagos para isso, como acontece quando somos professores, com certeza que sim. A
descrição clássica mais antiga e talvez mais extraordinária das dificuldades
desta relação é a maneira como Sócrates fala de si próprio em relação a Atenas,
na <i>Apologia de Sócrates</i>. Ele diz algo
como isto: ‘Sou um pateta que anda a fazer perguntas às pessoas pelos caminhos
de Atenas, todos me acham um bocadinho excêntrico, não tenho grande medo do que
me vá acontecer a seguir, mas, ao mesmo tempo, estou completamente ligado a
esta sociedade de idiotas de que faço parte e não posso ir pregar para outra
freguesia.’ No <i>Críton</i>, quando já foi
condenado à morte e um amigo fretou um barco e subornou os guardas para o
ajudar a fugir da prisão, Sócrates sugere que mudar de cidade é um plano
injusto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É uma ideia de pertença.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">É a ideia de que Sócrates
e Atenas é como bifes e batatas fritas. São duas coisas que vão muito bem
juntas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Sócrates e muitas pessoas
muito menos espertas do que Sócrates não achavam que fossem pessoas especiais,
antes achavam que precisavam das outras pessoas. E este é um ponto filosófico
muito importante: não acharmos que o mundo começou connosco, que vai acabar
connosco e que não existe mais ninguém. Aliás, a cultura contemporânea sublinha
esta possibilidade de não haver ninguém melhor que nós. Há poucas pessoas que
gostam de admitir que, para serem as pessoas que são, precisam das outras
pessoas, e que pensam nisso como uma responsabilidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Hoje em dia, são cada vez menos as pessoas que identificam, ainda menos as
que compreendem, a alusão a um clássico...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Mas, se estiverem
interessados, a gente explica-lhes, aqui, na universidade. Entre outras coisas,
é para isso que ela serve. Ler Platão ou Shakespeare não significa ter acesso a
conteúdos cognitivos ou, ainda menos, a valores que eles tenham veiculado. Muitas vezes é reconhecer coisas em que
tínhamos pensado, mas ditas por outras pessoas. Wittgenstein disse num prefácio
de um dos seus livros que este só seria percebido por pessoas que já tivessem
pensado aqueles pensamentos. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Voltamos à tal ‘sociedade dos amigos’, que partilha uma familiaridade de
base.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Há dois mil e quinhentos
anos, Platão observou, astutamente, que a experiência principal da aprendizagem
é anamnésica, é uma experiência de rememoração. Como se disséssemos: ‘Ah, estou
a lembrar-me de uma coisa que afinal sabia!’<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Nos clássicos, estamos a lembrar-nos de quê? De uma universalidade
qualquer, que transcende o texto?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Não acho que seja isso.
Estamos a lembrar-nos de pensamentos que podíamos ter tido ou já tivemos.
Imagine alguém que está a assistir a uma representação do <i>Rei Lear</i>. Logo no início, ouve a Cordélia dizer: ‘Eu não consigo
içar o coração até à boca.’ E pensa: ‘É extraordinário como eu já pensei isto.’<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Como explica que isso aconteça?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Porque somos parte da
mesma espécie e por pura coincidência. Ou então, pela extraordinária qualidade
de Shakespeare, que dá muitas vezes a impressão de nos conhecer melhor do que
nos conhecemos a nós próprios.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Que livros lê por puro prazer?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Romances.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Qual foi o último que leu?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pierrette</span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">, de Balzac.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Pode indicar cinco ou seis clássicos que gostava que
fossem lidos pelos seus alunos?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: #212121; font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Os seis
romances de Jane Austen, ou pelo menos cinco deles.</span><span style="font-family: "cochin";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Bibliografia:<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Hermenêutica e Mal-Estar </span></i><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"> (INCM,
1987, Prémio de Ensaio do Pen Club Português)<i> Manners of Interpretation: The Ends of Arguments in Literary Studies </i>(State
University of New York, 1993; INCM, 1994)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">The Matter of Facts: On
Invention and Interpretation </span></i><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">(Stanford University Press, 2000)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Artigos Portugueses </span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"> (Assírio
& Alvim, 2002; ed. aumentada, Documenta, 2015)<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Amigos de Objetos Interpretáveis </span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">(Assírio & Alvim,
2003),<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span lang="EN-US" style="background: white; color: #262626; font-family: "cochin";">What Art Is Like, in Constant Reference to the Alice
Books</span></i><span lang="EN-US" style="background: white; color: #262626; font-family: "cochin";"> (Harvard University Press, 2012)</span><span lang="EN-US" style="font-family: "cochin"; mso-ansi-language: EN-US; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">Erro Extremo </span></i><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: Ovo; mso-fareast-font-family: Ovo;">(Tinta-da-China, 2017)</span><span style="font-family: "cochin";"> <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<!--EndFragment--><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj4bdHq9zqOZCcc-ZnVJDMIdz3RIPrdkCA8Q0v78qTBiklRYtw7PaG9OT2W9pEBgBHMunOo_zYfUoK3neSw_rCDz-c5zq9h5trxVuAG7eRynulMBAzmqtCfLGhNNqXFNIccUDH1xAZlv4c/s1600/maxresdefault.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;">
<!--EndFragment--></a><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
</div>
<br />
<b>Ler Primavera 2018</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)<br />
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:roman;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cochin;
panose-1:2 0 6 3 2 0 0 2 0 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-2147482881 1073741898 0 0 7 0;}
@font-face
{font-family:Ovo;
panose-1:2 11 6 4 2 2 2 2 2 4;
mso-font-alt:Calibri;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:auto;
mso-font-signature:0 0 0 0 0 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:"Times New Roman",serif;
mso-fareast-font-family:"Times New Roman";}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-page-numbers:1;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-69066311977296725112017-07-04T16:34:00.000+01:002017-07-04T16:34:24.474+01:00Nikolai Gogol | A sangue-frio, nas estepes<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-size: 12pt;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjLewJxJRWzIA-Qxq2ljAO73NRSROH1Qq3V2M_Nou2zUsTv-w9d05d5gtX2Z2_Nmb75VqljkbugJZUpCnJvY9pU1lgHI40lDZ6sfdcitgraC_7GFfki7d65yeB1BsyMwIAL3nhEhLo_SlE/s1600/eYd09IJw7mjb0ynZiue5DstgyFA.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjLewJxJRWzIA-Qxq2ljAO73NRSROH1Qq3V2M_Nou2zUsTv-w9d05d5gtX2Z2_Nmb75VqljkbugJZUpCnJvY9pU1lgHI40lDZ6sfdcitgraC_7GFfki7d65yeB1BsyMwIAL3nhEhLo_SlE/s640/eYd09IJw7mjb0ynZiue5DstgyFA.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt;">O fulgor e a crueldade dos cossacos no século XVI ainda hoje eriçam os cabelos do leitor. </span><span style="font-size: 12pt;"> </span><span style="font-size: 12pt;">Nikolai Gogol descreveu-os, no epicentro histórico da tensão entre a Ucrânia e a Rússia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Em 1936, ao concluir o conto satírico <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Nariz</i>, Nikolai Gogol tinha 27 anos, vivia em São Petersburgo, era um funcionário ministerial apagado, mas um artista dominado por complexas preocupações moralistas e patrióticas. Procurava corresponder ao legado romântico (e nacionalista) do mestre Pushkin, ainda assim a sua prosa conjugava elementos de terror e humor absurdos ou mesmo grotescos com uma forte sensibilidade realista; a fonte da futura grande literatura russa. <span style="font-size: 12pt;">E, na verdade, ainda hoje a encenação deste texto provoca tão facilmente o riso como uma apreensão tensa.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Nikolai, o «russo mais estranho na Rússia» (Nabokov), nasceu em 1809 na Ucrânia, à data pertença do Império Russo. Filho de um antigo oficial cossaco, entendia que uma narrativa épica devia iluminar um herói e, em torno dele, todo um povo, ambos poeticamente inflamáveis, como faíscas na lenha seca. São prova disso as ficções folclóricas incluídas na coletânea de contos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Mírgorod</i>, de 1935, e, em especial entre elas, o conto <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Tarass Bulba, o cossaco</i>, transformado, em 1942, em novela. Estes dois textos acabam de ser publicados pela E-Primatur, com tradução do russo por Maria Vassilieva.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Tarass Bulba</i>, Nikolai Gogol compõe uma homenagem ao heroísmo dos seus antepassados, o que justifica a aura de artificialidade evocativa e colorida que envolve as figuras centrais: o velho líder guerreiro Tarass Bulba Tarass e os seus dois filhos, Ostap e Andrii. Veja-se, por exemplo, como este último se deixa inebriar pela música da guerra: «Ignorava o significado de ponderar, calcular ou medir com antecedência as suas forças e as dos outros. Encontrava nas batalhas um raivoso êxtase e encantamento: via-se-lhe como que uma embriaguez, naqueles minutos em que uma pessoa perde a cabeça, quando aos seus olhos tudo corre e voa: voam cabeças com estrondo, caem por terra os cavalos, e ele avança, como que embriagado, sob o assobio das balas e no esplendor dos sabres, distribuindo golpes sem se importar com os que recebia.»<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Tarass, Ostap e Andrii têm o sangue frio dos cossacos, cuja expressão facial era tão imperturbável que nem os bigodes se moviam. Segundo Gogol, este povo havia brotado do seio russo «pela chama das desgraças». Guerreiros e guardiões dos postos fronteiriços, eram nómadas independentes ou camponeses fugidos ao domínio dos senhores feudais e instalados nas terras selvagens na parte sudeste da Europa, mais precisamente naquilo a que se chamou a Pequena Rússia, a região de fronteira (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">U Krajina</i>) com os tártaros e os otomanos. Possuíam o «hábito desregrado do feitio russo» e uma bravura totalmente destemida. A época da ação de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Tarass Bulba</i> é o rude século XVI, o cenário é a estepe e o enredo acompanha a revolta, junto ao rio Dniestr, dos cossacos zaporójianos (da Zaporígia) contra a República das Duas Nações, confederação entre a Polónia e a Lituânia que, então, dominava esse território que é hoje a Ucrânia. Após massacrarem polacos e judeus com extraordinária brutalidade, os cossacos juraram fidelidade a Moscovo, em troca de uma autonomia que nunca foi totalmente respeitada ou assegurada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Cossacos, Novela do Caúcaso</i>,<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> </i>Tolstoi explicita «o amor à liberdade, ao ócio, à pilhagem e à guerra» como principais traços de carácter deste povo. Ressalta também a sua bárbara misoginia e o seu desprezo por todos os outros seres humanos. Está tudo muito bem expresso em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Tarass Bulba</i>, bem como um antissemitismo desprezível, na origem provável de muito do que de ignóbil se virá a passar no leste europeu.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
No texto original, de 1935, Gogol é claramente pró-ucraniano. Na segunda versão, bem mais extensa, de 1942, claramente pró-russo (nessa altura da vida, assume-se como um autocrata e abandona as antigas ideias liberais). As duas versões ilustram a dualidade ideológica e nacionalista do escritor, a sua pertença simultânea e indiscernível às duas culturas e países que ainda hoje o disputam com fervor.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Mas o conto/novela de Gogol é muito mais do que descrições de crueldade, mística de grupo ou bravura, discursos inflamados de líderes guerreiros e cenas heroicas de batalhas; contém uma difusa inspiração bíblica. Durante um cerco a uma cidade polaca, Andrii, apaixonado pela filha do líder inimigo, trai os seus e passa-se para as fileiras contrárias (a descrição do percurso de acesso à cidade tem traços surrealistas). Atraído para uma emboscada, Andrii é levado à presença do seu pai, que exclama, impassível, antes de o matar: «Fui eu quem te trouxe ao mundo e serei eu quem dele te vai tirar!» E, depois, em frente do corpo sem vida: «Que bom cossaco poderia ter sido!» Na cena da execução de Ostap (Tarass assiste, disfarçado, entre a assistência polaca) ou na descrição final da obstinação e do sacrifício de Tarass sobressai a moldura de libelo nacionalista («Mas haverá no mundo chamas, torturas e forças capazes de vencer a força russa?»), mas ainda assim, e apesar da rigidez da psicologia das personagens, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Tarass Bulba </i>é uma leitura histórica e literariamente importante.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<!--[if gte mso 9]><xml>
<o:OfficeDocumentSettings>
<o:AllowPNG/>
<o:PixelsPerInch>96</o:PixelsPerInch>
</o:OfficeDocumentSettings>
</xml><![endif]--> <!--[if gte mso 9]><xml>
<w:WordDocument>
<w:View>Normal</w:View>
<w:Zoom>0</w:Zoom>
<w:TrackMoves/>
<w:TrackFormatting/>
<w:HyphenationZone>21</w:HyphenationZone>
<w:PunctuationKerning/>
<w:ValidateAgainstSchemas/>
<w:SaveIfXMLInvalid>false</w:SaveIfXMLInvalid>
<w:IgnoreMixedContent>false</w:IgnoreMixedContent>
<w:AlwaysShowPlaceholderText>false</w:AlwaysShowPlaceholderText>
<w:DoNotPromoteQF/>
<w:LidThemeOther>PT</w:LidThemeOther>
<w:LidThemeAsian>X-NONE</w:LidThemeAsian>
<w:LidThemeComplexScript>X-NONE</w:LidThemeComplexScript>
<w:Compatibility>
<w:BreakWrappedTables/>
<w:SnapToGridInCell/>
<w:WrapTextWithPunct/>
<w:UseAsianBreakRules/>
<w:DontGrowAutofit/>
<w:SplitPgBreakAndParaMark/>
<w:EnableOpenTypeKerning/>
<w:DontFlipMirrorIndents/>
<w:OverrideTableStyleHps/>
</w:Compatibility>
<m:mathPr>
<m:mathFont m:val="Cambria Math"/>
<m:brkBin m:val="before"/>
<m:brkBinSub m:val="--"/>
<m:smallFrac m:val="off"/>
<m:dispDef/>
<m:lMargin m:val="0"/>
<m:rMargin m:val="0"/>
<m:defJc m:val="centerGroup"/>
<m:wrapIndent m:val="1440"/>
<m:intLim m:val="subSup"/>
<m:naryLim m:val="undOvr"/>
</m:mathPr></w:WordDocument>
</xml><![endif]--><!--[if gte mso 9]><xml>
<w:LatentStyles DefLockedState="false" DefUnhideWhenUsed="false"
DefSemiHidden="false" DefQFormat="false" DefPriority="99"
LatentStyleCount="382">
<w:LsdException Locked="false" Priority="0" QFormat="true" Name="Normal"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" QFormat="true" Name="heading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 9"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="header"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footer"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="35" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="caption"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of figures"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope return"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="line number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="page number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of authorities"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="macro"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="toa heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="10" QFormat="true" Name="Title"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Closing"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Default Paragraph Font"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="Body Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Message Header"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="11" QFormat="true" Name="Subtitle"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Salutation"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Date"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Block Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="FollowedHyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="22" QFormat="true" Name="Strong"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="20" QFormat="true" Name="Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Document Map"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Plain Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="E-mail Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Top of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Bottom of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal (Web)"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Acronym"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Cite"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Code"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Definition"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Keyboard"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Preformatted"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Sample"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Typewriter"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Variable"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Table"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation subject"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="No List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Contemporary"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Elegant"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Professional"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Balloon Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" Name="Table Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Theme"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Placeholder Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" QFormat="true" Name="No Spacing"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Revision"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="34" QFormat="true"
Name="List Paragraph"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="29" QFormat="true" Name="Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="30" QFormat="true"
Name="Intense Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="19" QFormat="true"
Name="Subtle Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="21" QFormat="true"
Name="Intense Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="31" QFormat="true"
Name="Subtle Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="32" QFormat="true"
Name="Intense Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="33" QFormat="true" Name="Book Title"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="37" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Bibliography"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="TOC Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="41" Name="Plain Table 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="42" Name="Plain Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="43" Name="Plain Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="44" Name="Plain Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="45" Name="Plain Table 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="40" Name="Grid Table Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="Grid Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="Grid Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="Grid Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="List Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="List Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="List Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Hyperlink"/>
</w:LatentStyles>
</xml><![endif]--> <style> <!-- /* Font Definitions */ @font-face {font-family:"Cambria Math"; panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;} @font-face {font-family:Calibri; panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;} /* Style Definitions */ p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal {mso-style-unhide:no; mso-style-qformat:yes; mso-style-parent:""; margin:0cm; margin-bottom:.0001pt; mso-pagination:widow-orphan; font-size:12.0pt; font-family:Calibri; mso-ascii-font-family:Calibri; mso-ascii-theme-font:minor-latin; mso-fareast-font-family:Calibri; mso-fareast-theme-font:minor-latin; mso-hansi-font-family:Calibri; mso-hansi-theme-font:minor-latin; mso-bidi-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi-theme-font:minor-bidi; mso-fareast-language:EN-US;} .MsoChpDefault {mso-style-type:export-only; mso-default-props:yes; font-family:Calibri; mso-ascii-font-family:Calibri; mso-ascii-theme-font:minor-latin; mso-fareast-font-family:Calibri; mso-fareast-theme-font:minor-latin; mso-hansi-font-family:Calibri; mso-hansi-theme-font:minor-latin; mso-bidi-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi-theme-font:minor-bidi; mso-fareast-language:EN-US;} @page WordSection1 {size:595.0pt 842.0pt; margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm; mso-header-margin:35.4pt; mso-footer-margin:35.4pt; mso-paper-source:0;} div.WordSection1 {page:WordSection1;} --> </style> <!--[if gte mso 10]>
<style>
/* Style Definitions */
table.MsoNormalTable
{mso-style-name:"Tabela normal";
mso-tstyle-rowband-size:0;
mso-tstyle-colband-size:0;
mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-style-parent:"";
mso-padding-alt:0cm 5.4pt 0cm 5.4pt;
mso-para-margin:0cm;
mso-para-margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-language:EN-US;}
</style>
<![endif]--> <!--StartFragment--> <!--EndFragment--><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i>Tarass Bulba</i>, Nikolai Gogol, E-Primatur, 245 págs., 17.90 euros<o:p></o:p></div>
<br />
Jornal «i» 05-06-2017<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-63246498794792593482017-06-22T11:47:00.000+01:002017-06-22T11:47:10.083+01:00John Banville | O sentimentalismo é a morte da arte<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhc-T9vzfy6OBWUheai4JvtgVkgPh7Xio4oYS5ItrOE0ySwkRvl3ZQ4kUQyG6heyoLtnK3l39pmZiCDEUOYia846qAvlwATqKuXywYHAKuRssMKfnn6FXu577t9Sa9p-4QJ-kvvYwAJd08/s1600/john-banville-chair-xlarge.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhc-T9vzfy6OBWUheai4JvtgVkgPh7Xio4oYS5ItrOE0ySwkRvl3ZQ4kUQyG6heyoLtnK3l39pmZiCDEUOYia846qAvlwATqKuXywYHAKuRssMKfnn6FXu577t9Sa9p-4QJ-kvvYwAJd08/s640/john-banville-chair-xlarge.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">John Banville é famoso pela escrita ultra-trabalhada, sensual na opulência formal e na atenção maníaca ao mundo exterior. Em entrevista, revela-se jocoso e provocador, solipsista (investiga quase cientificamente a fronteira entre razão e imaginação), mas sobretudo honesto na intenção vigorosa de levar ao limite as potencialidades da escrita de ficção.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Os romances do irlandês John Banville (n. 1945) estão cheios de monstros. Monstros protagonistas e narradores, que são totalmente humanos, quase ridículos na sua monstruosidade. Faltam-lhes muitas vezes sentimentos, mas nunca uma envolvência colorida, uma mente hipersensitiva e uma sinceridade perturbadora. Procedem habitualmente a uma investigação da trajetória da sua vida, confessam-se e desnudam-se sem contemplações. Foram egoístas e brutais com os outros humanos, mas agora, perante o leitor, estão, na sua narração, apenas a tentar chegar à verdade, e por isso merecem toda a nossa atenção. Esta mistura de coisas indignas narradas com brilho literário e capacidade de autoanálise feroz consegue pinceladas de cómico e desabusado no que poderia ser trágico, ou meramente pomposo. É o que se dá também com a narração de Olly (Oliver Orme), protagonista do romance mais recente, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Guitarra Azul</i>, pintor falhado, um pequeno cleptomaníaco, fascinado com o brilho e a nova vida que dá (diz ele, para se justificar) a objetos insignificantes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">A primeira tentação é dizer-se que John Banville faz uma escrita poética, pictórica, trabalhada para ser avaliada em primeiro lugar como estilo, qualidade de escrita. Em 2005, no discurso de recepção do Man Booker por <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Mar</i>, ele chegou a dizer que finalmente tinham dado o prémio a uma obra de arte... Mas os seus livros não são estáticos, muito menos contemplativos. Apesar do brilho ofuscante das metáforas, das aliterações e do estilo principesco, Banville ergue de imediato a voz credível de um protagonista com um mundo específico de referências e obsessões e, sobretudo, sabe construir muitas e pequenas cenas, momentos atmosféricos e incidentes que têm um efeito cumulativo. Dá tempo e espaço ao leitor para respirar e, sobretudo, para ver. É um escritor das interrogações e hesitações internas, mas que, para as elucidar, confia mais na descrição de pormenores externos do que na psicologia das suas figuras. Escreve numa espécie de êxtase, espantado com as revelações poéticas da sua escrita ou com a sua própria eloquência imaginativa, mas ainda mais com o que da verdadeira Natureza lhes escapa; em cada frase estamos à espera de encontrar uma epifania, uma descoberta essencial. As palavras parecem pedras preciosas, cuidadosamente escolhidas para serem engastadas numa joia. Ter de o traduzir deve ser uma tragédia, pelo que se perde de som, de iridescência visual. E, no entanto, como o brilho da sua escrita não é apenas superficial, a profundidade sobrevive — é sempre melhor lê-lo traduzido do que não o ler. John Banville é um ficcionista que gosta de pensar que também é um poeta, um pintor, um músico, até um coreógrafo. É assim que torna estranhamente eloquente a mudez de tudo o que não é humano e nos mostra, imaginando-as, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">as coisas, as pessoas e o mundo tal como são</i>.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">O que pensa do facto de a maior parte das críticas e comentários ao seu último livro, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Guitarra Azul</i>, defenderem que é um romance bem escrito, mas que está longe de ser o seu melhor livro? Para si, um novo romance é apenas mais um no conjunto da obra, tal como um novo filho integra de modo natural a família já constituída, ou tem ser o melhor de todos?</span></b><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Antes de mais, eu nunca leio as críticas aos meus livros, o que me dá uma sensação de grande liberdade e leveza. Não escrevo para os críticos, nem para os académicos, escrevo para os leitores e tento escrever cada livro o melhor que consigo. Mas, como tudo na vida, por mais planos que faça, quando começo um livro nunca sei onde ele irá parar. Sou incapaz de avaliar os meus livros: são todos péssimos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Não há nenhum de que goste mais?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Os Infinitos</span></i><span style="font-family: Garamond;"> [2009, Asa] foi o que mais se aproximou do que eu queria que ele fosse. Mas eu não sei nada sobre os meus livros. Ainda por cima, com a idade que tenho, já me esqueci da maior parte deles...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Os Infinitos </span></i></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">tem um ambiente próximo de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Na Minha Morte</i>... <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sim, talvez.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Inspirou-se no romance de Faulkner?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Nunca me inspiro em ninguém. Hoje em dia, só eu é que me sirvo de inspiração.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">«Ah. O amor. Sim. O ingrediente secreto de que me esqueço sempre e deixo de fora.» [<i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Guitarra Azul</i>] Todos o seus livros parecem dizer-nos que não colhemos nada de bom em sermos politicamente corretos, sobretudo se formos um artista. Para criar arte, não bastam as boas intenções e os bons sentimentos, pelo contrário. Concorda?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Absolutamente. A arte tem ser amoral, apolítica. Não deve querer trazer qualquer bem ao mundo. Há essa ilusão de que a arte nos faz pessoas melhores; não faz. A arte apenas pode fazer-nos sentir mais intensamente vivos, por um breve momento. Na sétima <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Elegia de Duíno</i>, Rilke questiona o porquê de ser humano e de estar aqui, e diz: “Mas porque estar aqui é muito, e porque tudo / o que é daqui aparentemente precisa de nós, estas coisas efémeras, que / estranhamente nos dizem respeito. A nós, os mais efémeros.” [trad. Maria Teresa Dias Furtado] É uma descrição perfeita. Porque estamos aqui, no curto espaço de tempo em que aqui estamos, devemos registar tudo da forma mais vívida e intensa que consigamos, e a arte ajuda-nos a fazê-lo. Felizmente, esse é o seu único propósito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Sem qualquer intenção de resolver o que quer que seja.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sim, claro. Um artista não é um político, um sociólogo ou um psiquiatra. Um artista é só um artista, criando o que de mais belo consegue criar e colocando-o no mundo. Escreve-se um livro apenas porque ele não existia antes, é só.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">De <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Mar</i>: “Vejo-os ali, aos meus pobres pais, brincando rancorosamente às casinhas na infância do mundo. A infelicidade deles foi uma das constantes dos meus primeiros anos, um zumbido agudo, incessante, no ponto limite da audição. Não os odiava. Talvez até os amasse. O problema é que eles estavam no meu caminho, ocultando-me o futuro. Com o tempo eu viria a conseguir ver através deles, os meus transparentes pais.” <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Já não me lembrava dessa passagem. É bastante bonita! [rio]<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Metaforicamente, temos de matar aquilo ou quem mais amamos, para nos tornar-nos artistas ou, tão-só, para nos tornarmos nós mesmos? <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Não creio que o artista seja alguém especial. Ele é apenas alguém que se concentra e que observa o que está à sua volta de um modo mais intenso do que o comum das pessoas. Não somos deuses. Pensamos que somos, mas não somos. Toda a gente tem essa sensação de que é preciso limpar a paisagem... Eu tive muita sorte: os meus pais morreram quando eu tinha trinta anos. O Kingsley Amis disse que o maior presente que um pai pode dar a um filho é morrer novo. Quando os nossos pais morrem, sentimos a falta deles, mas também nos sentimos...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">... libertos.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Hoje, olho para os meus filhos e penso que eles devem estar a dizer para si mesmos: “Quando é que este se vai embora?» [risos]<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Ser-se artista é ser-se impiedoso, um canibal, um ladrão (como o Olly). Nós roubamos coisas, mas só para lhes dar uma nova vida, para as renovar. A arte diz-nos: “Olha para esta cadeira, esta pessoa, este objeto... Vê como eu vou olhar para isto.” É por isso que, quando eu era novo, quis ser pintor. O olhar humano é extraordinário. O olhar do artista é quase indecente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Imagino que não porque queira despir a realidade, mas apenas porque quer vê-la...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">... tal como ela é. É maravilhoso ver como as crianças, os meus netos (tenho dois), olham para as coisas pela primeira vez. Os adultos só não acham o mundo um assombro permanente porque já se habituaram a ele. Pelo contrário, um artista nunca se habitua a andar por aqui. Eu nunca me habituei a estar neste mundo; continuo a achá-lo um lugar espantoso. Amo este mundo, mas nunca senti que aqui pertencesse. Não é que me sinta um estranho, mas também não me sinto em casa. A certa altura, o narrador de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Livro da Confissão </i>[1990, Quetzal] declara (e foi a única vez em que escrevi usando a minha própria voz) que nunca se acostumou a estar nesta terra e que a nossa presença aqui é um enorme erro cósmico. Questiona-se sobre as pessoas que cá deviam andar e sobre como elas estarão, do outro lado do universo. E conclui que elas já se devem ter extinguido há muito, por habitarem esse lugar, algures, que nos estava destinado a nós, selvagens humanos. Acho que é verdade. Nós somos demasiado selvagens para esta Terra tão gentil. Nós somos o vírus mais bem sucedido que alguma vez por aqui apareceu. E, um dia, talvez o planeta consiga curar-se.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Foi por causa desta sensação de não pertença que comecei a escrever muito cedo, ainda criança. Não para absorver o mundo, mas para o observar e para dar conta do porquê de eu estar aqui. Observar é muito fácil; o difícil é dar conta do que se observa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Para o observar melhor, o artista precisa de se afastar ou de se aproximar mais do mundo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Tem se aproximar mais, é claro.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Mas creio que disse algures que, para se tornar um artista, a criança tem de sofrer muitos traumas, tem de ser rejeitada, posta de parte, afastada do mundo das outras crianças, ferida.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">[ri] Bem, sou como um romântico do século XIX com as feridas por sarar e que acredita que o artista é uma pessoa ferida. Mas, quanto mais velho fico, mais me pergunto: quem é que não está ferido? Estamos todos feridos. Temos muita sorte em podermos aproveitar as feridas para criar algo belo. No meu caso, sinto-me um privilegiado por ter passado a vida a trabalhar a linguagem, porque a frase é a maior, a mais sofisticada, invenção humana. Houve civilizações que não inventaram a roda (como os incas ou os astecas), mas às quais a frase garantiu, precisamente, que se tornassem civilizações.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">A figura central dos seus romances, essa voz narrativa quase sempre usada na primeira pessoa do singular, é preferencialmente um homem maduro, se não já velho. Um pintor, escritor, cientista, que tem atrás de si um percurso de sucesso que lhe dá margem para</span></b><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> <b style="mso-bidi-font-weight: normal;">se permitir um excesso de misantropia, egocentrismo, desprezo pelos outros, cinismo em relação aos sentimentos convencionais.</b></span><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;"> São figuras antipáticas por natureza, mas com uma grande capacidade de articulação, um grande domínio da frase. </span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Para além disso, sabem de pintura, de ciência, parecem lidar bem com o francês e ao alemão, têm muitas referências de cultura clássica, sobretudo de mitologia grega.</span></b><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> </span><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Acha que é por isso que suscitam tanta curiosidade nos leitores? Por serem homens intelectualmente superiores, mas moralmente bárbaros?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Acho que eles são apenas honestos. Não são sentimentais. Não inventam desculpas. Certa vez, um jornalista alemão perguntou-me, em relação a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Mar</i>, como é que tinha sido capaz de não ser sentimentalista ao escrever um livro sobre um homem que acaba de perder a mulher. Nunca tinha pensado nisso. Respondi-lhe que o sentimentalismo é a morte da arte. Se olharmos para o mundo suficientemente de perto, com honestidade, é impossível sermos sentimentais. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier;">Os seus protagonistas não dispensam o humor.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span lang="EN" style="font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier;">De todo, acho que são até muito engraçados.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Aliás, o cinismo deles tem um charme estranho. <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Cinismo é apenas uma outra palavra para realidade. Alguém me acusou uma vez de escrever livros muito sombrios. Eu disse: “Olhe para o mundo!” Quando estava a encenar uma peça em Londres, Beckett foi questionado por um dos atores sobre o porquê da sua visão tão negra sobre o mundo. Ele respondeu: “Na parte de trás dos bancos do táxi que me trouxe hoje para o teatro, havia dois anúncios. Um pedia dinheiro para o treino de cães-guias de cegos; outro pedia dinheiro para as pesquisas de uma cura para o cancro. Em que mundo é que você vive?» Ele tinha toda a razão. Este mundo é terrível, mas, paradoxalmente, é extremamente belo. É isso que os meus narradores tentam comunicar: esta estranha e complexa mistura de requinte e de terror.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Qual é o papel do humor na sua obra, que é, afinal, tão séria?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Oiça, as pessoas não apanham nem metade das piadas que eu conto nos meus livros! [dou uma gargalhada, e Banville prossegue, com um sorriso faceto] Talvez com o tempo lá cheguem.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Um dos grandes problemas dos romancistas é que as pessoas pensam que basta ler uma vez um romance. Devemos ler cada romance pelo menos duas vezes! Da primeira vez, somos todos crianças curiosas à espera de ver o que acontece na página seguinte. No final, quando ficamos a conhecer a história toda, então devemos voltar à primeira página e reler o livro todo, agora, sim, com atenção ao modo como ele está escrito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier;">É o que se exige a quem recenseia livros, mas raramente é viável fazer-se uma releitura integral. Continua a escrever recensões? Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span lang="EN" style="font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier;">Sim, gosto muito de fazê-las. E leio os livros com toda a atenção. Se são bons, leio-os duas vezes. Escrever recensões é uma tarefa nobre, e necessária.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier;">Por que é que não lhes chama críticas?<span style="display: none; mso-hide: all;">ticas﷽﷽﷽﷽﷽ma crse e necessaz?<o:p></o:p></span></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="tab-stops: 45.8pt 91.6pt 137.4pt 183.2pt 229.0pt 274.8pt 320.6pt 366.4pt 412.2pt 458.0pt 503.8pt 549.6pt 595.4pt 641.2pt 687.0pt 732.8pt; text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN" style="display: none; font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier; mso-hide: all;">enç seia livros. s<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>vezesvez.s! [risos] lhe diss superiore, mas moralmente béé que </span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; mso-ansi-language: EN; mso-bidi-font-family: Courier;"><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Porque não sou um crítico, sou um recenseador de livros. Apresento aos leitores (quais quer que eles sejam, do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Guardian</i> ou da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">New York Review of Books</i>) livros recentes que considero que vale a pena serem lidos. Trata-se de uma opinião pessoal, que tento que seja o mais honesta, clara e verdadeira possível. Se o livro for mau, não escrevo sobre ele. Reconheço que, às vezes, me engano. É precisamente isso que define um recenseador de livros.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Reconsiderou o que escreveu sobre <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Sábado</i>, de Ian McEwan [“<i style="mso-bidi-font-style: normal;">A day in the life</i>”, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">New York Review of Books</i>, 26/05/2005]? Acha que se enganou?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Não, de todo. Mas digo-lhe qual foi o meu erro: o enfoque do texto. O romance tinha sido publicado em Inglaterra há vários meses. Eu queria destacar a estupidez dos recenseadores que embandeiraram em arco com um romance escrito desleixadamente, com um argumento estúpido. Teria mandado o livro para trás, sem escrever sobre ele, se não me tivesse irritado tanto a aclamação entusiástica de um romance tão mau. Era sobre isso que eu queria escrever. Ganhei muitos inimigos entre os recenseadores. E eles vingaram-se quando eu publiquei o meu romance seguinte. Hoje, lamento ter sido tão cruel para com Ian McEwan. Devia ter enfatizado que não era tanto o livro que estava em causa, mas a forma como foi recebido.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Imagina o que ele deve ter sentido quando leu a recensão?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Bem, espero sinceramente que o tenham avisado e que ele não a tenha lido. Afinal, é para isso que servem os melhores amigos...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">A delinquência e o furto são temas muito frequentes nas suas ficções, funcionam como uma espécie de moldura. O roubo talvez seja uma metáfora para o tipo de apropriação que os seus protagonistas fazem do mundo à volta, impondo-lhe a sua personalidade e os seus impulsos criativos psicopatas ou apenas autocentrados.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">O furto é uma metáfora para o que o artista faz: apropria-se das coisas. Destaca-as do mundo, torna-as únicas e notória a sua presença, antes desapercebida. Vou tentar explicar como. O artista concentra-se intensamente no objeto. O objeto não está à espera dessa atenção; antes ele estava apenas ali, discreto, escondido. O artista foca ainda mais o olhar sobre ele. O objeto ilumina-se, numa espécie de autoconsciência. E começa a corar. Quando as coisas [e as pessoas] coram, é quando ficam mais vulneráveis, mais ternas. Tornamo-nos intensamente conscientes de nós mesmos quando coramos. A tarefa do artista é essa: fazer o mundo corar. [pausa] É o que também acontece quando nos apaixonamos. A pessoa por quem nos apaixonamos é, em simultâneo, um espelho (no qual nos revemos e revemos quão bonitos somos) e um objeto de súbita e intensa atenção.<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><o:p></o:p></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Os fantasmas também estão sempre presentes. Tudo parece matéria espectral nos seus livros. </span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">O olhar nos espelhos. O olhar<span style="mso-bidi-font-weight: bold;"> dos</span> espelhos. As casas onde se viveu na infância e onde quase todos os protagonistas teimam em voltar. Os mortos na família, mesmo que seja (e quase sempre é) para se reafirmar que se lhes teve pouco amor. Os próprios objetos quotidianos e os elementos atmosféricos.</span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> Todos os seus protagonistas são investigados enquanto vestígios espectrais. </span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Ao mesmo tempo, simetricamente, tudo isto é mostrado como se fosse a única coisa que importa e que, se não está viva, representa o lado mais vivo de quem delas fala. </span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-font-style: italic; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Porquê?<o:p></o:p></span></b></div>
<pre style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: EN;">É uma excelente pergunta. [pausa] Não sei se sei responder-lhe. Tenho de pensar um bocado. [pausa longa] Pensamos que conhecemos os seres humanos, pensamos que conhecemos o mundo, mas só vemos a superfície. Como disse Nietzsche, é na superfície que encontramos a verdadeira profundidade. Isso é verdade, até certo ponto. Podemos viver com uma pessoa durante cinquenta anos e, um belo dia, sermos surpreendido por algo que ela diz, forçando-nos a rever tudo até então. Não deixa de ser fantástico descobrirmos, assim, uma nova pessoa. Conhece aquela sensação estranha que sentimos quando, como os linguistas identificaram, o significante vagueia liberto do significado? Por exemplo, pensamos na palavra “cavalo” e, de repente, é só um som, sem qualquer liga<span style="display: none; mso-hide: all;">o﷽﷽﷽﷽﷽﷽﷽﷽gnificado liberto do significante», mundo. Mas s</span>ção com o animal de quatro patas. O mesmo pode acontecer com as pessoas. E, então, perante essa estranheza, nós pensamos também: este não sou eu.
Porque é assim que nós lidamos com o mundo: transformamo-lo em nós mesmos.<o:p></o:p></span></pre>
<pre style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: EN;"><o:p> </o:p></span></pre>
<pre style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: EN;">Como num espelho?<o:p></o:p></span></b></pre>
<pre style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: EN;">Sim, mas tudo o que está à nossa volta tem de estar refletido em nós. E, de vez em quando, estranhamos e estranhamo-nos: “Este não sou eu!” Como a criança, quando descobre que não existe só ela (e, talvez, a mãe dela) no mundo. É nesse momento que surge a autoconsciência humana. Porque, se o mundo me é estranho e eu não consigo abarcá-lo todo, então, um dia, o mundo pode querer expelir-me. Lembro-me perfeitamente de quando, em criança, me dei conta disto. Tentava por tudo não adormecer à noite, com medo de morrer. Nunca me deitava apoiado neste lado [esquerdo], porque estava convencido de que, se o fizesse, sentiria o meu coração a parar. <o:p></o:p></span></pre>
<pre style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: EN;"><o:p> </o:p></span></pre>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Por falar em fantasmas de nós mesmos, quem é o Quirke [patologista irlandês que protagoniza sete dos nove romances policiais que, desde 2006, Banville escreveu sob o pseudónimo de Benjamin Black; em 2014, Andrew Davies e Conor Mc Pherson adaptaram as ficções de Quirke para uma série televisiva da BBC, com Gabriel Byrne no papel principal]?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Não sei.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Quirke é um espelho de Benjamin Black?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Não. Também não sei quem é o Benjamin Black. É frequente, em conversa, misturá-los aos dois, sem querer. De algum modo, eles são a mesma pessoa. Uma pessoa completamente diferente de mim...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">... ou não.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Diria antes: completamente <i style="mso-bidi-font-style: normal;">não eu</i>. Mas, na verdade, o John Banville também não<span style="display: none; mso-hide: all;">ao existe﷽rdade, o John<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Banville tambrente de mim. Mas,<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>o meu coraçundo. Mas sãoão</span> existe. O que existe sou eu, um cidadão, que anda no mundo, que vota, que tenta ganhar a vida, que, frequentemente, faz figuras tristes. Quando me levanto da minha secretária, aquela pessoa que escreve os livros deixa de existir.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Como é que passa, consistentemente, da escrita de Banville para a de Black?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Não é difícil, acredite. Durante trinta e cinco anos, fui jornalista. Escrevia para jornais diários, por isso trabalhava à noite. Passava os dias a escrever [ficção] e, à noite, voltava à minha forma humana, ia para a redação e tornava-me uma outra pessoa. Nós pensamos que somos seres singulares, mas isso não passa de uma ilusão, que nos ficou talvez da concepção religiosa de “alma”. Dentro de nós, existe uma luz, que brilha permanentemente. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">A cada dia, morrem e nascem milhões de células dentro de cada um de nós.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Refazemo-nos a cada minuto. E somos diferentes pessoas a cada circunstância. Deus nos livre de sermos singulares!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">John Banville criou e tem uma voz literária singular.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sim, mas sabe o que estou a fazer agora? Estou a escrever a segunda parte de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Retrato de uma Senhora</i>, de Henry James. Quem diria, hã? É uma direção totalmente nova. E é um fenómeno bastante estranho. Não sou John Banville, não sou Benjamin Black, não sou Henry James... Às vezes, estou sentado a escrever, levanto-me para ir buscar um café e, quando regresso à secretária, pergunto: «Então, como vai a escrita?» E há ali dois ou três parágrafos novos que não me lembro de maneira nenhuma de ter escrito. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Que mistério...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">A sério, sinto-me totalmente de fora. É um processo absolutamente fascinante! Escrevi <i style="mso-bidi-font-style: normal;">The Black-Eyed Blonde: A Philip Marlowe Novel</i> durante um verão inteiro [o romance foi editado em 2014] e não tenho a mais pequena memória de o ter feito. Falei com um psicólogo que me disse tratar-se de um fenómeno conhecido: quando desempenhamos uma tarefa muito específica, mas que não nos é essencial, pode dar-se uma espécie de auto-hipnose. Foi o que aconteceu comigo: eu não estava ali enquanto escrevia. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Uma experiência gótica.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sinto o mesmo com o que estou a escrever agora.<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> </i>Uso palavras, formulações frásicas que jamais usei. Às vezes, vêm-me à cabeça palavras cujo significado tenho de ir pesquisar no dicionário.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Surpreende-se a si mesmo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sim. Está a ver? Para o ano, posso ser a Jane Austen...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">É por isso que precisaremos sempre da guitarra azul...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Tudo está sempre a mudar. Mas, [no poema “<i style="mso-bidi-font-style: normal;">The Man With the Blue Guitar</i>”, Wallace] Stevens engana-se quando diz que <i style="mso-bidi-font-style: normal;">as coisas como são mudam na guitarra azul</i>. Ele usa a palavra «mudam» num sentido muito específico e algo enganoso. Em vez disso, devia dizer: as coisas são transfiguradas na guitarra azul. Elas continuam a ser o que são, são-no sempre. Mas transfiguram-se; assumem uma nova figura. Tal como acontece quando são sujeitas ao tal olhar do artista, que as torna aquilo que elas de facto são. [pausa] Há várias décadas, apaixonei-me por uma rapariga — mais do que ela se apaixonou por mim, diga-se de passagem. Conhecemo-nos numa festa e ela não gostou mesmo nada de mim: achou-me arrogante e opinativo — e estava cheia de razão. Mas, passada uma semana, ela estava apaixonada por mim. Entretanto, assisti à transformação, à transfiguração dela. Permaneceu quem era, mas tornou-se ela mesma. Tal como eu me tornei eu mesmo. A paixão não durou muito, mas ainda hoje nos vemos de tempos em tempos. Na última vez que a vi, quando nos encontrámos (assim, já velhos) para almoçarmos juntos, em Nova Iorque, ela corou. E eu corei também, de certeza. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Onde é que nós íamos mesmo?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Já não faço ideia. Mas, de qualquer modo, estamos bem, porque eu queria falar-lhe sobre as mulheres...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Ah, as mulheres para mim... Eu sou mesmo um romântico do século XIX com as feridas por sarar. Para mim, as mulheres são o supra sumo da beleza e de tudo o que há de mais precioso e doce na vida. Vivi toda a minha vida apaixonado pelas mulheres. Vejo uma velhinha na fila do supermercado à procura do troco na sua carteirinha, e apaixono-me por ela.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Está a falar da vida real, certo?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sim. É fantástico, porque cheguei a uma idade em que posso dizer às mulheres tudo o que me apetece. Uma empregada de café aproxima-se de mim e eu digo-lhe: «Tem uns olhos lindíssimos!» Há dez anos, jamais me atreveria a fazê-lo. Hoje, posso... porque elas me vêm como se fosse o pai delas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Ou vê-se a si mesmo como se fosse pai delas. <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">É verdade, tenho duas filhas e revejo-as nelas. Mas... Na semana passada, estava a caminhar por uma rua de Dublin — o tempo estava assim como hoje; suave, de final de primavera, início de verão — quando uma rapariga passou por mim e eu apanhei o perfume dela no ar: um perfume maravilhoso... Só os homens conseguem captar esta espantosa essência feminina, feita delas mesmas. Não é um perfume artificial; é o cheiro delas, das mulheres e do que elas são. Por momentos, fiquei num estado de felicidade absoluta. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Sim, sim, mas, então, por que é que as mulheres não passam de terceiras figuras nos seus livros? <o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Isso não é verdade!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">E por que é que, por mais feios e velhos que eles sejam, os seus protagonistas têm sempre muito sucesso com as mulheres e têm com elas intensas relações físicas, até mesmo obsessivas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">[ri] Talvez eu, o pequeno homenzinho feio, tenha tido sempre imenso sucesso com as mulheres... [risos]<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">E elas são</span></b><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> <b style="mso-bidi-font-weight: normal;">sempre mais novas e tendem para o <i>rubenesco</i>, são cheias, gordinhas e louçãs.</b></span><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;"><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Tem razão, é o tipo de mulher de que gosto: com formas de mulher. Já viu as modelos atuais? Têm as ancas alinhadas com os pés! São horríveis!<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><o:p></o:p></b></span></div>
<pre style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><span lang="EN" style="font-family: Garamond; font-size: 12.0pt; mso-ansi-language: EN;"><o:p> </o:p></span></pre>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Até mesmo em <i>Shroud</i> [2002], onde o protagonismo parece por uma vez dividido entre o homem velho e a mulher nova [Class Cleave], a figura feminina acaba por ser contaminada por um lado trágico de deficiente emocional, que a torna incapaz de disputar o primeiro plano.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Mas ele também tem esse lado! Só que o protagonista é ele. Quando publiquei <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Mar</i>, o meu amigo Rodrigo Fresán [romancista argentino] disse-me que, ao ver o título, pensara que se tratava do livro [da versão] de Class Cleave, e que eu devia escrevê-lo. Respondi-lhe que isso é impossível, porque Class Cleave tem de permanecer um enigma. Por outro lado, estou a sentir imenso prazer em escrever o livro de Isabel Archer [protagonista de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Retrato de uma Senhora</i>]. É curioso, como lemos o livro quando éramos novos, acho que todos nós pensamos nela como uma mulher de meia-idade. Nada disso: no início do livro, ela tem 20 anos, casa-se dois anos depois e o casamento acaba ao fim de seis anos. Ou seja, a história acaba quando ela tem 28 anos! Acho que o Henry James não deu conta disso. Acho que ele também pensou nela como sendo uma mulher de meia-idade. Afinal, ela é muito nova. Adoro escrever sobre ela. Apesar de o fazer na terceira pessoa, sinto-me completamente dentro dela.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Eu sou Isabel Archer...<o:p></o:p></span></i></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Isabel Archer, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">c’est moi</i>! E é delicioso, porque ela está a descobrir-se a si mesma. Sabe, li o livro pela primeira vez em Florença, muito perto do sítio onde Henry James começou a escrevê-lo. Tinha vinte e poucos anos e identificava-me por completo com Isabel Archer, com a sua liberdade de espírito. Quando reli o romance muitos anos depois, descobri o monstro egoísta que ela é. Num certo sentido, ela é tão má como Gilbert Osmond [o homem sem escrúpulos que a seduz e se torna seu marido], e apercebe-se disso nesta segunda parte da história. No outro dia, escrevi um parágrafo em que ela está a almoçar, servida por uma criada, que lhe parece tão leve e calorosa como um raio de sol que entrasse pela janela. Isabel pergunta-se: “Alguma vez terei sido assim e iluminado assim uma sala onde entrei? As pessoas que me amaram, dirão que sim. Contudo, talvez a luz que elas acreditam ter-me visto irradiar fosse apenas a incandescência exterior do meu amor próprio.” Portanto, ela está a aprender a viver no mundo. E é por isso que lhe vou dar a vida que Henry James não lhe deu. Acredito que ele está ao meu lado nisto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Mas, não quero deixar de dizer que acho que as pessoas interpretam mal as mulheres dos meus livros. Elas parecem maltratadas e desconsideradas, mas estão sempre no centro.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Estão preservadas porque não são protagonistas ou narradoras?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">É isso. Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Athena</i> [1995], por exemplo, o protagonista tem uma ligação com uma mulher e, de repente, apercebe-se de que ela não existe, nunca ninguém a viu. (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Athena </i><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>é uma história de fantasmas e só me apercebi disso quando acabei a finalizei) Ela é um fantasma, mas com uma presença sexual fortíssima. E veja como a Polly, em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Guitarra Azul</i>, é retratada por Olly de uma forma completamente errada. [«Não vinha maquilhada, nem sequer batom pusera, e as suas feições pareciam esborratadas e quase anónimas.», pág. 77] Ele passa o tempo a dizer que ela é desleixada e, por fim, ela aparece de saltos altos, e obriga-o a olhá-la com outros olhos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Os seus protagonistas narram trajetórias de vida desagradáveis, são antipáticos, contam sempre histórias de pouca simpatia pelos outros, quando não mesmo de desprezo, mas nunca se estão a desculpar ou a achar que foram bonzinhos ou a fazer-se de vítimas (como todos temos tendência a fazer). Eles confessam-se, investigam-se e desnudam-se sem contemplações. Foram egoístas e brutais com os outros humanos, mas agora, connosco, estão, na sua narração, apenas a tentar chegar à verdade. Se os virmos por este prisma, são quase generosos...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">São apenas seres humanos; comportam-se como se não o fossem, mas são-no. O Olly, por exemplo, apresenta-se-nos muito pior do que, na verdade, é. Gosto imenso da autoironia dele. A passagem de que mais gosto do romance é quando ele narra como as suas pernas e braços se atraíram mutuamente e ele se tornou um objeto circular, enrolado sobre si mesmo. [ri]<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">A dada altura, ele fala do «chicote sedoso da autorrepreensão».<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">O Ed Victor [o agente de Banville] contou-me a melhor piada de sempre sobre a condição humana. Um judeu está a tomar o pequeno-almoço. Barra uma torrada com manteiga, deixa-a cair no chão por acidente, ela cai com o lado barrado para cima. E ele diz: «Oh, meu Deus, devo ter barrado o lado errado!» [risos] É uma delícia, não é? É a minha anedota preferida: curtinha, honesta, certeira.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">T</span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">odas as suas ficções são livros de confissão, escritos não para que incriminemos os protagonistas/narradores, mas mais para que os desculpemos pelo seu mau feitio e pelas suas faltas. Ou seja, todos os seus livros se poderiam chamar <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Livro da Confissão</i> [título do primeiro romance de Banville, de 1989]. Alguém disse isto, já não me lembro quem.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Fui eu que o disse.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Desculpe.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Não tem problema. Mas não creio que sejam livros de confissão.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">São mais análises psicológicas?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Jamais! Eu detesto a psicologia! Há uma anotação fabulosa no diário de Kafka, em que ele diz: “Psicologia, nunca mais!” Os meus livros não são psicológicos, são testemunhais: isto é o que eu vi, isto é o que fiz do que vi, isto é o que pensei sobre o que vi. Não tenho qualquer pretensão de entrar na mente de outra pessoa ou dentro do que quer que seja. A superfície é tudo o que tenho, e já é muito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">A descrição do mundo externo pode funcionar como um substituto da análise psicológica.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Diria antes que... Bem, se tenho de ser alguma coisa, sou um pós-humanista. Não creio que os seres humanos sejam o centro do universo. <span style="display: none; mso-hide: all;">ario﷽﷽﷽﷽﷽﷽ no diologia!sicologia.sse]s, mas mais para que os desculpemosres nos meus livros.eçou a ecsrevárioário</span><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Aliás, prova disso é a sua capacidade de alargar o impacto de alguma coisa, através da metáfora, ligando essa coisa a tudo o que ela não é. Para mim, os seus livros podem ser apreciados como prosa ou como poesia...<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">O meu amigo John McGahern [romancista irlandês] faz uma excelente distinção entre o verso, a prosa e a poesia. A poesia resulta da intensificação da língua e da concentração dessa intensificação. Eu não conseguiria escrever versos, porque não sei como fazê-lo. Mas tenho uma relação profunda com a poesia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Desde criança e das aulas do Padre Larker, entusiasta professor de Inglês?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Oh, sim! No meu primeiro dia naquela escola [o St. Peter’s College, em Wexford, a sua terra natal], que era também o primeiro dia dele como professor, eu senti que ele estava em pânico. Logo no início da aula, ele pediu que um de nós lesse a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ode a Nightingale</i>, de Keats. Eu levantei-me e recitei-a de cor, fingindo que estava a lê-la do livro. Ficámos amigos para sempre.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Para mim, a poesia, como a música, é uma espécie de alquimia, de magia, que eu não compreendo como é feita. Leio a poesia de Yeats ou de Keats e acho-a um milagre.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Crê que são epifanias? Como aquelas que estamos sempre à espera que aconteçam nos seus livros e nunca acontecem?<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">É esse o efeito que pretendo atingir. Não escrevo em verso, escrevo prosa, mas aspiro a uma intensificação da linguagem como a que se dá na poesia. Mas, a poesia pode não ser mais do que som. Costumo dar o seguinte exemplo, retirado de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Quatro Quartetos</i>, de T.S. Elliot: “<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Garlic and saphires in the mud / Clot the bedded axle-tree.</i>” [“Alho e safiras na lama / Coagulam no leito das árvores”] Isto não quer dizer rigorosamente nada! E, no entanto, [em inglês] tem uma sonoridade sublime. Esta música... é impossível atingi-la na prosa. A prosa tem de fazer sentido. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">O efeito da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">poesia</i> na sua prosa é como um movimento da pintura figurativa para a pintura abstrata.<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Quero crer que seja o contrário; um movimento do que é incoerente para a realidade. Um movimento na direção da visão, do cheiro, do sentido da coisa em si: a realidade absoluta é isso e é isso que eu, e a poesia, tentamos atingir. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">A sua atenção ao que é visual e ao que é dirigido aos sentidos aproxima-o da sensibilidade de um pintor.</span></b><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Sim, mas também existe uma ligação com a música. Não sei se as traduções conseguem captá-lo, mas </span><span style="font-family: Garamond;">o ritmo da frase é muito importante para mim. Adoro Nabokov. Alguém me disse que ele era completamente surdo de ouvido. É isso; ele é estritamente pictórico, a prosa dele nunca é musical. Ele nunca <i style="mso-bidi-font-style: normal;">canta</i>, mas consegue dar-nos essa sensação de absoluta imediaticidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond;">Mas o Nabokov era um sinesteta, cruzava os vários sentidos, numa espécie de composição. Ele refere a sua sinestesia em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Fala, Memória </i>e, se bem me lembro, diz que possui uma «audição colorida».<o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">É verdade, sim. Alguém me perguntou ontem, numa entrevista, por que escrevo, por que quero viver. E eu citei o final de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Lolita</i>: “</span><em><span style="font-family: Garamond; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">I am thinking of aurochs and angels, the secret of durable pigments, prophetic sonnets, the refuge of art. And this is the only immortality you and I may share, my Lolita.” [“</span></em><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Estou a pensar em bisontes extintos e em anjos, no mistério dos pigmentos duradouros, nos sonetos proféticos, no refúgio da arte. Porque essa é a única imortalidade que talvez possamos partilhar, minha Lolita.”, tradução livre] É bonito, não é? Fico a lacrimejar sempre que cito isto. [funga] Esta passagem canta. Mas parece-me que canta involuntariamente. É isso que é fantástico na prosa de ficção: tem música, tem poesia, tem pintura. E, se for mesmo bem feita, até tem dança, uma sensação de dança. É fantástico trabalhar a prosa. Ao mesmo tempo, a prosa é trivial, no sentido em que se refere às pessoas. Até <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Finnegans Wake </i>tem um enredo, trata de pessoas. É impossível escrever um romance sobre nada, porque o mundo impõe-se sempre. O mundo chama-nos de volta: “Olha para mim. Sou mau, imbecil, sujo, estúpido, espantoso, sou o mundo.” É isso que temos de expressar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Sempre se referiu à origem desconhecida da sua escrita, e assume-a cada vez mais como “um instinto confuso”. Acha que, até ao final da sua vida, ela permanecerá um mistério para si?</span></b><b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: Didot; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"><o:p></o:p></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Sabe, ainda continuo a praticar para ser escritor. Diz-se que, aos 92 anos, no leito de morte, Henry James ainda mexia a mão, como se estivesse a escrever. Assim serei eu também.<o:p></o:p></span></div>
<!--[if gte mso 9]><xml>
<o:OfficeDocumentSettings>
<o:AllowPNG/>
</o:OfficeDocumentSettings>
</xml><![endif]--> <!--[if gte mso 9]><xml>
<w:WordDocument>
<w:View>Normal</w:View>
<w:Zoom>0</w:Zoom>
<w:TrackMoves/>
<w:TrackFormatting/>
<w:HyphenationZone>21</w:HyphenationZone>
<w:PunctuationKerning/>
<w:ValidateAgainstSchemas/>
<w:SaveIfXMLInvalid>false</w:SaveIfXMLInvalid>
<w:IgnoreMixedContent>false</w:IgnoreMixedContent>
<w:AlwaysShowPlaceholderText>false</w:AlwaysShowPlaceholderText>
<w:DoNotPromoteQF/>
<w:LidThemeOther>PT</w:LidThemeOther>
<w:LidThemeAsian>JA</w:LidThemeAsian>
<w:LidThemeComplexScript>X-NONE</w:LidThemeComplexScript>
<w:Compatibility>
<w:BreakWrappedTables/>
<w:SnapToGridInCell/>
<w:WrapTextWithPunct/>
<w:UseAsianBreakRules/>
<w:DontGrowAutofit/>
<w:SplitPgBreakAndParaMark/>
<w:EnableOpenTypeKerning/>
<w:DontFlipMirrorIndents/>
<w:OverrideTableStyleHps/>
<w:UseFELayout/>
</w:Compatibility>
<m:mathPr>
<m:mathFont m:val="Cambria Math"/>
<m:brkBin m:val="before"/>
<m:brkBinSub m:val="--"/>
<m:smallFrac m:val="off"/>
<m:dispDef/>
<m:lMargin m:val="0"/>
<m:rMargin m:val="0"/>
<m:defJc m:val="centerGroup"/>
<m:wrapIndent m:val="1440"/>
<m:intLim m:val="subSup"/>
<m:naryLim m:val="undOvr"/>
</m:mathPr></w:WordDocument>
</xml><![endif]--><!--[if gte mso 9]><xml>
<w:LatentStyles DefLockedState="false" DefUnhideWhenUsed="false"
DefSemiHidden="false" DefQFormat="false" DefPriority="99"
LatentStyleCount="382">
<w:LsdException Locked="false" Priority="0" QFormat="true" Name="Normal"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" QFormat="true" Name="heading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 9"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="header"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footer"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="35" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="caption"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of figures"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope return"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="line number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="page number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of authorities"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="macro"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="toa heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="10" QFormat="true" Name="Title"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Closing"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Default Paragraph Font"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Message Header"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="11" QFormat="true" Name="Subtitle"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Salutation"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Date"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Block Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="FollowedHyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="22" QFormat="true" Name="Strong"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="20" QFormat="true" Name="Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Document Map"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Plain Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="E-mail Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Top of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Bottom of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal (Web)"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Acronym"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Cite"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Code"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Definition"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Keyboard"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Preformatted"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Sample"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Typewriter"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Variable"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Table"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation subject"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="No List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Contemporary"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Elegant"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Professional"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Balloon Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" Name="Table Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Theme"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Placeholder Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" QFormat="true" Name="No Spacing"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Revision"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="34" QFormat="true"
Name="List Paragraph"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="29" QFormat="true" Name="Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="30" QFormat="true"
Name="Intense Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="19" QFormat="true"
Name="Subtle Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="21" QFormat="true"
Name="Intense Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="31" QFormat="true"
Name="Subtle Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="32" QFormat="true"
Name="Intense Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="33" QFormat="true" Name="Book Title"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="37" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Bibliography"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="TOC Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="41" Name="Plain Table 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="42" Name="Plain Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="43" Name="Plain Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="44" Name="Plain Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="45" Name="Plain Table 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="40" Name="Grid Table Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="Grid Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="Grid Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="Grid Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="List Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="List Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="List Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Hyperlink"/>
</w:LatentStyles>
</xml><![endif]--> <style> <!-- /* Font Definitions */ @font-face {font-family:"MS 明朝"; mso-font-charset:128; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-536870145 1791491579 134217746 0 131231 0;} @font-face {font-family:"Cambria Math"; panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4; mso-font-charset:1; mso-generic-font-family:roman; mso-font-format:other; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:0 0 0 0 0 0;} @font-face {font-family:Cambria; panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;} @font-face {font-family:Garamond; panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:647 0 0 0 159 0;} @font-face {font-family:Didot; panose-1:2 0 5 3 0 0 0 2 0 3; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-2147483545 0 0 0 507 0;} /* Style Definitions */ p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal {mso-style-unhide:no; mso-style-qformat:yes; mso-style-parent:""; margin:0cm; margin-bottom:.0001pt; mso-pagination:widow-orphan; font-size:12.0pt; font-family:Cambria; mso-ascii-font-family:Cambria; mso-ascii-theme-font:minor-latin; mso-fareast-font-family:"MS 明朝"; mso-fareast-theme-font:minor-fareast; mso-hansi-font-family:Cambria; mso-hansi-theme-font:minor-latin; mso-bidi-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi-theme-font:minor-bidi; mso-fareast-language:EN-US;} pre {mso-style-priority:99; mso-style-link:"HTML pré-formatado Caráter"; margin:0cm; margin-bottom:.0001pt; mso-pagination:widow-orphan; font-size:10.0pt; font-family:Courier; mso-fareast-font-family:"MS 明朝"; mso-fareast-theme-font:minor-fareast; mso-bidi-font-family:Courier; mso-fareast-language:EN-US;} span.HTMLpr-formatadoCarter {mso-style-name:"HTML pré-formatado Caráter"; mso-style-priority:99; mso-style-unhide:no; mso-style-locked:yes; mso-style-link:"HTML pré-formatado"; mso-ansi-font-size:10.0pt; mso-bidi-font-size:10.0pt; font-family:Courier; mso-ascii-font-family:Courier; mso-hansi-font-family:Courier; mso-bidi-font-family:Courier;} .MsoChpDefault {mso-style-type:export-only; mso-default-props:yes; font-family:Cambria; mso-ascii-font-family:Cambria; mso-ascii-theme-font:minor-latin; mso-fareast-font-family:"MS 明朝"; mso-fareast-theme-font:minor-fareast; mso-hansi-font-family:Cambria; mso-hansi-theme-font:minor-latin; mso-bidi-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi-theme-font:minor-bidi; mso-fareast-language:EN-US;} @page WordSection1 {size:595.0pt 842.0pt; margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt; mso-header-margin:35.4pt; mso-footer-margin:35.4pt; mso-paper-source:0;} div.WordSection1 {page:WordSection1;} --> </style> <!--[if gte mso 10]>
<style>
/* Style Definitions */
table.MsoNormalTable
{mso-style-name:"Tabela normal";
mso-tstyle-rowband-size:0;
mso-tstyle-colband-size:0;
mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-style-parent:"";
mso-padding-alt:0cm 5.4pt 0cm 5.4pt;
mso-para-margin:0cm;
mso-para-margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-language:EN-US;}
</style>
<![endif]--> <!--StartFragment--> <!--EndFragment--><br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
LER Setembro 2016<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-42640969948502086852017-05-31T23:21:00.000+01:002017-05-31T23:21:21.485+01:00Paolo Cognetti | Dar nomes às coisas nas montanhas
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Calibri;
panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjgm0rXeB2XSdihF9r6gRicAjnmLMVb9aKKYROuMsUOaTPf_ss3A7IEwchXCZs8bikgGgHMXZ09agNVm5BdH3tkjB8BRPauKy4_4WFR_r6A6ANhxrPZL-1Zfp0Z73QFQ81DsPm_8y06iqo/s1600/-Le-otto-montagne---Paolo-Cognetti-al-Caffe%25CC%2580-letterario-10513.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="428" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjgm0rXeB2XSdihF9r6gRicAjnmLMVb9aKKYROuMsUOaTPf_ss3A7IEwchXCZs8bikgGgHMXZ09agNVm5BdH3tkjB8BRPauKy4_4WFR_r6A6ANhxrPZL-1Zfp0Z73QFQ81DsPm_8y06iqo/s640/-Le-otto-montagne---Paolo-Cognetti-al-Caffe%25CC%2580-letterario-10513.jpg" width="640" /></a><br /><div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">História
de dois homens e uma montanha, o romance <i style="mso-bidi-font-style: normal;">As
Oito Montanhas</i> colocou Paolo Cognetti em destaque nas livrarias e nas mesas
de cabeceira de toda a Europa. Em entrevista, o escritor italiano, que vive há
oito anos a dois mil metros de altitude, apresenta-se como um novo realista, um
sereno combatente contra o ruído e a cacofonia contemporâneos.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Henry David Thoreau
defendeu, em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Walden</i> (uma referência
importante no seu romance): “A maior parte das pessoas tem vidas de desespero
resignado. Aquilo a que chamamos resignação não passa de desespero crónico. Da
cidade desesperada ao país desesperado, não nos resta senão procurar consolo na
coragem das martas e dos ratos-almiscareiros.” Concorda?</span></b><span style="font-family: "Times New Roman";"></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Essa
passagem é ainda mais verdadeira hoje do que no tempo de Thoreau. Os meios de
comunicação atuais são sobretudo meios de entretenimento. Tenho horror à nossa
obsessão por preencher cada minuto com qualquer coisa. Porque acredito que o
silêncio e a solidão escondem verdadeiros tesouros. O meu maior tesouro é a
escrita, que nasce do rumor e do silêncio. O maior prémio que este livro me deu
foi o encontro com a solidão na montanha. Hoje, a cidade, real ou virtual, está
cheia de ruído, que nos suga e nunca nos deixa ficar a sós.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">A sua paixão por Nova
Iorque, entre os 20 e os 30 anos, [escreveu dois diários de viagem sobre a
cidade] nasceu a partir da leitura da literatura norte-americana e antes sequer
de visitar a cidade. Quem foram os seus mestres norte-americanos e de que modo o
influenciaram?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Curiosamente,
são todos mais de oeste do que de leste. Existe uma divisão clássica entre uma
literatura nova-iorquina, citadina, muito próxima da europeia, e uma outra, ligada
ao mito da fronteira e ao Oeste. Sinto-me mais próximo desta última e de
autores como Jack London, Ernest Hemingway, Raymond Carver ou Charles Bukowski.
Foram eles que me ensinaram que uma história não nasce entre quatro paredes,
através de um processo intelectual; ela nasce, antes de mais, da vida e da sua
pulsação. Ensinaram-me que o que vivemos pode ser transformado em literatura.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Essa ligação aos EUA mudou
também a sua relação com a literatura italiana?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Sim,
muito. A minha rebeldia de estudante fez-me a rejeitar a literatura italiana e procurar
na literatura americana algo que fosse só meu, descobertas autodidatas, que eu
achava muito mais válidas do que quaisquer outras. Mas quando, há oito anos,
fui viver para a montanha, aproximei-me dos autores italianos que procuraram
uma língua em que pudessem contar a experiência vivida nos Alpes. É o caso de
Mario Rigoni Stern, cujos livros li e usei como uma espécie de enciclopédia.
Outros escritores da época de ouro da pós-Segunda Guerra, como Primo Levi ou
Cesare Pavese, também foram uma descoberta de maturidade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Há em todos eles um certo
lirismo na procura de um trilho individual que os leve para longe da violência
e da negritude da guerra e da cidade...</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Tinham
também um enorme sentido cívico, político da literatura. Para eles, o escritor
era um intérprete importante de uma sociedade e de uma época e também de certos
temas políticos prementes. Achavam que estavam a construir um mundo novo.
Admiro muito o sentido moral que os guiava e creio que, hoje em dia, quando
restam tão poucos autores assim, é urgente repensar a literatura sob esse
prisma e resgatá-la da ligeireza que, em geral, tomou conta da arte.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Ter um sentido moral não é de
todo uma tendência atual e é facilmente confundido com ser-se moralista... O
seu romance pode, precisamente, ser lido como um conto moral ou político, sobre
a distância entre os ideais e a realidade de uma cultura cada vez mais
materialista. Aceita esta descrição?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Não
pensei num tema preciso ou numa mensagem a transmitir, mas, antes de mais, numa
história a contar, composta, em parte, pela minha própria vida e pela vida de
várias pessoas que conheço. Mas aceito, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">a
posteriori</i>, que o romance contém uma mensagem moral.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">A nossa geração [que tem
hoje 30 e 40 anos] reagiu contra a ideia, ou foi impedida pelas circunstâncias,
de construir uma família, uma casa, uma carreira, e, em parte, rejeitou a
cidade, como espelho da ruína desses sonhos e da fragilidade e da incerteza da
vida atual. </span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Vivemos
uma crise económica que é também a crise de vários modelos de vida. Nasci e
cresci em Milão, uma cidade fundada no trabalho. Com a crise económica, de
produção e de emprego, Milão tornou-se um sítio hostil, onde a vida é muito
dura. Mas há qualquer coisa de belo na crise e na necessidade de encontrarmos
novos caminhos... Neste aspeto, somos mais afortunados do que os nossos pais, que
tinham a estrada traçada de antemão. Para nós, é tudo muito mais misterioso,
confuso e difícil. E é mais bela a perspetiva de que cada pode procurar e
encontrar o seu próprio caminho. Até porque, atenção, não penso que devamos ir
todos viver para as montanhas. [risos]</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Pergunto-me quanto deste
movimento atual de rejeição ou fuga à cidade, de procura de uma vida mais
simples e despojada, é genuíno ou traduz, apenas, mais uma moda...</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Bem,
que a ecologia seja uma moda é algo muito bom. Por outro lado, a renúncia e a
vontade de se libertar de coisas supérfluas e de viver de uma forma mais
simples nunca mais estarão na moda. Porque são movimentos contrários a tudo o
que é sugerido, valorizado, veiculado, hoje em dia, pela publicidade e pela
lógica e apelo do consumo. O despojamento até pode estar na moda, mas será apenas
uma miragem dele, não a sua substância.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">É reconstruindo um velho
abrigo na montanha e para tal colocando as suas vidas em pausa que Pietro [narrador
e protagonista de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">As Oito Montanhas</i>] e
Bruno, o seu amigo de infância e de montanha, cimentam a sua amizade na idade
adulta. O cenário do Vale de Aosta é também um exemplo da luta entre a
intervenção humana e a floresta, que recuperou os seus domínios após a guerra e
o abandono pelos homens. É como se os caminhos a escolher se bifurcassem, entre
o natural/autêntico e o superficial, o que está previamente construído e o que
está ainda por construir.</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Como
disse, fui muito influenciado pela ideia de fronteira americana, de algo para
lá do qual tudo é selvagem. Foi isso que primeiro procurei na montanha. Todavia,
na Europa não há nem Alascas, nem naturezas selvagens... Tudo é muito
antropizado, está habitado desde há milénios. Andar nos Alpes significa
reencontrar as marcas de uma civilização antiga que, pouco a pouco,
desapareceu. Os novos montanheses estão, na realidade, a reabilitar locais
abandonados, a pôr de pé algo a partir das ruínas pré-existentes. Esta é a
nossa experiência europeia; não somos um mundo novo. Seria muito mais luminoso
colonizar a natureza selvagem. Habitar um local cheio de signos e de memórias
atrai-me, mas, ao mesmo tempo, tem algo de deprimente, encerra uma atmosfera de
cemitério. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Pietro vive, ele mesmo,
entre a importância do legado do pai [que lhe apresentou e o levou a explorar a
montanha] e de a ele corresponder e a necessidade de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">matar o pai</i>, rejeitando-o e abrindo novos caminhos. No abrigo que ele
e Bruno constroem é gravado o seguinte epitáfio: “A memória é o melhor abrigo.»
Será mesmo?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Sim,
penso que é. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">No entanto, o romance é
muito crítico em relação ao peso dos laços familiares nas escolhas que podemos
fazer...</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Passamos
a vida em conflito com isso. Por um lado, na primeira parte do livro, há uma
certa nostalgia da infância. Por outro, existe uma raiva latente contra a
família. As duas forças estão presentes em todo o romance. Mas, afinal, não
vivemos todos assim: divididos entre a vontade de rejeitar o pai e a de fazer
as pazes com ele?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Talvez também nisso a virtude
esteja no meio, algures entre os dois apelos.</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">E
talvez só a atinjamos na meia-idade, quando se acalmam os radicalismos da
juventude e da primeira idade adulta. Aos 20 ou 30 anos, eu era muito radical;
depois, fui começando a rejeitar as categorizações absolutas. Agora, cada vez procuro
mais uma linha de equilíbrio, também a nível dos afetos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">No seu caso, viveu a
experiência de criação de um projecto cultural coletivo, no bairro milanês de
Bovisa; um projeto idealista que, disse algures, acabou corroído pelo cansaço,
peça inveja e pelo ciúme...</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Mas,
antes da desilusão, houve um grande encantamento. Milão tem uma tradição
operária e política muito fortes. Nos anos 1990, ainda estava viva a influência
dos centros sociais e culturais que surgiram em espaços ocupados (como fábricas
abandonadas) desde a década de 70. Sempre estive muito ligado a esse tipo de
experiências políticas urbanas. Tudo isso se foi extinguindo em Itália a partir
do ano 2000, graças ao regresso da direita, a Berlusconi e a tudo o que ele
representou. Esses foram anos muito pesados para mim, de muita desilusão
política e de luto pelo fim de muitos projectos bonitos. Foi por isso que fugi
à cidade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">E às pessoas?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Também,
um pouco. No início, fui para a montanha à procura de solidão, paz e descanso.
Mas, aos poucos, tal como Pietro e Bruno foram construindo a casa, eu fui-me
afastando da ideia de viver num ermitério. Cada vez se tornou mais importante a
colaboração com as pessoas de quem gosto. Aliás, este ano vai lugar a primeira
edição de um festival de arte, literatura e música da montanha, que criei e que
vou coordenar. Entretanto, comprei e estou a reconstruir um velho estábulo, que
será um refúgio cultural e artístico, um pólo de união entre os habitantes da
montanha e os citadinos. Agora, não quero, de todo, isolar-me. Pelo contrário,
estou num momento muito construtivo. Jon Krakauer estava certo quando disse [em
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Na Natureza Selvagem</i>]: “A felicidade
só é real quando partilhada.”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">No romance, Bruno, o
montanhês, diz: “São vocês, da cidade, que lhe chamam <i style="mso-bidi-font-style: normal;">natureza</i>. É tão abstrata na vossa cabeça que até o nome é abstrato.
Nós aqui dizemos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">bosque</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">pasto</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">rio</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">rocha</i>, coisas que se
podem apontar com o dedo. Coisas que se podem usar. Se não se podem usar, nem
lhe damos nome porque não servem para nada.” Como é que define este <i style="mso-bidi-font-style: normal;">dialeto da montanha</i>? Que papel teve na
construção do romance?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">A
língua deste livro foi algo que eu conquistei. Nasci e cresci na língua da
cidade. Para escrever a montanha, tive de aprender uma outra. Isso correspondeu
também a uma declaração poética; à busca de uma escrita que rejeitasse os
adjetivos e fosse composta quase só por substantivos. Cheguei à conclusão de
que os nomes das coisas são aqueles que melhor servem para contar uma história
honesta.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Quis afastar-se da
“retórica da montanha”, das imagens-comuns que têm a ver com o encantamento da
montanha. Mas a principal metáfora do romance está, afinal, contida nesta
frase: “Seja o que for o destino, habita nas montanhas que temos acima da
cabeça.” O que não deixa de ser uma certa retórica do paraíso da montanha,
certo?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Essa
é a montanha tal como o pai de Pietro a sonhava: um paraíso irreal, visto a
partir da cidade, ao fundo, distante. Eu queria que essa montanha, tal como
aparece no início do romance, fosse sendo substituída pela montanha real e, no
final, pela montanha habitada, que já não é idílica: continua bela, mas é dura
e desafiadora.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Tecnicamente, como é que
conseguiu dar à montanha não só uma forma, mas também uma substância, decisiva também
para as relações entre as personagens?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Nas
descrições da montanha, tentei evitar o uso do verbo “ser”. Quis descrevê-la
como algo vivo, como uma personagem que se move. A montanha não é estática,
muda a cada minuto e tudo na sua paisagem é movimento. Nesta perspetiva, Pietro
e Bruno reagem a algo vivo. Eles falam muito pouco sobre si mesmos e, como diz
o pai de Pietro no início, não lhes é permitido lamentarem-se. Por isso, os
seus estados de alma refletem-se, de modo misterioso, na montanha à sua volta.
Ela pode estar em plena floração primaveril e, ainda assim, surgir escura e
fechada, porque é assim que a personagem a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">vive</i>.
O humor da montanha é influenciado, transformado, pelas personagens.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Pietro e o pai, Bruno e a mãe,
são personagens enigmáticas. O silêncio faz parte delas e representa uma forma
de expressão. Até que ponto o silêncio é importante na literatura?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Na
literatura contemporânea, ainda estamos muito presos à prevalência do uso da
visão, daquilo que se pode ver. Estudei cinema precisamente porque pensava que
tudo o que é descrito numa história corresponde ao que se vê ou dá a ver, e não
ao que se pensa ou é pensado. Se as silenciarmos, as personagens são obrigadas
a expressar os seus sentimentos através do corpo e do movimento. É isso o que
mais me interessa. Talvez porque, como escritor, me sinto mais observador do
que escultor ou criador de mundos. E porque acredito que o corpo não mente.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Federica, namorada de
Paolo, que o acompanha durante a entrevista e serve, quando necessário, de
tradutora, diz: “Ele é assim também com as pessoas. A maneira como elas se
exprimem fisicamente mostra-lhe muito mais sobre elase o que são do que aquilo
que elas dizem. Ele acredita mesmo nisto!</span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">É curioso que, para criar
um retrato mais autêntico da montanha e das personagens, o Paolo rejeite o
instrumento literário realista por excelência: o diálogo. Foi através dele que
os chamados realistas deram voz àqueles que não a tinham: por exemplo, os
operários ou os pobres. O Paolo, em vez disso, propõe que, para dar a ver as
personagens, se explore o silêncio. </span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">É
verdade, nunca tinha pensado nisso. Gosto muito, por exemplo, das personagens
silenciosas, mas cujo diálogo interior está sempre presente, em Kent Haruf,
Cormac McCarthy, Hemingway or Carver. Não se trata d a voz interior modernista
de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>de Joyce. É algo ligado ao
corpo, à ligação física das personagens com os objetos, os animais, os
elementos naturais. É algo muito anti-urbano, no sentido em que a cidade quase
que anula o corpo. Pelo contrário, para mim, a montanha significou uma
redescoberta do corpo e do mundo, muito libertadora, também para exprimir
sentimentos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Em entrevista ao <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Corriere della Sera</i>, disse que o seu <i style="mso-bidi-font-style: normal;">motto </i>de escrita é a seguinte frase de
Santo Agostinho: “Ama e faz o que quiseres.” Como é que isso se traduz no afeto
pelas personagens e na liberdade que lhes é dada pelo escritor?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Significa
não escrever uma história na perspetiva do demiurgo, que manipula as
personagens como criaturazinhas ao seu serviço. Escrevo porque quero bem às
pessoas. Por detrás deste romance, está um grande amor pela minha mãe, pelo meu
pai, pelo meu amigo da montanha. Quis, antes de mais, contar a história do meu
pai, uma figura, obviamente, problemática para mim, e quis dizer-lhe que gosto
muito dele, apesar dos nossos conflitos e da nossa incapacidade de comunicação.
Esse é o principal motivo porque escrevo e crio histórias: dar conta do meu
afeto pelas pessoas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">Acha que foi também por
causa da autenticidade desse afeto que este romance conquistou de forma tão
arrebatadora os leitores? </span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Os
leitores acharam-no verdadeiro, porque, para mim, ele também corresponde a algo
verdadeiro. Perguntam-me muitas vezes quanto da história é autobiográfico, mas
isso não é importante; até porque é impossível distingui-lo do que é
ficcionado. Há momentos da história que foram imaginados ou sonhados, mas a maioria
provém de matéria real e da minha ligação real a determinadas pessoas...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-family: "Times New Roman";">E à natureza?</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman";">Sim,
num sentido mais humanista do que naturalista: o de uma natureza que serve o
homem, que o faz pensar e que pode trazer-lhe felicidade e paz.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-family: "Times New Roman";">As Oito
Montanhas</span></i><span style="font-family: "Times New Roman";">, Paolo Cognetti, Dom Quixote</span><span style="font-family: "Times New Roman";">, 223 págs., 15.90
euros</span>
</div>
<br />
<i>Sol</i>, 13-05-2017<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-79152354256126868412017-05-16T18:45:00.002+01:002017-05-31T23:28:49.052+01:00Moacyr Scliar | E se aquilo fosse um homem<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div style="text-align: center;">
<span style="font-family: "cochin";"><b></b></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjmztgpJpgYIWHWJlFqFtHa85GApIqBASRxwaLZWRRVQ8XnVUCumjqjwkZVtO77WateE0liup9pUSDFRnNPYf399_HeSNvP5t6xMNJ_cLe16x_MEjzkgE44eh6itu5aMBvvYm8tGW-n1d0/s1600/moacyr73.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="424" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjmztgpJpgYIWHWJlFqFtHa85GApIqBASRxwaLZWRRVQ8XnVUCumjqjwkZVtO77WateE0liup9pUSDFRnNPYf399_HeSNvP5t6xMNJ_cLe16x_MEjzkgE44eh6itu5aMBvvYm8tGW-n1d0/s640/moacyr73.jpg" width="640" /></a></div>
<br />
<span style="font-family: "cochin";"><b>Moacyr Scliar imaginou um judeuzinho brasileiro que nasceu metade cavalo. O romance é uma fábula alada, que atravessa o tempo.</b><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Na altura de dar os primeiros passos, o bebé </span><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">Guedali Tartakovsky apercebe-se da sua cauda farta, do grande bojo da barriga, do pénis, gigantesco e... circuncidado. Leva à boca uma das patas, mas, dada a desproporção entre as duas partes tão contrastantes do seu corpo, acaba por bater com o casco no lábio, ferindo-o. É assim, com esta primeira experiência de dor, que Guedali se dá conta «do conflito entre a dureza e a maciez, entre o bruto e o delicado, entre o equino e o humano». </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "cochin";">O Centauro no Jardim</span></i><span style="font-family: "cochin";">, romance datado de 1980, é uma fábula brilhante sobre a dupla identidade,</span><span style="font-family: "cochin"; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"> a inadequação social do sujeito e o desejo de assimilação, e foi colocado pelo norte-americano National Yiddish Book Center entre as cem melhores obras de temática judaica dos últimos dois séculos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Gaúcho (de Porto Alegre), filho de imigrantes judeus russos (como Guedali), Moacyr Scliar (1937-2011) projetou na prosa esta insólita combinação de origens. O corpo central da sua obra literária é alegórico, fabuloso, com um toque de absurdo kafkiano e humor iídiche (um mecanismo de defesa, «aquele nosso meio sorriso, meio amargo, meio filosófico», dizia ele). E, no entanto, na fisicalidade e na sensualidade, o texto parece ter brotado dos pampas; na objetividade, dos prontuários clínicos. Scliar, médico (higienista, com pós-graduação feita em Israel), compulsivo contador de histórias, escritor profissionalíssimo, publicou mais de 80 livros, em todos os géneros ficcionais. Ganhou três prémios Jabuti (1988, 1993, 2009) e uma cadeira entre os «imortais» da Academia Brasileira de Letras.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "cochin";">O Centauro no Jardim</span></i><span style="font-family: "cochin";"> vive do paradoxo entre a extraordinária condição do protagonista e o cenário realista das suas aventuras, vividas numa fazenda do Rio Grande do Sul, em São Paulo ou em Marrocos (onde o centauro Guedali e a sua amada, Tita – não judia, mas também centaura —, se fazem operar e adquirem finalmente pernas, ainda que mantenham cascos, que os obrigam a usar botas ortopédicas). A metáfora da cisão está presente desde logo no contraste entre o recurso a uma figura mitológica grega (o centauro, símbolo da fusão entre o humano e o bestial), adotada pelos modernistas latino-americanos, e todas as outras referências culturais e religiosas, advindas maioritariamente do universo judaico. O choque da diferença motivou os pais de Guedali a emigrar para o Brasil, fugidos ao confronto entre os habitantes dos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">shtetl</i> e os cossacos russos, que os pisavam sob os seus cavalos possantes. A metáfora da dualidade impregna também o cenário secundário: o de uma classe média em conflito com as convenções e em busca de uma possibilidade socialista, mas na qual também germina o Golpe Militar de 1964.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";">Tornada familiar pelo tom empregue pelo narrador (tão direto quanto encantatório), pelo uso do humor e pela ancoragem em referências realistas (por exemplo, à afirmação de Guedali no mundo dos negócios), a dimensão fantástica ou utópica desta história serve para que Scliar eleve a narrativa para além do tempo. Neste aspeto, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Centauro no Jardim</i> ultrapassa as coordenadas do realismo mágico e insere-se na longa tradição das alegorias rabínicas. A interpretação quer-se mais-do-que-literal, isto é, da ordem do estranhamento em relação ao que se lê e ao que se narra, pleno de significados ocultos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "cochin";"><i>O Centauro no Jardim</i>, </span><span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">Moacyr Scliar, </span><span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">Caminho, </span><span style="font-family: "cochin"; font-size: 12pt;">326 págs., 19.90 euros</span></div>
<b><br /></b>
<b>Jornal «i», 01-05-2017</b><br />
<b>© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)</b><br />
<style> <!-- /* Font Definitions */ @font-face {font-family:"Cambria Math"; panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;} @font-face {font-family:Calibri; panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;} @font-face {font-family:Cochin; panose-1:2 0 6 3 2 0 0 2 0 3; mso-font-charset:0; mso-generic-font-family:auto; mso-font-pitch:variable; mso-font-signature:-2147482881 1073741898 0 0 7 0;} /* Style Definitions */ p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal {mso-style-unhide:no; mso-style-qformat:yes; mso-style-parent:""; margin:0cm; margin-bottom:.0001pt; mso-pagination:widow-orphan; font-size:12.0pt; font-family:Calibri; mso-ascii-font-family:Calibri; mso-ascii-theme-font:minor-latin; mso-fareast-font-family:Calibri; mso-fareast-theme-font:minor-latin; mso-hansi-font-family:Calibri; mso-hansi-theme-font:minor-latin; mso-bidi-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi-theme-font:minor-bidi; mso-fareast-language:EN-US;} .MsoChpDefault {mso-style-type:export-only; mso-default-props:yes; font-family:Calibri; mso-ascii-font-family:Calibri; mso-ascii-theme-font:minor-latin; mso-fareast-font-family:Calibri; mso-fareast-theme-font:minor-latin; mso-hansi-font-family:Calibri; mso-hansi-theme-font:minor-latin; mso-bidi-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi-theme-font:minor-bidi; mso-fareast-language:EN-US;} @page WordSection1 {size:595.0pt 842.0pt; margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm; mso-header-margin:35.4pt; mso-footer-margin:35.4pt; mso-paper-source:0;} div.WordSection1 {page:WordSection1;} --> </style>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-11152093132759564702017-02-17T11:36:00.000+00:002017-02-17T11:41:53.617+00:00JAMES WOOD | A MECÂNICA DA FICÇÃO<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMjs6lGrt4TxM6-1vHDGju-_YgOw7qa2eDrDxx1xd2g8b-2vQvyVTwH1TLWj1Zc5MS60P-EtHw9jCHPky6CH7BGEhjR_T_JghhiGt7-o-9GJHf0ESIAm8a5Orjp7VsbfmlG_yZclJuLpQ/s1600/James+Wood+%2528David+Levenson%2529.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><span style="font-size: large;"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgMjs6lGrt4TxM6-1vHDGju-_YgOw7qa2eDrDxx1xd2g8b-2vQvyVTwH1TLWj1Zc5MS60P-EtHw9jCHPky6CH7BGEhjR_T_JghhiGt7-o-9GJHf0ESIAm8a5Orjp7VsbfmlG_yZclJuLpQ/s640/James+Wood+%2528David+Levenson%2529.jpg" width="640" /></span></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><span style="font-size: small;">© David Levenson</span></td></tr>
</tbody></table>
<br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;">Com o crítico literário James Wood entramos com facilidade no texto literário. O difícil, depois, é sairmos de lá.</span></div>
<span style="font-size: large;"><span style="color: black;"></span></span><br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><span style="color: black;"><br /></span></span></div>
<span style="font-size: large;"><span style="color: black;">
</span><span style="color: black;"></span></span>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><span style="color: black;">«Escrever crítica está para escrever ficção e poesia como navegar à vista está para a navegação em alto mar.» Foi John Updike quem o disse na primeira linha de um dos seus melhores conjuntos de textos sobre literatura, <i>Hugging the Shore</i> (sem edição por cá). A frase serviria como excelente comentário ao ensaio <i>A Mecânica da Ficção</i>, não fosse o autor, James Wood (n.1965), crítico literário e romancista inglês, escancarar uma cultivada embirração por Updike (chama-lhe «estilista sumptuoso» mas, na sua boca, isso é ofensa). Wood fez fama primeiro em Inglaterra nas páginas do <i>Guardian</i> e, depois, durante doze anos, nas do <i>New Republic</i>, nos EUA. Em 2007, entrou para a equipa da <i>New Yorker</i>, sendo hoje um dos mais influentes críticos literários. Como se pode então atirar a pequena traineira do comentário e da análise às altas ondas da ficção? No caso de Wood, tanto pelo elogio como pelo exame agudo, usando metáforas ou hipérboles, mas sendo sempre meticuloso na leitura e análise dos textos e pródigo nas citações e na erudição literária. Em 2008, lançou o ensaio <i>A Mecânica da Ficção</i>, agora editado pela Quetzal com tradução de Rogério Casanova. </span></span></div>
<span style="font-size: large;"><span style="color: black;">
</span><span style="color: black;"><div style="text-align: justify;">
O título em inglês (<i>How Fiction Works</i>) e o da tradução portuguesa indicam que o livro pretende ser uma cartilha de acesso de «qualquer tipo de leitor leigo» à mecânica do romance e do conto. Wood quer «fazer as perguntas de um crítico e oferecer as respostas de um escritor». É estimável a intenção, bem como a inegável e contagiosa paixão do autor pela literatura (e a ideia de que tem de ser ela mesma a ensinar-nos a lê-la melhor). Não deixa, contudo, de ser também inegável a paixão do autor pelas suas próprias qualidades de crítico. Explica que «o que Barthes quer dizer é que […]». Logo no início do ensaio, cita Joyce quando este rejeita o «genuíno fedor escolástico», devendo presumir-se que ele mesmo, o impoluto Wood, se considera inocente de qualquer discussão escolástica nas actividades inerentes à sua função de professor de Prática de Crítica Literária na Universidade de Harvard. A sua aproximação ao texto busca dar «respostas práticas» e é nessa linha que <i>A Mecânica da Ficção</i> «conduz um debate sustentado contra» os formalistas Viktor Chklovsky e Roland Barthes. Wood assegura-nos que não precisa de mais do que recorrer aos «livros ao alcance da mão, no [seu] escritório» para nos oferecer este «pequeno livro». É o bastante para, capítulo a capítulo, dar a sua contribuição para o esclarecimento da mecânica da narração, do detalhe, das personagens, da linguagem, da gestão de temporalidades ou do diálogo, «uma breve história da consciência», reflexões sobre «complexidade e compaixão» e, <i>last but no least</i>, uma tese sobre «verdade, convenção, realismo». Tudo em 123 curtas secções de texto e pouco mais de 200 páginas. É obra. Nos EUA, muitos escritores e candidatos a escritores apontam já <i>A Mecânica da Ficção</i> como uma influência importante no seu trabalho. Missão cumprida. Mas estará mesmo?</div>
</span><span style="color: black;"><div style="text-align: justify;">
De facto, toda a investigação de Wood serve exaustivamente para defender a tese central de que «a ficção é simultaneamente artifício e verosimilhança, e que não há qualquer dificuldade em suportar estas duas possibilidades». Ele quer explicar a «técnica desse artifício» e «voltar a ligá-la ao mundo». A tal tese sobre verdade, convenção e realismo é apenas a defesa de um certo realismo. O programa estético de James Wood é, afinal, naturalista e anti-vanguardista, com uma previsível colagem ao crítico inglês novecentista John Ruskin (a dificuldade que estes ingleses têm em, apesar de tudo, escapar à influência...). Wood confia na conjugação do poder mimético da ficção (sobretudo pela <i>voz própria</i> e <i>interior</i> das personagens) com a intuição criativa do autor. Ambas seriam formas de ligação <i>verosímil</i> e intimidade <i>fiável</i> do texto literário com o mundo <i>real</i>. Condição essencial para que isso acontecesse: rejeitar a omnisciência ou omnipresença do autor, expressas em intencionais exibições de estilo («esteticismo») ou na auto-complacente afirmação de um cunho autoral. Chave-de-ouro ou pedra filosofal: o autor mergulharia no interior da personagem através do uso do «discurso indirecto livre»; faria a narração numa <i>terceira pessoa próxima</i>, ponte e fusão de autor e personagem, aproximando-o de uma realidade que não lhe é desconhecida, mas que lhe é externa. Resultado: «Não temos a certeza absoluta sobre quem é 'dono' da palavra.» Em vez de «cravar as suas bandarilhas no mapa mental» da personagem, o autor deveria deixar-nos habitar nessa cartografia. No limite, diz-nos o crítico (na sua omnisciência, maior do que a do escritor), «a função do romancista é transformar-se, imitar aquilo que descreve, mesmo quando a matéria-prima é empobrecida, vulgar, entediante» (embora, por exemplo, a «decomposição da linguagem na América» seja «uma ameaça mimética para o escritor», sobretudo se ele se chamar Pynchon, DeLillo ou Foster Wallace, ou seja, figuras a abater pelo ambicioso Wood).</div>
</span><span style="color: black;"><div style="text-align: justify;">
Está bem explícito nestas páginas o combate contra aquilo que, em 2001, numa crítica ao romance de estreia de Zadie Smith (<i>Dentes Brancos</i>), Wood cunhou como «realismo histérico»: o estilo megalómano, verborreico, caótico e dispersivo do autor sobrepondo-se à atenção ao enredo e ao desenvolvimento das personagens, logo, às «verdades humanas essenciais» que a ficção pode capturar e revelar. O crítico rejeita também a linha do «realismo comercial» (como em Le Carré ou P. D. James), marca ficcional mais lucrativa e monopolizadora do mercado. O romance, insiste, «é o grande virtuoso do excepcionalismo: consegue sempre livrar-se das regras com que o tentam manietar. E a personagem romancesa é o Houdini desse excepcionalismo.» Aos autores, caber-lhes-ia então colocarem-se ao seu serviço, libertos de qualquer contexto social, histórico, psicológico, ideológico ou sociológico em que se insiram (o que daria depois imenso jeito aos críticos que só teriam de concentrar-se, também <i>virgens</i>, no texto). Até Wood dar um pontapé final no traseiro daqueles que apontam o realismo como mera convenção morta, <i>A Mecânica da Ficção </i>aplica-se na sua reabilitação enquanto «impulso central na ficção» para a «fidelidade às coisas como elas são». E prescreve receitas para se chegar lá.</div>
</span><span style="color: black;"><div style="text-align: justify;">
As impressões digitais de um grande escritor na grande ficção são, «paradoxalmente, identificáveis mas invisíveis». Para o justificar, Wood esgravata passagens de obras dos autores que mais estima, da Bíblia e Shakespeare a Henry James, Virginia Woolf, Jane Austen, Ford Madox Ford, José Saramago, Saul Bellow ou Ian McEwan. É um prazer assistir à sua invejável dissecação dos tais «livros ao alcance da mão». O crítico mostra-se entusiasta («Que tremendo exemplo de escrita é este!»), mas nunca condescendente («É útil ver bons escritores a cometerem erros»). Eleito Flaubert («ao mesmo tempo um realista e um estilista») como mestre da narração moderna, Wood discorre sobre o olho do autor e o olho da personagem, ambos em exercício de captação do detalhe. «O artifício reside na <i>selecção </i>do detalhe», afirma. E é também a exploração de detalhes <i>que palpitam</i> o que salva a leitura de <i>A Mecânica da Ficção. </i>A análise pormenorizada e a citação (esplendorosas nos capítulos dedicados às personagens e à linguagem) permitem-lhe mostrar a diversidade de registos, o carácter palpável e visual, a musicalidade, a eficácia da prosa. Mas é pena que Wood use esse dom para sustentar um plano de argumentação teórica. Porquê? Apenas e tão só porque qualquer argumentação teórica é saudavelmente contestável e, por essência, externa à ficção analisada. No limite, segundo a sua própria lógica, para deixar respirar a <i>realidade</i> e grandiosidade do texto literário, o crítico literário devia abter-se de teorizar sobre ela, limitando-se a sinalizá-la, descrevê-la e interpretá-la.</div>
</span><span style="color: black;"><div style="text-align: justify;">
Ao defender que um romance fracassa «quando não consegue que o leitor se adapte às suas convenções [e às suas 'limitações expansivas'], quando não consegue engendrar uma ânsia específica pelas suas próprias personagens, pelo seu próprio nível de realidade», Wood advoga que o encontro do crítico e do leitor com o texto e o autor é um encontro de <i>subtilezas</i> («subtileza de análise, de investigação, de atenção, de pressão sentida»). Uma espécie de aperto de mãos misterioso e sensível. Depois, conclui: «A realidade ficcional é de facto construída a partir de 'efeitos', mas o realismo pode ser um efeito e simultaneamente ser verdadeiro». Afinal, os «grandes realistas, de Austen a Alice Munro, são também grandes formalistas.» E, dado que o romance, simultaneamente «natural e artificial», é uma convenção da vida — não mera verosimilhança ou veracidade, mas «<i>a coisa mais próxima</i> da vida» —, a palavra <i>realismo</i> deve ser substituída por <i>lifeness</i>: «a vida na página, a vida reanimada pela arte mais elevada».</div>
</span><span style="color: black;"><div style="text-align: justify;">
Se tivesse havido na literatura, como houve (e ainda há) na pintura, uma luta entre arte abstracta e figurativa, é fácil percebermos onde estaria James Wood. Não exactamente no século XIX, mas talvez perto dos «novos figurativos». Wood defende, assim, uma teoria conservadora, bastante agressiva para a liberdade, afirmação e inovação estilística autoral e muito permissiva quanto à recepção <i>impressiva</i> por parte do crítico. É uma teoria respeitável e bem defendida. É apenas de lamentar que Wood também queira convencer os leitores de que ele escreve sobre a literatura tal como ela é. Propondo-se desfrutar e desmontar a arte da ficção como ela seria em si mesma, o crítico quer afinal ligá-la à vida <i>como ela é</i>. E a vida, tal como ela é, não existe por si só nos livros; as suas manifestações pluriformes pertencem à afirmação criativa, inalienável e intransmissível, de cada autor. Talvez seja isto o que, precisamente, acabará sempre por escapar a olhos realistas e a egos irrealistas, como o do crítico e ensaísta James Wood. Diz Laura Miller, no Salon.com: «Ele é sempre interessante, mas poucas vezes convincente. Ninguém o supera a dar a entender que a literatura é uma questão moral, mas o problema é que não nos faz querer ler os livros de que gosta.»</div>
</span><i>
</i></span><br />
<style type="text/css">
p.p1 {margin: 0.0px 0.0px 0.0px 0.0px; text-align: justify; font: 12.0px Helvetica; color: #275d90}
p.p2 {margin: 0.0px 0.0px 0.0px 0.0px; text-align: justify; font: 12.0px Helvetica; color: #275d90; min-height: 14.0px}
</style>
<br />
<span style="font-size: large;"><br /></span>
<span style="font-size: large;">LER Setembro 2015</span><br />
<span style="font-size: large;">© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)</span>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-71470483102151620002017-01-20T09:18:00.001+00:002017-01-20T09:18:46.994+00:002016<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div style="text-align: center;">
<b><br /></b>
<b><i><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiWM-5d_ZYC6rPQlFFJeZ_Nohpf1esJXtw5otSS_4ZTc-SR8nQqfA5sxdtq8GyLkmapVUm-SEG3kKObpq6OZ739AY2IP2zbbV-qwTjwGkjKH7sDJsmxS89j8H4uEKhJtLEVl9ullJGWSYQ/s1600/BI%25CC%2581BLIA.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="424" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiWM-5d_ZYC6rPQlFFJeZ_Nohpf1esJXtw5otSS_4ZTc-SR8nQqfA5sxdtq8GyLkmapVUm-SEG3kKObpq6OZ739AY2IP2zbbV-qwTjwGkjKH7sDJsmxS89j8H4uEKhJtLEVl9ullJGWSYQ/s640/BI%25CC%2581BLIA.jpg" width="640" /></a></i></b></div>
<h2>
<div style="text-align: center;">
<i style="font-style: italic;">Bíblia </i>(Vol. I, <i>Novo Testamento</i>)</div>
<b><div style="text-align: center;">
<b>trad. Frederico Lourenço</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Quetzal</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div style="text-align: center;">
<o:p></o:p></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Frederico Lourenço propôs-se traduzir a versão do Antigo e do Novo Testamentos apelidada de <i>Versão dos Setenta </i>ou <i>Septuaginta</i>, traduzida do hebraico para o grego <i>koiné</i> (comum) entre o séc. III e o séc. I a.C., em Alexandria, crê-se que por setenta e dois rabinos, respondendo a setenta e duas questões, em setenta e dois dias. A publicação do primeiro de seis volumes (quatro dedicados ao Antigo Testamento, dois ao Novo) deste projeto hercúleo, com conclusão prevista para 2019, foi o grande acontecimento editorial de 2016. Destinada a crentes e a não crentes, a versão de Frederico Lourenço é apresentada como a mais completa até à data, contendo oitenta livros, mais catorze do que as versões protestantes e mais sete do que a versão do latim da <i>Vulgata</i>. Incluindo notas e comentários do tradutor, a nova Bíblia em português acentua o valor universal e literário do «Livro dos Livros».</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<o:p><img alt="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgigIx2UhyN8989NFZTJAT8nW7QLtI-s9TwT3qTwfjGxzQPVvYo_wv9yTmRRAio9EKd8CX2q0l0ytlXqb9Ve_4zC1OFZ2REmDU3usUS5wn2mQeRhysJz88kc9lkqnPa-ddXDzabcE3xPKQ/s1600/unnamed.jpg" class="shrinkToFit" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgigIx2UhyN8989NFZTJAT8nW7QLtI-s9TwT3qTwfjGxzQPVvYo_wv9yTmRRAio9EKd8CX2q0l0ytlXqb9Ve_4zC1OFZ2REmDU3usUS5wn2mQeRhysJz88kc9lkqnPa-ddXDzabcE3xPKQ/s640/unnamed.jpg" width="407" /></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<i><div style="text-align: center;">
<i>À Luz do que Sabemos</i></div>
</i><b><div style="text-align: center;">
<b>Zia Haider Rahman</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Quetzal</b></div>
</b></h2>
<div style="text-align: center;">
<i><br /></i></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div style="text-align: center;">
<o:p></o:p></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Zia Haider Rahman nasceu no Bangladesh, formou-se em Inglaterra, trabalhou em Wall Street, especializou-se como advogado em direitos humanos e, em 2014, publicou este primeiro romance, de inspiração autobiográfica, escrito com uma inteligência e um fôlego narrativo ímpares. O narrador (sem nome) reproduz o relato de vida que lhe foi feito, em 2008, por Zafar, seu amigo dos tempos de Oxford nos anos 80. Em mais de 700 páginas de «digressões, tangentes, análises minuciosas e reflexões amplas», entre o Afeganistão, o Bangladesh, a Inglaterra e os EUA, desenvolve-se uma epopeia sobre o que significa ser deslocado de um país, de uma classe social, de uma cultura, de uma certeza ou de um preconceito. Como a verdade dos números, a realidade esconde-se atrás de ícones. De que nos vale o conhecimento para tentarmos modificá-la?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br />
<div style="text-align: center;">
<img alt="https://lh3.googleusercontent.com/-4FmutNPwHQM/Vhe0ht-MZzI/AAAAAAAAA2g/KTtiwwTNwCM/w640-h400-p-k/ng4851878.JPG" height="400" src="https://lh3.googleusercontent.com/-4FmutNPwHQM/Vhe0ht-MZzI/AAAAAAAAA2g/KTtiwwTNwCM/w640-h400-p-k/ng4851878.JPG" width="640" /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<div style="text-align: center;">
<b><i>Vozes de Chernobyl</i></b></div>
<div style="text-align: center;">
<b><i>A Guerra Não Tem Rosto de Mulher </i></b></div>
<b><div style="text-align: center;">
<b>Svetlana Alexievich</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Elsinore</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Merecidamente distinguida com o Prémio Nobel da Literatura em 2015, Svetlana Alexievich firmou um novo género, o «romance de vozes», baseado na pesquisa e colagem de testemunhos, a meio caminho entre a ficção e o jornalismo. <i>A Guerra Não Tem Rosto de Mulher</i> (de 1985) e <i>Vozes de Chernobyl </i>(1997) integram um projeto literário notável, através do qual a escritora se propôs contar uma história alternativa, moral, do «<i>homo sovieticus»</i>. O primeiro título é um registo inédito das experiências de duzentas mulheres ex-combatentes no conflito russo-alemão de 1941-45. O segundo reúne relatos de cerca de cem testemunhas do desastre no quarto reator da central nuclear bielorussa de Chernobyl em 1986 e das suas consequências. Dramático, comovente, o trabalho de Alexievich veio redimensionar «a medida do nosso tempo na terra».<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div style="text-align: center;">
<img alt="https://images.portoeditora.pt/getresourcesservlet/image?EBbDj3QnkSUjgBOkfaUbsI8xBp%2F033q5Xpv56y8baM6HrhAj1iE6Y6BZaLd1oK1Q&width=500" height="640" src="https://images.portoeditora.pt/getresourcesservlet/image?EBbDj3QnkSUjgBOkfaUbsI8xBp%2F033q5Xpv56y8baM6HrhAj1iE6Y6BZaLd1oK1Q&width=500" width="428" /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<i><div style="text-align: center;">
<i>À Beira do Abismo</i></div>
</i><b><div style="text-align: center;">
<b>Ian Kershaw</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Dom Quixote</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Reputado biógrafo de Hitler, o historiador inglês Ian Kershaw considera a Alemanha o «centro <i>pivot</i>» do continente e, por isso, centrou este primeiro volume da sua história monumental do século XX europeu no período entre 1914 e 1949 e no jogo de poderes que, a partir daquele país, determinou as duas guerras mundiais e impeliu o continente para a autodestruição. <i>À Beira do Abismo</i>, organizado de forma cronológica, explica como o medo generalizado do futuro e o «cheque em branco» dado pela Alemanha à Áustria-Hungria resultaram na catástrofe de 1914 e como «a intensidade inédita e assustadora da violência política» entreguerras cimentou a competição entre três sistemas incompatíveis: o comunismo, o fascismo e a democracia liberal. Uma abordagem judiciosa, importante para o entendimento das reminiscências atuais de um passado imperialista, nacionalista e xenófobo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br />
<div style="text-align: center;">
<img alt="https://tionitroblog.files.wordpress.com/2016/08/todos-os-contos-clarice-lispector-livro.jpg" height="495" src="https://tionitroblog.files.wordpress.com/2016/08/todos-os-contos-clarice-lispector-livro.jpg" width="640" /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<div style="text-align: center;">
<i>Todos os Contos</i></div>
<b><div style="text-align: center;">
<b>Clarice Lispector</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Relógio d’Água</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Oitenta e cinco histórias, escritas entre os 19 anos e os dias anteriores à morte, revelam Clarice como grande experimentalista e contista fenomenal. Com edição, introdução e notas do biógrafo Benjamin Moser, a reunião de <i>Todos os Contos</i> pela primeira vez num só volume é para guardar na estante mais privilegiada e ler e reler até à exaustão. Por vezes com estruturas «cubistas», noutras com encadeamento circular, no final mais diretas e imediatas, cada um dos textos testemunha o clarão estranho do talento da escritora, transcendente e visionário, ou apenas, como ela própria defendeu, abstrato porque «figurativo de uma realidade mais delicada e mais difícil, menos visível a olho nu». Quem não leu ainda <i>Laços de Família</i>, «O ovo e a galinha» ou «Ele me bebeu», já não tem desculpa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br />
<div style="text-align: center;">
<img alt="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgOXPu7DKuuPuL3oBSYs9LEVg_JJ9uVn8ZB5KDU2H8hylF_U9u4IHEC5LrfIWDk4TyLGGIGCfpeMI_1ZEBH6QMGbqrHCc3MNb84LdbcuMOgE3sD5jFVixGf4NBfcYsASqQu4RAfFj4mtvE/s400/A+Gorda+K+2+3D.jpg" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgOXPu7DKuuPuL3oBSYs9LEVg_JJ9uVn8ZB5KDU2H8hylF_U9u4IHEC5LrfIWDk4TyLGGIGCfpeMI_1ZEBH6QMGbqrHCc3MNb84LdbcuMOgE3sD5jFVixGf4NBfcYsASqQu4RAfFj4mtvE/s640/A+Gorda+K+2+3D.jpg" width="496" /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<div style="text-align: center;">
<b><i>A Gorda</i></b></div>
<b><div style="text-align: center;">
<b>Isabela Figueiredo</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Caminho</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
«Todas as personagens, geografias e situações descritas nesta narrativa são mera ficção e pura realidade.» A advertência da autora indicia a natureza autobiográfica deste romance, surpreendente pelo tema, comovente no tom testemunhal, realista e cru, mas melancólico, com que narra a história da protagonista. Ela, «a gorda», não suporta o seu corpo porque aprendeu, como todos à volta, «a rejeitar o invulgar, o excessivo». Ao mesmo tempo, resiste e ama-o, usa-o como arma, ele é como a casa-organismo dentro da qual se refugia, protegida pelo papá e pela mamã. O mundo lá fora é feroz e opaco, mas a muralha de carne transforma-se em palavras e estas voam como nos sonhos da infância. <i>A Gorda </i>é um romance <i>sincero</i> e notável.<o:p></o:p><br />
<br />
<div style="text-align: center;">
<img alt="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdT0o_0UQNLj0E6GyXNuoi2Zg-tgeg-h07Xgoyj3U6zz15ffTI72OlthiZWhaKWCRtEwYKdxpLMtiIAvJq2u7TJ0yE5CnW3_ytf9gIes1oZXu6Sn_D1z4Xat3kji3n7QsuXCy5Nw88my4/s1600/capa.jpg" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdT0o_0UQNLj0E6GyXNuoi2Zg-tgeg-h07Xgoyj3U6zz15ffTI72OlthiZWhaKWCRtEwYKdxpLMtiIAvJq2u7TJ0yE5CnW3_ytf9gIes1oZXu6Sn_D1z4Xat3kji3n7QsuXCy5Nw88my4/s640/capa.jpg" width="459" /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<div style="text-align: center;">
<i>Habitarei o Meu Nome</i></div>
<b><div style="text-align: center;">
<b>Saint-John Perse</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Assírio & Alvim</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Quem saberá ainda que o poeta francês Saint-John Perse (de seu nome verdadeiro Alexis Léger, nascido nas Antilhas Francesas,) ganhou o Nobel da Literatura em 1960? Por essa altura, num discurso proferido ao lado de André Malraux, disse: «A poesia, irmã da ação e mãe de todas as criações, iniciada em todas as ciências e predecessora de todas as metafísicas, é a animadora do sonho dos viventes e a guardiã mais segura da herança dos mortos.» A sua, distinta pelo recurso a vocabulário obscuro, aristocrática no uso do verso-prosa, atenta aos ritmos e aos sons das palavras e ao simbolismo das imagens, é objeto de nova antologia em português (a anterior data dos anos 60, assinada por Alfredo Margarido e Carlos Cunha), com seleção e tradução de João Moita.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br />
<div style="text-align: center;">
<img alt="http://imgs.sapo.pt/canais_internacionais/images/image_381796_5_1477489319.jpeg" height="476" src="https://imgs.sapo.pt/canais_internacionais/images/image_381796_5_1477489319.jpeg" width="640" /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<h2>
<div style="text-align: center;">
<b><i>Obra </i>Poética, Vol.I</b></div>
<b><div style="text-align: center;">
<b>Ruy Cinatti</b></div>
</b><b><div style="text-align: center;">
<b>Assírio & Alvim</b></div>
</b></h2>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Trinta anos após a morte do poeta e a edição de uma primeira antologia da sua poesia e prosa, organizada por Joaquim Manuel Magalhães, vinte e quatro sobre a reunião da poesia a cargo de Fernando Pinto do Amaral, a Assírio & Alvim inicia a edição da <i>Obra Poética</i> de Ruy Cinatti, com um primeiro volume dedicado aos poemas publicados em vida, «em livro ou folheto». A fixação de texto partiu das últimas versões revistas pelo poeta e é assinada por Luís Miguel Gaspar, que contou com a colaboração de Joana Matos Frias e Peter Stilwell na organização, revisão e anotação da edição. Como Matos Frias, doutorada em 2006 com uma dissertação sobre a poesia de Cinatti, escreve, no prefácio, trata-se de «um murro no gosto [do] público»: «É com certeza aqui que se encontra a razão da resistência e do fascínio, da fuga e da força, da distância e da intimidade que esta obra parece provocar.»<o:p></o:p></div>
<br />
<b>SOL 24-12-2016</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-33943827469775233062016-12-19T15:30:00.000+00:002016-12-19T15:30:19.093+00:00Don DeLillo | Os donos do fim do mundo<div class="MsoNormal" style="margin-right: -0.35pt; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh8K8qq_erjEzDZNUqYhl-503i4UCIvVWuAo3l_yBwT0VbOeKLCP8HF0DgtYl_XUtRVW1GQ312JalqolNw2MNYPfNgt6m0ixXexDpnBxs_IBRNQ8VJfz12zsTCgylcqiBTqwWdJ2HW0Ccg/s1600/30201823995812.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="448" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh8K8qq_erjEzDZNUqYhl-503i4UCIvVWuAo3l_yBwT0VbOeKLCP8HF0DgtYl_XUtRVW1GQ312JalqolNw2MNYPfNgt6m0ixXexDpnBxs_IBRNQ8VJfz12zsTCgylcqiBTqwWdJ2HW0Ccg/s640/30201823995812.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-right: -.35pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-right: -.35pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">Em mais um romance futurista, Don DeLillo especula
sobre a capacidade humana de superação do medo e da morte ou, apenas, de cada
história individual. Quando a catástrofe se tornou uma canção de embalar.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Facto:
chama-se Alcor Life Extension Foundation, é a líder mundial em investigação,
tecnologia e conservação criónica, tem sede no deserto do Arizona e um grupo de
apoiantes em Portugal (</span><a href="http://www.alcorportugal.com%29/"><span style="font-family: Garamond;">www.alcorportugal.com)</span></a><span style="font-family: Garamond;">, visa o desenvolvimento da ciência criónica (do
grego <i style="mso-bidi-font-style: normal;">kyros</i>, que significa «frio»), isto
é, da tecnologia de preservação de corpos e órgãos humanos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">post mortem</i>, com recurso a baixas temperaturas e por tempo
indeterminado, até que a ciência possa <i style="mso-bidi-font-style: normal;">redespertá-los</i>.
Neste momento, a Alcor tem a seu cargo cerca de centena e meia de corpos conservados
em nitrogénio líquido. Ficção: chama-se Convergência, é um complexo/comunidade
instalado num local ultrassecreto, algures entre o Quirguistão e o Cazaquistão,
com a missão de preservar a vida através da crionização, e está no centro de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Zero K</i>, décimo sétimo romance de Don
DeLillo (nasceu em 1936, no Bronx, descendente de imigrantes italianos). «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Todos querem ser donos do fim do mundo</i>»,
esclarece Ross Lockhart, multimilionário e financiador do projeto. «Tecnologia
assente na fé. Eis do que se trata. Outro deus. Não muito diferente, no fim de
contas, de alguns dos deuses anteriores. Só que este é palpável, é genuíno,
premeia os fiéis.»<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">O
narrador de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Zero K</i> é Jeff (Jeffrey),
o filho que Ross abandonou com 13 anos e que, agora, aos 34, está de visita à
Convergência, chamado a acompanhar os últimos dias da madrasta, Artis, arqueóloga,
vítima de esclerose múltipla e prestes a ser encapsulada e crionizada.
Circulando por corredores bordejados de portas fechadas, estranhas performances-vídeo
(registando as mais diversas catástrofes naturais ou provocadas pelo homem), palestras,
encontros, episódios e conversas, Jeff é aos poucos tomado pela atmosfera claustrofóbica
que o rodeia (não há janelas), até perceber o peso e alcance daquela tentativa
de superação do tempo e da História. Uma das «mentes fulcrais» do projeto
afirma: «Isto é o futuro, este cariz remoto, esta dimensão subterrânea, oculta.
Sólida, mas também esquiva, de certo modo. Um conjunto de coordenadas
cartografadas do espaço. E um dos nossos objetivos é instaurar uma consciência
que se funda com o ambiente.» A descrição poderia ser também aplicada à escrita
de Don DeLillo, que continua a questionar todo o aparato de assimilação
contemporâneo («usando o quadro todo, a cultura toda») no sentido da integração
ou desintegração do ser humano. Os temas centrais mantêm-se, desde o primeiro
romance, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Americana</i>, de 1971: a solidão,
o anonimato, a alienação, a paranoia, a distopia, a procura de catarse, a
intervenção política e artística. Permeando todos eles, o habitual tom
meditativo e sombrio, um desassossego crónico e insidioso e a suspeita
permanente de conspiração. DeLillo é uma «alma profética» (Martin Amis), com
uma profundidade críptica.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: Garamond;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhC8AEGv-gYvFIiY0UCAej-S3wPm_89oDdub9lgkesdEJ-XZ0rVLR6oZTq5b1J8fv1njcLuvD4HcIOzDOSXlW1usAq1Y_cG8pJ-hPE-6tt9VTRo7L3KybqH5UtKOr5NEBeg0ZzPsALz3YY/s1600/cryogenics.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhC8AEGv-gYvFIiY0UCAej-S3wPm_89oDdub9lgkesdEJ-XZ0rVLR6oZTq5b1J8fv1njcLuvD4HcIOzDOSXlW1usAq1Y_cG8pJ-hPE-6tt9VTRo7L3KybqH5UtKOr5NEBeg0ZzPsALz3YY/s640/cryogenics.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">A
entrada na unidade especial Zona K, onde Ross voluntariamente se tornará, antes
do tempo, um «eu puro suspenso em gelo», será o culminar de um percurso de vida
criteriosamente pensado e concretizado como um desafio (desde quando inventou
um nome falso ou começou a construir fortuna). «O casulo seria o derradeiro
santuário das prerrogativas do meu pai», afirma Jeff. A habilidade narrativa de
DeLillo contrapõe o balanço da existência de Ross à rememoração e exame de
consciência feitos pelo seu filho nos dias passados na Convergência. O panorama
geral do romance, especulativo e universal, apoia-se na narração muito
particular da história de vida e da relação entre os dois, e de Jeff com a mãe
(a cuja morte assistiu pouco tempo antes da ação do romance), abandonados por
Ross. O diálogo pai-filho é o verdadeiro labirinto de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Zona K</i>, trabalhado como uma metáfora para a identidade e a
viabilidade humanas. «A vida contemporânea é tão etérea. Consigo trespassá-la
com um dedo espetado», diz o Monge. Na Convergência, procura-se uma
alternativa, um sistema com novos significados, perceções e possibilidades,
quando, afinal, o caminho da humanidade parece estar cada vez mais próximo de
um fim, irreversível.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Don
DeLillo é o desmancha-prazeres da (pouca) ficção contemporânea interessada em
refletir de fato sobre o novo milénio. A cada livro, o grande pessimista
parece-se dizer-nos de forma mais convicta que nenhum novo realismo, ficção
científica ou pós-pós modernismo superará a lucidez pura a que o artista pode
aceder, ao serviço da humanidade. Ainda que sem o alcance ou a densidade de
outras obras (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ruído Branco</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Mao II, Submundo</i> ou <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Corpo Enquanto Arte</i>), <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Zero
K</i> é um clássico DeLillo, conjugação rara de ficção e reflexão, a pedir
digestão lenta e com o impacto de um meteorito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Garamond;"><i>Zero K</i>, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">Don DeLillo, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">(trad.) Paulo Faria, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">Sextante, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">270 págs., 17.70 euros, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">****</span></div>
<br />
Jornal «i», 16-12-2016<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)<br />
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Calibri;
panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:647 0 0 0 159 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
a:link, span.MsoHyperlink
{mso-style-priority:99;
color:#0563C1;
mso-themecolor:hyperlink;
text-decoration:underline;
text-underline:single;}
a:visited, span.MsoHyperlinkFollowed
{mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
color:#954F72;
mso-themecolor:followedhyperlink;
text-decoration:underline;
text-underline:single;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-4381002481648915702016-12-10T13:43:00.000+00:002016-12-10T13:44:42.906+00:00Patrick White | Uma chama no deserto<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhKtLqXfixXlhXSM7mxqM-AequbCkGENJUQrBmfFu-WdNVLji5dy_eh9eys5JQnjVI9H0Rbngi6Q-T9oNAP44wJNw9qIM4DwGKx5T5fgbsbn_I488jDAxYq8P2sPckz2B80zDqSn_9k9No/s1600/5016168-3x2-940x627.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhKtLqXfixXlhXSM7mxqM-AequbCkGENJUQrBmfFu-WdNVLji5dy_eh9eys5JQnjVI9H0Rbngi6Q-T9oNAP44wJNw9qIM4DwGKx5T5fgbsbn_I488jDAxYq8P2sPckz2B80zDqSn_9k9No/s640/5016168-3x2-940x627.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div style="text-align: center;">
<span style="font-family: "garamond";">Tido
como um monumento da literatura australiana e universal, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Voss </i>é um romance iluminado pelo clarão brilhante, mas opaco, das grandes
obras modernistas.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";">Enquanto
na pintura as formas, as cores e os materiais se sobrepunham à expressão do
real, na literatura, as palavras, os ambientes, as personagens e até os objetos
adquiriam vida própria, formando composições estranhas e visões distorcidas.
Trabalhando a presença da visão da personagem sobre o mundo como se de um
objeto a três dimensões se tratasse, o modernismo elevou a vida interior sobre
a exterior e fez da reprodução da ambiguidade fundamental do eu e do comportamento
humano o seu objetivo e tema principais. Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Voss</i>,
a obra-prima escrita pelo australiano Patrick White (Londres, 1912 - Sydney,
1990) em 1957, as características modernistas servem como metáfora do
equipamento e companhia com os quais o explorador alemão Johann Ulrich Voss se apetrecha
para se aventurar na desconhecida Austrália central. Compelido para dentro daquele
país, Voss é, como Charles Marlow de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O
Coração das Trevas </i>de Joseph Conrad ou o «rapaz» de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Meridiano de Sangue</i> de Cormac McCarthy, o estrangeiro que penetra
no mistério indomável. A Austrália, pátria de desterrados, é o território
perturbador onde «é mais fácil descartar o supérfluo e tentar o infinito» e
onde se torna possível a viagem de Voss à procura do seu génio — «Serás muito
provavelmente queimado, verás a tua carne arrancada dos ossos, e é provável que
sejas torturado de muitas formas horríveis e primitivas, mas perceberás qual o
génio que, por vezes, pensas possuir, e do qual não me dirás ter medo».<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">Voss </span></i><span style="font-family: "garamond";">baseia-se na biografia do naturalista prussiano
Ludwig Leichhardt que, em meados do século XIX, realizou três expedições ao
interior da Austrália (procurando percorrer o território de Brisbane a Perth) até
desaparecer sem deixar rasto e sem que o seu corpo fosse jamais encontrado. O
romance termina 20 anos depois, com uma festa em honra do explorador
protagonista, a quem é erigida uma estátua. Logo nas primeiras páginas e depois
num certo encontro na escuridão de um jardim (que podia ser o do paraíso),
revelara-se uma estranha afinidade entre o seu mundo particular, «feito de
deserto e de sonhos», e o universo sensível da orfã Laura Trevelyan, sobrinha
do seu maior patrocinador, o Sr. Bonner. E é Laura, acompanhada por Mercy, a filha
adotiva (nascida de Rose, a criada liberta), quem termina por dizer que Voss,
como outros homens, tinha em si um pouco de Cristo: «Se era composto de mal
juntamente com o bem lutou contra esse mal. E falhou.» Pleno de simbolismos, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Voss </i>é um longo exercício de prova de
que «as palavras são somente compassivas quando livres das suas obrigações»,
uma missão exploratória também levada a cabo pelos modernistas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";">Patrick
White, Nobel da literatura em 1973 (o primeiro australiano a receber esta
distinção), afirmou que escrevia sempre três versões dos seus livros: «A
primeira é agonia e ninguém a perceberia. Com a segunda atinjo uma forma, mais
ou menos certa... A terceira é a que ilumina de algum modo esse sofrimento.»
Tão enigmática como certas passagens de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Voss</i>,
esta afirmação fornece uma chave importante para a compreensão do efeito
estranho que o romance provoca no leitor. A descoberta do eu como recurso
estilístico abriu campo para que o escritor trouxesse o tempo e o espaço para
dentro de si mesmo, como um microcosmo, misterioso e pessoal (Daniel Boorstin).
A riqueza do pensamento, do que passa pela nossa cabeça num só minuto, é tão
enigmática que só através do fluxo livre da escrita talvez alguma vez a
alcancemos, recriando-a num outro espaço e tempo. É daí que vem a convicção de
Virginia Woolf de que «nada acontece verdadeiramente até estar escrito». Ou o
lamento de Laura: «Oh, Céus, se ao menos pudesse descrever em palavras simples
a imensidão do conhecimento simples...» O processo de transposição do mistério
para uma forma mais ou menos racional implica necessariamente insucesso e sofrimento
e, segundo White, alguma forma de contrição. Voss e Laura sabem-se habitados
por uma centelha rara, um vento traiçoeiro, relampejos de intuição que os
aproximam ainda mais enquanto estão separados (e estão-no durante todo o
romance) e apenas podem comunicar entre si por cartas e nos sonhos.
«Debatemo-nos com a cartilagem e os ossos antes de nos aventurarmos a assumir a
carne», escreve ele, numa carta que o velho negro Dugald rasgará em mil
pedacinhos «de maus pensamentos do homem branco», antes de partir com os da sua
tribo e ser absorvido por completo pelo presente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjB-cCOWimPkJ17_L-qMbIJRIfuE8vZlmCMAz9DoiEO6Hc62InJbNVKG0pLoWPvaPKt7eg102CnAIqbP2wKvX9fHPgPkEFMwduGhEgc7aWdaokgh-tKoxvp7NVSdQqMl0tDSbm9rdZ32M4/s1600/australia_8898_966x.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="308" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjB-cCOWimPkJ17_L-qMbIJRIfuE8vZlmCMAz9DoiEO6Hc62InJbNVKG0pLoWPvaPKt7eg102CnAIqbP2wKvX9fHPgPkEFMwduGhEgc7aWdaokgh-tKoxvp7NVSdQqMl0tDSbm9rdZ32M4/s640/australia_8898_966x.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";">Patrick
White criou um painel vivo, estacionado em Sidney ou em movimento através do
coração da Austrália, procurando descrever um país que nunca se deixará
submeter por completo ao aborígene ou ao colono e que sempre conterá um deserto
implacável, capaz de sugar todos os Voss «obcecados pelo seu sonho de distância
e com o futuro». O tempo do romance é o tempo da expedição à natureza
psicológica e espiritual de cada personagem: do poeta secreto Frank Le Mesurier,
o simplório Harry Robarts, o ornitólogo Palfreyman, o bêbado Turner, o jovem
proprietário Ralph Angus, o condenado liberto Judd, caráter oposto ao de Voss, dos
aborígenes Jackie e Dugald aos habitantes do círculo social de Potts Point,
Sydney. Na gruta ou no deserto, comparáveis à impenetrabilidade e ao vazio da
alma humana (onde se revelam as verdades mais profundas), o estilo de White
assume-se mais críptico e elíptico, por vezes quase incompreensível, como o são
as palavras em alemão que Voss dirige aos nativos ou as almas desaparecidas e
representadas por pinturas nas grutas. A vastidão das distâncias e a paisagem
hostil são metáforas poderosas da solidão espiritual humana. Após o dilúvio,
saídos da gruta, os homens percorrem pastagens líricas até reentrarem no
deserto redentor. «A região diabólica, inicialmente plana, depressa irrompeu em
barrancos tortuosos, não particularmente profundos, mas suficientemente
íngremes para esforçar as costas dos animais que tinham de os atravessar, e
desgastar os corpos e os nervos dos homens com o movimento frenético que tal
acção envolvia. Não havia como evitar o caos fazendo um desvio.» Só lhes resta
conservar a esperança.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhR3APbpd33IkABNIiehg0Y5S8KdyzhL0D-G9obXl2hUBWHo2cQdZXnZUjY5HbNNYqsDyJOWYq2OYYh8oO7btmU28iekriifRZ3FRgZGgpO0j1YUZgIXBPRZRG2tjqbreVpNFFrLQlWS98/s1600/desert-sand-red-sand.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="384" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhR3APbpd33IkABNIiehg0Y5S8KdyzhL0D-G9obXl2hUBWHo2cQdZXnZUjY5HbNNYqsDyJOWYq2OYYh8oO7btmU28iekriifRZ3FRgZGgpO0j1YUZgIXBPRZRG2tjqbreVpNFFrLQlWS98/s640/desert-sand-red-sand.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";">Profundamente
original, Patrick White influenciou decisivamente todas as gerações seguintes
de autores australianos (David Malouf e Peter Carey tornaram pública a sua
dívida para com ele; o primeiro dedicou-lhe até o libreto de uma ópera), mas é
hoje quase ignorado pelos leitores europeus. <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Voss</i>, narrativa simbólica, acompanha uma história de amor e a
tentativa épica de um homem (Voss) em imaginar-se divino, quando, afinal, a sua
salvação reside na possibilidade de se perder no deserto. O combate de Voss e
Laura contra a arrogância e a fragilidade que os definem num primeiro momento
acompanha a revelação progressiva da sua verdadeira natureza. O seu casamento
(Laura aceita por carta a proposta feita por Voss) é uma ilusão, tão imaterial
e ilusória como as palavras que dirigem um ao outro ou a sua «filha», Mercy. A
plenitude atingida através do sacrifício (da cadela, do pássaro, do cavalo, de
Le Mesurier) e do sofrimento é uma forma de auto transcendência, que prescinde
de Deus. Sobre Laura, diz-se logo no início: «Já em menininha se mostrara algo
céptica, talvez devido ao tédio: sufocava com a penugem da fé. Acreditava
contudo, de modo palpável, na madeira, com os reflexos que nela se reproduziam,
e na clara luz do dia, e na água. Ainda hoje em dia reflectia fanaticamente num
qualquer problema matemática só pela excitação que lhe proporcionava, para
assim o solucionar e conhecer.» <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Voss</i>
é, igualmente, uma expedição, modernista, em rutura com todas as relações
óbvias com os objetos comuns da nossa experiência, à procura de uma corrente de
consciência que reproduza as composições invulgares do pensamento humano. Ou,
como confessará a Menina Laura Trevelyan: «O conhecimento nunca foi uma questão
de geografia. Antes pelo contrário: inunda todos os mapas existentes. O
verdadeiro conhecimento talvez surja apenas da tortura no país da mente.»<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "garamond";">Voss, </span><span style="font-family: "garamond"; font-size: 12pt;">Patrick
White, </span><span style="font-family: "garamond"; font-size: 12pt;">E-Primatur, </span><span style="font-family: "garamond"; font-size: 12pt;">489
págs., 19.90 euros, </span><span style="font-family: "garamond"; font-size: 12pt;">*****</span></div>
<br />
Jornal «i», 28-11-2016<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)<br />
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:1;
mso-generic-font-family:roman;
mso-font-format:other;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:0 0 0 0 0 0;}
@font-face
{font-family:Calibri;
panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:647 0 0 0 159 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-14973452681322687602016-12-04T15:36:00.000+00:002016-12-04T15:36:09.419+00:00Riad Satoouf | Um miúdo loiro no Médio Oriente<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjYY8aOydByTD1qc2OQo1MkPkMzfV5Q5-H-_yMkGqvCc5u9RSOYAPWWAVKzlCQOm1o5aoe61XbGLs8_ZXqDsu9H_3IjxWwYnJYtZ8JLKBgtMB8HnKN12wuHWAkJ8GZQCnoqDXEFznwDNA4/s1600/sattouf.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="408" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjYY8aOydByTD1qc2OQo1MkPkMzfV5Q5-H-_yMkGqvCc5u9RSOYAPWWAVKzlCQOm1o5aoe61XbGLs8_ZXqDsu9H_3IjxWwYnJYtZ8JLKBgtMB8HnKN12wuHWAkJ8GZQCnoqDXEFznwDNA4/s640/sattouf.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Durante
a infância passada na Líbia e na Síria, o desenhador francês Riad Sattouf foi
educado para ser um «árabe do futuro». Visto pelos seus olhos de criança, esse
mundo muçulmano dos anos 1980 é uma caricatura brutal.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Quando
lhe perguntam a que ponto se sente francês ou árabe, Riad Sattouf responde que
se sente mais... cartunista. Mas, em 2011, quando já era um autor de banda
desenhada e realizador conhecido, o fato de ter de superar muitos entraves para
ajudar alguns dos familiares sírios a se refugiarem da guerra civil em França
fê-lo desejar escrever sobre as suas origens. Nasceu daí o projeto de novelas
gráficas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Árabe do Futuro: ser jovem no
Médio Oriente</i>, nas quais relata a infância na Líbia e na Síria e a
adolescência em França, exclusivamente a partir da memória pessoal e na
perspetiva do protagonista homónimo. Em Portugal, o primeiro volume (que cobre
entre 1978 e 1984) saiu no ano passado e o segundo (1984-1985) chegou às
livrarias há pouco; o terceiro está previsto para Setembro de 2017, todos editados
pela Teorema.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Filho
de pai sírio (sunita, adepto do pan-arabismo progressista, obcecado com a
educação dos árabes, estudou História Contemporânea na Sorbonne, graças a uma
bolsa do governo francês) e mãe francesa (da Bretanha), Riad Sattouf (hoje com
38 anos) nasceu em Paris, mas cresceu na Líbia (em Trípoli, entre os dois e os
quatro anos) e depois na Síria (na aldeia natal do pai, até aos sete anos). O trânsito
peripatético entre as culturas francesa e muçulmana colocou-o muito cedo à
margem das outras crianças, num estado de solidão que, garante, o impulsionou a
tornar-se desenhador. Na Líbia e na Síria, os hábitos ocidentais e os cabelos
compridos, «de um loiro platinado, espesso e sedoso» valeram-lhe ser apontado
como «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">yehudi</i>» (judeu, «O» pior
inimigo à época, odiado visceralmente por todos); em França (onde passa férias
com a avó e onde se formará em Animação) foi sempre o tipo árabe com um nome
esquisito (em francês, o seu apelido assemelha-se a «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">sa touffe»</i>, associado ao sexo feminino). Vítima de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">bullying</i>, Riad tornou-se um observador apurado,
muito apto na descrição de ambientes, personagens e sensações — assumem
particular importância os sons, as cores (azul e vermelho nas páginas sobre a
França, amarelo para a Líbia e carmim para a Síria) e os cheiros (o cheiro a
suor maternal da avó síria e o cheiro a perfume da avó francesa, o cheiro a
urina das multidões líbias, entre muitos outros).<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEizhx0oOP-C3hOJiLrQyX3mAMV-noTXRLVxUIVo7ZakpHAdbZk9Kc1u0Mew6eaEZyZcK10Z-090VWeenPdvyQ6OrY5O2d8whJahSKbVu7H55OluMzQn71MOP3YeooxBn3zopVZA-0-yxDU/s1600/the-arab-of-the-future-2-05.png" imageanchor="1"><img border="0" height="290" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEizhx0oOP-C3hOJiLrQyX3mAMV-noTXRLVxUIVo7ZakpHAdbZk9Kc1u0Mew6eaEZyZcK10Z-090VWeenPdvyQ6OrY5O2d8whJahSKbVu7H55OluMzQn71MOP3YeooxBn3zopVZA-0-yxDU/s640/the-arab-of-the-future-2-05.png" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Exercício
de rememoração ou autoanálise sem filtros, mas também sem nostalgia, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Árabe do Futuro </i>insere-se na linha
autobiográfica de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Persépolis</i>, de
Marjane Satrapi (sobre crescer no Irão de Komeini) ou <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Mourir, partir, revenir</i>, memórias da libanesa Zeina Abirached. Nos
últimos anos, o enfoque deste tipo de registo gráfico no ponto de vista
picaresco da criança ou do adolescente abriu novas possibilidades de
representação de realidades, conflitos e traumas históricos. Oferecendo uma
perspetiva individual e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">alternativa</i>
do quotidiano num certo Médio Oriente, Satrapi, Abirached e Sattouf
conquistaram quase de forma unânime o público e a crítica. No caso de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Árabe do Futuro</i>, é a sinceridade
ingénua do protagonista que lhe permite afirmar, por exemplo, enquanto olha os
retratos do líder espalhados por toda a parte: «Eu gostava menos do Assad que
do Kadafi. Era menos bonito, menos atlético. Tinha uma testa desproporcionada e
um ar um pouco aldrabão. Os seus olhos não se viam bem.» <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjm_rv6Rc8cIdQskKtzXb67IpGh500I9F8iNApUSl2Z7oEWaq-rHBD_iPH4CtNrOTtWpoUDhzIihPqm9KLhaVJ90CCgaZyx3UEvScNv_ixq5GVPVf-Jr9xooyWcUw5MxQUvEHIy6_N3Gso/s1600/riad_sattouf_mea.png" imageanchor="1"><img border="0" height="402" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjm_rv6Rc8cIdQskKtzXb67IpGh500I9F8iNApUSl2Z7oEWaq-rHBD_iPH4CtNrOTtWpoUDhzIihPqm9KLhaVJ90CCgaZyx3UEvScNv_ixq5GVPVf-Jr9xooyWcUw5MxQUvEHIy6_N3Gso/s640/riad_sattouf_mea.png" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Riad
Sattouf, descrito como um sujeito reservado e esquivo que nunca foi ativista de
causa nenhuma a não ser a da estranheza do olhar infantil ou adolescente sobre
o mundo, foi o único cartunista de origem árabe na equipa da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Charlie </i>Hebbdo entre 2004 e 2014 (saiu
meses antes do atentado de Janeiro de 2015), onde publicou a série semanal <i style="mso-bidi-font-style: normal;">La vie secrète des jeunes</i>, composta por
cenas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">photomaton</i> por ele
testemunhadas nas ruas e nos transportes de Paris. Atualmente assina a série <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Les cahiers d’Esther</i>, no <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Le Nouvel Obs</i>, a partir de histórias
reais do quotidiano de uma miúda francesa de 10 anos. O seu trabalho nunca foi
provocatório em relação ao mundo árabe, mas, ainda que sem julgamento político,
a fórmula narrativa de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Árabe do Futuro</i>
permite-lhe dar a ver uma realidade social quase totalmente desconhecida pelos
ocidentais e onde impera a violência, a sujidade, a penúria e o fanatismo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Raid
e a família moram num apartamento (de uma assoalhada, sem chave) e comem a
comida (por vezes, só bananas) disponibilizados pelo Estado das massas
populares árabes líbias. A mãe perde o emprego como locutora de rádio porque
desata a rir ao ler um texto oficial em que se diz que Kadafi irá matar «o
filho de um cão do Reagan». As crianças brincam com armas e passam o tempo a
bater-se (com gosto) umas às outras. As casas, cheias de rachas, nunca são concluídas,
de modo a evitar o pagamento de impostos. Na Síria, Raid vê, pela janela do
apartamento, uma mulher a estender roupa na corda, à chuva, enquanto pousa um
bebé no chão de cimento, puxando-o depois por uma perna e cobrindo-o de beijos.
Ali perto, outros vizinhos espancam um burro (é constante a violência sobre os
animais). O irmão bebé come baratas. As mulheres comem os restos da refeição
dos homens. Os professores espancam os alunos com sadismo. Uma mulher é
assassinada porque engravidou fora do casamento (os assassinos ficam impunes).
Em traços negros e cenário colorido, pleno de anedotas e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">fait divers</i>, o pequeno Raid assiste a tudo, dividido entre a
ambiguidade do que vê e a adoração pelo pai, um professor universitário
instruído, mas racista, belicista e cada vez mais fanatizado, com quem em
adulto ele cortará relações. <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Árabe do
Futuro</i> retrata um sonho passado (o do pan-arabismo paterno), com imagens de
um quotidiano de pesadelo, onde as personagens se salvam pelo humor e pelo
absurdo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond;">O Árabe do Futuro, </span></i><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">Riad Sattouf, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">Teorema, </span><span style="font-family: Garamond; font-size: 12pt;">158 págs., 19.90 euros</span></div>
<!--[if gte mso 9]><xml>
<o:OfficeDocumentSettings>
<o:AllowPNG/>
<o:PixelsPerInch>96</o:PixelsPerInch>
</o:OfficeDocumentSettings>
</xml><![endif]-->
<!--[if gte mso 9]><xml>
<w:WordDocument>
<w:View>Normal</w:View>
<w:Zoom>0</w:Zoom>
<w:TrackMoves/>
<w:TrackFormatting/>
<w:HyphenationZone>21</w:HyphenationZone>
<w:PunctuationKerning/>
<w:ValidateAgainstSchemas/>
<w:SaveIfXMLInvalid>false</w:SaveIfXMLInvalid>
<w:IgnoreMixedContent>false</w:IgnoreMixedContent>
<w:AlwaysShowPlaceholderText>false</w:AlwaysShowPlaceholderText>
<w:DoNotPromoteQF/>
<w:LidThemeOther>PT</w:LidThemeOther>
<w:LidThemeAsian>X-NONE</w:LidThemeAsian>
<w:LidThemeComplexScript>X-NONE</w:LidThemeComplexScript>
<w:Compatibility>
<w:BreakWrappedTables/>
<w:SnapToGridInCell/>
<w:WrapTextWithPunct/>
<w:UseAsianBreakRules/>
<w:DontGrowAutofit/>
<w:SplitPgBreakAndParaMark/>
<w:EnableOpenTypeKerning/>
<w:DontFlipMirrorIndents/>
<w:OverrideTableStyleHps/>
</w:Compatibility>
<m:mathPr>
<m:mathFont m:val="Cambria Math"/>
<m:brkBin m:val="before"/>
<m:brkBinSub m:val="--"/>
<m:smallFrac m:val="off"/>
<m:dispDef/>
<m:lMargin m:val="0"/>
<m:rMargin m:val="0"/>
<m:defJc m:val="centerGroup"/>
<m:wrapIndent m:val="1440"/>
<m:intLim m:val="subSup"/>
<m:naryLim m:val="undOvr"/>
</m:mathPr></w:WordDocument>
</xml><![endif]--><!--[if gte mso 9]><xml>
<w:LatentStyles DefLockedState="false" DefUnhideWhenUsed="false"
DefSemiHidden="false" DefQFormat="false" DefPriority="99"
LatentStyleCount="382">
<w:LsdException Locked="false" Priority="0" QFormat="true" Name="Normal"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" QFormat="true" Name="heading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 9"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="header"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footer"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="35" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="caption"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of figures"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope return"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="line number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="page number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of authorities"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="macro"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="toa heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="10" QFormat="true" Name="Title"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Closing"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Default Paragraph Font"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Message Header"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="11" QFormat="true" Name="Subtitle"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Salutation"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Date"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Block Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="FollowedHyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="22" QFormat="true" Name="Strong"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="20" QFormat="true" Name="Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Document Map"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Plain Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="E-mail Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Top of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Bottom of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal (Web)"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Acronym"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Cite"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Code"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Definition"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Keyboard"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Preformatted"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Sample"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Typewriter"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Variable"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Table"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation subject"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="No List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Contemporary"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Elegant"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Professional"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Balloon Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" Name="Table Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Theme"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Placeholder Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" QFormat="true" Name="No Spacing"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Revision"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="34" QFormat="true"
Name="List Paragraph"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="29" QFormat="true" Name="Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="30" QFormat="true"
Name="Intense Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="19" QFormat="true"
Name="Subtle Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="21" QFormat="true"
Name="Intense Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="31" QFormat="true"
Name="Subtle Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="32" QFormat="true"
Name="Intense Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="33" QFormat="true" Name="Book Title"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="37" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Bibliography"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="TOC Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="41" Name="Plain Table 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="42" Name="Plain Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="43" Name="Plain Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="44" Name="Plain Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="45" Name="Plain Table 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="40" Name="Grid Table Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="Grid Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="Grid Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="Grid Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="List Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="List Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="List Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Hyperlink"/>
</w:LatentStyles>
</xml><![endif]-->
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Calibri;
panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:647 0 0 0 159 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<!--[if gte mso 10]>
<style>
/* Style Definitions */
table.MsoNormalTable
{mso-style-name:"Tabela normal";
mso-tstyle-rowband-size:0;
mso-tstyle-colband-size:0;
mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-style-parent:"";
mso-padding-alt:0cm 5.4pt 0cm 5.4pt;
mso-para-margin:0cm;
mso-para-margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-language:EN-US;}
</style>
<![endif]-->
<!--StartFragment-->
<!--EndFragment--><br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Garamond;">****<o:p></o:p></span></div>
<br />
SOL 10-11-2016<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-72987394006449203702016-11-09T17:20:00.000+00:002016-11-09T17:20:22.638+00:00America, terra longe
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Calibri;
panose-1:2 15 5 2 2 2 4 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073786111 1 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:647 0 0 0 159 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Calibri;
mso-ascii-font-family:Calibri;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:Calibri;
mso-fareast-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Calibri;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgb6GIhD7RRn1s0b6-yKbK6KVfUro0N6nNdwbr6zlnxgUqBzrN_ph6qQE17YPa9K2xwH2j2fNYOT7_wEb73KzMgQtHzpXkwDA7NMx94Bo58Rqt0SXt-Y72uQtxezGK4WbwPWUr0iIfA5Bg/s1600/eagle-219679_1280.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgb6GIhD7RRn1s0b6-yKbK6KVfUro0N6nNdwbr6zlnxgUqBzrN_ph6qQE17YPa9K2xwH2j2fNYOT7_wEb73KzMgQtHzpXkwDA7NMx94Bo58Rqt0SXt-Y72uQtxezGK4WbwPWUr0iIfA5Bg/s640/eagle-219679_1280.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;"></span><br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Antologia
de textos de autores portugueses sobre os Estados Unidos, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">America, the Beautiful</i>, com organização de Carla Baptista, mostra o
quão longe estamos do outro lado do Atlântico. De projeção em projeção, é de
uma terra distante e exótica que ali se fala (ainda mais agora, na era Trump).</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Antes
de irmos para Ocidente, até à América, vamos até ao Oriente, mais precisamente
até ao território desconhecido que Marco Polo percorreu no século XII e de que
deu conta ao seu colega de cela, Rusticiano de Pisa, no que seria depois
publicado como <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Il Milione</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Descrição do Mundo</i> ou somente <i style="mso-bidi-font-style: normal;">As Viagens de Marco Polo</i>. Sendo um dos
primeiros ocidentais a percorrer a Rota da Seda, Polo viajara através de um
território real que o imaginário medieval povoara de seres fabulosos e
efabulados. Daí que o relato das suas viagens se situe entre a realidade então descortinada
e o gosto fantasioso da época. Polo tanto descreve com minúcia unicórnios,
amazonas ou centauros, como desmistifica a figura do rinoceronte, grande como
um elefante, com pelo de búfalo e cabeça de porco selvagem, amante do lodo e da
lama, e que, diz ele: «De facto, não se parece com a ideia que temos nem com o
que dizemos quando o descrevemos como animal que se deixa agarrar pelos braços
de uma virgem: é precisamente o oposto.» </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Ora,
vem isto a propósito de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">America, the
beautiful</i>, antologia organizada por Carla Baprista (docente da
FCSH/Universidade de Lisboa, jornalista <i style="mso-bidi-font-style: normal;">freelance</i>,
investigadora no Centro de Investigação Media e Jornalismo, especialista em
história do jornalismo em Portugal e argumentista de cinema. Trata-se de uma recolha
de registos de escritores portugueses sobre a América do Norte, de Eça de
Queirós, em 1866, a José Rodrigues Miguéis, em 1972, passando por Antero de
Figueiredo, António Ferro, Natália Correia, Joaquim Paço d’Arcos, Norberto
Lopes ou Jorge de Sena, entre outros. São 15 testemunhos pessoais, compostos
sobretudo em viagem, sobre um território e um povo que, então, como creio que
ainda hoje acontece, nos permanecem essencialmente desconhecidos. Como a Ásia o
era para o Ocidente no século XII, a América foi e continua a ser em grande
parte um país verdadeiramente exótico para os portugueses. Uma terra povoada
por amazonas e rinocerontes (sim, é uma analogia atual) ou, melhor, povoada por
centauros e por coelhos, ao jeito de John Updike.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Lê-se
na contracapa deste livro, para dar o tom: «A América era longe e linda.
Oferecia uma paisagem imensa e uma energia surpreendente aos viajantes.» América,
terra longe, linda, remota e excêntrica. Eduardo Lourenço retratou-a como uma
«entidade quase estranha, paradoxal, complexa», como «um incontornável
histórico» ou como o «continente futurante por excelência». E já Tocqueville
havia ido até à América porque acreditava que ela representava o futuro – o que
ali acontecia, aconteceria no futuro na Europa e no mundo. Ali aportaram os primeiros
peregrinos como numa nova Canãa, num novo paraíso, um novo mundo onde o plano
de Deus se podia realizar, e realizou, numa conjugação singular de abundância
material, liberdade individual e cumprimento ético e religioso. No sonho e na
realidade americana, as igrejas assemelham-se a bancos e as lojas de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">fast food</i> parecem igrejas. Uma
conjugação única e inimaginável, pelo menos pelos europeus, até ela, por
imitação, chegar às suas cidades e às suas autoestradas e as ocupar em nome da
mundialização - que é o mesmo que dizer em nome da americanização do mundo. O
que aqui vai escrito sobre a América precede esta contaminação da Europa pela
cultura <i style="mso-bidi-font-style: normal;">pop</i> e por uma ideologia e prática
americanas de consumo, que afinal nos mantêm ignorantes sobre o verdadeiro <i style="mso-bidi-font-style: normal;">american way of life</i>, mas que
contaminaram o discurso intelectual europeu sobre os Estados Unidos nas últimas
quatro décadas, não englobadas neste livro. Até à década de 1970, a América
correspondeu essencialmente a uma «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">beautiful
idea</i>»: a de um espaço de democracia e de sonho, onde tudo há e onde tudo
acontece.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Miguel
Torga, referido no prefácio por Carla Baptista, refere a «fascinação
consciente» do intelectual europeu pela América, nestes termos: «Do Alasca à
Patagónia surge-lhe um tesouro de cintilações diversas que o encandeiam […] A
voz de Walt Whitman deixa de ser uma modulação íntima e metrificada em quadras
e tercetos. É um desbordamento continental, uma torrente que inunda como um rio
de águas indisciplinadas. Nem misticismos maceradores, nem sentimentalismos
ambíguos, nem satânicos requintes. Versos de aço como linhas de
caminho-de-ferro, por onde o progresso desliza, trepidante e optimista.» Este
fascínio é visível em cada um dos textos antologiados, ainda que aqui e ali
temperado por um olhar crítico, ambíguo sobre essa «oficina sombria e
resplandecente», como lhe chamou Eça de Queirós. Nova Iorque, é uma cidade que
em parte eu amo e que em parte eu detesto, disse ele. «Querida Nova Iorque! —
Não, odiada Nova Iorque!» Natália Correia, no registo mais crítico desta
antologia, declara que se descobriu europeia na América, mas não escapa a
deslumbrar-se com a «diversidade do espetáculo humano», com a vida autêntica da
classe média, o «gozo das coisas ingénuas», a interdependência social, a
valorização individual, a meritocracia, o espírito de «viver e deixar viver», o
respeito pela liberdade de cada um. De regresso a Portugal, reconhece que
existe uma alma por debaixo da face insípida, uniformizada que a América primeiro
lhe mostrara. E conclui: «A América é um problema de que só ela tem a chave. […]
Os americanos transmitem-nos a angústia do inacabado. Eles não são
completamente generosos, nem completamente egoístas; não são completamente
cordiais, nem completamente hostis. São seres por revelar. […] É tão impossível
gostar da América como não gostar. Isso traduz-se num sentimento abstrato: o da
fascinação.»</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">A
ambiguidade talvez não seja mais do que um sinal de que, na América, o viajante
europeu, e em concreto o viajante português, é invadido pela projeção do desejo
de ser outro, tal qual o peregrino prestes a embarcar na viagem épica. Na
maioria dos casos, as conquistas da sociedade americana são apresentadas pelos
autores dos textos reunidos neste livro como gloriosas, porque derivam de uma
notória conjugação entre individualismo («o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">myself</i>,
eu mesmo, eu cidadão americano, de resto nada», de que fala Eça), uma notória
conjugação, dizia, entre o contributo individual e a consciência de missão
coletiva, entre a audácia e o valor pessoal e a organização geral de muitos, o
respeito pelos valores democráticos inexistente no Portugal sob a ditadura.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">«Na
América, tem-se culpa de tudo, é-se responsabilizado por tudo», diz António
Ferro. Vários são os autores que referem a importância da
autorresponsabilização, o incentivo à formação da personalidade, a religião de
consciência honesta, que estimula a cooperação, mais do que a competição, entre
profissionais, que permite a ascensão social, que incentiva a camaradagem entre
professores e alunos, «a instrução que não é tortura mas que faz parte do ar
que se respira» (o segredo dos Estados Unidos, segundo António Ferro).
Espanta-os a organização e o método, que resolvem tudo na América. Fidelino de
Figueiredo salienta o «bom humor, saudável e cortês, o triunfo devido a
qualidades reais […], a aristocracia da inteligência e a da riqueza quase se
confund[indo].» Manuel Rodrigues explica que a «chave para a compreensão do
sistema político norte-americano está no facto de este se basear não no
princípio de maioria, mas no consentimento mútuo e no compromisso». Friedrich
Wohlwill destaca também o «sentimento democrático», presente na vida de cada
dia, e também os avanços na ciência médica, aproveitando «os grandes meios financeiros
[do] país, a maior parte dos quais provêm de homens ou de instituições
particulares.» Joaquim Paço d’Arcos apresenta o Presidente Truman como exemplo
acabado do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">self made man</i> e evidencia
a forma como, nos Estados Unidos, «estão ao alcance da grande massa as melhores
riquezas [do país]; como estas estão preservadas e defendidas para usufruto
colectivo; como é constante o pensamento de fornecer a todos o bem-estar e as
regalias que dantes eram pertença de alguns.» A América, esta América onde
ainda impera o princípio de «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">equal
opportunity for all</i>» e onde a livre expressão do pensamento é um direito
básico é um retrato inverso do Portugal de então.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Como
esclarece Umberto Eco sobre Marco Polo e as representações da Ásia no século
XII, «o novo olhar analítico do artista e do letrado esmiúça, pouco a pouco,
com a dúvida do seu relativismo, o universo fantástico e maravilhoso feito de
símbolos e de sentidos figurados que caracterizou a cultura cristã medieval» e,
acrescente-se, que determinou durante séculos a visão da Ásia no Ocidente.
Sendo a América o novo mundo desconhecido dos séculos XIX e XX, aplica-se-lhe
também esta perspetiva. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Já
no século XXI, concretamente em 2005, chegado a Newport, Rhode Island, onde
Tocquevile aportou na América, o filósofo francês Bernard Henri-Levy
espantou-se com a profusão de bandeiras americanas. Bandeiras por todo o lado.
Nas janelas, nos pórticos, nos jardins, nas lojas, nas bicicletas, nos barcos, nos
carros, ... Vindo de um país onde não é comum exibir-se a bandeira nacional,
espanta-o esta epidemia americana. E põe-se a pensar. A primeira hipótese que
formula é a de esta obsessão tem que ver com a fragilidade de uma nação que se
estende por 50 estados e é composta por gente vinda de todos os cantos do
mundo. Mas, depois, conclui que a grandeza da América como nação não tem nada a
ver com a evidência do seu corpo enquanto nação, nem com o facto de os seus
habitantes partilharem raízes comuns no mesmo espaço. A grandeza da américa
como nação, corrige ele, tem a ver com uma ideia e com contratos. Tem a ver com
a vontade de ser americano. Porque, diz ele: «Nós não nascemos americanos,
tornámo-nos americanos, o que resulta numa espécie de incerteza, numa espécie
de fragilidade. A compensação para ela é a radical exibição da bandeira.» A
hipótese de Bernard Henri-Levy deriva de uma projeção da sua realidade de
origem e de uma reconversão de símbolos. O mesmo podemos dizer que acontece
como ponto de partida para todas as hipóteses formuladas pelos autores destes
textos (e trata-se sempre de hipóteses, visto serem visões pessoais, grande
parte das vezes após limitado tempo de observação). O que se descobre sobre a
América estando na América transporta, no caso de cada um deles, a mitologia da
Estados Unidos enquanto história próxima e reconhecível, mas, afinal, tão
distante e desconhecida.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Garamond;">Num
país imenso, um povo muitíssimo heterogéneo compõe uma nação de contrastes e
contradições. O gigantismo do seu feito tem o seu contraponto na uniformização
de costumes, urbanística e até de mentalidades, que, aponta Jorge de Sena,
«pode levar o turista a supor que, após milhares de quilómetros, está, por
piada, no mesmo lugar». A uniformização, diz Sena, é o corretivo social da
magnitude da América. É, provavelmente, o que suscita as maiores críticas por
parte dos autores dos textos antologiados. Talvez porque essa uniformização
contraria a imagem dos Estados Unidos enquanto invenção total, de cada homem e
de uma ideia defendida e concretizada por um conjunto de homens por ela unidos.
O sonho da América, como defende Eduardo Lourenço, é um «sonho quase messiânico
de um outro mundo, de qualquer coisa de outro». É ele que guia o confronto ou o
encontro do viajante com o território da América, uma terra povoada por
amazonas e rinocerontes, por centauros e por coelhos, onde, como aqui defende
Guilherme Pereira da Rosa, «há tanta coisa para ver que se perde a conta;
coisas tão diferentes por lá, como o são a noite e o dia, o ruído e o silêncio,
o tudo e o nada»: America, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">the beautiful</i>,
é impossível conhecê-la - ainda mais agora, no advento da era Trump.</span><span style="background: white; color: black; font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;"></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="background: white; color: black; font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">America, the Beautiful</span></i><span style="background: white; color: black; font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">, Carla Baptista, Tinta-de-China</span><span style="background: white; color: black; font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT;">, 368 págs., 16.90 euros</span><span style="font-family: Garamond;"></span>
</div>
<br />
Jornal «i», 31-10-2016<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-82866508727891605662016-10-19T22:02:00.000+01:002016-10-19T22:02:29.198+01:00John Le Carré | A verdade, agora a cores<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1-vXVQw6CudCPQ7hQ9Qwi2KS_Im454TFGChQkPw3_jM0I0cdJwFk5jpviO-k_iofInFYHgdiadtjsAjLjq-z9HLcMK3RxJEFejR9bC2y0AFGJnUjTPNM2yHutYt0-q-7kiSpSlqy4W6M/s1600/john-le-carre--644x362.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg1-vXVQw6CudCPQ7hQ9Qwi2KS_Im454TFGChQkPw3_jM0I0cdJwFk5jpviO-k_iofInFYHgdiadtjsAjLjq-z9HLcMK3RxJEFejR9bC2y0AFGJnUjTPNM2yHutYt0-q-7kiSpSlqy4W6M/s640/john-le-carre--644x362.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
John
Le Carré escreveu uma autobiografia que não revela segredos íntimos ou de de Estado,
mas é uma boa coleção de reminiscências de um ficcionista patológico.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
David
John Moore Cornwell (n. 1931) tinha 25 anos quando foi formalmente admitido
como agente júnior do Serviço Secreto Britânico, no M15. Quatro anos depois,
insatisfeito com a falta de ação naqueles serviços, o jovem caçador de espiões
pediu transferência para o M16, do outro lado da rua. Do tempo no M15, guardaria
sobretudo na memória as correções ortográficas anotadas nas margens dos seus
relatórios pelos agentes seniores com estudos clássicos. «Nenhum editor que
encontrei desde então foi alguma vez tão exigente ou teve tanta razão.» Poucos
anos depois, com 33 anos, o agente reforma-se, graças ao sucesso internacional de
um romance, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Espião que Saiu do Frio</i>.
Haviam nascido entretanto John Le Carré e George Smiley («o velho espião
apressado»).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
«A
espionagem e a escrita de romances foram feitas uma para a outra. Ambas pedem
um olhar atento à transgressão humana e às muitas vias para a traição.» Aos 84
anos e após a publicação de mais de 23 livros<span style="mso-spacerun: yes;">
</span>— sobretudo <span style="mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">histórias de espiões passadas durante a
Guerra Fria (1945-1991)</span> —, John Le Carré fez sair finalmente a sua
autobiografia, projeto que tentara completar em 1979 e em 2001. A publicação
recente (Outubro de 2015) de uma biografia autorizada de mais de 600 páginas
pesou na vontade de contar a sua versão dos factos, mas, ainda assim, o resultado
final não acrescenta muito ao trabalho do biógrafo Adam Sisman. <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Túnel dos Pombos </i><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>é uma coleção de histórias e fragmentos que o
próprio autor apresenta de forma despretensiosa, como registo de «incidentes
isolados, autónomos, não apontando em nenhuma direção de que eu tenha
consciência, contados pelo que acabaram por significar para mim e porque me
alarmam, assustam ou comovem, ou porque me acordam a meio da noite e me fazem
rir alto.» Na verdade, o conjunto lê-se de forma tão saborosa como os seus
romances, mas sem o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">suspense</i> habitual.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Talvez
a única revelação autobiográfica digna desse nome sejam alguns pormenores da
relação do escritor com os pais; a mãe, que o abandonou quando ele tinha cinco
anos de idade («até hoje não faço a ideia de que tipo de pessoa era»), e o pai,
Ronnie, um vigarista de primeira, «fantasista, preso ocasional», «viciado em
teatralidade», que batia nos filhos, mas lhes assegurou uma educação de elite
e, no caso de David, legou-lhe a irrequietude crónica e a arte de tecer uma
história a partir do nada e «cegar as pessoas com pormenores inventados».
Mirabolantes, os esquemas do pai são relatados pelo filho (que os explorou em
vários enredos, sobretudo no romance mais autobiográfico, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Espião Perfeito</i>) com ambiguidade moral (uma expressão que lhe é
cara enquanto ficcionista) ou, pelo menos, sem uma censura veemente. Afinal,
Ronnie foi a primeira grande personagem de David Cornwell <span style="mso-spacerun: yes;"> </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;">aka</i>
John Le Carré, a fonte de todas as perguntas e efabulações, a raiz da
habilidade em mentir e imaginar: «nascido para a mentira, criado para ela,
treinado para ela por um sector que mente para ganhar a vida, treinado nela
como romancista». <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Do
ambiente na Alemanha do pós-guerra (onde assistiu, repugnado, ao branqueamento
de velhos nazis) e da Guerra Fria até uma entrevista com Bernard Pivot (à conta
de uma gravata emprestada) e aos encontros com vários realizadores e atores
famosos (Fritz Lang, Stanley Kubric, Francis Ford Coppola ou Martin Ritt; Alec
Guiness, Richard Burton, entre outros) sucedem-se múltiplas histórias reais,
contadas de memória, grande parte delas vividas enquanto o romancista pesquisava
para os seus livros e personagens (para quem conhece bem a obra, é curioso
conhecer a fonte de várias delas). <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgWEb1_MPuDkwLQXYF7TEk685ZamXzoUaJAsVavZY4CbPsEUJraJgFrBhg4OTAFz7qfuZ_iBYVqybPF0EknPOWYzgLbHb5e4bFwrjkvfCi1SThyCOt7ADHhtUwlx3uMAnglZFMa8nf02co/s1600/p046lx1w.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgWEb1_MPuDkwLQXYF7TEk685ZamXzoUaJAsVavZY4CbPsEUJraJgFrBhg4OTAFz7qfuZ_iBYVqybPF0EknPOWYzgLbHb5e4bFwrjkvfCi1SThyCOt7ADHhtUwlx3uMAnglZFMa8nf02co/s640/p046lx1w.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
«A
meio da vida, eu estava a ficar gordo e preguiçoso e a viver à custa de um
fundo de experiência passada que estava a esgotar-se. Chegara o momento de
abordar mundos não familiares», confidencia. Assim, muitas vezes à boleia de
repórteres de guerra e correspondentes (que lhe emprestaram também a coragem), o
escritor correrá mundo à procura de histórias, da rendição de Phnom Penh (onde
pela primeira vez lhe apontaram uma arma) à eleição pluripartidária no Congo
Oriental, em 2006. A parte mais interessante de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Túnel dos Pombos </i>reúne relatos destas aventuras e de
extraordinárias personagens reais mais ou menos conhecidas: da ativista
humanitária Yvette Pierpaoli a Yasser Arafat (que cheira a pó de talco
Johnson’s e com quem ele dança o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">dabke</i>
numa passagem de ano) à ativista alemã radicalizada Brigitte, ao dissidente
Andrei Sakharov, ao chefe mafioso russo Dima, Rupert Murdoch, ao ex-chefe do
KGB Vadim Bakatin, ao agente russo Issa Kostoev, ao poeta exilado Joseph
Brodsky, ao presidente italiano Francesco Cossiga, a Margaret Tatcher, ao
espião Nicholas Elliott (que discorre sobre Kim Philby) ou a Thomas, senhor da
guerra congolês. Do contacto com todos eles e das notas em caderninhos que
foram depois escrupulosamente aproveitadas para a escrita, sempre à mão, dos
romances, Le Carré diz que contou agora a verdade, se não toda, aquela que
melhor serviu à ficção, uma verdade disfarçada, sim, onde necessário, mas nunca
conscientemente falseada. Afinal, «a verdade real reside, se reside algures,
não nos factos, mas nos matizes». <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Túnel
dos Pombos </i><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>dá-nos uma boa conta
deles.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i>O
Túnel dos Pombos</i>, <span style="font-size: 12pt;">John
Le Carré, </span><span style="font-size: 12pt;">Dom
Quixote, </span><span style="font-size: 12pt;">382
págs., 18.90 euros</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<o:p></o:p></div>
<!--[if gte mso 9]><xml>
<o:OfficeDocumentSettings>
<o:AllowPNG/>
</o:OfficeDocumentSettings>
</xml><![endif]-->
<!--[if gte mso 9]><xml>
<w:WordDocument>
<w:View>Normal</w:View>
<w:Zoom>0</w:Zoom>
<w:TrackMoves/>
<w:TrackFormatting/>
<w:HyphenationZone>21</w:HyphenationZone>
<w:PunctuationKerning/>
<w:ValidateAgainstSchemas/>
<w:SaveIfXMLInvalid>false</w:SaveIfXMLInvalid>
<w:IgnoreMixedContent>false</w:IgnoreMixedContent>
<w:AlwaysShowPlaceholderText>false</w:AlwaysShowPlaceholderText>
<w:DoNotPromoteQF/>
<w:LidThemeOther>PT</w:LidThemeOther>
<w:LidThemeAsian>JA</w:LidThemeAsian>
<w:LidThemeComplexScript>X-NONE</w:LidThemeComplexScript>
<w:Compatibility>
<w:BreakWrappedTables/>
<w:SnapToGridInCell/>
<w:WrapTextWithPunct/>
<w:UseAsianBreakRules/>
<w:DontGrowAutofit/>
<w:SplitPgBreakAndParaMark/>
<w:EnableOpenTypeKerning/>
<w:DontFlipMirrorIndents/>
<w:OverrideTableStyleHps/>
<w:UseFELayout/>
</w:Compatibility>
<m:mathPr>
<m:mathFont m:val="Cambria Math"/>
<m:brkBin m:val="before"/>
<m:brkBinSub m:val="--"/>
<m:smallFrac m:val="off"/>
<m:dispDef/>
<m:lMargin m:val="0"/>
<m:rMargin m:val="0"/>
<m:defJc m:val="centerGroup"/>
<m:wrapIndent m:val="1440"/>
<m:intLim m:val="subSup"/>
<m:naryLim m:val="undOvr"/>
</m:mathPr></w:WordDocument>
</xml><![endif]--><!--[if gte mso 9]><xml>
<w:LatentStyles DefLockedState="false" DefUnhideWhenUsed="false"
DefSemiHidden="false" DefQFormat="false" DefPriority="99"
LatentStyleCount="382">
<w:LsdException Locked="false" Priority="0" QFormat="true" Name="Normal"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" QFormat="true" Name="heading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="9" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="heading 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index 9"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 7"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 8"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="toc 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="header"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footer"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="index heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="35" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="caption"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of figures"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="envelope return"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="footnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="line number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="page number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote reference"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="endnote text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="table of authorities"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="macro"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="toa heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Bullet 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Number 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="10" QFormat="true" Name="Title"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Closing"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Default Paragraph Font"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="List Continue 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Message Header"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="11" QFormat="true" Name="Subtitle"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Salutation"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Date"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text First Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Body Text Indent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Block Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Hyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="FollowedHyperlink"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="22" QFormat="true" Name="Strong"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="20" QFormat="true" Name="Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Document Map"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Plain Text"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="E-mail Signature"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Top of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Bottom of Form"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal (Web)"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Acronym"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Address"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Cite"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Code"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Definition"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Keyboard"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Preformatted"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Sample"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Typewriter"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="HTML Variable"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Normal Table"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="annotation subject"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="No List"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Outline List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Simple 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Classic 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Colorful 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Columns 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Grid 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table List 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table 3D effects 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Contemporary"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Elegant"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Professional"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Subtle 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Web 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Balloon Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" Name="Table Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Table Theme"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 2"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 3"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 4"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 5"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 7"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 8"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Note Level 9"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Placeholder Text"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="1" QFormat="true" Name="No Spacing"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" Name="Revision"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="34" QFormat="true"
Name="List Paragraph"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="29" QFormat="true" Name="Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="30" QFormat="true"
Name="Intense Quote"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="60" Name="Light Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="61" Name="Light List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="62" Name="Light Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="63" Name="Medium Shading 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="64" Name="Medium Shading 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="65" Name="Medium List 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="66" Name="Medium List 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="67" Name="Medium Grid 1 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="68" Name="Medium Grid 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="69" Name="Medium Grid 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="70" Name="Dark List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="71" Name="Colorful Shading Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="72" Name="Colorful List Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="73" Name="Colorful Grid Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="19" QFormat="true"
Name="Subtle Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="21" QFormat="true"
Name="Intense Emphasis"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="31" QFormat="true"
Name="Subtle Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="32" QFormat="true"
Name="Intense Reference"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="33" QFormat="true" Name="Book Title"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="37" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" Name="Bibliography"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="39" SemiHidden="true"
UnhideWhenUsed="true" QFormat="true" Name="TOC Heading"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="41" Name="Plain Table 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="42" Name="Plain Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="43" Name="Plain Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="44" Name="Plain Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="45" Name="Plain Table 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="40" Name="Grid Table Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="Grid Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="Grid Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="Grid Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="Grid Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="Grid Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="Grid Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="Grid Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="Grid Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="Grid Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="Grid Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46" Name="List Table 1 Light"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51" Name="List Table 6 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52" Name="List Table 7 Colorful"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 1"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 2"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 3"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 4"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 5"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="46"
Name="List Table 1 Light Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="47" Name="List Table 2 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="48" Name="List Table 3 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="49" Name="List Table 4 Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="50" Name="List Table 5 Dark Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="51"
Name="List Table 6 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" Priority="52"
Name="List Table 7 Colorful Accent 6"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Mention"/>
<w:LsdException Locked="false" SemiHidden="true" UnhideWhenUsed="true"
Name="Smart Hyperlink"/>
</w:LatentStyles>
</xml><![endif]-->
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:128;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 134217746 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;
mso-fareast-language:EN-US;}
@page WordSection1
{size:612.0pt 792.0pt;
margin:70.85pt 3.0cm 70.85pt 3.0cm;
mso-header-margin:36.0pt;
mso-footer-margin:36.0pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<!--[if gte mso 10]>
<style>
/* Style Definitions */
table.MsoNormalTable
{mso-style-name:"Tabela normal";
mso-tstyle-rowband-size:0;
mso-tstyle-colband-size:0;
mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-style-parent:"";
mso-padding-alt:0cm 5.4pt 0cm 5.4pt;
mso-para-margin:0cm;
mso-para-margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-language:EN-US;}
</style>
<![endif]-->
<!--StartFragment-->
<!--EndFragment--><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<o:p></o:p></div>
<b>Jornal Sol, 07-10-2016</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-11465156652811263292016-10-06T22:59:00.002+01:002016-10-06T23:01:04.547+01:00Rebecca West | Alemanha, país zero<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiWzSNEnOCfbOdY9yUC0jQhyY0snw0Od_wNE6GCzpXqoIZMAL4nASmmNWCqyTx38Q57j5ag36yDFN0tdfxB3b_b1RhUXgKFQXV3Io6vimFEsC26moNgZg9zxleXzuQs2wtUkQXTJHCU30U/s1600/nuremberg_trial.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="416" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiWzSNEnOCfbOdY9yUC0jQhyY0snw0Od_wNE6GCzpXqoIZMAL4nASmmNWCqyTx38Q57j5ag36yDFN0tdfxB3b_b1RhUXgKFQXV3Io6vimFEsC26moNgZg9zxleXzuQs2wtUkQXTJHCU30U/s640/nuremberg_trial.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Enquanto
assistia aos julgamentos de Nuremberga, Rebecca West procurava sinais de uma
paz e de uma justiça que o fim da guerra ainda não fizera chegar. A História ao
vivo nunca é como a que ficará escrita nos livros.</div>
O
ano de 1945, a hora zero (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Stunde nul</i>)
como lhe chamaram os alemães, havia sido celebrado em todos os jornais como o
do fim da guerra, mas, na verdade, seria em Nuremberga, no ano seguinte, que as
forças ocupantes procurariam julgar e enterrar os demónios, à vista de todos e
de vez. Cerca de 325 correspondentes de órgãos de informação de 23 países
diferentes acotovelaram-se desde o primeiro minuto para acompanhar as sessões
hora a hora, dia a dia, até que, dado o carácter percursor daquele tribunal
internacional e as decorrentes disciplina de ferro, complexidade e morosidade
dos trabalhos em curso, todos haviam sido abatidos pelo tédio. Rebecca West
(1892-1983), famosa repórter e ficcionista inglesa, havia sido enviada a
Nuremberga pela revista norte-americana <i style="mso-bidi-font-style: normal;">The
New Yorker</i> e, no décimo mês do julgamento, era já peremptória: «A sala de
audiências era a cidadela do aborrecimento. Todos os que se encontravam na sua
esfera de ação eram presa do mais extremo tédio. […] O símbolo de Nuremberga
era o bocejo. […] Para todos os que ali estavam, sem exceção, aquele era um
lugar de sacrifício, de aborrecimento, de dores de cabeça, de saudades de
casa.» O desmantelamento da máquina da guerra acompanhava aos poucos os
esforços da máquina da paz e da justiça, mas no epicentro da transição,
revelavam-se particularidades que a História apagaria e que só um olhar
presente, mais atento e mais crítico, conseguiria registar; um olhar
suficientemente estático mas desperto para verificar a verdadeira velocidade e
intensidade das mudanças. Foi o caso do olhar de Rebecca West, plasmado em três
textos escritos entre 1946 e 1954 sobre o mais famoso julgamento de todos os
tempos e agora publicados pela Relógio d’Água, com o título <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Estufa com Ciclâmenes</i>. A par, por
exemplo, de registos de <span style="mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Alfred Döblin</span> ou W. G. Sebald,
trata-se de um retrato raríssimo da Alemanha no imediato pós-guerra.<br />
<br />
<div style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhccj25kz40Why7rNCSe35eCaYB1Xj5M9cTXRTaiSoxt-JfP9JZtDDWZxnMIuAquAoRgzAAzwpafJ4xBHfLx-FaVV-0zMfMAJT19U9g6EXSK1DKvsdEq35EqaKYk7Cb1YEOT9EnrJopeRM/s1600/West.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="424" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhccj25kz40Why7rNCSe35eCaYB1Xj5M9cTXRTaiSoxt-JfP9JZtDDWZxnMIuAquAoRgzAAzwpafJ4xBHfLx-FaVV-0zMfMAJT19U9g6EXSK1DKvsdEq35EqaKYk7Cb1YEOT9EnrJopeRM/s640/West.jpg" width="640" /></a> </div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Rebecca
West, como quase todos os outros correspondentes estrangeiros, estava alojada
num palacete nos arredores de Nuremberga, ex-propriedade de uma família de
industriais bávaros «com um belo historial de distinção académica e de serviço
público» depois manchado pela ligação às elites nazis. Numa estufa escondida nos
jardins desse «conto de fadas alemão», um jardineiro perneta (Rebecca acentua
que o governo nazi não se esforçou por enterrar os seus mortos nas cidades
bombardeadas ou por providenciar próteses aos seus soldados mutilados na frente
de combate), e apenas ajudado por uma rapariguinha, cultivava ciclâmenes que,
apesar da rígida proibição vigente, comercializava com grande sucesso. Tal como
neste exemplo, a repórter inglesa acentua características típicas dos civis
alemães: o espírito industrioso, a confiança no poder do trabalho, um estoico
sentido do dever, a paixão pela produtividade. Encontra-as patentes na margem
de um riacho, onde um citadino pratica exercício apaixonadamente («ainda tinha
o seu corpo, ainda tinha aquele músculo estomacal decerto notável, ainda
mantinha o seu eu único») ou em Berlim, onde os escombros dos prédios incendiados
ou recém-demovidos são removidos por mulheres de idade: «os cabelos grisalhos
caindo hirtos como cordões de botas emoldurando os seus rostos curtidos, os
corpos uma mescla de ossos e coisas amarrotadas como um guarda-chuva mal
enrolado, as mãos quase tão ossudas como as suas ferramentas de trabalho.»
Interpreta-as em Nuremberga, em 1946, ou na Berlim dividida dos anos 50, onde,
diz-se, muitos<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>berlinenses compreenderão
por fim o que é o totalitarismo. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9ZmgJfWh0tqrF0ZGLotoestgWCUyh_WMSSYO-MoK9_1XTu8v7foAe6xD48YbT-co8ls3gPBcCsTM1StC9Bq675wg7npCUWhLebqLl2UIGTkeal9IAfl5JghSUcw_SumwxCzeG56sIRSw/s1600/Nuremberg_Trials_retouched.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="492" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9ZmgJfWh0tqrF0ZGLotoestgWCUyh_WMSSYO-MoK9_1XTu8v7foAe6xD48YbT-co8ls3gPBcCsTM1StC9Bq675wg7npCUWhLebqLl2UIGTkeal9IAfl5JghSUcw_SumwxCzeG56sIRSw/s640/Nuremberg_Trials_retouched.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Na
sala do tribunal, em Nuremberga, ao tédio juntava-se a excentricidade de
algumas regras e normas de segurança (incapazes, ainda assim, de impedir o
suicídio de Göring na véspera da execução), «a doença da uniformidade que
atacara os acusados durante o julgamento» e os havia vencido, a evidência da
excessiva delicadeza e postura de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">nostra
culpa </i>dos conquistadores (uma armadilha que «pode bem ser considerad[a] a
coisa mais importante que aconteceu em Nuremberga») e das diferenças de
comportamento entre as forças ocupantes (evidenciando-se, por exemplo, a sovinice
dos ingleses, a generosidade dos americanos, a alienação dos franceses e a
ferocidade gélida dos russos). Atenta a cada detalhe, exímia na recriação de
ambientes e posturas, acutilante, West é peremptória: «O problema de Nuremberga
era ser tão manifestamente parte da vida tal como esta é vivida. O tribunal era
parte integrante das estranhas coisas que aconteceram na sua periferia; e estas
já eram suficientemente estranhas.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
O
maior feito de Nuremberga é termos todos ficado a saber, «sem a menor dúvida»,
o que fizeram aqueles dezoito homens que ali foram julgados: «Nenhuma pessoa
letrada pode agora alegar que aqueles indivíduos fossem outra coisa que não
abcessos de crueldade.» E, no entanto, o legado de Nuremberga é muito mais
complexo do que isto («Na verdade, a sala de audiências era um tanque atulhado
de equívocos até à borda») e a repórter deixa-o bem claro quando se refere, por
exemplo, à satisfação com que muitos recebem a notícia do suicídio de Göring ou
à iniquidade do sistema de execução da pena de morte («nunca houve
acontecimento legal que fedesse tanto a ilegalidade» e Nuremberga não foi
exceção). Profundamente político, o legado do testemunho de Rebecca West é, por
sua vez, único e denso, uma janela aberta no muro da perspectiva convencional e
uniformizada sobre a época em questão. A dado ponto, salientando a capacidade
da Alemanha para reerguer a sua indústria no pós-guerra, ela escreve: «Os
alemães prestaram-nos um serviço ao livrarem-nos da culpa do nosso pecado
contra os refugiados.» E, mais uma vez, a sua clarividência dá que pensar,
apontando para que «o argumento político mais decisivo do nosso tempo não será
lido em livros, será vivido».</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<i>
</i><br />
<div class="MsoNormal">
<i>Estufa com Ciclâmenes</i>, Rebecca West, Relógio d'Água, 162 págs., 15 euros</div>
<b>
</b><br />
<br />
<b>Jornal «i» 03-10-2016</b><br />
<b>© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)</b>Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-45928195453783479302016-09-15T16:05:00.000+01:002016-09-15T16:09:04.378+01:00Alexander von Humboldt - Isto anda tudo ligado<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:3 0 0 0 1 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
--></style><span style="font-family: "garamond";"> <a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjNMQhKoCOHostziHERpnACtGaaxc9C1ifp5D5uZhwalkxfUOdIW1kKIR_AYSYURkhEuX6qgCIXDV4jVGAucGlF3ymRsDdK9zhq55W-qKl8ePZUSQO22vdidwt4k-7ZMLoNheQCm_bV42k/s1600/Baron_Alexander_von_Humboldt_by_Julius_Schrader_1859.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjNMQhKoCOHostziHERpnACtGaaxc9C1ifp5D5uZhwalkxfUOdIW1kKIR_AYSYURkhEuX6qgCIXDV4jVGAucGlF3ymRsDdK9zhq55W-qKl8ePZUSQO22vdidwt4k-7ZMLoNheQCm_bV42k/s640/Baron_Alexander_von_Humboldt_by_Julius_Schrader_1859.jpg" width="552" /></a></span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Alexander von Humboldt foi o primeiro a olhar a
terra como um organismo vivo e interdependente e a alertar para a mão
destrutiva do Homem sobre ela. Uma biografia recupera-o como herói de aventuras
e da ciência.</span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">«A natureza, em toda a parte, fala ao homem com
uma voz [que é] familiar à sua alma.» Colocada hoje em destaque, esta frase com
toques <i style="mso-bidi-font-style: normal;">new age </i>passa despercebida ou
é associada, talvez, a uma promoção qualquer de terapias alternativas ou à
defesa do Urso Rosa ou do Tigre da Malcata. Alexander von Humboldt escreveu-a
algures em 1800, resumindo uma inédita valorização das sensações e da reação
emocional para a observação e estudo dos fenómenos naturais. Influenciado por
Kant e por Goethe, o naturalista alemão foi o primeiro a defender a terra como
uma cadeia unificada e animada por forças interativas, logo vulnerável à
intervenção humana nociva (é considerado o pai do ambientalismo), uma rede de
vida cuja compreensão depende obrigatoriamente de uma «impressão do todo».
Humboldt revolucionou a forma como vemos o mundo natural ao ponto de a clareza
e clarividência dos seus ensinamentos apagarem o seu nome da História. Em 2015,
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Invenção da Natureza: As aventuras de
Alexander von Humboldt, herói esquecido da ciência</i> resgatou-o do
esquecimento e conquistou o Costa Biography Award, o mais importante prémio
para este género.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Quando faleceu, em 1859, nas vésperas do
nonagésimo aniversário, era o segundo homem mais famoso do mundo (a seguir a
Napoleão). Centenas de rios, cidades e outros locais haviam sido nomeados em
sua honra, cerca de 5000 cartas eram-lhe dirigidas por ano, o seu nome era
familiar por todo o globo e um anatomista alemão havia mesmo requisitado o seu
crânio para análise aturada (ao que ele ainda respondeu: «preciso da minha
cabeça por mais algum tempo, mas mais tarde terei todo o gosto em lha ceder»). Centenas
de milhares de pessoas compuseram a procissão de um quilómetro e meio que acompanhou
o carro fúnebre através de Berlim, empunhando bandeiras pretas. Nos EUA, os
jornais noticiaram o fim da «era Humboldt». Graças à biografia escrita por
Andrea Wulf, torna-se fácil percebermos hoje o protagonismo deste viajante
científico excepcional, cujas ideias e abordagem multidisciplinar ainda podem
ser tidas como proféticas. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZ2SNc2K8RUaJR9s9IA-Y1R99l-YXlQUV_SQAa1F4CrrTU2SSYhIVOF1IpvjHk5nmPF8lVZMOw6jByd7TW0Ux-ucJiO9altyr9sPV0McEZzubDzp1Wz7A3lTn-LXcKxSlJkNLDJJQfwKo/s1600/img-6.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="458" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZ2SNc2K8RUaJR9s9IA-Y1R99l-YXlQUV_SQAa1F4CrrTU2SSYhIVOF1IpvjHk5nmPF8lVZMOw6jByd7TW0Ux-ucJiO9altyr9sPV0McEZzubDzp1Wz7A3lTn-LXcKxSlJkNLDJJQfwKo/s640/img-6.jpg" width="640" /></a> </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Um colega testemunhou que ele era capaz de
«percorrer a cadeia de todos os fenómenos do mundo ao mesmo tempo» e Goethe,
grande companheiro de debate, explicou que «em oito dias a ler livros não se
conseguia aprender tanto como aquilo que ele nos oferece numa hora». O
essencial do retrato de Humboldt composto por Andrea Wulf (nasceu na Índia,
cresceu na Alemanha e hoje vive em Inglaterra) advém da consulta da sua
correspondência e de múltiplos registos pessoais. Optando por traçar
mini-retratos de várias grandes figuras por ele influenciadas, como Charles Darwin,
Thomas Jefferson, Simón Bolívar, Henri David Thoreau, George Perkins Marsh,
Ernst Haeckel ou John Muir (dedica a estes três os capítulos finais), a
historiadora acentua o valor do legado holístico e interdisciplinar de
Humboldt, a sua ligação excecional da ciência à arte ou à política (foi
anti-esclavagista e anti-colonialista).</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Dissolvidos numa narrativa viva (são raras, e
pouco extensas, as citações do próprio), os dados mais ínfimos sobre a vida, ideias
e viagens de Humboldt são inteligentemente integrados para sustentar, sem
folclore, uma grande ideia de e sobre o protagonista. Wulf segue de muito perto
o herói, mas para nos dar uma perspetiva completa de um caminho de descoberta,
experiência e registo. No mesmo parágrafo, explica-nos que o naturalista
«achava difícil encontrar um método racional para estudar o que o rodeava» e
que, nos cinco anos fundamentais de viagem pela América do Sul, os seus baús se
encheram tão depressa que «tiveram de encomendar mais resmas de papel para
pressionar as suas plantas e, por vezes, encontravam tantos espécimes que mal
conseguiam levá-los para casa».</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiXMy3P4H5RaPgmgoLq4iv_sJSU2ehgodsVqKeC-AA8gdbQNL7oSCBog6WABfT8iUWOb2BwnnNuOau4uZZHwfNon8_pM4DbamjlEllAuC-UPOeMTKJCWBpJsfN7_tboKtOkyo2el0XJ85M/s1600/Alexandre_humboldt.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiXMy3P4H5RaPgmgoLq4iv_sJSU2ehgodsVqKeC-AA8gdbQNL7oSCBog6WABfT8iUWOb2BwnnNuOau4uZZHwfNon8_pM4DbamjlEllAuC-UPOeMTKJCWBpJsfN7_tboKtOkyo2el0XJ85M/s640/Alexandre_humboldt.jpg" width="462" /></a> </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Humboldt perseguiu cada um dos fios da teia da
vida, a 6000 dos 6300 metros de altitude do equatorial vulcão inativo
Chimborazo, nas profundezas da floresta tropical (onde se deliciava com o coro
dos macacos, procurando distinguir as contribuições das várias espécies) ou nas
plantações coloniais junto ao lago venezuelano Valencia, onde primeiro se
apercebeu do efeito devastador das desflorestações, tal como na siberiana
estepe de Barada, dizimada pela epidemia de antraz, confirmou o impacto
ambiental da agricultura intensiva. Atento às diferenças e semelhanças entre as
coisas que via, mais do que à sua classificação, concluiu que os «poderes
orgânicos trabalham incessantemente» e a vida pulsa por todo o lado. Isso mesmo
tentou reproduzir (foi o primeiro divulgador científico com impacto<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>transversal e universal) numa proto-infografia,
um desenho de 90 por 60 centímetros representando o Chimborazo em corte
transversal e toda a variedade e riqueza da rede de vida que o compunha. A
biografia de Andrea Wuld reprodu-lo também a ele, Alexander von Humboldt,
assim, detalhado e completo, uma «fonte que nunca secou».</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i><span style="font-family: "garamond";">A Invenção da Natureza</span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Andrea Wulf</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Temas e Debates / Círculo de Leitores</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">568 págs., 22.20€</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">SOL | 30-07-2016 </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">© Filipa Melo (Reprodução integral interdita sem autorização prévia)</span></div>
Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-62459633093742335492016-09-08T15:58:00.003+01:002016-09-08T15:58:49.915+01:00Svetlana Alexievich - A Guerra Não Tem Rosto de Mulher <a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEieW4Sfss5iIOoEdWIQHQ4CsjrMZ0tFJEraVmvLTkBAby0HrJBL2-cFgNr5ImupLlowdZTFKu47yAiRGS2CVnh2kGOkQGhJaQTvoBRpw4GyY8b0Ux9FOisAYOdjxh3qo4YkFmy3H5Yv2Ko/s1600/main_1200.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="416" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEieW4Sfss5iIOoEdWIQHQ4CsjrMZ0tFJEraVmvLTkBAby0HrJBL2-cFgNr5ImupLlowdZTFKu47yAiRGS2CVnh2kGOkQGhJaQTvoBRpw4GyY8b0Ux9FOisAYOdjxh3qo4YkFmy3H5Yv2Ko/s640/main_1200.jpg" width="640" /></a>
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:1 134676480 16 0 131072 0;}
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:1 134676480 16 0 131072 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1107305727 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:3 0 0 0 1 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: Garamond;"></span><span style="font-family: Garamond;"></span><b><span style="font-family: Garamond;">Apertem o coração em punho</span></b><b>
</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<br /></div>
<div style="text-align: center;">
<b>
</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<b><span style="font-family: Garamond;">Svetlana Alexievich inaugurou um género novo, o
«romance de vozes», com uma história feminina do conflito russo-alemão de
1941-45, composta após sete anos de pesquisa e a colagem de testemunhos de mais
de 200 mulheres ex-combatentes. Este é um dos mais terríficos e sensíveis
registos de guerra, capaz de fazer chorar ou vomitar até os generais.</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">«Ai, meninas, a guerra é mesmo sórdida... Vista
com os nossos olhos. Olhos de mulher... É ainda mais horrenda. Por isso não nos
questionam...» Algumas tinham pouco mais de 15 anos («fui combater tão nova,
que durante a guerra até cresci»). Cortaram-lhes as tranças (ficava só um pequeno
topete), formaram-nas, deram-lhes fuzis, muitas vezes maiores do que elas, encaminharam-nas
para o combate, para os serviços e os hospitais militares. Elas partiram felizes
por irem defender a Pátria. Nas unidades do Exército Vermelho ou integradas nos
destacamentos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">partisans</i>, mataram e
viram matar e morrer. «Amigas, sequem as lágrimas. Apertem o coração em punho.»
Presenciaram e viveram os mais cruéis, os mais desumanos atos de violência.
Endureceram.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Depois? A guerra acabou e mandaram-nas calarem-se.
Muitas regressaram às suas aldeias e as famílias enxotaram-nas; traziam
medalhas e honras, mas vinham desonradas por terem estado com os homens na
frente. Já não sabiam usar vestidos, andar de saltos, pintar os lábios, várias
delas haviam mesmo deixado de menstruar e outras, apesar de terem pouco mais de
20 anos, tinham o cabelo todo branco. Quatro décadas mais tarde, uma delas
disse: «Vou-te explicar: recordar é terrível, mas não recordar é mais terrível
ainda.» E outra: «Sim, vencemos, mas a que preço? A que terrível preço?»</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Quase um milhão de mulheres soviéticas participaram
na Grande Guerra Patriótica, desempenhando todas as profissões militares, e foram
depois silenciadas sobre as suas experiências e o seu contributo para a gloriosa
Vitória. No final dos anos 1970, uma jovem jornalista, natural de Minsk,
capital da Bielorrússia, seguiu o rasto das ex-combatentes e registou mais de
500 encontros com elas. A seleção e súmula tratada do testemunho de cerca de
200 dessas vozes escutadas por Svetlana Alexievich chama-se <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Guerra Não Tem Rosto de Mulher </i>e é um
documento histórico e literário de importância maior. Acaba de chegar às
livrarias portuguesas, pela Elsinore (400 págs., 20.99 euros).</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Rejeitada pelos editores soviéticos e só editada
aquando da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">perestroika</i>, em 1985, a
primeira edição do livro teve uma tiragem de dois milhões de exemplares e inaugurou
o projeto literário Vozes da Utopia, que a autora dedicou à história moral do «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">homo sovieticus</i>». Compõem-no: </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">As
Últimas Testemunhas: cem histórias nada infantis</span></i><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> (1985, memórias de quem era criança na
Segunda Guerra; a editar pela Elsinore em 2018), <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Rapazes de Zinco</i> (1989, relatos de veteranos e mães de combatentes
soviéticos na Guerra do Afeganistão; a editar pela Elsinore em 2017), <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Encantados pela Morte</i> (1993, sobre
suicídios motivados pela queda do regime soviético), <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Vozes de Chernobyl: história de um desastre nuclear</i> (1997,
Elsinore) e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Fim do Homem Soviético: um
tempo de desencanto </i>(2013, Porto Editora). Por estes cinco «romances de
vozes» e pela criação de um novo género literário de não-ficção, «f</span><span style="font-family: Garamond;">eito de vozes reais e confissões, testemunhos e evidências
documentais</span><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">», Svetlana
Alexievich ganhou o Prémio Nobel da Literatura em 2015.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> <a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEht3Pc2eBbAXu-yKicY4EAu9eHLAmulqPShjjPCKwKpLiVcGnbzfrbyRbGJzKK2lIy4T1BTCsRFdhC-_UHUgtznfzOu7bzw7RK7BcyeReueNrkX5BV7rGE4QW0TJgQ6LmmBjchQl5YTBKU/s1600/775%252Bconfirmed%252Bkills%252Bin%252Bone%252Bpicture%252C%252B1945.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEht3Pc2eBbAXu-yKicY4EAu9eHLAmulqPShjjPCKwKpLiVcGnbzfrbyRbGJzKK2lIy4T1BTCsRFdhC-_UHUgtznfzOu7bzw7RK7BcyeReueNrkX5BV7rGE4QW0TJgQ6LmmBjchQl5YTBKU/s640/775%252Bconfirmed%252Bkills%252Bin%252Bone%252Bpicture%252C%252B1945.jpg" width="410" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">«A guerra é uma experiência demasiado íntima. E
tão infinita como uma vida humana..» Para Alexievich, que se intitula
«historiadora da alma», o desafio era dar voz ao protagonista concreto de um
tempo (passado) e de uma experiência concreta, mas captar nele os sentimentos e
o sofrimento (pedra-de-toque dos seus grandes mestres russos: Dostoiévski, </span><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Tolstoi e <em><span style="font-family: Garamond;">Tchékhov</span></em></span><span style="font-family: Garamond;">),
lapidar dele a «trepidação da eternidade» e assim «unir a fala da rua e a da
literatura». No primeiro prefácio de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A
Guerra Não Tem Rosto de Mulher</i>, explicou: «[Quis] escrever um livro sobre a
guerra de modo que a guerra provoque náuseas e que a própria ideia dela seja
repugnante. Demente. Que faça vomitar até os próprios generais».</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Como inspiração, a escritora apoiou-se no livro
que mais a marcou após concluir a sua formação em Jornalismo: </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Sou
da Aldeia Incendiada</span></i><span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> (1977), assinado por
Janka Bryl, Vladzinik Kalesnik e Ales Adamovich (que se tornaria o seu principal
mentor). Nele, o relato dos incêndios das aldeias bielorussas pelos nazis (de
que há também registos impressionantes em </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond;">A Guerra Não Tem Rosto de Mulher</span></i><span style="font-family: Garamond;">) parte do discurso na primeira pessoa de múltiplas
testemunhas, que os autores editaram o mínimo possível e fundiram com elementos
esparsos da sua autoria. Svetlana interessou-se de imediato por esta técnica de
registo da história oral. Comprou um gravador, partiu à procura de depoimentos
sobre a migração do campo para a cidade (de que resultou um primeiro
manuscrito, não editado) e apurou lentamente a justaposição de testemunhos
transcritos e a sua seleção, edição e compilação final, sem apoio de cronologias
ou outros elementos contextuais. Nasceu assim o «romance de vozes» ou
«romance-oratório» (Ales Adamovich), um romance-painel de vozes anónimas,
reais, registo inédito do passado quotidiano na primeira pessoa vivida, sem
heróis, personagens ou esqueleto narrativo. A história do «pequeno grande
homem» apanhado nas malhas da grande História.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond;">Perfeitamente adaptado ao tema da ascensão e queda
da utopia soviética, o novo género de gravação e registo literário de
testemunhos anónimos desenvolvido por Svetlana Alexievich afirma-se igualmente
como anti-ficção, porque valoriza a experiência individual em detrimento da
efabulação literária ou do mito coletivo. Neste registo, de livro para livro de
Vozes da Utopia, revela-se o complexo processo psicanalítico por que passaram
os habitantes da ex-URSS na conquista de uma identidade individual (e original,
nesse sentido), ao invés da crença cega no valor da Pátria e do sofrimento em
nome dela e de um destino épico.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: Garamond; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Em </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: Garamond;">A Guerra Não Tem Rosto de Mulher</span></i><span style="font-family: Garamond;">, este resgate de voz própria é uma missão
plenamente assumida pela autora. Tendo crescido na sombra da morte e da guerra,
entre vozes e choros das mulheres da aldeia, cujo sofrimento trágico e
enigmático a assustava e fascinava, Svetlana quis escrever a história feminina
da guerra. Uma guerra <i style="mso-bidi-font-style: normal;">feminina</i>, com
cores, cheiros, iluminação, espaço de sentimentos e palavras próprias, uma
guerra onde «não há heróis nem proezas incríveis, mas tão-só as pessoas
ocupadas na sua atividade humana e simultaneamente desumana». Quarenta anos
após regressar da frente, uma mulher diz: «Pergunte-me: o que é a felicidade?
Respondo: é encontrar alguém com vida entre os mortos.» Acrescentamos: e deixar
esse alguém falar.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<b>Jornal «i», 05-09-2016</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-83224799765592092202016-08-26T14:49:00.001+01:002016-08-26T14:56:08.024+01:00Manuel António de Vasconcelos - Um moderno na ilha<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi7cOHoW59E1tI2oXhnA4N4BAjayOS1wtbE3Xc-Am1M5eMmfmpEuDDssOwFcwNWQWCQIZxcQRUbEI33p0aS3Yqri60YhK9ie8mb86O5oKxlt4aYCkDEXnzRyfHZAG_g5r5GRUFpXHjuHYI/s1600/Aguarela+de+MAV.+Hall+do+Casino+das+Furnas.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="312" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi7cOHoW59E1tI2oXhnA4N4BAjayOS1wtbE3Xc-Am1M5eMmfmpEuDDssOwFcwNWQWCQIZxcQRUbEI33p0aS3Yqri60YhK9ie8mb86O5oKxlt4aYCkDEXnzRyfHZAG_g5r5GRUFpXHjuHYI/s640/Aguarela+de+MAV.+Hall+do+Casino+das+Furnas.jpg" width="640" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><br /></td></tr>
</tbody></table>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Sem
mestre, tertúlia ou seguidores, Manuel António de Vasconcelos, o engenheiro
químico que se fez arquiteto, levou o modernismo até aos Açores. Sai nova obra
de resgate do seu legado.
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Era
costume ser visto a circular pelas ruas de Ponta Delgada, ao volante de um Ford
Taunus azul clarinho, com <i style="mso-bidi-font-style: normal;">design</i> e
cor bastante insólitos para a época e para a ilha. Entre 1933 e 1942, quando o
açoriano Manuel António de Vasconcelos (1907-1960) produziu o essencial da sua
obra arquitectónica, tornou-se evidente que o gosto estético e a sensibilidade
técnica que exibia excediam em muito os dotes artísticos de base e a formação
em engenharia química (com especialidade em açúcares) adquirida na Bélgica. O
estilo distinto deste arquiteto autodidata provinha sobretudo de Paris (e de
curtas incursões na Holanda e na Alemanha) e dos nove meses que ali passara
numa espécie de ano sabático, a apurar o seu <i style="mso-bidi-font-style: normal;">hobbie</i>, a pintura, na Academia dirigida por Maître Emile Renard, a
contatar com artistas (como o escultor Ernesto Canto Maia, seu conterrâneo) e a
imbuir-se de referências estéticas modernistas (como a do arquiteto Robert
Mallet-Stevens) e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">art déco</i>. Disso
fazem prova ainda hoje as obras-maiores, o que dela resta ou ficou registado: o
Casino das Furnas (1937/8, desenhado de raiz), o Hotel Terra Nostra (de 1935; «uma
nota perfeita de civilização, em tão remotas paragens», destacaria Raul Lino),
a Barbearia Gil (incrustação subversiva num edifício de traça oitocentista,
destacada pelo arquiteto <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Francisco Gomes
de Menezes «pelo requinte e ousadia»), o Montepio Terceirence (1939; onde
perseguiu também «o gosto até ao pormenor, na caracterização de uma determinada
atmosfera», segundo o arquiteto João Maia Macedo), os vários projetos
residenciais (entre eles, a moradia de família, sóbria e geometricamente
elegante), o Armazém de Chá de Porto Formoso (1937) ou o edifício dos
Produtores de Papel (1952).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiAIrk-OG1XXQlRukvYKsrAj7f9bjHy27EtCb5zTQxUARQEXHnH4qv-UigRhUWLRH1AV7VYPTeCEefBD0tn_67nZyjGWo2co7Dg2k9kqxcSnKfXoC5uaTDY7wOwhzcpLaP9Uljlg0X8t54/s1600/MAV+desenhando+no+jardim+de+sua+casa+%2528DR%2529.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiAIrk-OG1XXQlRukvYKsrAj7f9bjHy27EtCb5zTQxUARQEXHnH4qv-UigRhUWLRH1AV7VYPTeCEefBD0tn_67nZyjGWo2co7Dg2k9kqxcSnKfXoC5uaTDY7wOwhzcpLaP9Uljlg0X8t54/s640/MAV+desenhando+no+jardim+de+sua+casa+%2528DR%2529.jpg" width="496" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">MAV desenhando no jardim de sua casa (© D.R.)</td></tr>
</tbody></table>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Em
1993, saíra já uma biografia do arquiteto açoriano, assinada por Manuel
Ferreira. O resgate do seu contributo prossegue agora, com a edição, pelo
Instituto Cultural de Ponta Delgada, de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Manuel
António de Vasconcelos: pioneiro da arquitectura modernist</i>a, da autoria de
Cristina Cordeiro, jornalista, ex-diretora das revistas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Casa Cláudia</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Arquitectura</i>
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">&</i> <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Construção </i>e CUBO, aqui assistida na pesquisa por Ana Maria
Vasconcelos Faria e Maia (filha do visado). À venda nos Açores, o álbum
ilustrado chegará ao continente em Setembro. É um trabalho delicado de pesquisa,
contextualização e validação.
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Manuel
António de Vasconcelos, neto do fundador do jornal <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Açoriano Oriental</i>, foi engenheiro químico, diretor da Fábrica de
Açúcar de Santa Clara (como o havia sido o seu pai) e diretor técnico da
Fábrica de Papel, arquiteto autodidata e diretor artístico e técnico ao serviço
da Sociedade Terra Nostra. Vale a pena descobri-lo através dos documentos
coligidos: por exemplo, a revista <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Architectes
de Gand</i> dedicada a três arquitetos flamengos que o terão influenciado;
anotações criteriosas dos caderninhos pretos que dedicou às obras da Sociedade;
fotografias de época que ilustram como simulou, de modo precursor, o uso de
betão; aguarelas do próprio, plantas e fotografias atuais das obras. O cuidado
da jornalista na pesquisa resulta em detalhes deliciosos, como a inclusão de uma
planta de interior desenhada de memória e comentada pela filha de dois antigos
empregados da Casa de M. Friedman (1939-42). Na parte final do livro, seis
entrevistas e um ensaio (pela historiadora de arte Isabel Soares de Albergaria)
validam a revisão crítica da concepção arquitectónica de um modernista, «muitas
das vezes mais por desejo do que por realidade» (José Manuel Fernandes), com
obra breve, mas marcante.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Manuel António de Vasconcelos: Pioneiro da
Arquitectura Modernista</i>, Cristina Cordeiro, Instituto Cultural de Ponta
Delgada, 156 págs.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEijKDLjNUGfSGAC2W7gB8XJCsJFyoWXkqZngv1MyS_XVMYoYmDLbi_si_vM8jInfgeDN5kJwaXHvIRZP4YYOoGVjU9ff0BOJxOwFSHc-iloKgKn-TuxNTtD1ZyXV2jWPW1TcapCyppRIcQ/s1600/CAPA+DO+LIVRO.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="400" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEijKDLjNUGfSGAC2W7gB8XJCsJFyoWXkqZngv1MyS_XVMYoYmDLbi_si_vM8jInfgeDN5kJwaXHvIRZP4YYOoGVjU9ff0BOJxOwFSHc-iloKgKn-TuxNTtD1ZyXV2jWPW1TcapCyppRIcQ/s400/CAPA+DO+LIVRO.jpg" width="311" /></a> </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<b>Jornal "i" 02-07-2016</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-47618528682164769782016-08-03T17:42:00.000+01:002016-08-03T17:49:47.793+01:00Jean-Jacques Rousseau | Sr. Paradoxo<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:Times;
panose-1:2 0 5 0 0 0 0 0 0 0;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:3 0 0 0 1 0;}
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";}
a:link, span.MsoHyperlink
{mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
color:blue;
text-decoration:underline;
text-underline:single;}
a:visited, span.MsoHyperlinkFollowed
{mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
color:purple;
mso-themecolor:followedhyperlink;
text-decoration:underline;
text-underline:single;}
p
{mso-style-noshow:yes;
mso-style-priority:99;
mso-margin-top-alt:auto;
margin-right:0cm;
mso-margin-bottom-alt:auto;
margin-left:0cm;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:10.0pt;
font-family:Times;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";}
p.descender, li.descender, div.descender
{mso-style-name:descender;
mso-style-unhide:no;
mso-margin-top-alt:auto;
margin-right:0cm;
mso-margin-bottom-alt:auto;
margin-left:0cm;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:10.0pt;
font-family:Times;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";}
p.pullout, li.pullout, div.pullout
{mso-style-name:pullout;
mso-style-unhide:no;
mso-margin-top-alt:auto;
margin-right:0cm;
mso-margin-bottom-alt:auto;
margin-left:0cm;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:10.0pt;
font-family:Times;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";}
span.line
{mso-style-name:line;
mso-style-unhide:no;
font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;}
.MsoPapDefault
{mso-style-type:export-only;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div style="text-align: center;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"> <a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjKTa_FR5EGGyn41Db2SueujHd93g-l9zUgy12qJUMMoREgjgB5_Ja7WQoeAw2gQ6YXFQXuzepIF0l8TASZ0111hRmDl25HwtUDldXzYjKHdVFNIN4zKZQ4wqOp2m_AHUo56luXywLPDyk/s1600/rousseau_jean_jacques_2.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="560" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjKTa_FR5EGGyn41Db2SueujHd93g-l9zUgy12qJUMMoREgjgB5_Ja7WQoeAw2gQ6YXFQXuzepIF0l8TASZ0111hRmDl25HwtUDldXzYjKHdVFNIN4zKZQ4wqOp2m_AHUo56luXywLPDyk/s640/rousseau_jean_jacques_2.jpg" width="640" /></a></b></div>
<div style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Trezentos anos após o
seu nascimento, Jean-Jacques Rousseau permanece um dos mais controversos
contribuidores da grande história das ideias. Terá ele sido um abnegado
filantropo ou um narciso ressabiado? Um libertário democrata ou um potencial
totalitarista? Com as comemorações, renasce o debate sobre a importância e
atualidade dos pensamentos do cidadão de Genebra.</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
«Nasci quase morto.» Ao ver pela primeira vez a luz do dia,
a 28 de Junho de 1712, Jean-Jacques Rousseau provoca a morte da mãe (Suzanne
Bernard, filha de um relojoeiro) e enfrenta um primeiro combate com a sua própria
morte, que o vencerá apenas aos 66 anos, em 1778, vítima de hemorragia. Graças
ao desvelo de uma tia, a criança sobrevive, mas permanece sempre no homem uma
infantil necessidade de atenção maternal e uma sensação de orfandade e
desajuste no contacto com os outros, compensadas ambas por um ímpeto truculento
e seguro de si e um grande amor à natureza e à solidão. O pai, Isaac Rousseau, descendente
de huguenotes franceses e relojoeiro de profissão, guarda, entre as ferramentas
do ofício de alta precisão, «as obras de Tácito, Plutarco e Górcio». É um homem
culto, independente, arrebatado e muito pouco convencional. Obrigado a
abandonar Genebra devido a uma rixa, abandona também o filho, com quem irá
manter um contacto irregular, mas terno.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Jean-Jacques convence-se mais tarde de que o progressivo
afastamento por parte do pai se deveu ao facto de este não querer reivindicar
junto do filho o direito a também usufruir da pequena herança materna. Na
primeira parte das memórias autobiográficas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Confissões</i>
(edição póstuma em 1782; a segunda parte, em 1789), escreve: «Extraí daí esta
grande máxima de moral, talvez a única de utilidade prática, que é a de evitar
as situações que põem os nossos deveres em oposição com os nossos interesses, e
nos revelam o nosso bem no mal dos outros, convencido de que, em tais situações,
mesmo que a elas tragamos um sincero amor da virtude, fraquejamos mais cedo ou
mais tarde sem dar por isso, e tornamo-nos injustos e maus nas ações sem
deixarmos de ser justos e bons na alma.» Estabelecida como objetivo para todos
os atos futuros (e, paradoxalmente, não o impedindo de colocar os cinco filhos
na roda em nome da boa educação que não lhes poderia dar; ele, que sempre disse
desprezar o dinheiro, mas que assumia ter «uma avareza quase sórdida»), esta máxima,
central na ideia futura de «felicidade colectiva», provocaria a perplexidade «aos
olhos do público» e, sobretudo, a dos seus «conhecidos».</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Rousseau quer manter a bondade e a justiça na alma porque
acredita que elas são inatas e não dependentes de Deus. Mas, como fazê-lo? Procurando
a virtude, que não se possui de antemão, antes se adquire. Evitando o conflito
entre os seus próprios interesses e os interesses dos outros homens, as situações
passíveis de corromper o desejo do bem dos outros – a base para <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Contrato Social ou Princípios de Direito
Político<span style="display: none; mso-hide: all;">´t﷽﷽﷽﷽﷽﷽﷽﷽reito Polo s e os
paradoxos. os razer» de homens comunspressa a chegada dos nossos dias mmais do
que isso.»)ificialism</span></i>. Mais: rejeitando a supremacia das regras e do
artificialismo que esmagam a simplicidade e naturalidade originais do homem.
Para Rousseau, é neste sentido que a civilização humana, orientada para o
progresso através do avanço da ciência e da tecnologia, resultou numa fraude, pervertendo
o homem, naturalmente bom e justo, no seu caminho de aperfeiçoamento ao
encontro da natureza (escreve, a Voltaire: «se é verdade que todo o progresso
humano é pernicioso para a espécie humana, o do espírito e da inteligência, que
aumenta o nosso orgulho e multiplica os nossos erros, apressa a chegada dos
nossos dias maus»). O conhecimento e a arte apenas trazem proveito ao homem se
forem subjugados às necessidades sociais e à moral.<span style="display: none; mso-hide: all;">a vida﷽﷽﷽﷽ade sociais e penas trazem proveito ao homem se forem
subjugados<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>ia visitaridade smorei mais
do que isso.»)ificialismà moral</span> Contra a voz da razão e da lógica (acessíveis
a poucos), Rousseau enaltece a voz do coração e da consciência (que todos
possuem). Em vez dos pré-conceitos, privilegia os exemplos e os paradoxos. Aos
salões elegantes e civilizados, aos filósofos «impostores», o pensador
genebrino virará as costas, em favor da virtude desafectada, do humanitarismo e
da vida campestre. Ao teatro e à hipocrisia social, oporá a solidão e a
sinceridade individual.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Em 2012, a obra do autodidata Jean-Jacques Rousseau («Eu
estava destinado a ser o rebotalho de todas as profissões»), tão contraditória
e tão exaustivamente contraditada, continua a colocar perguntas para as quais
ainda não encontrámos (boas) respostas. É inegável que a sua teoria do homem plantou
muitas das mais importantes sementes da modernidade. Rousseau estabeleceu o
cisma entre as ciências, as «artes» (mecânicas e belas-artes) e a moral e conduziu
o homem à divisão entre o sentimento e a razão. Graças a ele, e ao seu intempestivo
questionamento das convicções iluministas, a Revolução Francesa consagrou como
lema três princípios fundamentais, tão consubstanciais como a identidade das três
pessoas da Santíssima Trindade, e ainda hoje em vigor como grande utopia humana:
Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Foi com Rousseau, e com <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Émilio ou da Educação</i>, que a criança
deixou de ser vista como um pequeno adulto, para se tornar objeto de atenção e direitos
específicos e o centro do processo educacional. É ele quem primeiro elogia a
formação no meio familiar e o vínculo materno através da amamentação e quem faz
nascer uma relação estreita entre política e educação. Foi Rousseau quem elevou
o homem a sujeito da sua própria vontade e, em simultâneo, o condenou à consciência
do perpétuo conflito entre as ações e os propósitos morais. Por tudo isto, eis-nos
ainda hoje às voltas com o paradoxo Rousseau. É ao cidadão de Genebra (apodo que
colocava no frontispício dos seus livros) que podemos agradecer a
responsabilização de cada homem como autónomo construtor e legislador da sua
vida (raiz da filosofia prática kantiana) e o desenvolvimento deste conceito até
à noção de Estado de Direito (cunhada pelo jurista alemão Robert von Mohl, em
1835) e de Liberalismo (enquanto expressão dos direitos individuais e do governo
representativo). Mas é também em Rousseau que repudiamos uma justificação
racional para a alienação de todos os direitos individuais em nome do direito
da sociedade a forçar os homens a serem livres. Da sujeição total a um contrato
social como <i style="mso-bidi-font-style: normal;">vontade </i>geral, nasce a
legitimidade de um Estado omnipotente, ao qual se deve submissão total, terreno
fértil para os déspotas absolutos e os totalitaristas.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Pleno homem e cidadão do seu tempo, Jean-Jacques Rousseau previu
ele mesmo que o julgariam noutros tempos. Apesar do seu gritante narcisismo e de
um neurótico complexo de perseguição, não terá sido capaz de imaginar a que
ponto o fariam (Isaiah Berlin, por exemplo, explicita que o mal por ele
provocado consiste «em ter iniciado a mitologia do eu verdadeiro, em nome do
qual nos é permitido forçar as pessoas» e aponta-o como «um dos mais funestos e
formidáveis inimigos da liberdade em toda a história do pensamento moderno»).
Nas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Confissões</i>, Rousseau prometeu
pintar-se «tal como sou», expondo ao mundo os pormenores mais ínfimos de «um
destino que não tem exemplo entre os mortais», julgando torná-lo assim um monumento
seguro contra os ataques e as desfigurações dos inimigos: «Quero mostrar aos
meus semelhantes um homem em toda a verdade da natureza, e esse homem serei eu.
[…] ouso crer não ser feito como nenhum dos que existem. […] Soe a trombeta do
juízo final quando lhe aprouver; irei com este livro na mão apresentar-me ao
juiz supremo» [tradução de Fernando Lopes Graça para a única edição disponível
de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Confissões</i>, da Relógio D’Água, com
prefácio de Jorge de Sena]. A si mesmo, Rousseau impunha a tarefa de «ser
verdadeiro»; ao leitor, a de «ser justo» («Nunca lhe pedirei mais do que isso»).
Se possuía algum defeito, deus nosso, era apenas o de ser... brutalmente
honesto e justo consigo mesmo (como pretendeu também em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Rousseau juge de Jean-Jacques</i>). Mais uma vez, caiu na espiral
contorcida do paradoxo.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Primeiro educado numa escola religiosa, na companhia feliz
de um primo e melhor amigo de infância, Jean-Jacques falhou como aprendiz de
notário e foi colocado na oficina de um gravador tirano, de onde fugiu, aos 16
anos, para correr mundo. Em Annecy, depois em Chambéry, às portas dos Alpes, acolhe-o
a deísta suíça Madame Warens, descendente de uma nobre e antiga família, primeiro
e grande amor da sua vida (chamava-lhe «Maman»), fonte da aprendizagem das
maneiras de sociedade, da conversão temporária ao catolicismo e do contacto com
a filosofia e a música (Rousseau ganha primeiro fama como compositor e, durante
muito tempo, vive da transcrição de partituras; assina as 200 entradas da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Encyclopédie</i> sobre música, produzidas em
apenas três meses, e um muito reputado <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Dicionário
da Música</i>). Pouco mais tarde, em Itália, enquanto lacaio da altiva Madame
de Vercellis, Jean-Jacques experimenta pela primeira vez «aquele jogo maligno
dos interesses ocultos em que esbarra[rá] toda a vida e que provocou [nele] uma
bem natural aversão pela ordem aparente que os gera». Morta a senhora, o rapaz
rouba-lhe uma fita velha. Acusado pelo furto, incrimina a cozinheira. Rousseau
garante que, quarenta anos depois, a lembrança deste episódio e a necessidade
de repor a justa verdade foram o principal motor para escrever as <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Confissões</i>. Em contraponto à obra homónima
de Santo Agostinho, estas irão abrir portas para a secularização da escrita de
memórias, como gesto puramente público, terapêutico ou literário.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: center; text-indent: 7.1pt;">
<br />
<br />
<div style="text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjv7Ysuv-JhND27pGZc5E58ccpxrpVst7vI1Gv6lPtausQcLohmZzcVjRKYUBGP9NPgnDfVzrS5n50uKbHZOLQYpzj0lR7wANC_x8368O0Sj4ilHnQyzqPqwbgO0g_cPSzWy1exnJe7sv4/s1600/AnticStore-Large-Ref-45004_02.jpg" imageanchor="1"></a><br /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
<div style="text-align: center;">
<br /></div>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Jorge de Sena aponta uma questão fundamental: «O que choca,
em Rousseau, é a contraditória complacência consigo mesmo e as suas recordações
e o tom perturbado e perturbador em que estas são evocadas.» Salientando o carácter
obsessivo da narração de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Confissões</i>,
Sena acha-o chocante porque aquela é «uma obra-prima indecisa entre o documento
e a arte». Disfarçado sob<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>a ambiguidade
estética, o livro está carregado de «ilusões moralistas». «A hipocrisia de
Rousseau é a homenagem do seu individualismo, da sua sensibilidade, do seu
anseio de ser ele mesmo único e irrepetível, aos preconceitos legalistas e moralistas
da sociedade burguesa [e, acrescente-se, da sociedade do espetáculo] que ele
anunciava.» Rousseau, com a sua retórica persistente e a sua suposta nudez
confessional, a sua conjugação explosiva de criatividade e narcisismo, lega-nos
o problema da confusão entre a sinceridade estética e a sinceridade do indivíduo.
Edmund Burke repudia-o em particular por essa «nova espécie de glória» que ele
conquista por trazer à luz «vícios obscuros e vulgares» que sabemos que muitas
vezes afectam «até os talentos mais eminentes». Para Sena, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Confissões</i> «é um grande livro irritante e comovente, atraente e
repulsivo, em que a chateza e a profundidade estão indissoluvelmente ligadas. […]
É a história dolorosa de uma ascensão para a genialidade. […] O anseio de
justificação de uma vida pela mesma vida, a fúria de impor aos outros a própria
personalidade, a inquietação desesperada do homem que ascende socialmente pelo
próprio mérito mas nunca adquire um <i style="mso-bidi-font-style: normal;">status</i>
definido — a tudo isso trouxe Rousseau uma coloração nova.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Rousseau, que sempre foi pobre e descendia «com todo o
prazer» de homens comuns, mantém toda a vida um sublimado complexo de classe; não
o superará nem com a amizade dos enciclopedistas e a plena integração nos salões
parisienses, nem com a fama e glória que o público lhe devota desde os 37 anos
de idade e o ensaio <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Discurso sobre os
efeitos morais das Artes</i> <i style="mso-bidi-font-style: normal;">e das Ciências
</i>(primeiro prémio num concurso da Academia de Dijon e resultado de uma «inspiração
súbita» numa tarde quente de Outubro de 1749, no caminho para Vincennes, onde
ia visitar o amigo Diderot, preso por ter violado a censura). Ao contrário de
Voltaire, que também não possuía ascendência nobre, Jean-Jacques jamais
pretende ascender socialmente ou conquistar a unanimidade: «Nada me pareceu
maior e mais belo do que ser livre e virtuoso, acima da fortuna e da opinião, e
bastarmo-nos a nós mesmos.» O puritanismo original e um apego sempre presente
aos oprimidos molda a sua observação crítica do mundo e fá-lo decidir-se a quebrar
as amarras que o prendem à vida em sociedade. Rompe com os amigos. Larga os
dourados e as meias brancas, põe uma peruca redonda, depõe a espada e vende o
relógio. Instala-se numa pequena aldeia e aspira a ser um camponês anónimo,
dependente apenas do caderno branco e do lápis que levava sempre na algibeira
para longos passeios meditativos. De ocupação em ocupação, de mulher em mulher,
Rousseau repudiara as convenções. Nenhum como ele vivera todos os cambiantes de
categoria social. Ele é aquele que experimenta, depois recua, assiste de longe,
e vê. Nada como a filosofia, ligando-o ao essencial da religião, o «havia
libertado daquela moxinifada de formulazinhas com que os homens a obscurecem».
Só no encontro com a natureza (aos 65 anos, dedica-se à Botânica), Jean-Jacques
Rousseau se torna verdadeiramente livre, o narrador pacificado dos incompletos <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Devaneios de um Caminhante Solitário</i> (antecedente
remoto do trabalhador no gozo de férias pagas ou da reforma).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
O trabalho de interpretação da álgebra iluminista e dos
paradoxos radicais e desestabilizadores do pensamento de Rousseau começa a ser
feito ainda em vida do autor, mas excede-a num desentendimento sem remédio. Os
enciclopedistas não lhe perdoam o desprezo pelo luxo («essa tão necessária coisa»,
Voltaire) e pelas ideias de progresso, refinamento e liberdade que preconizam. Os
românticos recuperam-no na defesa de que o homem deve viver não só pela razão,
mas pelo instinto e pela emoção. O sonho americano encontra fundamentos na sua
confiança na meritocracia. As suas reticências quanto à civilização cosmopolita
servirão tão bem os habitantes das periferias urbanas, os ambientalistas ou os
adeptos de um êxodo para o campo. A filosofia plástica de Rousseau serve todos
e nenhum por completo, sendo o seu nome mais popularmente associado a mitos e a
lugares-comuns. Entre eles, destaquem-se o conceito de Bom Selvagem e a defesa
do primitivismo ou a leitura incompleta da frase «O homem nasceu livre e,
todavia, por toda a parte se encontra a ferros» como uma espécie de apelo ao
anarquismo — quando o pensador pretendeu tão só sustentar a passagem do estado
de natureza ao estado social, do poder físico ao poder moral, ou seja,
legitimar as leis e a subordinação política: «O que o homem perde pelo contrato
social é a sua liberdade natural e um direito ilimitado a tudo aquilo que lhe é
necessário; o que ele ganha é a liberdade civil [limitada pela convencionada <i style="mso-bidi-font-style: normal;">vontade geral</i>] e a propriedade de tudo
aquilo que possui.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;">
Jean-Jacques Rousseau, cidadão de Genebra (como das
idealizadas Roma ou Atenas), J.J., autor mais de um diagnóstico do que de uma
reforma radical, mantém-se hoje como o filósofo mais enigmático do século
XVIII. Nele, como resume Laurence Mall (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Magazine
Littéraire</i>), «as máquinas de fazer sonhar são também máquinas de fazer
pensar, e máquinas de guerra». A sua obra permanece «um vasto terreno de demolição»
e Rousseau, paradoxalmente capaz de «lirismo político» e «emoção filosófica»,
criador de um «sonho antropológico» e de «uma reflexão sensivelmente universal»,
persiste sendo aquilo que sempre quis ser: um homem verdadeiramente singular.</div>
<br />
<br />
LER Junho 2014<br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-78740838950652640732016-07-27T22:23:00.002+01:002016-07-28T19:36:17.133+01:00Ulisses de James Joyce | A literatura é para os fortes<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:Arial;
panose-1:2 11 6 4 2 2 2 2 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536859905 -1073711037 9 0 511 0;}
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1791491579 18 0 131231 0;}
@font-face
{font-family:Cambria;
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:-536870145 1073743103 0 0 415 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;
mso-bidi-font-family:"Times New Roman";
mso-bidi-theme-font:minor-bidi;}
@page WordSection1
{size:595.0pt 842.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiOceyxXJ9mqgRH5YFRHLsrTrokzn265a1z1n95hi6wJygd7WKUQKUTLi8k6Bwvm4Gdc_9d5WgSY4w0bvDuYSYq4Q-17mWIY4nMIPnoWfX46F4Suzz0MVpFRQLrVyXxWzvZT9TdqyFRmbs/s1600/jamesjoyce.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="482" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiOceyxXJ9mqgRH5YFRHLsrTrokzn265a1z1n95hi6wJygd7WKUQKUTLi8k6Bwvm4Gdc_9d5WgSY4w0bvDuYSYq4Q-17mWIY4nMIPnoWfX46F4Suzz0MVpFRQLrVyXxWzvZT9TdqyFRmbs/s640/jamesjoyce.jpg" width="640" /></a><br />
<b></b><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b>Modelo
de linguagem ultra modernista, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>
tem novo tradutor em português. Para Jorge Vaz de Carvalho, o romance de James
Joyce só será lido por uma elite intelectual, disposta a perder o pé numa
tempestade de vagas altas. Mas o que ali está não é um mar, antes um lago onde
navega o herói grego transformado em homem comum.</b></div>
<b>
</b><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
A
tia Josephine ajudou James Augustine Aloysius Joyce (1882-1941) nos detalhes
mais ínfimos da composição do mapa concreto de Dublin em 1904. Em troca, ele
obrigou-a a ler <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Odisseia</i> de Homero
para compreender melhor o seu <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Ao
amigo italiano Carlo Linati, o escritor irlandês enviou um <i style="mso-bidi-font-style: normal;">resumo-chave-esqueleto-esquema</i>, para entrar no <i style="mso-bidi-font-style: normal;">romance-monstro</i>, «uma epopeia de duas raças (israelita-irlandesa) e
ao mesmo tempo o ciclo do corpo humano, uma pequena história de um dia de vida e
uma espécie de enciclopédia».</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Jacques
Benoîst-Méchin não teve direito ao esquema de Linati, apenas à informação de
que os enigmas e quebra-cabeças do romance ocupariam os académicos durante
séculos, a tentarem adivinhar o que Joyce quis dizer. Esse seria o melhor modo
de lhe garantirem a imortalidade.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Em
1922, em Paris, pouco antes da primeira publicação integral do romance por
Sylvia Beach, Joyce disse a Djuna Barnes: «O mal é que o público há de pedir e
há de encontrar lições morais no meu livro, mas dou-lhe a minha palavra de
honra de que não há nele uma única linha escrita a sério.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
O
poeta americano Max Eastman acusou-o de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">culto
da ininteligibilidade</i> e Joyce respondeu-lhe: «O que peço ao meu leitor é
que dedique a sua vida inteira a ler as minhas obras.» Coisa pouca, ainda há quem
esteja disposto a isso?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>volta às livrarias portuguesas pela
editora Relógio d’Água, 47 anos após a primeira tradução, assinada pelo
filólogo brasileiro Antônio Houaiss, e 24 depois da adaptação desta por João
Palma-Ferreira. Esta nova tradução é de Jorge Vaz de Carvalho, poeta (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Lenta Rendição da Luz</i>, 1992), ensaísta
e <span style="background: white; color: black;">professor universitário, </span>doutorado
em Estudos da Cultura (com a tese <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Jorge
de Sena:</i> “<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Sinais de Fogo” como
romance de formação</i>), também cantor lírico (barítono) eclético e com uma carreira
internacional consistente. Não se assume como tradutor profissional, mas <span style="background: white; color: black;">traduziu</span><span style="mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"> </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="background: white; color: black;">Ciência Nova</span></i><span style="background: white; color: black;"> de Giambattista Vico (Prémio de Tradução
Científica e Técnica FCT/União Latina 2006), <i>Canções de Inocência e de
Experiência </i><span style="mso-bidi-font-style: italic;">de William Blake</span>
ou <i>Vida Nova </i><span style="mso-bidi-font-style: italic;">de Dante
Alighieri</span>.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Vaz
de Carvalho acusa Houaiss de uma adulteração extrema do texto original e de quase
o usar para construir um determinado modernismo brasileiro. Em contraponto, a
sua tradução, concretizada em dois anos e sustentada por décadas de convívio
com a obra, busca a maior fidelidade possível à matriz. O tradutor restringiu-se
a uma posição de «transparência»: «Não tenho o direito de disputar a autoridade
do romance. Guiei-me pela convicção de que o estou a traduzir como penso que
Joyce o escreveria em português.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Joyce
pertence ao grupo de autores preferidos do tradutor português: aqueles que
«nunca tratam o leitor como um cretino». <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>,
em ruptura com tudo o que era o paradigma narrativo do século XIX, «exige apenas
essa raridade de leitor que possui<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> </i>curiosidade
intelectual perante o texto literário e as possibilidades infinitas da língua».
Esta é uma leitura que «nos atira para fora de pé, sem sequer nos termos
chegado a molhar.». Obriga o leitor a abdicar da bengala do enredo e a
transformar-se «de banhista da rebentação em banhista de ondas poderosas». Não
é de todo uma leitura para todos.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEha5YQqRO-4HLWPmuBcIxfqb8dfHmjtHBbvFw9EExeiSd9KLxshv0uGwSxXJB-WuD8hyphenhyphen-3DlDWrbYN8U8qW-tou6J1M1j75OgSsaHW2OgkMERV5UWeAeezFYZ8Uic01mTD_k39HhUjbPjQ/s1600/joyce-ulysses.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="628" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEha5YQqRO-4HLWPmuBcIxfqb8dfHmjtHBbvFw9EExeiSd9KLxshv0uGwSxXJB-WuD8hyphenhyphen-3DlDWrbYN8U8qW-tou6J1M1j75OgSsaHW2OgkMERV5UWeAeezFYZ8Uic01mTD_k39HhUjbPjQ/s640/joyce-ulysses.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Os
vários níveis narrativos, como camadas de cebola, podem ser lidos consoante o
grau de cultura ou o domínio das técnicas narrativas do leitor, «mas a maioria
dos leitores o que quer saber é da historiazinha e o problema é que <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>não a tem». Pior: tal como
defende o poeta, crítico e historiador espanhol José María Valverde, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>representa «o negativo
caricatural de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Odisseia</i>: o “herói”
volta ao seu lar para não ser nada, nem sequer o que ele tentou fracassadamente
durante o dia<i style="mso-bidi-font-style: normal;">»</i>. Então, como podemos ajudar
os leitores convencionais a entrar no romance? Responde Vaz de Carvalho: «Não
podemos. Se o leitor não estiver disposto a aceitar novas regras de jogo, será
uma perda de tempo tentar convencê-lo». Essa não é uma atitude demasiado
intimidatória? «Claro que é. Mas a literatura é só para os fortes.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Estamos
de acordo, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i> será devidamente apreciado
sobretudo por leitores-corredores-de-fundo. Na verdade, desde há 91 anos que o
seu público ideal é esta espécie de leitores, hoje em vias de extinção, que
aceita a perseverança e a disciplina como passes inevitáveis para o acesso à <i style="mso-bidi-font-style: normal;">alta-leitura</i>, logo à alta-cultura. Contudo,
defender que <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>se destina só a essa
elite intelectual pode prestar um mau serviço à riqueza e à complexidade de Joyce.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
É o
próprio Vaz de Carvalho, na linha do académico irlandês Declan Kiberd, autor de
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulysses and Us: The Art of Everyday Living</i>,
quem defende esta obra como um livro magistral «onde não se passa nada a não
ser a banalidade do quotidiano» e da luta de pessoas comuns pela sobrevivência
e nas relações com os outros. «Não é por acaso que o título aponta para uma
epopeia, mas toda a estrutura do romance é a da tragédia», alerta o tradutor.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
No
fim destas 24 horas de rotinas triviais e de pequenos dramas pessoais, sem a grande
retórica ou a eloquência da epopeia, as personagens regressam todas às suas Ítacas.
Todavia, elas partilham com Ulisses a mesmíssima e absoluta necessidade de
sobreviver. Segundo Vaz de Carvalho, este é o centro da renovação moderna do mito
antigo grego concretizada por James Joyce e obriga-nos a uma reavaliação do
valor da História e da história pessoal.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i> pretende retratar o homem comum e
as suas muito vulneráveis condições de acesso à dignidade. Então, como entender
que Joyce (um socialista) tenha vedado o acesso do grande público ao seu
romance? Pois se a fala interna do cidadão comum é o objetivo e o objeto máximos
da sua experimentação... O próprio Joyce definiu, logo em 1900, na conferência <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Drama And Life</i>: «Penso que da triste
monotonia da existência podemos extrair aspectos do drama da vida. O maior
lugar-comum e o mais morto dos vivos podem ter um papel neste grande drama.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvQFRlx_WyM6VW7W8yFU3HZxjB6VfnmPEMnuAOzPnMY8Hao80XfKA8N-_srP_egXULD4HrcDBe3aADZV-IsGleb8hCMwaa8trUO5xbI8XPxX4kISHAGAEAJl724fhTA9f5MM4ztqDYReI/s1600/0138.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="478" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvQFRlx_WyM6VW7W8yFU3HZxjB6VfnmPEMnuAOzPnMY8Hao80XfKA8N-_srP_egXULD4HrcDBe3aADZV-IsGleb8hCMwaa8trUO5xbI8XPxX4kISHAGAEAJl724fhTA9f5MM4ztqDYReI/s640/0138.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Quem
diminui o valor da leitura direta do romance e privilegia a abordagem a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>como uma <i style="mso-bidi-font-style: normal;">oeuvre à clef </i>(e não é de todo este o caso de Jorge Vaz de Carvalho)
corre o risco de reduzir o romance a um busílis formal e esquemático. As suas
três partes e 18 <i style="mso-bidi-font-style: normal;">capítulos-episódios</i>
não foram totalmente definidos por Joyce; pelo caminho ele desistiu dos títulos
que faziam remissões para a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Odisseia </i>(ver
o estudo <i style="mso-bidi-font-style: normal;">The Ulysses Theme</i>, de W.B.
Stanford). Cada uma destas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">etapas </i>corresponde
a uma hora do famoso dia 16 de Junho de 1904: das 8h de manhã às 2h da
madrugada seguinte, à exceção das três primeiras horas, repetidas para Dedalus
e Bloom, e de vazios entre as 11h e as 12h (suposto banho de Bloom) e as 18h e as
20h (provável visita de pêsames).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Em
inglês, o romance tem cerca de 265 mil palavras e um léxico de 30 mil. A cada
episódio corresponde um estilo diferente e, segundo alguns teóricos sugestionados
pelo autor, um órgão físico, uma cor ou até uma arte ou ciência diferentes. Os
protagonistas são três: Stephen Dedalus (<i style="mso-bidi-font-style: normal;">alter
ego</i> do jovem Joyce, com ecos de Hamlet), Leopold Bloom (símbolo do Judeu
Errante ou do irlandês excluído, como Joyce) e a sua mulher Marion (Molly) Bloom.
Mas <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i> foi escrito para dar
privilégio absoluto e absoluto protagonismo à linguagem. É «um livro tão opaco
e pormenorizado como a vida» (John Updike). Como entrar nele?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Suponho
que a poucos agradará a ideia de provar um pequeno-almoço de rim de porco com
chá e torradas ou andar com uma batata no bolso, em homenagem ao tormento da
fome por que passaram os antepassados. Por exemplo, para (re)criar com
fidelidade a Dublin do Bloomsday, a via sacra de Bloom em Dia do Juízo Final
(Doomsday), James Joyce recorreu a um exemplar do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Dublin Evening Telegraph</i> desse dia e à edição de 1904 do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Thom’s Directory</i>, o diretório de todos
os imóveis residenciais e comerciais da cidade e respetivos proprietários. O
escritor acreditava que, se um dia fosse necessário reconstruir a cidade,
bastaria compô-la, tijolo a tijolo, a partir de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Talvez
só mesmo identificando-se com esta obsessão joyceana com os detalhes exteriores
mais microscópicos e dando um tremendo salto de contextualização histórica é
que o leitor atual de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>conseguiria
penetrar de facto na vida das personagens, no tema principal (Bloom e o
Destino, segundo Nabokov) e no grande motor do romance: a verbalização
interior.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Segundo
José María Valverde, «Joyce foi um grande ouvido: a princípio [em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Dublinenses</i>] com uns olhos que captam de
vez em quando um instantâneo, uma “epifania”, como ele disse; finalmente, já
sem olhos [quase cego, criando a pirueta lexical <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Finnegans Wake</i>]. […] Para o ler não basta a tradução (se não
sabemos inglês); temos de voltar à época em que a linguagem vivia na boca, no
ouvido e na lembrança.» Mais: para compreender realmente <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>, teríamos que ter presentes de memória todas as frases da
obra (E. R. Curtius).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Conhecemos
o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">mar verde-ranho</i> ou <i style="mso-bidi-font-style: normal;">mar escroto-constritor </i>que Joyce parece
opor ao <i style="mso-bidi-font-style: normal;">oceano azul</i> de Byron. Conhecemos
bem de perto as opiniões de Stephen sobre a paternidade (pai = <i style="mso-bidi-font-style: normal;">um mal necessário</i>) ou sobre a trajetória
do mijo (com Bloom). Conhecemos a retrete e os borborigmos intestinais e as
reflexões masturbatórias do Sr. Bloom. Ou os devaneios de Molly sobre atos e
órgãos sexuais (os seios são, em definitivo, mais bonitos do que os pénis) explanados
em oito<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> frases</i> e 66 páginas de
solilóquio. O que sobressai em todos os casos é a franqueza e a crueza da
expressão-retrato de um ser humano. A repugnância pode ser um convite à empatia
humanitarista. Por exemplo, com Bloom, «uma criatura intrinsecamente decente»
(Vaz de Carvalho).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Este
portento de aproximação simultânea ao interior profundo de uma personagem «nos
extremos do realismo» (W. B. Yeats) só é possível graças a uma fidelidade ao
linguajar específico que o traduz. Joyce cria palavras interiores que se
deslocam em divagação e evocação, mas com naturalidade, pelo bruaá quotidiano
das grandes avenidas ou das ruelas esconsas, das bibliotecas e das redações, das
casas e dos pubs da Dublin moderna. «Eles estão todos aqui, os grandes
faladores, eles e as coisas que eles esqueceram», confidenciou o escritor a
Djuna Barnes. Para lá disso, o que existe é uma cadeia de acontecimentos
triviais sincronizados: «no decurso do livro, as pessoas tropeçam
constantemente umas nas outras: os seus caminhos encontram-se, separam-se e
voltam a encontrar-se […] uma coisa leva à outra neste maravilhoso livro»
(Nabokov).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhixIZhZk8IxuNNgc-qDNPmCm5NpOJXW1SS0f4gYWA8ksPdkFQuu8MWaAdHojO2CchFhsCr4s5BOOKAuQPvr6inPFPg5VsdqbOk4Wf9hwlkv8lntubIaw3r5iLVTq3GzdTjU00ypH78YnE/s1600/Circe.80.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="640" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhixIZhZk8IxuNNgc-qDNPmCm5NpOJXW1SS0f4gYWA8ksPdkFQuu8MWaAdHojO2CchFhsCr4s5BOOKAuQPvr6inPFPg5VsdqbOk4Wf9hwlkv8lntubIaw3r5iLVTq3GzdTjU00ypH78YnE/s640/Circe.80.jpg" width="516" /></a> </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Sobre a Literatura</i>, Umberto Eco salienta
que Joyce estaria profundamente convencido de que a verdade artística está
contida em todas as línguas do mundo; manipulando-as, o escritor poderia
atingi-la. «Assim, dedicou grande parte da sua vida à invenção de uma nova
gramática e a procura da verdade tornou-se para ele [como para Dante] a procura
de uma língua perfeita.» Obcecado em inventar essa língua «perfeita, moderna e
natural», Joyce obstinou-se em restaurá-la «através da sua pessoal invenção
poética […] uma língua que não será arbitrária como a linguagem comum, mas
necessária e motivada». Onde tem origem esta <i style="mso-bidi-font-style: normal;">odisseia </i>do escritor?</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
José
María Valverde e John Updike colocam a interessante hipótese de a raiz estar na
educação jesuíta de Joyce. Foi ela que o levou «a criar uma novela do
quotidiano, guarnecida com referências e caixas e esquemas tão rigorosos como
num esotérico livro de feitiçaria», defende o escritor americano. É nela que
encontramos uma noção essencial que perpassa o desafio estilístico e temático
de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>: a consciência do homem é
a consciência da linguagem humana e esta antecede os seus atos. Segundo
Valverde, o romance é «um exemplo extremo de exame de consciência, ao modo
jesuítico». Recorre a uma técnica de inspeção psicológica (o famoso <i style="mso-bidi-font-style: normal;">stream of consciousness</i>) que aceita a
linguagem como limite do homem e se constitui como «um processo de sentido
linguístico, de verbalização do vivido, mesmo que este tenha sido pecaminoso, tomando-o
em si mesmo com a maior objetividade». </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Aqui,
o exame de consciência surge sem remorso, desejo de emenda ou qualquer intenção
moral ou catequista. Jorge Vaz de Carvalho defende: «Para que este seja um
romance pacifista, basta-lhe pôr na boca de Molly a queixa de que a guerra está
a matar todos os rapazes bonitos.» Para ser um retrato soberbo e original da
condição humana, basta-lhe tão só centrar-se num homem, Stephen, torturado por
não ter acedido ao pedido da sua mãe moribunda para que ele rezasse por ela, e
noutro homem, Leopold, reduzido, após a perda de um filho, a aceitar as
infidelidades da mulher, a deitar-se em posição invertida no leito conjugal e a
beijar <i style="mso-bidi-font-style: normal;">os roliços melões adocicados
alourados perfumados do rabo dela</i>. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
«Há
quem diga que <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>é uma epopeia da mente, que é onde o indivíduo
pode conquistar uma Ítaca, de onde pode regressar de uma maneira relativamente
livre.» Para Vaz de Carvalho, o romance é, na sua épica do quotidiano, um
monumento à capacidade interior de superação. A proposta de Joyce é a de
mergulharmos num «não-estilo, que é exatamente a confluência e a profusão dos
vários estilos e vários níveis de língua, construídos ou pessoalmente ou
através de atos paródicos».</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Entretanto,
<span style="mso-fareast-font-family: "Times New Roman";">Bloom escreve na areia
da praia: «eu sou um» e nunca completa a frase. «Esta ideia pode explicar a
questão central: a nossa vida, tal como o texto de <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses</i>, está sempre a ser escrita e sempre toda ela por escrever.»
História incompleta e rede de encontros falhados expressa nos limites da
linguagem, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Ulisses </i>está muito próximo
de uma das fontes que Umberto Eco lhe atribui: o </span><i style="mso-bidi-font-style: normal;">Livro de Kells </i>(manuscrito composto por monges celtas entre os
séculos VIII-IX a.C.), «modelo do livro infinito ainda por escrever, só legível
por um leitor ideal afectado por uma ideal insónia». Para este leitor ideal,
aqui está um exemplo da obra-prima do escritor ideal: <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Pensamento é o pensamento do pensamento. Luminosidade tranquila. A alma
é de certa maneira tudo o que é: a alma é a forma das formas. Tranquilidade
súbita, vasta, candente: forma das formas.</i><span style="mso-fareast-font-family: "Times New Roman";"></span></div>
<br />
<b>LER Janeiro 2014</b> <br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-38301022542733372432016-07-23T11:48:00.002+01:002016-07-23T19:12:39.230+01:00Leituras de Verão | Cidades com livros <a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjMUR3Rl5-zHN7XMfkJnLa96G9djMP_LVv_VlQQKCrUKkCC6uH0iI78-EIt6VP5OCZbjDJcFHTeoMuRgJZbSbkyHrhTwvC9LKszwi2JJJ-vErNk-5tNQdTfTnqMWvR1Wj1ECB3w93ej8x8/s1600/site_0089_0001-750-0-20151104130534.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="410" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjMUR3Rl5-zHN7XMfkJnLa96G9djMP_LVv_VlQQKCrUKkCC6uH0iI78-EIt6VP5OCZbjDJcFHTeoMuRgJZbSbkyHrhTwvC9LKszwi2JJJ-vErNk-5tNQdTfTnqMWvR1Wj1ECB3w93ej8x8/s640/site_0089_0001-750-0-20151104130534.jpg" width="640" /></a>
<style>
<!--
/* Font Definitions */
@font-face
{font-family:"MS 明朝";
mso-font-charset:78;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:1 134676480 16 0 131072 0;}
@font-face
{font-family:"Cambria Math";
panose-1:2 4 5 3 5 4 6 3 2 4;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:3 0 0 0 1 0;}
@font-face
{font-family:Garamond;
panose-1:2 2 4 4 3 3 1 1 8 3;
mso-font-charset:0;
mso-generic-font-family:auto;
mso-font-pitch:variable;
mso-font-signature:3 0 0 0 1 0;}
/* Style Definitions */
p.MsoNormal, li.MsoNormal, div.MsoNormal
{mso-style-unhide:no;
mso-style-qformat:yes;
mso-style-parent:"";
margin:0cm;
margin-bottom:.0001pt;
mso-pagination:widow-orphan;
font-size:12.0pt;
font-family:"Times New Roman";
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;}
.MsoChpDefault
{mso-style-type:export-only;
mso-default-props:yes;
font-family:Cambria;
mso-ascii-font-family:Cambria;
mso-ascii-theme-font:minor-latin;
mso-fareast-font-family:"MS 明朝";
mso-fareast-theme-font:minor-fareast;
mso-hansi-font-family:Cambria;
mso-hansi-theme-font:minor-latin;}
.MsoPapDefault
{mso-style-type:export-only;}
@page WordSection1
{size:612.0pt 792.0pt;
margin:72.0pt 90.0pt 72.0pt 90.0pt;
mso-header-margin:35.4pt;
mso-footer-margin:35.4pt;
mso-paper-source:0;}
div.WordSection1
{page:WordSection1;}
-->
</style>
<br />
<div class="MsoNormal">
<b><span style="color: black; font-family: "garamond";">A fénix do
Cairo </span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">São cinco mil anos de civilização e
cerca de oito milhões de corpos concentrados numa devoradora mega metrópole, a
maior e mais densamente povoada de África, do Mediterrâneo e do mundo islâmico,
sede da Liga Árabe e capital do Egipto. Para entender o Cairo, lendário umbigo
do mundo, temos de senti-lo vibrar num cruzamento ao meio-dia, quando o barulho
equivale aos noventa decibéis de um concerto de rock. O melhor guia será Max
Rodenbeck, correspondente do <i>The Economist </i>para o Médio Oriente,
habitante cairota desde os dois anos de idade. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i><span style="color: black; font-family: "garamond";">Cairo, A Cidade Vitoriosa</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";"> (de 1998) é um pessoalíssimo roteiro
de informação, crítica e humor que descreve o Cairo desde o tempo dos faraós até
ao presente. Em onze capítulos, contextualiza a «fluidez resistente» da metrópole
«dura e inflexível» onde nasceu o mito da fénix renascida. No Cairo, assegura
Rodenbeck, o gosto pelo espalhafato, pelas anedotas e trocadilhos sinaliza essa
resiliência afinal permeável aos constantes reajustes sociais. Disso se faz
prova também nos mais de quarenta romances de Naguib Mahfouz (1911-2006, Nobel
da Literatura em 1988) e, sobretudo, na sua obra-maior, <i>Trilogia do Cairo</i>,
a saga da família Gawwad entre as duas guerras mundiais.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">Sim, é verdade, muitas das riquezas do
Cairo foram delapidadas ou desleixadas, e a própria riqueza individual não
cobre mais do que quatro a cinco gerações da mesma árvore genealógica. Mas, tal
como defende Rosenbeck, esta é uma «sociedade em que a vergonha é mais sentida
como um fardo do que como uma culpa». Uma sociedade cuja adesão ao islamismo
militante determinará o futuro do mundo árabe, segundo a controversa tese de
Mary Anne Weaver, correspondente da revista <i>The New Yorker</i>. E, no
centro, uma metrópole tradicionalista e de vanguarda que Mahfouz disse ser tão
fascinante «como encontrar o amor na velhice».</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Cairo, A
Cidade Vitoriosa», Max Rodenbeck, Europa-América</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Trilogia do
Cairo»: «Entre os Dois Palácios» (2007), «O Palácio do Desejo» (2008), «O Açucareiro»
(no prelo), Naguib Mahfouz, Civilização</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«A Portrait
of Egypt: A Journey Through the World of Militant Islam», Mary Anne Weaver,
Farrar, Straus and Giroux</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiruu_Hu-YFv84LkpdjLCJ1lD4-vM3KT0_K52ny7QL8BND7i0Ds34ufpIE2nOPc1PiWs2BEBUv9IlwpUmW9DGwoNRiUxi0USTHyRcOcEBlctGFq9CnpMZBL5MUkbEnsgenke4e7dce2lmI/s1600/Saigon-Apprentice.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="368" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiruu_Hu-YFv84LkpdjLCJ1lD4-vM3KT0_K52ny7QL8BND7i0Ds34ufpIE2nOPc1PiWs2BEBUv9IlwpUmW9DGwoNRiUxi0USTHyRcOcEBlctGFq9CnpMZBL5MUkbEnsgenke4e7dce2lmI/s640/Saigon-Apprentice.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">O enigma Ho Chi Minh</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Marguerite Duras, furiosa narcisista, teve uma
frase de marca: «A verdade está toda nos meus livros.» Uma biografia anulou-a
em definitivo em 1998, dois anos após a morte da escritora. Para Laure Adler,
responsável pela revelação de documentos inéditos, Duras foi uma “profissional
da confissão inexacta». É somente inquestionável a paixão pela Indochina natal,
manifesta inclusive numa «impregnação física», os traços asiáticos do rosto de
Duras. Até aos 17 anos, quando partiu para França, foram dela «a terra das
mangas, a água negra do Sul, as planícies do arroz, o rumor dos juncos no rio».
Ainda o são para muitos viajantes, ali levados pelas suas ficções.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Marguerite nasceu Donnadieu, a 4 de Abril de 1914,
em Gia Dinh, arredores de Saigão, hoje Ho Chi Minh, a maior cidade da República
Socialista do Vietname. A explicação para a àvida busca de amor de Duras está
contida em todos os seus livros, mas acima de tudo ao longo do delta do Mekong.
É uma história suja de violência e traição vivida até à idade adulta, numa
longa, e paupérrima, errância entre Saigão e Phnom Penh. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Nos antípodas de Duras, Norman Lewis (1908-2003),
o elegante autor de livros de viagens britânico, descreveu-se como «um homem
quase invisível». Da sua capacidade de apagamento perante a paisagem nasceram
algumas melhores descrições da Indochina nos anos 50. Será quase impossível,
hoje, para um ocidental, essa atitude de permeabilidade imparcial perante o
presente pós-colonial e pós-guerra do Vietname. Em 2002, o norte-americano David
Lamb, repórter veterano, tentou-a. Mas a verdade é que Ho Chi Minh, e a
ex-Indochina, são ainda protagonistas de uma narrativa truncada onde a beleza e
a verdade lutam com a mentira e a incompreensão.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Marguerite
Duras, Uma Biografia», Laura Adler, Quetzal</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">«Vietname Now: A Reporter Returns», David Lamb, Public
Affairs (2002)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">«A Dragon Apparent: Travels in Indo-China», Norman
Lewis, Eland (1951)</span><span style="font-family: "garamond";"> </span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdTLVaa1wkavmgvyHTytxc23xBrbHOnNrRyqMCOSiBJiML9Bqi8QStR8ZZo16BX7rromOYIzClIDnOJbqz7yeM9qy-ZxfOg8jX6JBMFIr2-yOYv9YBYmsUWDH40DbUE6vnFh_AsFOeSuI/s1600/00207629.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="424" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjdTLVaa1wkavmgvyHTytxc23xBrbHOnNrRyqMCOSiBJiML9Bqi8QStR8ZZo16BX7rromOYIzClIDnOJbqz7yeM9qy-ZxfOg8jX6JBMFIr2-yOYv9YBYmsUWDH40DbUE6vnFh_AsFOeSuI/s640/00207629.jpg" width="640" /></a> </span></div>
<div class="MsoNormal">
<b><span style="font-family: "garamond";">Istambul, recordação e
miragem</span></b></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">De Eminönü, o coração da velha cidade murada de
Constantinopla, para Üsküdar, o subúrbio densamente povoado onde se espremem
meio milhão de habitantes da actual Istambul anatólia. Pelo meio, o Bósforo do
Corno de Ouro, unindo as duas extremidades de dois continentes e faces opostas
da mesma cidade. «O habitante de Eminönü que vai a Üsküdar, diz: “Vou à Ásia”
e, na volta: “Regresso à Europa.” Às vezes, as frases repetem-se duas vezes por
dia.» Quem o narra é o escritor e crítico literário francês Daniel Rondeau. E só
mesmo ele conseguiria resumir num episódio vivo e actual a essência da cidade.
Em 2002, esquadrinhou-a <b>com um</b> olhar culto e inesperado. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Do cais de Karaköy, onde<b> hoje</b> <b>(tirar)</b>
desembarcam os desempregados russos e romenos e as «Natachas» que logo se
prostituirão ali perto, nas ruas do antigo bordel. Do pôr-do-Sol estonteante do
Café Pierre Loti, na colina dos mortos, a sete quilómetros de caminhada ao
longo da muralha, a antiga cerca de Teodósio. Rondeau abre-nos Istambul. Não
lhe interessa muito a figura de <span style="color: black;">Atatürk, o construtor
da<b> nova</b> Turquia, mas essa encontramo-la inteira na biografia «definitiva»
de Andrew Mango. Nem tanto a magia oitocentista do Império Otomano, captável
nas cartas da erudita embaixatriz inglesa Mortley Montagu.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">Rondeau é o guia do presente. No
entanto, para apreender o carácter central de Istambul, o <i>hüzün</i>
(melancolia), é preciso ler Orhan Pamuk (n. 1952), o irreverente filho de uma
abastada família burguesa caída em declínio, Nobel da Literatura em 2006. Os
romances de Pamuk e, sobretudo, o estupendo ensaio memorialista que, em 2005,
dedicou à sua adolescência em Istambul, estão cheios dessa forma de ver a vida
simultaneamente em negativo e em positivo. Istambul h<i>üzün</i>, como duas
margens do mesmo rio.</span><span style="font-family: "garamond";"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Istambul»,
Daniel Rondeau, Europa-América (2002)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Istanbul:
Memories and the City», Orhan Pamuk, Faber and Faber/ Knopf / Gallimard/
Debolsillo</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«The Turkish
Embassy Letters», Lady Mary Mortley Montagu, Virago Press</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Voyage en
Orient», Gerard de Nerval, Folio</span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Atatürk»,
Andrew Mango, John Muray Publishers (1999)</span><span style="font-family: "garamond";"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "garamond";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7Ujco1jHZacuNffhEwrMXWgFYYyAa5RWl7_VPAQgR7Jog3Ib0UioRSLunrdzz49Pg9RByN9a2iJmveUVbMJwZF06440oiBk44YQTCpkYNGtAad4-3lI799-oaPkXzhBfK3VjHt7lwgHA/s1600/84627915.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="290" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7Ujco1jHZacuNffhEwrMXWgFYYyAa5RWl7_VPAQgR7Jog3Ib0UioRSLunrdzz49Pg9RByN9a2iJmveUVbMJwZF06440oiBk44YQTCpkYNGtAad4-3lI799-oaPkXzhBfK3VjHt7lwgHA/s640/84627915.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-align: justify; text-autospace: none; text-justify: inter-ideograph;">
<b><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Mumbai, cidade máxima</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-align: justify; text-autospace: none; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-align: justify; text-autospace: none; text-justify: inter-ideograph;">
<span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Já em 1990, V. S. Naipaul
insistia que era ali, em Mumbai, capital do estado de Maharashtra, que todo o
progresso social indiano se concentrava sob a forma de fluxos de multidões e de
motins. Em 2005, o jornalista e escritor</span><span style="color: black; font-family: "garamond";"> indiano Suketu Mehta apelidou-a de «Cidade Máxima», no homónimo
livro de memórias, reportagem e análise socio-política que lhe </span><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">valeu </span><span style="color: black; font-family: "garamond";">o universalista Prémio Kiriyama e a
nomeação para o Pulitzer. Em três ou quatro décadas de aposta no
desenvolvimento económico</span><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">, Mumbai, a «Boa Baía» <b>(Bombaim)</b> onde os
portugueses desembarcaram há quinhentos anos, tornara-se o epicentro do <i>boom</i>
da Índia. Mehta e Naipaul (Nobel da Literatura em 2001) registaram essa mudança,
convictos de que a diversidade humana é a maior força e talvez a maior causa do
sucesso democrático indiano.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Em três livros
para 26 anos de experiência como visitante incansável na escuta dos indianos,
Naipaul caminha do pessimismo para o optimismo. Sempre perito em estragar
festas, destrói de vez a ideia romântica da Índia que recebera dos seus
antepassados hindus (emigrados para Trinidad e Tobago no século XIX) e que
ainda se conserva nos três volumes do colonial dicionário geográfico <i>The
Gazetteer</i>, de 1909. Exceptuando durante a luta pela independência, talvez
nem como mito tenha alguma vez existido essa Índia-como-uma-só-comunidade-e-identidade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Hoje, nos estúdios
de Bollywood, nos gabinetes ministeriais e nas sedes de partido, nos feios
arranha-céus, nos bairros de lata ou nos </span><span style="color: black; font-family: "garamond";">minúsculos T1 para famílias inteiras, Mumbai é a Índia em
movimento. Lendo Naipaul ou Mehta, conhecêmo-la através de um prisma de
identidades particulares. Reflexo de como as <span style="mso-bidi-font-weight: bold;">melhorias económicas</span>, a educação e a politização fizeram renascer
lealdades de região, religião, clã ou casta. E geraram novas e imparáveis
correntes de reivindicação, conflito e progresso.</span><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;"></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-autospace: none;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-autospace: none;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">An
Area of Darkness</span></i><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">, V. S. Naipaul, Vintage (1964) </span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">India, A Wounded Civilization</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, V.S. Naipaul, Vintage (1977)</span><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">India: A Million Mutinies Now</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, V.S. Naipaul, Vintage (1990)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Maximum City: Bombay Lost and Found</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Suketu Mehta, Vintage (2004)</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-autospace: none;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">The
Gazetteer of Bombay City and Island<span style="mso-bidi-font-style: italic;"> (</span></span></i><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">3 vols), S. M.
Edwardes, Cosmo</span><span style="font-family: "garamond";"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "garamond";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: "garamond";"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhnbs_0Huez5NSRMn6Vups90CjyduSklLNxHicaiWAfOvGROIhPXF7am7c2mUmp5wS4x1-W082qQ2X_9O5d_kE0KNTYcLfbv4rNY_8S8JbbD-lxGgkNL9j0W4kzgJi0EYJRjmZDrosf-2U/s1600/13796.0.original.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="402" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhnbs_0Huez5NSRMn6Vups90CjyduSklLNxHicaiWAfOvGROIhPXF7am7c2mUmp5wS4x1-W082qQ2X_9O5d_kE0KNTYcLfbv4rNY_8S8JbbD-lxGgkNL9j0W4kzgJi0EYJRjmZDrosf-2U/s640/13796.0.original.jpg" width="640" /></a></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b><span style="font-family: "garamond";">Pequim de proibida a olímpica</span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Tem a forma de um dragão e é o maior e mais avançado
aeroporto do mundo. Sob o lema «Nova Pequim, Grandes Olimpíadas», ficou pronto
para, em Agosto de 2013, receber os dois milhões de visitantes, entre eles dezasseis
mil jornalistas estrangeiros, esperados para os XXIX Jogos Olímpicos. De boca
escancarada e olhos no tecto aerodinâmico do edifício central destes 1,3 milhões
de metros quadrados dedicados à aviação, é difícil não exclamarem: «Pequim já
não é Pequim.»</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Em percentagem, são muito poucos os chineses que
podem sequer aspirar a uma visita ao novo aeroporto. No entanto, a capital da
superpotência emergente que resultou da recente «ascensão pacífica» prossegue
imparável a sua marcha para o futuro, e de costas cada vez mais voltadas ao
passado. Daí a importância da edição, em 2007, do primeiro livro em inglês que
traça a história de Pequim dos primórdios até à actualidade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Beijing:
From Imperial Capital to Olympic City</span></i><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">, escrito por
três professores de História, Língua e Literatura chinesas nos Estados Unidos,
sinaliza a progressiva destruição dos vestígios históricos. Em Pequim, a
transformação do passado em plástico espectáculo turístico coincide hoje com a
construção de uma nova metrópole, assente no dinheiro e no comércio. Más notícias
para os apaixonados da China milenar e dinástica, que ainda assim lhe poderão
dar vida através das memórias do professor norte-americano</span><span lang="EN-US" style="font-family: "garamond";"> </span><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">David Kidd
(1927-1996). Apaixonado pela cultura e modos de vida ancestrais, suprimidos no
final dos anos 40 pela revolução maoísta, Kidd foi um dos melhores intépretes
do eclipse da velha Pequim.</span><span style="font-family: "garamond";"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">Historias de Pekín</span></i><span style="font-family: "garamond";">, David Kidd, Libros del Asteroide</span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-autospace: none;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Beijing: From Imperial Capital to Olympic City</span></i><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">,
Lillian M. Li, <a href="http://us.macmillan.com/author/alisondraynovey"><span style="color: black; text-decoration: none;">Alison Dray-Novey</span></a>
e <a href="http://us.macmillan.com/author/hailikong"><span style="color: black; text-decoration: none;">Haili Kong</span></a>, Palgrave
Macmillan</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b><span style="font-family: "garamond"; font-size: 14.0pt;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidvP-PWO1Sk44FzsoYvJ99l-CTAv-GikI9wdEDDRYHw2G6CsFtGswQydgdEyHY3oExLsp6-kNm_AVaAtTsh_r6Cfv6eOGhRpiZGHoPxXSx5om0RbJ-7OXssttAFvgIfVC9jLKn6el2Yw4/s1600/San-Francisco-Gay-Pride-Parade-balloons.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="360" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidvP-PWO1Sk44FzsoYvJ99l-CTAv-GikI9wdEDDRYHw2G6CsFtGswQydgdEyHY3oExLsp6-kNm_AVaAtTsh_r6Cfv6eOGhRpiZGHoPxXSx5om0RbJ-7OXssttAFvgIfVC9jLKn6el2Yw4/s640/San-Francisco-Gay-Pride-Parade-balloons.jpg" width="640" /></a></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><b>São Francisco, arco-íris <i>dot-com</i></b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Destino: São Francisco, norte do Estado de Califórnia,
Estados Unidos da América, à margem do Pacífico. Se vai à procura de sinais
radicais da pulsão sexual libertária e da contra-cultura dos anos 50 até 70,
mais vale ler alguns romances de Jack Kerouac, o papa dos <i>beatniks</i>,
inspirado a doses cavalares de benzedrina e escrita compulsiva. Hoje, em São
Francisco é até proibido fumar ao ar livre, em parques municipais e áreas
recreacionais. E, se persiste em levar uma flor no cabelo, não se esqueça de
levar também um computador portátil e um preservativo no bolso. São Francisco
foi abalada nos 80 pela SIDA, um violento desmancha-prazeres. Mas, na mais
progressista e radical metrópole da América, os encontros homossexuais
continuam a ser uma das maiores atracções. E, esses, combinam-se agora pela
internet, honrando os anos de ouro da década de 90, quando a economia da cidade
conheceu um surto graças à indústria da informática. São Francisco hoje é <i>make
safe love dot.com</i>, pois claro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Sobre o berço e evolução do movimento
reivindicativo homossexual e, em concreto, sobre o quotidiano do Castro, o
primeiro bairro-gueto <i>gay</i> do mundo, escreve o cronista e activista
Armistead Maupin. Está tudo na sua série «Histórias da Cidade», primeiro
publicadas, em 1974, no jornal local <i>The Pacific Sun</i> e depois
multiplicadas em <span style="mso-bidi-font-weight: bold;">ficção</span>. Para um
retrato mais recuado, e pitoresco, da cidade, procurem-se os textos jornalísticos
de Mark Twain, escritos entre 1864 e 1870, na sua fase «oeste», a do início de
carreira. Não está lá, e não é credível, mas é a piada mais contada em São
Francisco. Sobre a cidade, Twain teria dito, de modo lapidar: «O meu mais frio
Inverno foi um Verão passado em São Francisco.»</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">Os Subterrâneos</span></i><span style="font-family: "garamond";"> e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Pela Estrada Fora</i>, Jack
Kerouac, Relógio D’Água</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Histórias de São Francisco</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Novas
Histórias de São Francisco</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Mais Histórias
de São Francisco </i>e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Outras Histórias
de São Francisco</i>, Armistead Maupin, Gótica</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Roughing It</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Mark Twain, University of California
Press</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhw0qC-GbRPGt-cN8D6NLecyU607IAgU4CcfMKdNayrThdXtqfBkVbeOaTOwCbbuaO8-YaDbmocLorQiUIFsiRWyr_9HELR_Z347nyRnL5Jggg_esdx_2aBeKh_cIif1hOyeDEzgU4kfz8/s1600/m_foto_05.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="480" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhw0qC-GbRPGt-cN8D6NLecyU607IAgU4CcfMKdNayrThdXtqfBkVbeOaTOwCbbuaO8-YaDbmocLorQiUIFsiRWyr_9HELR_Z347nyRnL5Jggg_esdx_2aBeKh_cIif1hOyeDEzgU4kfz8/s640/m_foto_05.jpg" width="640" /></a><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><b>Metro São Petersburgo, paragem Literatura</b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Ainda se escuta nestas ruas o «guincho ignóbil»
(Gorki) das personagens de Fiódor Dostoiévski ou o frufru do roçagar dos
vestidos de Anna Karénina pela calçada. </span><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">À frente da
estátua equestre de Pedro, o Grande, podemos perder a vergonha e declamar
apaixonadamente o poema que lhe dedicou Puchkín, ou antes «</span><span style="font-family: "garamond";">We shall meet again, St. Petersburg<span style="color: black;">» de Ossip Mendelstam. </span>Esta é «a cidade mais
abstracta e intencional do mundo» (Dostoiévski). Uma nostalgia alucinatória,
impressa na perspectiva única dos ensaios </span><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">«A Guide to
the Renamed City» e «In Room and a Half», do seu filho exilado, Joseph Brodsky
(Nobel da Literatura em 1987). </span><span style="font-family: "garamond";">Em São
Petersburgo, tudo é passado, museu vivo e literatura.<span style="color: black;"></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Apesar do esplendor monumental de séculos, a
antiga capital czarista nunca se esqueceu de que foi construída sobre pântanos.
Está escrito no seu bilhete de identidade, pleno de simbolismos, histórias
urbanas, lendas populares, e elementos surreais. Hoje, os cadernos subterrâneos
da cidade têm os mesmos traços complexos da nova sociedade russa.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Ingrid Bengis, ensaísta e ficcionista
nova-iorquina descendente de emigrantes russos, presenciou o colapso da União
Soviética em São Petersburgo. Em livro, a sua experiência é a de imersão numa «catastroika»
imprevisível. A ingénua apaixonada pela arte e cultura russas que chegara à
cidade em 1990, mudou ela mesma num tumulto até à partida, em 1996. Bengis
insiste que São Petersburgo nunca permitiria que ali se escrevessem «livros
calmos e sem grandes questões». O dela, é uma excelente abordagem a «um certo
sentido de destino» que define a cidade.</span><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;"></span></div>
<div class="MsoNormal" style="mso-layout-grid-align: none; mso-pagination: none; tab-stops: 28.0pt 56.0pt 84.0pt 112.0pt 140.0pt 168.0pt 196.0pt 224.0pt 252.0pt 280.0pt 308.0pt 336.0pt; text-align: justify; text-autospace: none; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">Less Than One</span></i><span lang="EN-US" style="color: black; font-family: "garamond"; mso-ansi-language: EN-US;">,
Joseph Brodsky, Farrar, Strauss and Giroux (1986)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Metro Stop Dostoevsky: Travels in
Russian Time</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Ingrid
Bengis, North Point Press, (2003)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b><span style="font-family: "garamond"; font-size: 14.0pt;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrIpzNVQLTYGpU4SGiIA-jVpaNGRVx05DLBXWm9FPkhOJjWERqmsVuQwUD8VZfThmSc2CBYZT9slB0i4YtIneJsML5vKeqsUQDcyakWFPCklyS0CCYmHewf-8KNa73nUKbaubb3HyUvL8/s1600/botany-bay-edisto1.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrIpzNVQLTYGpU4SGiIA-jVpaNGRVx05DLBXWm9FPkhOJjWERqmsVuQwUD8VZfThmSc2CBYZT9slB0i4YtIneJsML5vKeqsUQDcyakWFPCklyS0CCYmHewf-8KNa73nUKbaubb3HyUvL8/s640/botany-bay-edisto1.jpg" width="640" /></a></span></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><b>Distorcer Sidney</b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">A tese pretende fazer justiça e provar «como os
portugueses descobriram e cartografaram secretamente a costa da Austrália e da
Nova Zelândia 250 anos antes da chegada do Capitão Cook». Em 2007, o jornalista
anglo-australiano Peter Trickett chamou-a para subtítulo de <i>Para Além do
Capricórnio</i>, recém-editado pela Caderno. Mas o que é que isso <span style="mso-bidi-font-weight: bold;">nos dá mais</span> a conhecer da «Ilha de
Ouro» de Marco Polo ou da Sydney actual? Nada. Apenas prova que a História — e,
nela, as cidades - nos reserva surpresas nos antípodas das nossas certezas. O
que já é muito.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Ao rodar 90º uma metade de um dos mapas do Atlas
Vallard (de 1547), Trickett encontrou as costas leste e sul da Austrália
cartografadas com tal detalhe que, a partir delas, se desenhariam à escala «as
pistas do actual aeroporto» de Sydney. Produto, garante, dos desenhos do
navegador Cristovão de Mendonça, aportado na Baía de Botany em 1522, a mando
ultra-secreto de D. Manuel I. Uma descoberta tão surpreendente como a do
protagonista de «O Cágado», de Almada Negreiros, que, à procura do dito, escava
o planeta até aos antípodas, para por fim descobrir o bicho na primeira pazada
que deu. Foi o que aconteceu a Peter Carey, em <i>30 Dias em Sydney</i> (da
excelente colecção «O Escritor e a Cidade», Bloomsbury/Asa). </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Peter Carey (n. Melbourne, 1943) é duplo
vencedor<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>do Booker Prize e um fantástico
contador de histórias. Viveu em Sydney aos 40 anos e regressou 27 anos depois,
em 2001, após se ter fixado nos Estados Unidos. Na cidade de arenito que ele
primeiro achara «rasca, degenerada e degradada», e em encontros únicos com os
seus habitantes, irá testar preconceitos e paradoxos. Com ele, na inigualável
Baía de Botany, também nós <span style="mso-bidi-font-weight: bold;">percebemos
que</span>, às vezes, o vento secreto de uma cidade sopra do lado mais
inesperado.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">30 Dias
em Sydney: Um Relato Incrivelmente Distorcido</span></i><span style="font-family: "garamond";">, Peter Carey, Asa (2001)</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">Para Além
de Capricórnio</span></i><span style="font-family: "garamond";">, Peter Trickett,
Caderno</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">As
Viagens de Marco Polo</span></i><span style="font-family: "garamond";">, Europa-América</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">Oscar e
Lucinda</span></i><span style="font-family: "garamond";">, Peter Carey, Dom Quixote
(1988)</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-family: "garamond";">A
Verdadeira História do Bando de Ned Kelly</span></i><span style="font-family: "garamond";">, Peter Carey, Dom Quixote (2000)</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgs6xTBnTNSO30-iIuZYLrypvb3KmVKp0X6Nnfrb_N5AVF4QTuAmhBVv0eux9LALpenWPVN87HT9CqcwWuhaNN-fI01QEw5cC98p8jnkKedXAQEwlP7TTQZezprLVvly6htiw6fTP48Cp0/s1600/shutterstock_129755993_Tangier-Morocco_baixa.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="424" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgs6xTBnTNSO30-iIuZYLrypvb3KmVKp0X6Nnfrb_N5AVF4QTuAmhBVv0eux9LALpenWPVN87HT9CqcwWuhaNN-fI01QEw5cC98p8jnkKedXAQEwlP7TTQZezprLVvly6htiw6fTP48Cp0/s640/shutterstock_129755993_Tangier-Morocco_baixa.jpg" width="640" /></a><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><b>Tânger, porquê?</b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><b> </b> </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Sabedoria e êxtase. O compositor e escritor Paul
Bowles (1910-1999) encontrou os dois em Tânger. Impossível ir à capital da região
marroquina de Tetouan e ignorar a sombra do norte-americano que, desde 1947 e
até à morte, «abraçou o deserto como um santo cristão abraça o seu martírio»
(Edmund White). Tânger e Marrocos de Bowles estão <span style="mso-bidi-font-weight: bold;">fixadas</span> por ele em mil páginas ficcionais<span style="mso-bidi-font-weight: bold;"> (cortar de viagem)</span> e <span style="mso-bidi-font-weight: bold;">diarísticas</span>,
nos mil registos da música e das narrativas locais que compilou como chaves da
cultura marroquina.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Em 1987, no primeiro livro de viagens que dedicou à
cidade, Daniel Rondeau tornou-se o arauto da associação hoje óbvia entre Tânger
e Bowles. Por ali tinham antes passado, para visitar o casal Paul e Jane e em
prospecção criativa, Truman Capote, Tennessee Williams ou Gore Vidal, nos anos
50 e 60, os <i>beats</i> Allen Ginsberg e William S. Burroughs. Todos atraídos
pelo homem que sabia «beijar a mão de condessas e falar com os elefantes»
(Rondeau) ou pela cidade que o adoptara? A dúvida é inevitável logo à chegada
de barco, depois da travessia do Estreito de Gibraltar. A vista feia e
agressiva parece a séculos de distância do quadro «de um azul pálido,
alcandorad[o] entre muros castanhos contra densos jardins» que a romancista
Edith Warthon descreveu em 1917.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Nos livros, Tânger permanece o local de todas as
promessas. Na realidade, talvez seja o espaço de todas as mentiras. Rondeau
concluiu, em 1997, que cada vez mais se torna um «subúrbio de ângulos afiados».
Só mesmo indo lá se comprova por que é que, desde sempre, esta porta de Roma, término
das caravanas ou antecâmara da Hégira, «deu a volta à cabeça» dos estrangeiros.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Memórias de um Nómada</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Paul Bowles, Assírio & Alvim
(Autobiografia)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Tânger e Outros Marrocos</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Daniel Rondeau, Europa-América
(1997)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Tanger</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Daniel Rondeau, Quai Voltaire (1987)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">Em Marrocos</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Edith Warthon, Europa-América</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">My Tangier</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, Daniel Blaufuks, Difusão Cultural
(1991)</span></div>
<div class="MsoNormal">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="color: black; font-family: "garamond";">The Tangier Diaries: 1962-1979</span></i><span style="color: black; font-family: "garamond";">, John Hopkins, Cadmus Editions</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhou8fZckezrBjrBq-ne4EP-UNdYFCeqxyiBVSlP3zyeDmelt4wREhaBzGTtbDbi6JOI0QuVZCOmssL1jZFbt-f-cmuq_qoaDb99bYxvWfK2gK-hkT6005wgskd4M897zumX_5VzeIJIhQ/s1600/Venice_-_Gondolas_-_3643.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhou8fZckezrBjrBq-ne4EP-UNdYFCeqxyiBVSlP3zyeDmelt4wREhaBzGTtbDbi6JOI0QuVZCOmssL1jZFbt-f-cmuq_qoaDb99bYxvWfK2gK-hkT6005wgskd4M897zumX_5VzeIJIhQ/s640/Venice_-_Gondolas_-_3643.jpg" width="640" /></a><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";"><b>Veneza, água e tinta</b></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Proust enalteceu-a a partir dos ensaios críticos
de John Ruskin, como «lugar elevado da religião da Beleza». O diplomata e
escritor francês Paul Morand (1888-1976) mostra-a como a última cidade do último
país a oferecer-se como «espectáculo gratuito», herança dos Romanos. Veneza é a
cidade mais cara de Itália, mas os seus prazeres não custam quase nada. As
ruas, as pontes, são como «palácios sem tecto». A pé, em passos que deslizam
como a água, por entre «edifícios com nostalgia de barcos». De gôndola, os sons
com uma profundidade que parece vir do fundo, como um eco. Morand diz que os
canais de Veneza são negros como tinta; usada por Shakespeare em <i>Otelo</i> e
<i>O Mercador de Veneza</i>, nas memórias de Giacomo Casanova, por Henry James
ou Thomas Mann ou Hugo Pratt.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i><span style="font-family: "garamond";">Venises</span></i><span style="font-family: "garamond";">,
de Morand, é um raro testemunho de viagem. Autobiográfico e poético, descreve «uma
união sem nuvens» do autor com a cidade, do início do século XX até 1970. «O mérito
destas páginas, é terem sido vividas; o seu conjunto é uma colecção privada,
talvez mesmo o meu museu secreto; cada uma delas representa um dia, um minuto,
um entusiasmo, um fracasso, uma hora decisiva ou uma hora perdida.» Ao leitor,
a revisitação desses momentos, longe da turba dos turistas, jamais no Verão.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="font-family: "garamond";">Assediada por milhões de invasores, Veneza dos
venezianos é um local quase sem crime. Sem sangue. A não ser nas páginas da
norte-americana Donna Leon (n.1942), a autora de policiais (todos editados pela
Presença) que, desde 1992, adoptou a cidade do comissário Guido Brunetti. Culto
e com uma vida familiar feliz, Brunetti é tão pouco convencional como a
excelente visão sociológica que nos dá de Veneza: uma realidade cultural que o
turismo está a afundar.</span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Venises», Paul Morand, Gallimard
(1970)</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Morte no La Fenice», Donna Leon,
Presença (1992)</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«O Mercador de Veneza» e «Otelo»,
Shakespeare, Europa-América</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«História da Minha Fuga das Prisões de
Veneza», Giacomo Casanova, Antígona</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Retrato de Uma Senhora», Henry James,
Relógio D’Água</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«A Morte em Veneza», Thomas Mann, Relógio
D’Água</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<span style="color: black; font-family: "garamond";">«Corto Maltese: Fábula de Veneza»,
Hugo Pratt, Meribérica</span><span style="font-family: "garamond";"></span></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<b>Ler 2012 </b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-2192168283727479141.post-32545524756884461312016-07-23T11:23:00.004+01:002016-07-23T19:53:38.914+01:00Leituras de Verão | Ir até ao cabo do mundo<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1fQxAOhODhHa2UyvQ0ZfHzo_SPWceY1uFM8hsA_JO7vkEmHDhYLNzpx5BCVrbxLMvNYB8ejt7fKHot_yb9eE4KbaiQrO-9HEiI8ioP7M8t0yK2UuSNj4GX_c24HolX31RtJFAzFWPwzo/s1600/darien-river-piragua-900x900.jpg"><img border="0" height="426" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi1fQxAOhODhHa2UyvQ0ZfHzo_SPWceY1uFM8hsA_JO7vkEmHDhYLNzpx5BCVrbxLMvNYB8ejt7fKHot_yb9eE4KbaiQrO-9HEiI8ioP7M8t0yK2UuSNj4GX_c24HolX31RtJFAzFWPwzo/s640/darien-river-piragua-900x900.jpg" width="640" /></a><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Fernando
Pessoa garantiu que para viajar basta existir. Depois de mais de cinquenta anos
a correr mundo, a ler e a escrever sobre viagens, Paul Theroux atingiu o que é
reservado a poucos: um ponto onde milhares de vidas se cruzam com milhares de
rotas. Assim surgiu uma das melhores antologias de sempre sobre a arte da
viagem.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Ir
ao cabo do mundo é ir ao cabo de si mesmo. E voltar. Por mais ou menos iniciática,
romântica ou <i style="mso-bidi-font-style: normal;">new age</i> que seja, esta
convicção continua a alimentar o imaginário da grande arte de viajar. O verdadeiro
viajante será um andarilho, um peregrino, um intruso, um errante que desbrava o
mundo que lhe é desconhecido e temeroso, sem nunca o querer domar ou arrotear.
Um ser nos antípodas da espécie hoje mais comum em todas as rotas do globo: o
turista predador, desprezível papa-<i style="mso-bidi-font-style: normal;">miles</i>,
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">tours</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">snapshots</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">happenings</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">resorts</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">cruises</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">amusements</i>, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">shoppings</i> e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">memorabilia</i>. O grande viajante deve antes entregar-se ao
ensinamento de Buda: «Não podes viajar pelo caminho antes de te tornares o
caminho.» O grande viajante viaja até quando está parado. É ele o protagonista d’
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem</i> e a fonte de inspiração
para o que este livro propõe ao leitor: partir, fisicamente estático, para todo
o alhures e com as melhores companhias.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem</i> «pretende ser um guia,
um como fazer, uma miscelânea, um <i style="mso-bidi-font-style: normal;">vade
mecum</i>, uma lista de leituras, uma reminiscência». Recolha de experiências e
escritos de viagens organizada por Paul Theroux em 2011 a partir dos seus mais
de cinquenta anos de leitura, prática e escrita de viagens, esta antologia candidata-se
à lista dos melhores livros de sempre para ler numa praia, quer esteja superpovoada
ou fique numa ilha deserta. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
A
primeira vez que viajei sozinha para o estrangeiro tinha doze anos, passei mais
de 24 horas (tirando umas quatro pausas para chichis) espremida num banco de camioneta,
a mastigar compulsivamente os frutos secos que a minha mãe me mandara por
farnel e a rever incessantemente os passos que teria de dar mal chegasse ao destino.
Quando pus o pé em Paris, as pernas pareciam de pedra, a cara tinha explodido
em borbulhas e eu estava aterrorizada. Mas pela primeira vez experimentava a
minha dose de uma mistura poderosa e aditiva de medo e euforia: a sensação de ser
um viajante. Mais, tinha sido iniciada na solidão e ganhara uma história para
contar.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Uma
das virtudes d<i style="mso-bidi-font-style: normal;">’A Arte da Viagem </i>é
precisamente o facto de Paul Theroux destacar a solidão como qualidade intrínseca
da maioria dos grandes viajantes (embora haja um capítulo reservado àqueles «Que
Nunca Foram Sozinhos», como Bruce Chatwin, André Gide, Sir Richard Burton ou V.
S. Naipaul). Estão aqui muitos dos mais respeitados viajantes-contadores de que
há memória, mas nunca as suas narrativas e experiências são comparadas entre si,
o que sustenta as suas excecionalidade e singularidade. Ainda assim, e é o único
senão da estratégia, a perspectiva de Theroux serve de soberano fio condutor: no
primeiro dos vinte e sete capítulos do livro (em grupos de três, iniciados com
a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Sabedoria de Viagem </i>de um grande
viajante) são dele 94 das 120 citações de aforismos ou epigramas incluídas, o
que, convenhamos, se revela um escusado périplo à volta do próprio umbigo. </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Segundo
Sir Francis Galton, os dorminhocos e os surdos são os únicos humanos incapazes
de viajar sozinhos e isto só porque a vigília e a vigilância são essenciais em
viagem. Freya Stark, autora de mais de trinta livros sobre as tradições do Médio
Oriente, do Afeganistão e da Turquia («o país mais esplêndido, mais variado e
mais interessante do mundo», disse ela), acreditava na viagem solitária como uma
vacina para a «doença de estar sempre a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">fazer
</i>alguma coisa». Também para o compulsivo gregarismo da vida ocidental: «A
solidão, refleti eu, é uma profunda necessidade do espírito humano a que nunca se
dá o reconhecimento adequado nos nossos códigos. É considerada um castigo ou um suplício,
mas quase nunca como o agradável ingrediente indispensável à vida normal, e
desta carência vem metade dos nossos problemas domésticos.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Acompanhado
ou rodeado por uma multidão, cada viajante só se torna um narrador no momento
em que a solidão e o silêncio o destacam de todos. Só então adquire <i style="mso-bidi-font-style: normal;">olhos de ver</i>, apercebendo-se e sentindo no
singular. Quando eu era pequena e estava nas colónias de férias, esta sensação
manifestava-se depois de me isolar algures para escrever o postal regulamentar para
casa. As duas primeiras frases eram sempre: «Por aqui está tudo bem. Tenho os
olhos cheios de vistas.» Só depois vinha o relato. Theroux conta que, em
viagem, se não falasse durante dois dias seguidos, «tinha a impressão alarmante
de que estava a desaparecer». Parece contraditório: «viajar é um ato de
desaparição» mas, como escreveu Jonathan Raban, «a solidão faz acontecer
coisas.» Dentro e fora das nossas cabeças.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Noutro
passo, Theroux afirma que «<i style="mso-bidi-font-style: normal;">Infinito </i>é
o tipo de hipérbole que afecta muitos viajantes iludidos em África». Paul
Bowles, na verdade, é muito culpado pela metáfora estafada do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">chá no deserto</i>. Todavia, o próprio Bowles
esclarece que o Sara é um dos poucos locais acessíveis à face da Terra onde
dinheiro não é sinónimo ou garantia de conforto. Então, porquê ir? Porque é lá
que se escuta o maior silêncio e ocorre o «baptismo da solidão»: «Uma vez que
esteja sob o feitiço do país vasto, luminoso e silencioso, nenhum outro lugar é
suficientemente forte para [um homem], nenhum outro ambiente pode
proporcionar-lhe a sensação supremamente satisfatória de existir no meio de
algo que é absoluto. Voltará, custe o que custar em conforto e dinheiro, porque
o absoluto não tem preço.»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Comparável
a <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem</i> entre as
antologias do que de melhor alguma vez se escreveu sobre viagens, só mesmo <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Book of Traveller’s Tales</i> (1985) de
Eric Newby, mas este peca por se centrar no anacrónico viajante da época de
ouro da descoberta, exploração e colonização do mundo. Paul Theroux, a par de
Bruce Chatwin, Rory Stewart, Rudyard Kapucinski ou James Fenton, pertence à geração
inovadora<i style="mso-bidi-font-style: normal;"> </i>que, associada à primeira
edição <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Travel Writing</i> lançada pela <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Granta</i> em 1983, cunhou uma nova tradição
de viagem e escrita de viagens, destacada de qualquer ismo ou doutrina e mais
próxima de noções como liberdade, diferença.<br />
<br />
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjqJhbJiiHqeMycZqjxBH9zHKbzHy-mi3-iQZ9AKq3rClJ3EhMf4YbI72xEXuCMRk0VBwINJ1naIczF3UzsT_ko1v34FkdUJEcHwBsG6b9E27NmuaB7C_2mMi2B8MX_qyCDwszypVga4ts/s1600/99_reasons_to_travel.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="448" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjqJhbJiiHqeMycZqjxBH9zHKbzHy-mi3-iQZ9AKq3rClJ3EhMf4YbI72xEXuCMRk0VBwINJ1naIczF3UzsT_ko1v34FkdUJEcHwBsG6b9E27NmuaB7C_2mMi2B8MX_qyCDwszypVga4ts/s640/99_reasons_to_travel.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem</i> desfilam as mais variadas
experiências (e conselhos), mas está implícito que ir e voltar <i style="mso-bidi-font-style: normal;">de verdade</i> significa sobretudo mergulharmos
como que nus no quase absoluto desconhecido, entre estranhos, fora do tempo e
aguardando mais a estranheza, as dificuldades e o medo do que a felicidade, a
surpresa ou o fascínio. Viajar é como atravessar um espelho e ver-se do avesso
do outro lado. O verso e o reverso da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">grande
viagem</i> tem tantas expressões quantas as personalidades e objetivos dos
viajantes que nela se refletem. Pode ser uma expedição guiada no Evereste: Jon
Krakauer garante que esta escalada só deve ser feita por pessoas programadas
para ignorar o sofrimento pessoal e driblar o terrível dilema do equilíbrio
certo entre motivação e noção do perigo. Pode ser a procura de uma droga:
William Burroughs odiava viajar e desprezava estrangeiros, mas percorreu a América
Latina e embrenhou-se na selva da Alta Amazónia em busca da <i style="mso-bidi-font-style: normal;">ayahuasca</i>, uma poção feita de videira. Pode
ser um bom par de horas a regatear uma <i style="mso-bidi-font-style: normal;">dejellaba</i>
num souk marroquino, onde «uma pessoa é tentada a pensar que há mais tipos de
preços do que tipos de pessoas no mundo» (Elias Canetti). Pode ser o êxtase da
luz crepuscular reflectida no Palácio Potala em Lhasa ou... provar escaravelho
de saguzeiro frito na Nova Guiné (Tim Cahill), pés de urso, barbatanas de foca ou
mão de macaco. Pode ser um memorável exercício de paranoia (Evelyn Waugh no
Ceilão) ou um desafio para vencer a agorafobia (Geoffrey Moorhouse, seis mil
quilómetros pelo deserto desde o Atlântico até ao Nilo: «para explorar o
extremo da experiência humana»). Theroux reserva mesmo um capítulo para os casos
de escritores que descreveram lugares onde nunca foram, como Kafka em relação à
América ou Edgar Rice Burroughs (criador de Tarzan) e Saul Bellow em relação a África.
No limite, «fechar os olhos é viajar», como assegurou a poetisa norte-americana
Emily Dickinson, a Grande Reclusa (viveu 25 anos sem sair do perímetro da casa
dos pais).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Quando
os inuit polar viram pela primeira vez um branco diferente deles (o explorador
Sir William Harry em 1821) questionaram-se: «É do Sol ou da Lua?» Salto no
escuro, «fuga e perseguição em partes iguais» (Theroux), toda a viagem significa
um encontro marcado com o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Outro</i> e a
sua diferença e estranheza. A relação entre locais e viajantes pode ser a
experiência mais trágica ou a mais hilariante e <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem </i>contém várias histórias que ilustram as duas
possibilidades. Contudo, ainda é mais cativante descobrir que o grande viajante
é alguém capaz de, muitas vezes de forma extremada, revelar-se um Outro que antes
supunha não existir dentro de si. Efeito de adaptação, transformação ou forma
de resistência? Dervla Murphy, por exemplo, disfarçou-se de homem para viajar
através da Etiópia. Mas, quando foi de bicicleta da Irlanda à Índia (a base do
relato <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Full Tilt</i>), viveu uma experiência
tão ou mais radical: «Quando cheguei à fronteira afegã, parecia-me
perfeitamente natural, antes de uma refeição, limpar a lama seca do pão, tirar
os pelos do queijo e catar os insetos do açúcar. Também tinha deixado de
registar a presença de moscas, a ausência de talheres e o facto de não despir a
minha roupa nem dormir numa cama há dez dias.» Outra coisa não seria de esperar
de quem aconselha: «Ao nascer do Sol, não é necessário, nem sequer desejável,
saber onde iremos estar ao pôr do Sol.» Valerian Albanov, atravessou 235 milhas
do Ártico na neve, no gelo e no mar alto. Após dois meses sem se lavar e com a
roupa interior tomada pelos parasitas, afiançou: «Se puséssemos uma das nossas
blusas infestadas no chão, ela arrastar-se-ia sozinha para longe!»</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem</i>, Paul Theroux arruma os
vários viajantes e narradores de viagens segundo rotas, meios de transporte
(privilégio para os amantes do comboio), motivações, bagagens, medos e neuroses,
companhias, nacionalidade («Sobre Fugir de Inglaterra»), delírios, refeições, fantasias,
epifanias ou até pela duração das viagens. Neste último caso, destaca-se o
antropólogo Paul du Chaillu, primeiro <i style="mso-bidi-font-style: normal;">estrangeiro</i>
a confirmar a existência de gorilas e de pigmeus na África Central. Passou no total
só três anos a viajar, mas fê-lo «sempre a pé e sem a companhia de outros
homens brancos — cerca de 13 000 quilómetros»: «Abati, embalsamei e trouxe para
casa mais de 2000 aves, mais de 60 das quais são espécies novas, e matei mais
de 1000 quadrúpedes, 200 dos quais foram embalsamados e trazidos para casa,
sendo 60 até aí desconhecidos da ciência. Sofri cinquenta ataques de febre
africana, tendo tomado, para me curar, mais de quatrocentos gramas de quinino.»
Que diferença de Xavier de Maistre, defensor das viagens à volta do próprio
quarto. Ou do grande poeta romântico inglês William Wordsworth: anósmico (não
tinha olfato), adorava flores, estar ao ar livre e toda a vida compôs poemas durante
caminhadas (sobretudo pelo Lake District inglês). Aos sessenta anos de idade, os
seus passeios a pé diários iam pelo menos até às quatro horas de duração e aos
trinta e seis quilómetros de percurso. As viagens, pequenas ou grandes, longas
ou curtas, reais ou imaginárias, incómodas ou confortáveis, assustadoras ou
pacificadoras, são sempre partidas de Cá para Lá. Em <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A Arte da Viagem</i> transformam-se em «histórias de Lá e Volta»(Theroux).
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">1ª edição:</b> <i style="mso-bidi-font-style: normal;">The Tao of Travel</i>: <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Enlightments
from Lives on the Road</i>, Paul Theroux, Houghton Mifflin Harcourt, Maio 2011,
Boston, EUA</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Personagens principais:</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
Paul
Theroux é o protagonista de todas as escolhas e reserva-se o maior espaço de
citação, relato e opinião. Ainda assim, destaca a «Sabedoria de Viagem» de
Henry Fielding, Samuel Johnson, Sir Francis Galton, Robert Louis Stevenson,
Freya Stark, Claude Lévi-Strauss, Evelyn Waugh e Paul Bowles.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Curiosidades:</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
• Da
Patagónia, não passarás. Também para Paul Theroux e Bruce Chatwin, fundadores
de um novo tipo de experiência e escrita de viagens no século XX, ainda que com
personalidades diferentes e em alguns aspectos opostas, a Patagónia foi uma
experiência e uma metáfora do «cabo final do exílio», limite metafórico para as
suas ambições de conhecimento e exploração do mundo. Da memorável conversa que
um dia os dois tiveram na The Royal Geographical Society sobre esta influência
nasceu, em 1986, um pequeno livro que é um tesouro: <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Regresso à Patagónia</i> (Quetzal, 2009).</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
• O
livro de viagens mais famoso e considerado de Paul Theroux foi o de estreia, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">O Grande Bazar Ferroviário</i> (1975;
Quetzal, 2011), relato do percurso que fez da Grã-Bretanha ao Japão e volta.
Mas talvez o seu relato de viagens mais talentoso seja <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Subway Odissey</i>, um texto publicado no <i style="mso-bidi-font-style: normal;">The New York Times </i>a 31 de Janeiro de 1982 e ainda acessível no
site do jornal. Nele, Theroux descreve as suas impressões sobre o metro de Nova
Iorque com a mesma intensidade com que descreveria uma viagem ao coração da
selva ou ao pico dos Himalaias.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
• O
mais recente livro de viagens de Paul Theroux chama-se <i style="mso-bidi-font-style: normal;">The Last Train to Zona Verde: My Ultimate African Safari</i> e foi lançado
em Maio deste ano pela Houghton Mifflin Harcourt.<br />
<br />
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj0MBAk0A4pzpIfUMXOsfek6OxpekXKHe9SGZVnDWF9BKo_w5vp3TRATHCH0yFOByv47rGpqbHZGTPhfmw2sr8yrPNbyh8HerXMRdKMS3F2CCxMH8R6BYvXSJdTGrRHXA7XV-zBiVVeTCc/s1600/a-arte-da-viagem.jpg" imageanchor="1"><img border="0" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj0MBAk0A4pzpIfUMXOsfek6OxpekXKHe9SGZVnDWF9BKo_w5vp3TRATHCH0yFOByv47rGpqbHZGTPhfmw2sr8yrPNbyh8HerXMRdKMS3F2CCxMH8R6BYvXSJdTGrRHXA7XV-zBiVVeTCc/s320/a-arte-da-viagem.jpg" width="204" /></a> </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i>Porque
se todo o verdadeiro caso amoroso puder ter o sabor de uma viagem a um país
estrangeiro, onde não sabemos falar a língua e não sabemos para onde vamos e
somos puxados cada vez mais para dentro da sedutora escuridão, toda a viagem a
um país estrangeiro pode ser um caso amoroso em que ficamos a pensar quem somos
e por quem nos apaixonámos. (…) Todas as viagens têm que ver, como o amor, com
sermos tirados de dentro de nós próprios e depositados no meio do terror e do
espanto.</i><b> Pico Iyer</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i>Tchekov
disse: “Se tens medo da solidão, não te cases.” Eu diria: se tens medo da solidão,
não viajes. A literatura de viagens mostra os efeitos da solidão, umas vezes
desolada, mais frequentemente enriquecedora, de vez em quando inesperadamente
espiritual.</i> <b>Paul Theroux</b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;">
<i>Escolha
o país, sirva-se de guias de viagem para identificar as zonas mais frequentadas
por estrangeiros — e depois vá em sentido contrário.</i> <b>Dervla Murphy</b></div>
<br />
<b>LER 2013</b><br />
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)<br />
<br />Filipa Melohttp://www.blogger.com/profile/14938166828029526590noreply@blogger.com